MAZELAS DA JUSTIÇA

Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.

sábado, 30 de junho de 2012

A SALVAÇÃO DOS CONTA-SUJAS

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OPINIÃO O Estado de S.Paulo - 30/06/2012

Em março passado, inspirado na Lei da Ficha Limpa, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que os candidatos às eleições deste ano teriam de ter aprovadas as contas de suas campanhas anteriores, do contrário não poderiam concorrer. A reprovação, entendeu a Corte, "implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral". Até então, a legislação exigia apenas a apresentação da papelada para que as candidaturas fossem registradas, transformando em letra morta a obrigação dos políticos de submeter ao exame da Justiça Eleitoral o balanço de entradas (doações, repasses partidários e recursos próprios) e saídas (gastos autorizados para a conquista do voto popular) no decorrer do pleito.

O estoque de contas rejeitadas é da ordem de 21 mil, mas nem por isso os seus responsáveis - os contas-sujas, como passaram a ser chamados, por analogia com os fichas-sujas - se tornaram inelegíveis para o pleito seguinte. Esse evidente contrassenso foi removido pelo TSE por 4 votos a 3. Os três ministros do Supremo que integram o colegiado de sete membros - à época, Cármen Lúcia, Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski - apoiaram o parecer da relatora da matéria, Nancy Andrighi, segundo o qual a mera entrega das demonstrações financeiras não basta para os candidatos se acharem quites com a lei. Parece óbvio. Para comparar, o pagamento de um imóvel por meio de um cheque só quita a dívida do comprador quando o banco considerar bom o cheque em posse do vendedor.

Como era de esperar, os políticos exerceram o seu direito de pedir que a decisão fosse reconsiderada. A ação movida pelo PT, a que aderiram 17 outros partidos, invocou apropriadamente o princípio da anualidade: por ter sido baixada a menos de 12 meses do pleito, a norma adotada pelo TSE só poderia produzir efeitos a partir das eleições de 2014. No entanto, na última quinta-feira, quando o recurso foi julgado - e acolhido, também por 4 votos a 3 - prevaleceu o entendimento antigo de que a simples entrega do papelório, contenha ele os erros ou fraudes que contiver, é sinônimo de quitação cabal. Em algum momento no futuro os procuradores eleitorais poderão pedir a inelegibilidade do candidato cuja documentação contenha gastos ilícitos. Mas até lá, a vida segue.

"Penso que amanhã a Justiça Eleitoral será excomungada pela opinião pública", advertiu o ministro Marco Aurélio, ao proferir o seu voto. "O tribunal está considerando o certo por errado." A rigor, não foi o TSE que recuou. Dos quatro defensores da tese criticada pelo colega, três já a haviam apoiado na votação anterior. E dois dos três ministros do STF da maioria de então mantiveram as suas posições, assim como a relatora. O que fez toda a diferença foi o afastamento de Lewandowski, em abril, da Corte que presidia: o seu substituto, José Antonio Dias Toffoli, na contramão das demandas por lisura nas campanhas e contra a impunidade dos candidatos maracuteiros, decidiu a parada em favor dos "fichas-sujas".

Se depender do Congresso, a polêmica deixará de ter sentido prático - e vai sem dizer em benefício de quem. Em fins de maio, numa reação fulminante à resolução moralizadora do TSE, a Câmara dos Deputados aprovou por nada menos de 299 votos a 14, passados apenas nove dias úteis de sua apresentação, um projeto que autoriza o registro das candidaturas dos políticos cujas contas de campanhas anteriores tenham sido rejeitadas pela Justiça Eleitoral. Todos os partidos, menos o PSOL e escassos membros de outras bancadas, como se vê pelos números, apoiaram a proposta. Será surpresa se cair no Senado.

A anistia aos contas-sujas equivalerá a uma carta branca para o caixa 2 - o uso de recursos financeiros não declarados à Justiça Eleitoral para quitar débitos não contabilizados assumidos nas campanhas políticas -, como explicou o professor Delúbio Soares depois de se transmutar em tesoureiro do PT e se tornar um dos mentores do mensalão. Os partidos poderão então entregar-se com desenvoltura àquilo que o então presidente Lula, patrono de Delúbio, disse certa vez que todos faziam "sistematicamente".

CONTAS MAL FEITAS

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ZERO HORA 30 de junho de 2012 | N° 17116

EDITORIAL 


É desconcertante a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) liberando registro de candidaturas de políticos que não tiveram suas contas de campanha aprovadas na eleição anterior. Ao revogar a decisão de 1º de março do próprio tribunal, que condicionava a emissão de certidão de quitação eleitoral à aprovação das contas, os ministros abriram caminho para a candidatura de pessoas que, por desonestidade ou inaptidão, não conseguiram comprovar devidamente doações e gastos – o que, como se sabe, é um caminho para a corrupção.

Com a decisão, fica definido o quadro político e abre-se o caminho para a indicação de candidatos e a formação de coligações nas convenções partidárias a serem concluídas neste final de semana, assim como para o registro de candidaturas, até o dia 5. Conforme o TSE, os Tribunais Regionais Eleitorais e os juízes de primeira instância serão orientados “no sentido de que não conste como requisito de inelegibilidade a desaprovação das contas”. Com a volta atrás, a estimativa é de que pelo menos 20 mil políticos retomem as condições de voltar a pedir voto, mesmo que suas contas anteriores tenham sido rejeitadas. A única exceção são os gestores que tiveram a contabilidade referente a suas administrações no setor público rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que continuarão sujeitos à inelegibilidade.

Difícil de ser entendida por eleitores preocupados em votar em políticos comprometidos com a ética, a reviravolta só ocorreu porque, desde março, quando foi aprovada resolução condicionando as candidaturas à aprovação de contas anteriores de campanha, mudou a composição do TSE. Dias depois, o PT pediu reconsideração, com o apoio de 17 partidos, que acabou sendo aceita. O entendimento acaba reforçando, assim, decisão da Câmara dos Deputados, que em maio, às pressas, aprovou projeto pondo fim à exigência das contas de campanha aprovadas. Condenada por instituições dedicadas à luta contra a corrupção política, a decisão ainda dependia de aprovação do Senado para entrar em vigor, até a mais recente decisão do TSE sobre o tema.

A volta atrás na exigência de aprovação de contas de campanhas de políticos, substituída agora pela simples apresentação da contabilidade, é um retrocesso que prejudica eleitores preocupados com a qualidade de seu voto. Um dos pressupostos mínimos exigidos de qualquer político é que ele esteja em dia com suas obrigações eleitorais, prestando contas com o máximo de transparência sobre a origem dos recursos de campanha e sobre a sua efetiva aplicação. A simples apresentação formal das contas, sem a exigência de aprovação pelos órgãos de acompanhamento do processo, sempre parecerá pouco para evitar que os eleitores acabem elegendo candidatos descomprometidos com a ética.

Na falta de maior rigor legal, os eleitores precisarão se mostrar mais atentos ainda para evitar equívocos em suas escolhas. A saída, nesses casos, será recorrer mais a entidades da sociedade organizada com atuação voltada para a moralização da política.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA
  • Que país é este onde os "representantes do povo" manobram a favor de pessoas suspeitas de atos de improbidade e onde a justiça dá aval para que estes continuem concorrendo a cargos públicos antes de julgados?

  • Jorge Bengochea Se os "representantes" agem assim em nome do povo, é porque tem o aval do povo nas urnas. E se a justiça decide desta forma é porque tem o aval dos magistrados e da lei.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

PELUSO REAGE ÀS CRITICAS DE CALMON SOBRE SALÁRIOS

Cezar Peluso reage às críticas de Eliana Calmon sobre salários . Ex-presidente do CNJ nega que tentou ‘relativizar’ exigência de tribunais informar vencimentos


Thiago Herdy
O GLOBO 29/06/12 - 10h54



SÃO PAULO - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Cezar Peluso reagiu às declarações da corregedora geral de Justiça, Eliana Calmon, que em entrevista ao site do GLOBO o acusou de "relativizar" a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que exigia dos tribunais o envio de informações sobre salários de magistrados e servidores. Calmon diz ter evitado o confronto com Peluso, então presidente do CNJ, e por isso, nada teria feito com os dados.

- É absolutamente falsa a informação de que, como presidente do CNJ, tenha tentado, de alguma forma, “relativizar” a disciplina legal dos subsídios dos magistrados. Isso jamais foi cogitado durante minha gestão - reagiu Peluso.

Em sua defesa, o ministro afirma, inclusive, ter votado contra a extensão de vantagens do Ministério Público à magistratura sem apoio em lei, iniciativa que turbinou os vencimentos dos juízes.

- Fui vencido na votação do Pedido de Providência (PP nº 204322) e da Resolução aprovada pelo CNJ (Ato nº 818083), que estenderam, sem apoio em lei, vantagens do Ministério Público à magistratura. É só consultar os registros - alegou o ministro do STF.

Conforme o GLOBO noticiou no último domingo, tribunais de todo país se recusam a informar os nomes dos magistrados que recebem salários milionários em função de "vantagens eventuais" obtidas nos últimos anos. O CNJ recebe os dados para exercer o controle da atividade judiciária, mas nada faz com eles. Não há nem mesmo um gestor responsável por acompanhar o cumprimento da resolução pelos tribunais.

- Levei dois anos sem questionar isso, embora a corregedoria seja independente, ela tem uma certa hierarquia e obedece às políticas traçadas pela presidência, e isso era para eu não mexer - acusou Calmon, na entrevista ao GLOBO.

JUSTIÇA LIVRA DEPUTADO CUJO ASSESSOR FOI FLAGRADO COM DINHEIRO NA CUECA


 João Bosco
O ESTADO DE SÃO PAULO, 28.junho.2012 19:38:29

Justiça livra José Guimarães de investigação dos dólares na cueca




Sete anos depois – e às vésperas do julgamento do mensalão – o Superior Tribunal de Justiça (STJ) livrou o vice-líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), da acusação de envolvimento no episódio em que um assessor dele, José Adalberto Vieira, foi preso no Aeroporto de Congonhas em São Paulo com US$ 100 mil escondidos na cueca, e mais R$ 209 mil numa maleta de mão, quando embarcava para Fortaleza.

O fato ocorreu no dia 8 de julho de 2005, em meio aos desdobramentos do mensalão, e precipitou o afastamento do então deputado José Genoíno da presidência do PT.

Irmão de Guimarães, Genoíno era alvo de investigação da CPI dos Correios e cogitava deixar o comando do PT. Ele acabou renunciando ao cargo dois dias depois da prisão do assessor parlamentar de seu irmão, que na época era deputado estadual e presidente do PT no Ceará.

Hoje Genoíno é um dos 38 réus do mensalão, que será julgado a partir de agosto. Já Guimarães, em plena ascensão no PT, é coordenador da bancada do Nordeste e cotado para assumir a liderança da bancada federal em 2013.

A Primeira Turma do STJ – da qual faz parte o novo Corregedor Nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão – acolheu, por unanimidade, no último dia 21 de junho, recurso para determinar que José Guimarães não figure mais como réu na ação de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público Federal, em tramitação na 10a Vara Federal em Fortaleza, embora ainda não haja até hoje, sentença final de mérito e o processo ainda se encontre na fase das alegações finais.

“Tenho que tais circunstâncias, de relação de amizade e companheirismo político e partidário, não são o bastante para sustentar a instauração de uma ação de improbidade em relação ao recorrente”, diz o relator, Benedito Gonçalves, em seu voto.

A decisão surpreendeu o Ministério Público Federal, que havia opinado pela rejeição do recurso. “É uma decisão forte, eu não esperava que o tribunal chegasse a esse ponto”, disse o subprocurador da República Antônio Carlos Fonseca ao Estado.

Ele defendia que a investigação fosse concluída na primeira instância, a fim de que na sentença final o juiz avaliasse a responsabilidade de Guimarães no episódio, em meio a um amplo conjunto de provas. Fonseca adiantou que pretende recorrer da decisão.

A defesa de José Guimarães afirma que desde o início, não havia elementos que ligassem o deputado aos dólares apreendidos com seu assessor. O advogado Hélio das Chagas Leitão Neto afirma que indícios não bastam para processar o seu cliente.

Ele admite que Guimarães conhecia Vieira, até porque era assessor dele. “Mas isso não o responsabiliza”, argumenta. “Se o meu assessor comete um deslize, sou automaticamente responsabilizado?”, questiona.

Dinheiro de propina

A linha de investigação do Ministério Público é de que o dinheiro apreendido com Vieira seria de propina, fruto de vantagens ilegais obtidas pelo consórcio Sistema de Transmissão do Nordeste S/A, cujo acionista majoritário é a empresa Alusa (Companhia Técnica de Engenharia Elétrica S/A).

O consórcio conseguiu uma linha de crédito de R$ 300 milhões junto ao Banco do Nordeste (BNB) e venceu licitação para construir uma rede de transmissão de energia elétrica entre Fortaleza e Teresina (PI).

Este financiamento teria sido intermediado por Kennedy Moura Ramos, assessor especial da presidência do Banco do Nordeste, e ex-assessor e tesoureiro de José Guimarães, que o teria indicado para o cargo.

Até 2004, Kennedy foi chefe de gabinete do então presidente do BNB, Roberto Smith. Ambos figuram como réus na ação de improbidade, ao lado de Guimarães, Vieira, e de mais oito acusados, entre diretores do BNB e das empresas ligadas ao consórcio STN.

O MP atribui a Guimarães as indicações de Smith e Kennedy para a cúpula do Banco do Nordeste.

“Graças a Deus”

Na inicial da ação de improbidade, o Ministério Público apontou indícios da participação de Guimarães no episódio. Para os procuradores, ele seria “o mais forte elo de ligação entre Kennedy e Adalberto”.

Ao longo das investigações, que envolveram a quebra de sigilos telefônicos e outras provas, o MP verificou contatos pessoais e telefônicos entre Guimarães, Kennedy e Vieira. Os procuradores lembram que Guimarães “apresentou confusas versões” sobre o dinheiro apreendido. Pediu a Kennedy que assumisse a propriedade do dinheiro. E teria exclamado um “graças a Deus” ao ser informado de que Vieira não tinha falado nada sobre ele.

Militante histórico do PT, Vieira era assessor do gabinete de Guimarães na Assembleia Legislativa do Ceará desde 2001. Quando foi preso, portava um celular corporativo do partido. Deste aparelho, disparou a primeira ligação, após sua detenção, para Kennedy, que por sua vez, acionou advogados para livrá-lo.

Um dos indícios de que o dinheiro não pertenceria a Vieira, segundo os procuradores, eram os sinais exteriores de riqueza, incompatíveis com a renda dele. Na véspera da viagem a São Paulo, Vieira comprou um Corsa 1.8, zero quilômetro. A banca de advogados que o defendeu foi a mesma que advogou para empresários e políticos, como o deputado Paulo Maluf (PP-SP).

O SANGRAMENTO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


O ESTADO DE SÃO PAULO, 29 de junho de 2012 | 3h 10


ALOÍSIO DE TOLEDO CÉSAR, DESEMBARGADOR APOSENTADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO



É preocupante verificar que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), o maior do País, continua a sangrar por força do comportamento inadequado e censurável de um grupo de desembargadores que se prevaleceram da posição em que se encontravam para obter privilégios de recebimentos e, assim, tornar-se desiguais em relação aos demais.

A rigor, dos aproximadamente 360 desembargadores paulistas, cerca de 10% passaram na frente dos colegas, num comportamento lamentável, e receberam por antecipação valores correspondentes a direitos trabalhistas que haviam sido reconhecidos a todos.

O ponto lamentável e condenável dessa conduta está em eles se haverem prevalecido de suas respectivas posições no momento de avançar sobre os valores que deveriam ser creditados igualitariamente a todos os juízes, ativos e inativos, em pequenos pagamentos mensais. O juiz que está segregado, lá nas beiras do Rio Paraná, não teria nunca a chance de fazer o mesmo.

As explicações dadas individualmente levam sempre à conclusão de que não foi um comportamento justo, o que se mostra trágico, porque envolve juízes. É possível que esses desembargadores ainda não tenham consciência do estrago que impuseram à imagem do Poder Judiciário no Brasil e, em especial, no Estado de São Paulo. O pior é que, na tentativa de justificar os recebimentos equivocados desses valores, passaram a acusar uns aos outros, alimentando os órgãos de divulgação com notícias que gradativamente fazem aumentar o descrédito em torno deles.

Por motivos muitos menos relevantes e menos graves, foram frequentes no Tribunal de Justiça, ao longo de décadas, pedidos de aposentadoria formulados por desembargadores que configuraram conduta não criminosa, porém eticamente inadequada. Diante do chamamento aos deveres formulado pelo presidente do tribunal, esses desembargadores tomaram a decisão mais conveniente de se afastar.

Essa linha comportamental se alia à necessidade de que os jurisdicionados precisam ter sempre a segurança de que serão julgados por pessoas dotadas de credibilidade e respeito. Sim, porque ao jurisdicionado é fundamental que o juiz ao qual está submetido não esteja de forma nenhuma envolvido por uma sombra de suspeição.

O direito que nos rodeia, impalpável, abstrato, somente tem sua existência reconhecida pelo cidadão no momento em que é violado. Nessa hora, o cidadão se dá conta de que o direito violado terá de ser exposto e pleiteado perante um juiz. E como deve ser esse juiz? O requisito essencial, além da competência necessária para o exercício do cargo, é que sobre ele não pese nenhuma suspeita.

Não é conveniente que um juiz atingido por dúvida comportamental ou que seja réu em processo administrativo de tamanha relevância continue a julgar, nem se pode esperar que os seus julgamentos sejam recebidos com a necessária credibilidade. O ideal, nessas circunstâncias, talvez seja a opção pelo afastamento voluntário, importante para impedir que a imagem pessoal de cada um, desgastada e vulnerada, alcance e contamine cada vez mais o Tribunal de Justiça, já bastante abalado pelo ocorrido.

Seria um gesto de grandeza dessas pessoas deixar de fazer por meio da imprensa afirmações que explicam, mas não justificam, a conduta assumida. Poderiam, também, por respeito humano, pensar um pouco mais nos demais juízes e desembargadores que continuarão na ativa e que também estão sofrendo com esse desgaste, para o qual não concorreram.

A Lei Orgânica da Magistratura, norma complementar à Constituição federal, dispõe com toda clareza, em seu artigo 35, inciso VIII, que os juízes de direito têm o dever de "manter conduta irrepreensível na vida pública e particular". Para contrabalançar e dar equilíbrio às prerrogativas que lhes são privativas, como vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos, o legislador impôs aos juízes o dever da conduta irrepreensível.

O descumprimento dessa regra obriga o presidente do tribunal a agir em sua defesa quando, individualmente - como no caso presente -, ocorrem violações e, principalmente, quando elas acabam se tornando públicas. Isso está ocorrendo de forma desastrosa, porque acabou aguçando as emoções, levando a uma lamentável "troca de chumbo" entre altos figurões da magistratura.

Num patamar bem abaixo deste palco onde ocorrem as disputas e os xingamentos estão mais de 2 mil juízes paulistas, cada um em sua comarca, cada um em sua vara, porém todos abalados e abismados com o atual espetáculo. Esses juízes nada têm que ver com os deslizes éticos de seus superiores, mas estão pagando um preço muito alto por eles: com muita frequência, são vistos como suspeitos pelos jurisdicionados.

Inicialmente, com boas razões, a ministra Eliana Calmon investiu furiosamente contra a conduta errada de juízes brasileiros. A forma com que ela fez isso lhe conferiu incrível notoriedade e levou a resultados surpreendentes no trabalho de "abrir a barriga" do Poder Judiciário. No Tribunal de Justiça de São Paulo, sobretudo, viu-se que o comportamento eticamente condenável desses desembargadores iniciou um processo de sangria que parece não ter fim.

As divergências entre os desembargadores alcançados pelas acusações de conduta inadequada já se tornaram pessoais e são a toda hora repetidas. Parece faltar, sem nenhuma dúvida, um pouco de grandeza a esses desembargadores, para que se deem conta de algo que parecem haver esquecido: eles são juízes e têm o dever de cumprir aquilo que está exposto na Lei Orgânica da Magistratura, ou seja, sua obrigação é "manter conduta irrepreensível na vida pública e particular".

COLEGIADO DE JUÍZES CONTRA O CRIME

 

EDITORIAL CORREIO DO POVO, 29/06/2012


Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que institui um colegiado de juízes para julgar os delitos cometidos por organizações criminosas. Atualmente, a proposição se encontra na Câmara dos Deputados por conta de alterações que foram feitas no Senado em relação ao texto original votado pelos deputados federais, o que determinou seu retorno à casa de origem.

Para a corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, é urgente que os parlamentares aprovem o quanto antes o projeto de lei da Câmara n 3 de 2010 (PLC 03/2010). Segundo ela, é preciso tirar o foco do juiz singular, que fica muito visado pelos criminosos. Pela proposta, serão três julgadores, um que é da causa e mais dois escolhidos por sorteio eletrônico. Se necessário, poderá ser decretado o sigilo das sessões de julgamento. A iniciativa da apresentação do PLC partiu da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

Recentemente, um episódio serviu para motivar mudanças nos procedimentos penais de julgamento de integrantes de grupos acusados de crimes. Um juiz pediu afastamento do caso envolvendo o empresário Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira. Ele alegou cansaço, mas também denunciou ameaças à sua família, o que foi decisivo para seu pedido de substituição.

Além dos juízes, é preciso ainda levar em conta medidas protetivas para os promotores, afinal, eles são os responsáveis pela acusação e igualmente ficam expostos a represálias dos delinquentes. Tantos juízes quanto promotores encaminham os procedimentos de penalização daqueles que atentam contra o bem-estar da sociedade e não podem, de forma alguma, sofrer qualquer tipo de restrição no seu mister. Para isso, é preciso que recebam a proteção e os instrumentos necessários para coibir com rigor a atuação daqueles que escolheram o caminho do crime. Ao Congresso cabe aprovar as leis que vão lhes permitir realizar suas tarefas com todas as garantias compatíveis com seus ofícios.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Já está na hora do Poder Judiciário participar do esforço nacional contra o crime. Chega de ser manter o atual status-quo soberbo, mediador, tolerante, alternativo e figurante em questões de ordem pública. É preciso reformar o Judiciário e promover um ativismo judicial que aproxime o a justiça da sociedade, dos delitos, das polícias e das questões que envolvem a ordem púlbica, a vida e o patrimônio das pessoas.  O Brasil precisa ter um SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL com varas especiais de justiça, colegiado de julgadores, juízes de instrução e juizes de garantia, atuando de forma desburocrata, descentralizado, em processos ágeis e fortalecidos com suporte em leis rigorosas e decisões respeitadas.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

FUTURO PRESIDENTE DO STF FALA SOBRE MENSALÃO E MAZELAS DO JUDICIÁRIO

FOLHA.COM 14/04/2012 - 17h00

Entrevista de Ayres Britto à Folha e ao UOL

DE BRASÍLIA

O ministro Ayres Britto, que assumirá a Presidência do STF (Supremo Tribunal Federal) em 19 de abril, participou do "Poder e Política", projeto do UOL e da Folha conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 12.abr.2012 no gabinete de Ayres Britto no STF, em Brasília.


Mensalão deve ser julgado até 30/6 ou fica para 2013. Novo presidente do STF afirmou que julgamento deveria acabar antes do 2º semestre para não correr junto com casos ligados à eleição.


Narração de abertura: Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto tem 69 anos. É ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), desde 2003. Foi indicado ao cargo pelo ex-presidente Lula. Advogado e professor da Universidade Federal de Sergipe, Ayres Britto tentou ser deputado federal pelo PT em 1990... Mas perdeu a eleição. Em 2002, o PT não permitiu sua candidatura a senador. Ayres Britto é considerado um dos mais liberais integrantes do STF. Ele assume o Supremo agora, em 19 de abril, e comanda a Corte até novembro de 2012, quando fará 70 anos e terá de se aposentar. A expectativa é que o julgamento do mensalão ocorra sob sua presidência.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política Entrevista".

Este programa é uma realização do jornal Folha de São Paulo e dos portais Folha.com e UOL. A gravação desta edição está acontecendo dentro do Supremo Tribunal Federal. É que o entrevistado desta edição é ministro Carlos Ayres Britto, que vai assumir o comando do Supremo no dia 19 de abril.

Folha/UOL: Muito obrigado por receber a Folha e o UOL aqui no Supremo. Eu começo perguntando: o sr. esteve com a presidente Dilma Rousseff [antes de gravar a entrevista, Ayres Britto esteve com a presidente]. Como foi a conversa?


Ayres Britto: Ah, uma visita muito agradável. Fui levar, como de praxe, um convite para que Sua Excelência comparecesse à cerimônia de posse da nova direção do Supremo. E a presidente foi muito receptiva, muito carinhosa. E travamos... desenvolvemos uma conversa muito carinhosa, muito agradável, descontraída.

Folha/UOL: Ministro, o sr. vai ser o presidente do Supremo mais liberal da história desta corte?

Ayres Britto: Não, eu não acredito que eu seja o mais liberal. Há tantos liberais aqui. As comparações são perigosas, tanto quando as generalizações. Já dizia Millôr Fernandes. Eu me considero uma pessoa aberta para o novo. Eu até dizia a você ainda há pouco, Fernando, que a minha única questão fechada é a minha abertura para o novo. Mas não é um novo pelo novo. É aquele novo que tem um potencial qualitativamente transformador da sociedade.

Folha/UOL: O seu antecessor, que ainda é presidente [do STF] enquanto falamos, Cezar Peluso, ao assumir disse que enviaria ao Congresso, era plano dele, um projeto de Lei Orgânica da Magistratura Nacional [Loman] nova. Ele não conseguiu. O sr. pretende, no seu período na presidência, tocar nesse tema e produzir esse novo projeto de Loman?

Ayres Britto: Sim. Será uma das prioridades. Atualizar o projeto de lei e encaminhá-lo. Agora, tudo tem que ser feito de comum acordo com os demais ministros e outros protagonistas de proa da cena judiciária, como os presidentes dos tribunais superiores, também os presidentes de associação.

Folha/UOL: O sr. acredita que durante o período da sua Presidência vai ser possível enviar o projeto de Loman para o Congresso?

Ayres Britto: Farei todo o esforço. Porque nós precisamos de um estatuto da magistratura atualizado, já produzido de acordo com os princípios e preceitos da Constituição Federal. E a magistratura anseia por essa atualização no seu regime jurídico central no plano orgânico propriamente dito.

Folha/UOL: Os cerca de quase 3 meses por ano de descanso, em média, que juízes têm de acordo com o que está na lei... entre férias e feriados prolongados e recessos. O sr. acha que esse prazo oficial de descanso anual para os juízes, magistrados, é bom ou deve ser reduzido?

Ayres Britto: É um tema que será objeto, no meu período de administração, de focada discussão. Há prerrogativas que se justificam. Há outras que se desatualizaram, se defasaram. E o foro adequado para esse debate me parece o Conselho Nacional de Justiça, que faz o planejamento estrutural e estratégico das atividades do Judiciário. É certo que a atividade judicante é incomparável, é absolutamente insimilar. O juiz não se descarta dos seus processos, das teses que precisa dominar para equacionar os casos como qualquer pessoa se desvencilha de uma gravata quando chega à sua casa, de uma camisa, de um paletó, joga sobre a cama ou põe no cabide. Nós somos como que, aspas, obrigados a levar conosco mentalmente, sentimentalmente, os nossos processos. E sonhamos com feriadões, com finais de semana prolongados, com férias para equacionar os nossos casos mais complexos. Porque o dia a dia é tão brutalmente envolvido com processos, uma quantidade desumana que não nos dá tempo para uma reflexão acurada, detida, sobre esses casos.

Folha/UOL: No caso das férias objetivamente, a Loman, lei da magistratura, diz que os juízes terão férias de 60 dias anuais. Esses 60 dias parecem corretos para o sr. ou o sr. acha que o ideal seria reduzir para 30, como a maioria dos brasileiros têm?

Ayres Britto: É como eu estou lhe dizendo. Se considerarmos o princípio republicano da igualdade com os outros servidores, sem dúvida que a redução se impõe para 30 dias. Agora, a partir da minha experiência como juiz, eu não gozo sequer 15 dias de férias por ano. Não tenho condições de gozar. Eu fico completamente envolvido com as minhas ações. Até brincando comigo mesmo, eu digo assim quando vou dormir: "Senhor, livrai-me de tanta ação". Tal é o número das ações que ficam à espera da minha reflexão, da minha percepção das coisas.

Folha/UOL: Mas o sr. acha que a Loman quando for enviada, a lei, o projeto de lei, para o Congresso, ela pode contemplar essa... redução.


Ayres Britto: Sim, é um tema obrigatório. Pode. Teoricamente, sim.

Folha/UOL: Deve?

Ayres Britto: Se eu fosse falar pessoalmente, pelo meu ponto de vista exclusivamente pessoal, eu tentaria uma redução. Eu acharia um pouco mais republicana. Agora, preciso ouvir os outros protagonistas. É da minha natureza fazer as coisas compartilhadamente, dialogando.

Folha/UOL: O sr. pessoalmente seria favorável à redução de quanto? De 60 [dias] para 30 [dias]?

Ayres Britto: Eu seria favorável a uma redução, não sei se exatamente para 30 dias. Mas conforme eu estou lhe dizendo, não é um tema para ser decidido solitariamente, por esse ou por aquele administrador judiciário. Precisamos conversar com toda a categoria, com toda a classe dos magistrados.

Folha/UOL: Outro tema polêmico: salário dos magistrados. Hoje o mais alto da magistratura é do ministro do Supremo Tribunal Federal, R$ 26.723,15. Esse valor é alto, é justo ou precisa ser reajustado para cima?

Ayres Britto: Se for comparado com a remuneração dos servidores públicos em geral é um salário alto. Agora, se levar em consideração os impedimentos que são impostos aos magistrados, a essa carga brutal de trabalho a que os magistrados se submetem, ao fato de que o único Poder totalmente profissionalizado é o Poder Judiciário. E por consequência, por definição, é o mais preparado tecnicamente. E aquele de quem mais se cobra. E ainda considerando o que efetivamente ganham outros membros do Poder, como outros membros do Poder Legislativo e os membros do Poder Executivo com, sobretudo, com o número daqueles que fazem parte de conselhos, sob jeton de presença, ou se compararmos o que ganha um ministro do Supremo, por exemplo, com os altos executivos do setor público na Petrobrás, no Banco do Brasil, na Caixa Econômica etc, é preciso atualizar. Até porque estamos há alguns anos sem atualização desse teto.

Folha/UOL: O sr. durante a sua Presidência pretende então portanto encaminhar esse reajuste desse valor?

Ayres Britto: Sim, vamos retomar as tratativas. Porém num plano mais profissionalizado.

Folha/UOL: Como assim?

Ayres Britto: Eu entendo que, primeiro, quem deve conduzir a discussão desse tema é o CNJ, porque está mais aparelhado, afeiçoado ao levantamento de dados, trato científico dos números levantados. É ele que deve zelar por desígnio constitucional, por norma constitucional. Inciso primeiro do parágrafo quarto do artigo 103 B. É ele que deve zelar pela autonomia do Poder Judiciário. E essa autonomia é também orçamentária, financeira e remuneratória e nesse âmbito, nesse aspecto de profissionalização, para discussão objetiva e científica da matéria, eu vou... a designação de uma comissão tripartite, com membros do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, para num prazo relativamente curto, digamos de 30 dias, colocar a vista de todos o que de fato cada um dos membros do Poder, cada um ganha. E no plano dos servidores em geral também. Não sei se você sabe, Fernando, eu sou testemunha aqui. Nunca ouvi dizer que levas de servidores do Executivo saíssem do Executivo. Levas de servidores do Legislativo saíssem do Legislativo. Mas levas de servidores do Judiciário saem daqui, migram. Nós preparamos a mão de obra dos servidores concursados, quando eles se sentem mais preparados, experimentados, eles vão para os outros Poderes da República, porque os outros Poderes da República são mais atraentes remuneratoriamente do que o Poder Judiciário.

Folha/UOL: Então hoje, no Supremo, é permitido que um cidadão com certificado digital tenha acesso a todo o acervo de processos na corte e possa ler. Isso só acontece no Supremo. Em todos os demais tribunais do país é necessário ser advogado, ou parte. E mesmo advogados que não são parte têm acesso. Agora, cidadãos comuns não têm acesso. Isso não está errado?

Ayres Britto: Está.

Folha/UOL: Como resolver?

Ayres Britto: A fórmula do Portal da Cidadania, é um portal eletrônico, deve se estender a todo o país. E, pessoalmente, me empenharei.

Folha/UOL: O CNJ terá poderes para obrigar todos os tribunais, pelo país, a darem acesso facilitado a todo e qualquer cidadão?


Ayres Britto: Tem, como política pública judiciária tem. Uma resolução determinando, por exemplo, a implantação desse sistema de portais da cidadania para facilitar a comunicação instantânea. Inclusive sobretudo em época eleitoral. Lembra-se daquela luta desenvolvida lá desde 2008 para que o eleitor tivesse concretizado o seu direito de saber tim-tim por tim-tim da biografia do candidato. É um direito que tem o eleitor de acessar dados relativos referentes à vida pregressa do candidato. E eu dizia: não precisa de lei para isso não. Não precisa de Lei da Ficha Limpa. É um direito elementar do eleitor.

Folha/UOL: Deixe-me ver se entendi, o sr. como presidente do Supremo e como presidente do CNJ pretende tomar alguma medida que permita fazer com que todos os tribunais do país deem acesso a todos os processos e não mais a advogados ou partes.

Ayres Britto: O acesso à informação junto a dados do Poder Público é um direito constitucionalmente assegurado no artigo quinto.

Folha/UOL: Ou seja, o sr. pretende fazer com que valha...

Ayres Britto: Concretizar esse direito. A transparência é o novo pilar da democracia. A visibilidade das coisas do Poder é um direito da cidadania e um dever do próprio poder. Isso é a democracia. A menina dos olhos da Constituição é a democracia.

Folha/UOL: O sr. citou juízes auxiliares que os ministros do Supremo têm para auxiliá-los nessas ações penais, enfim, e tem sido útil aqui no Supremo. Agora, qual é a legalidade dessa figura do juiz auxiliar? Em ele sendo legal, isso não poderia também existir em outras instâncias e tribunais?

Ayres Britto: Poderia também. Como já vem acontecendo. Eu acho que isso é, como já diria Nelson Rodrigues, isso é o óbvio ululante. Quem dá os fins, quem põe os fins, deve dar os meios. Se temos esse fim, essa finalidade de julgar com razoável duração os processos, precisamos dos meios para fazê-los. E no patamar dos meios é que se colocam os juízes auxiliares.

Folha/UOL: O sr. acha que os outros tribunais, outras instâncias podem também usar esse tipo de ajuda?

Ayres Britto: Sim. Que é necessária, absolutamente necessária.

Folha/UOL: A lentidão da qual estamos falando, em certa medida, do Judiciário deveria ser melhorada, mitigada na aprovação da chamada PEC dos Recursos, a proposta de Emenda Constitucional que reduz o número de instâncias recursais?

Ayres Britto: Sim. A ideia é muito bem inspirada. O problema é que ela não foi discutida interna corporis aqui no âmbito interno do Supremo, nem dos outros tribunais. Mas é uma ideia boa, desde que certos obstáculos sejam removidos. Por exemplo, há quem afirme que, tal como proposta, com supressão de instâncias, ao menos no plano da execução do que foi decidido, a proposta padece de inconstitucionalidade. Então é preciso discutir isso.

Folha/UOL: O sr. tem juízo formado sobre isso?

Ayres Britto: Não. Eu simpatizo muito com a ideia.

Folha/UOL: Mas não sabe se poderia eventualmente...

Ayres Britto: Precisava estudar com mais detensa, com mais vagar, o aspecto constitucional da proposta.

Folha/UOL: Ministro, e o foro privilegiado, ajuda ou atrapalha a Justiça?

Ayres Britto: Nos casos listados, arrolados pela Constituição, eu acho que o foro especial se justifica, desde que observemos devidamente a Constituição e interpretemos devidamente a Constituição até como... digamos, não generosamente, mas por modo estrito. Acho que o foro especial deve se manter.

Folha/UOL: O sr. acha que é bom que ele exista?

Ayres Britto: Nos termos da Constituição. E nos termos da Constituição, quando você se desinveste do cargo, você decai do foro especial. Ele é chamado de privilegiado, mas na verdade é especial. Porque privilégio é uma categoria jurídica das monarquias e não das Repúblicas.

Folha/UOL: Magistrados de cortes superiores e tribunais de Justiça no Brasil, em geral, têm carros oficiais, motoristas, seguranças. É necessário esse benefício?

Ayres Britto: É necessário se fazer um reestudo sobre isso. Em princípio sim. A segurança do magistrado é diferente, deve ser.. E nós temos problemas de insegurança da magistratura de maneira até incomum ultimamente. A segurança do magistrado deve ser viabilizada porque o magistrado lida com os mais caros e delicados interesses do indivíduo, do cidadão, das empresas. Quando se litiga em juízo, o que se coloca em jogo, quase sempre, é a honra de uma pessoa, é o patrimônio de uma pessoa, ou a intimidade, a vida privada, ou a liberdade de uma pessoa.

Folha/UOL: Mas carros com motorista que é uma prática mais ou menos generalizada no Judiciário. Isso é um bom hábito?

Ayres Britto: Depende, depende. Se caracterizar mordomia, é evidente que não é. Porque passa a ser privilégio. Mas no limite da necessidades estritas, de segurança, eu... tudo depende de um planejamento. Eu acho que se justifica. Por exemplo: o carro não deve ser usado, jamais, para fins particulares. Então o carro que signifique um deslocamento mais célere e seguro do magistrado para as salas de audiência ou para os seus tribunais, nessa medida de instrumento necessário de trabalho, me parece que desde que usado com parcimônia merece continuidade. Mas é um tema que deve ser discutido. Olhe, a sociedade é mais exigente hoje em dia. Muito mais republicana. E às vezes o que a gente tem, no âmbito do Judiciário mesmo, como justificado, por efeito de uma tradição, tem que ser questionado. Quando você faz esse tipo de pergunta, eu fico até feliz, porque legitima até, da minha parte, o lançar deste tema como pauta de discussão a partir do CNJ.

Folha/UOL: O sr. pretende discutir esse tema lá?

Ayres Britto: Sim, pretendo.

Folha/UOL: Agora, o carro exclusivo para cada um dos magistrados, do STJ, dos superiores, cada um tem um carro e um motorista. Se for só para ir trabalhar e voltar do trabalho, o sr. acha que é correto?

Ayres Britto: Em princípio sim. Na medida em que isso signifique celeridade, deslocamento célere e seguro para seu local de trabalho. Porque o magistrado trabalha também com horários, com audiências marcadas. Então ele deve ter facilitado esse seu trajeto para exercício da função judicante.

Folha/UOL: Vamos falar da punição de magistrados. No Brasil, magistrados que acabam sendo considerados como tendo uma conduta imprópria ou cometeram alguma irregularidade, são punidos com aposentadoria e manutenção dos seus proventos. Esse tipo de punição não tinha que ser mudada? Até porque para muitos não é uma punição.

Ayres Britto: É, está na Constituição originária. Foi uma avaliação que fez o constituinte brasileiro.

Folha/UOL: É uma cláusula pétrea essa que manda aposentar o magistrado compulsoriamente e ele mantém os proventos?

Ayres Britto: Não. Não é cláusula pétrea. Isso pode ser modificado. O que fez a Constituição foi o seguinte: disse que, quando processado administrativamente, não judicialmente, por falta disciplinar, o magistrado se submete a algumas penas. Como, por exemplo, advertência, censura, suspensão ou aposentadoria compulsória. Porque a decisão foi administrativa. Mas isso não significa que o aposentado compulsoriamente, com direito a proventos proporcionais, não venha a perder totalmente esses proventos. Desde que ele seja processado, por exemplo, criminalmente. Desde que haja uma ação regressiva.

Folha/UOL: Mas isso não seria possível quando ocorre a punição administrativa por um delito ali que é reconhecido, que esse magistrado seja removido da sua função e que, a partir daquele momento até terminar o processo, ele tenha alguma outra punição, por exemplo, a perda dos proventos?

Ayres Britto: É o que eu estou falando. A Constituição fez uma escolha legislativa. O magistrado que é processado por falta disciplinar administrativamente, ele tem contra si, e como pena máxima, a aposentadoria compulsória. Mas sem perda dos proventos que serão calculados proporcionalmente ao tempo de serviço. O que cabe ao Estado? Ir penalmente. Abrir um processo contra essa magistrado na perspectiva de desinvesti-lo, de cassar o direito a proventos.

Folha/UOL: Nesse particular então o Judiciário não poderia agir, teria que ser o Ministério Público ou o Congresso mudando a legislação?

Ayres Britto: Perfeito. De ordinário, o Ministério Público, que faz a denúncia e, se a infração disciplinar caracterizar ao mesmo tempo crime, delito propriamente dito, e ele pode perder os proventos.

Folha/UOL: Um tema correlato: o CNJ deve ter total liberdade para investigar juízes nos Estados ou só deve tomar essa iniciativa depois de comprovado que a corregedoria local não foi eficaz?

Ayres Britto: Não. Decidimos no julgamento da Resolução 135 do CNJ que o CNJ tem o poder para atuar tanto de ofício, ou seja, por impulso próprio, quanto provocadamente. Vale dizer, por terceiro. E ele não precisa esperar que o processo seja aberto.

Folha/UOL: Isso está totalmente pacificado?

Ayres Britto: Totalmente pacificado. O que é bom para o sistema de controle. Quanto mais eficaz é o sistema de controle, melhor para a Constituição, que se torna mais facilmente aplicável, concretizada. Então a Constituição é muito copiosa. É muito copiosa é redundante. É muito rica quanto aos mecanismos de controle da atuação do poder público. Eu acho que essa proliferação dos controles, entregues a órgãos como Polícia Federal ou Polícia Estadual, Civil, ou Ministério Público, Tribunal de Contas, CNJ, quanto mais copioso esse sistema de controle, melhor para a sanidade dos nossos costumes. Devemos interpretar o sistema de controle à larga. E não restringidamente.

Folha/UOL: Costumes: é costume no Brasil magistrados organizarem eventos, congressos, seminários e serem patrocinados nesses eventos por associações e empresas que têm interesses no Poder Judiciário porque têm ações. É correto aceitar esse tipo de patrocínio?

Ayres Britto: Esse é um tema que se tornou também, por efeito dessa evolução mental digamos assim dos costumes do corpo social, é um tema que se tornou recorrente. Objeto de permanente discussão. E a corregedora-nacional de Justiça atual, a digna e ilustre ministra Eliana Calmon do STJ colocou esse tema em pauta para discussão no CNJ.

Folha/UOL: Qual é a sua opinião sobre esse tema?

Ayres Britto: Eu acho que deve ser interpretado isso com todo cuidado mesmo. EU sou meio arredio também a patrocínios de Congresso por instituições que atuam no mercado e que têm causas quase permanentemente no Judiciário. Eu simpatizo com a ideia da interpretação restritiva dessa possibilidade.

Folha/UOL: De impedir que empresas ou associações com causas no Judiciário...

Ayres Britto: Patrocinem os eventos. No meu ponto de vista pessoal, em linha de princípio, é esse.

Folha/UOL: Quem poderia patrocinar tais eventos?

Ayres Britto: As próprias instituições. Com recursos dos seus membros. Dos respectivos membros.

Folha/UOL: Ministro, no dia 16 de maio entra em vigor a Lei de Acesso a Informações Públicas no Brasil. No que diz respeito ao Judiciário, dados importantes poderão ou não vir a ser divulgados. Por exemplo: o salário e benefícios de todos os magistrados brasileiros. Dois: a lista completa de todas as pessoas que têm audiência com um magistrado em determinado momento. Esse tipo de informação, à luz da ideia da Lei de Acesso a Informações Públicas deve ser público. No caso do Judiciário, como fazer para que isso ocorra também?

Ayres Britto: Sem dúvida que deve ser também. Olha, o Judiciário, ele deve estar na vanguarda, e não na retaguarda do saneamento dos nossos costumes. Esse princípio do controle, da transparência, da visibilidade, devem ser exigidos e praticados pelo Poder Judiciário. E o Poder Judiciário quer isso. Um ou outro setor do Judiciário, uma ou outra reação que reponta aqui e ali não significa que o Judiciário como característica central seja arredio a esse tipo de providência.

Folha/UOL: No Supremo o sr. pretende implantar dessa forma?

Ayres Britto: Sim.

Folha/UOL: Os salários, todos os benefícios diretos e indiretos, as audiências concedidas, tudo vai ser publicado com frequência diária?

Ayres Britto: Sim. Vamos sair das palavras e vamos para os atos. Nós decidimos ainda no ano passado, quero crer que por unanimidade, a propósito da divulgação, pela Prefeitura de São Paulo, da folha de pagamento de todo seu corpo de servidores. Nós decidimos, eu fui o relator, nós decidimos, fui eu o relator, que está correto divulgar. É um direito do cidadão ser informado quanto à folha de salário do funcionário público de ponta a ponta. Quero crer que o Supremo decidiu essa causa por unanimidade.

Folha/UOL: É uma liminar ainda?

Ayres Britto: Não. A liminar foi concedida pelo ministro Gilmar Mendes quando ele estava na Presidência. Já foi o mérito. Quero crer que sim, quero crer que sim. Mas vamos confirmar. Ou seja, o Judiciário tem dado excelentes exemplos na direção do saneamento dos nossos costumes. Foi o primeiro Poder da República que cortou na própria carne proibindo o nepotismo na ADC número 12, eu fui o relator também, apenas por coincidência, não quero fazer autoelogio. A propósito da resolução número sete de quem? Do CNJ, que é órgão do Poder Judiciário. Tudo o que o CNJ faz é o Judiciário que está fazendo.

Folha/UOL: Que tipo de informação aqui no Supremo, por conta da Lei de Acesso a Informações, não era prontamente colocada à disposição do público e passará a estar?

Ayres Britto: Por exemplo, eu nem sei que tipo de informação tem sido sonegada aqui no Supremo e que passaria a ser prestada com a nova lei. Eu não sei decor nenhuma. Porque aqui no Judiciário... O que tem sofrido uma certa crítica contra o Judiciário é que aqui no Supremo alguns processos não vêm com os nomes patronímicos das partes, apenas com as iniciais. Mas pode olhar que é crescente o número de ministros que, monocraticamente, esses ministros mandam abrir, mandam identificar.

Folha/UOL: Há como padronizar essa prática?

Ayres Britto: Sim. E devo padronizar.

Folha/UOL: O sr. quer padronizar essa prática?

Ayres Britto: Pretendo fazê-lo. Apenas eu tenho o cuidado de dizer que a minha administração será compartilhada, eu sou de dialogar. Eu não faço carreira solo. Então eu tenho que respeitar meus pares e colher a opinião deles na busca do consenso. Mas, sim. Isso faz parte das minhas políticas públicas judiciárias em termos propostos.

Folha/UOL: Conversar com seus outros dez colegas do Supremo Tribunal Federal para que em nenhum processo mais fique apenas constando as iniciais...

Ayres Britto: A não ser naqueles casos que a própria lei... como por exemplo interesses de menores ou brigas de família etc. Fora disso, a regra é a visibilidade, é a transparência.

Folha/UOL: Ministro, a Lei Eleitoral no Brasil é muito restritiva e proíbe certas ações fora de um prazo muito delimitado. Muitas vezes no que se refere à manifestação de liberdade de expressão de alguém, em relação a algum tema. Há aí uma possível inconstitucionalidade?

Ayres Britto: Olha, a nossa legislação eleitoral, e você é um especialista, Fernando Rodrigues, no estudo, na reflexão das leis eleitorais e do processo eleitoral como um todo. Elas andam meio em descompasso com essa liderança que o Brasil exerce no mundo inteiro. É a Justiça Eleitoral melhor do mundo em termos de confiabilidade. A Justiça é boa. Já as leis estão para mim numa época ultrapassada de, digamos, de impor dificuldades ao conhecimento de certas práticas e, pior ainda, da participação do eleitor no processo eleitoral mais pró-ativamente.

Folha/UOL: Por exemplo, a lei proíbe que um cidadão seja ele quem for coloque adesivo em seu carro, particular, dizendo que é a favor de fulano que vai ser candidato no ano que vem a prefeito. Isso é crime eleitoral.

Ayres Britto: Perfeito. Na minha opinião não está de acordo com o espírito da Constituição, da liberdade de expressão, liberdade de manifestação de pensamento. Agora, é um ponto de vista pessoal. Mas vamos reconhecer, o Supremo Tribunal Federal decidiu que mesmo em processo eleitoral o humor pelo rádio, pela televisão, estava liberado, como efetivamente está liberado.

Folha/UOL: Agora, no entanto, redes sociais, na internet, elas não podem ter pessoas dizendo que são candidatas ou que vão disputar determinado cargo, porque isso é considerado proselitismo e essa pessoa pode ser condenada pela Justiça Eleitoral, pela letra fria da lei. Nesses casos, da internet, onde a pessoa se manifesta na internet, a qualquer tempo e época, impedir que isso ocorra também não fere os pontos de vista da Constituição?

Ayres Britto: Do meu ponto de vista sim. E eu tenho para mim que esse tipo de restrição está com seus dias contados. Essa nossa Constituição, que foi a mais democrática, a mais debatida das Constituições do Brasil, ela é também a melhor das Constituições brasileiras e, talvez, a melhor do mundo ocidental. Ou seja, o Brasil é primeiro mundista em duas coisas: primeiro mundista em processo eleitoral e em Constituição positiva. Essa Constituição nos torna juridicamente à frente de qualquer povo pela sua densa rede axiológica, de proteção do indivíduo, do cidadão, do trabalhador, do meio ambiente. É uma Constituição modelar. Ela precisa de concretização.

Folha/UOL: Ou seja, se alguém arguir no Supremo sobre uma eventual inconstitucionalidade por conta da eventual falta de liberdade de expressão imposta pela Lei Eleitoral...

Ayres Britto: Tem chance de êxito.

Folha/UOL: Com o fim da Lei de Imprensa, no Congresso alguns setores passaram a defender a necessidade de se ter uma lei específica de direito de resposta daqueles que se sentiram ofendidos pela mídia. Essa lei é necessária?

Ayres Britto: Estritamente necessária não é. A Constituição bem aplicada, ela viabiliza o direito de resposta ao tempo e a hora, bem adequado. Mas não seria ruim uma lei, nem está proibida uma lei que venha a dispor sobre direito de resposta. Porque direito de resposta não é uma relação jurídica central de imprensa. Ela circunda liberdade de imprensa, mas não é da essência da liberdade de imprensa. O que é elementarmente de imprensa, centralmente de imprensa, é que não pode ser objeto de lei. Porque a lei só teria a força de reduzir a liberdade, não de ampliar. Mas quando a relação é lateralmente de imprensa, secundariamente de imprensa, pode ser objeto de lei.

Folha/UOL: O caso do mensalão poderá ser julgado com o Supremo Tribunal Federal sem a sua composição completa de onze ministros?

Ayres Britto: De poder, pode.

Folha/UOL: Deve?

Ayres Britto: Pode não ser conveniente. Não é que deve. É conveniente? Não é conveniente. Mas é viável, é legítima a composição do Supremo com a redução de um ou até dois membros? Sim. Não é conveniente. Bom, quando uma decisão no Supremo é produzida pelo número íntegro, cheio dos seus membros, ela é mais rica de equacionamento técnico. E ela é politicamente mais legítima. Porque o número conta sim no plano da legitimidade. Casa ministro do Supremo projeta sobre a sua causa, o seu saber, a sua ciência, a sua experiência. E o número onze, um número integro carreia para a causa uma contribuição desse plano técnico e político maior.

Folha/UOL: O sr. já estudou o processo, como todos os seus colegas aqui, o processo do mensalão. Quantos dias o sr. acha que são necessários, fazendo um cálculo realista para que esse julgamento seja realizado?

Ayres Britto: Não estudei completamente o processo. Eu teria condições de votar com brevidade, se ele viesse. Eu teria condições de votar com mais uma semana, alguma coisa assim, eu teria. Faria um esforço concentrado...

Folha/UOL: Considerando a corte, o número de réus...

Ayres Britto: Mas já venho estudando de algum tempo [o processo do mensalão]. E todos os ministros também vêm estudando. Agora, é um processo incomum, inusitado, pelo número de, réus, são 38 réus, pelo número de testemunhas, em torno de 600 testemunhas, pelos volumes, centenas de volumes, de apensos, de anexos. Teremos 38 sustentações orais, fora a do procurador-geral da República. Certamente teremos um relator e o alongado. E um voto também. Em seguida, o relatório e o voto do revisor. Então precisaríamos de um script, na linguagem do ministro Gilmar Mendes, de uma formatação diferenciada para o enfrentamento judicante dessa causa.

Folha/UOL: Levando tudo isso em conta, tudo considerado, o sr. acha, em dias corridos, são 30, 60, 45, em quantos dias o sr. acha exequível fazer...

Ayres Britto: A formatação, o script será objeto de uma decisão colegiada...

Folha/UOL: Mas a sua ideia?

Ayres Britto:...o modelo de concepção e de execução das sessões de julgamento, isso será objeto de uma decisão colegiada. Eu quero crer que em 20 dias úteis, de esforço concentrado, um regime quase de mutirão, para impedir uma inconveniência. Qual é a inconveniência? Objetivamente inconveniente, não é subjetivamente. Não é bom que um processo dessa envergadura corra em paralelo com o processo eleitoral. O processo eleitoral se inicia rigorosamente com o dia 6 de julho. E é um processo no país inteiro, com 5.562 municípios, 400 mil candidatos, em torno disso, em torno de 50 cargos disputados, entre os cargos parlamentares e os executivos, é... Até 30 de junho, 30 de junho é um sábado... Em 29 de junho, no mais tardar 5 de julho, se houver consenso para uma convocação extraordinária no recesso me parece de bom tamanho, de bom aviso. Mas tudo isso será objeto de uma decisão coletiva.

Folha/UOL: E tudo isso depende, para começar, da apresentação do voto do ministro relator, do ministro Ricardo Lewandowski.

Ayres Britto: Sim, ele é quem disponibiliza o processo para a pauta de julgamento. E cabe ao presidente providenciar a publicação da inclusão em pauta de o fato de o processo estar pronto para ser julgado 48 horas antes da primeira sessão. Não é que o presidente vai julgar em 48 horas, é que deve haver a publicação da pauta de julgamento 48 horas antes, publicação no Diário da Justiça. Para que advogados e partes se deem por intimidados.

Folha/UOL: Quando seria desejável dar início a esse processo para terminar no final de junho?

Ayres Britto: É como eu estou dizendo né? Se conseguirmos dispor de tempo suficiente para evitar esse paralelismo de tramitação, o processo eleitoral de um lado e o chamado mensalão de outro, melhor. E precisa ter um tempo também porque nós do Judiciário somos afeitos à ideia-força de que nada pode prejudicar a nossa análise objetiva dos fatos, a nossa isenção, a nossa imparcialidade, isso é intocável.

Folha/UOL: Agora posso inferir, por isso que o sr. está dizendo, que se entrarmos em junho sem esse julgamento já em curso, fica muito difícil de julgá-lo antes de julho então?

Ayres Britto: Sim, do ponto de vista lógico, pela magnitude, pela complexidade da causa, pelo volume das peças processuais...

Folha/UOL: E, depois, agosto... o ministro Cezar Peluso, ele em meados de agosto, quando completar 70 anos deve se aposentar...

Ayres Britto: Também, é fato, não se pode negar isso. E fica difícil. Sem falar, eu me permito dizer isso, não há de minha parte nem de nenhum ministro pré-disposição para condenar nem para absolver, seja parcialmente, seja totalmente. Nós somos vacinados contra esse tipo de pressão. Os jurisdicionados têm o direito de saber que os seus jurisdicionantes são pessoas equilibradas, amadurecidas psicologicamente, tranquilas emocionalmente, imparciais tecnicamente. Mas se prejuízo de nada disso, contar no processo com a participação da envergadura técnica, ética, experimental de Cezar Peluso, é um trunfo.

Folha/UOL: Ou seja, não sendo possível julgar o mensalão até o dia 30 de junho, fica muito difícil no segundo semestre empreender essa...

Ayres Britto: Fica mais difícil porque seis ministros do Supremo estarão ao mesmo tempo comprometidos com o processo eleitoral. São três titulares na Justiça Eleitoral e três substitutos. E o processo eleitoral, nós sabemos, desencadeia sessões contínuas de ordinário, sessões extraordinárias no Tribunal Superior Eleitoral. Efetivamente, do ponto de vista operacional fica dificultado o exame célere, sem prejuízo da segurança técnica se o processo até o mês de julho não estiver julgado.

Folha/UOL: O ministro Lewandowski tem dito ao sr. se pretende entregar o relatório como ministro revisor?

Ayres Britto: Não. O ministro Lewandowski é um ministro respeitável, experimentado, é um acadêmico. Tem cerca de duas décadas de judicatura colegiada, merece toda a nossa admiração e respeito. O "timing" é dele, é exclusivamente dele como juiz independente.

Folha/UOL: E quais penas prescrevem dessas que o sr. já olhou, o sr. disse que já estudou um pouco?

Ayres Britto: É, em tese nenhuma está prescrita.

Folha/UOL: Desde que seja a máxima.

Ayres Britto: Ou não necessariamente a máxima, mas não a mínima secamente. Isso depende de cada imputação. Depende de cada réu. Vamos ouvir o voto do relator. Eu não estou trabalhando...

Folha/UOL: Elas [as penas] começam a prescrever quando, ministro? No ano que vem?

Ayres Britto: Não, depende da... Olha, em tese tudo é possível. Em tese é possível absolvição. Em tese é possível condenação total, condenação parcial. Agora, a prescrição vai depender, se houver condenação, da dosimetria da pena.

Folha/UOL: É que muitos são réus primários.

Ayres Britto: Tem isso também. Então isso puxa a pena para baixo. Então vai depender muito da dosimetria.

Folha/UOL: Eles podem ter inclusive penas convertidas em prestação de serviço a comunidade também?

Ayres Britto: As penas alternativas, não é?

Folha/UOL: Isso é possível?

Ayres Britto: Aí é que está [risos].Vai depender do relator, vai depender do revisor. Vai depender da dosimetria. Pela Constituição as penas privativas de liberdade, elas comportam a sua substituição em penas restritivas de direito. Porque as penas obedecem ao princípio da individualização. Às vezes uma pena restritiva de direitos é suficiente para cumprir a finalidade do próprio direito penal, que é ressocializar o... castigar e ao mesmo tempo ressocializar, reeducar o apenado. Mas eu não gosto de falar sobre isso porque aí nós estamos partindo do pressuposto de que vai haver condenação fatalmente. E não se pode trabalhar com essa hipótese radical de absoluta condenação de todo mundo e etc.

Folha/UOL: O sr. não acha que o fato de muitos serem réus primários diminui aí o prazo para que a gente tenha até em alguns casos as penas alternativas?

Ayres Britto: Em tese, em tese sim. Mas é como eu estou lhe dizendo. Vamos aguardar. Sobretudo a análise do relator do processo e sua propositura, seu equacionamento da causa, o seu veredicto. Eu prefiro não avançar nesses meandros até também para nem remotamente inibir o trabalho que deve ser tecnicamente elogiável, excelente e imparcial, altivo, como de hábito, ou como invariavelmente sucede com as decisões do ministro relator, que é o ministro Joaquim Barbosa.

Folha/UOL: Ministro Ayres Britto, muito obrigado por sua entrevista.

Ayres Britto: Não há porque. Sempre bom estar com você.

JUDICIÁRIO DIFICULTA ACESSO A DESPESAS DE SEUS MINISTROS

EQUIPE AE - Agência Estado 23 de junho de 2012 | 8h 39



Um mês após entrar em vigor, a Lei de Acesso à Informação enfrenta resistência na cúpula do Judiciário. Ao mesmo tempo que prometem publicar os salários de servidores, os tribunais superiores adotam postura inversa quando se trata de divulgar gastos dos ministros com dinheiro público.

No Supremo Tribunal Federal (STF), a justificativa é que a lei precisa ser regulamentada por uma comissão que não tem prazo para fazê-lo nem data para se reunir. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manda o cidadão consultar tabelas de seu orçamento disponíveis na internet e não atende a consultas específicas.

Com a entrada em vigor da nova lei, em 16 de maio, os pedidos foram reapresentados. Em resposta por e-mail, após um pedido de prorrogação do prazo inicial de 20 dias, a Corte alegou que a Lei de Acesso será objeto de regulamentação pela Comissão de Regimento. "Aguarde-se a edição do respectivo regulamento, para o fornecimento das informações solicitadas."

A decisão de deixar as regras a cargo da comissão foi tomada em 6 de junho, em sessão administrativa. O presidente do STF, Carlos Ayres Britto, sugeriu uma definição ali, mas o ministro Gilmar Mendes propôs que o assunto fosse levado ao grupo, o que foi aceito por todos. Internamente, ministros demonstram receio em relação a pedidos de informações sobre despesas. O Estado apurou que, enquanto o impasse não se resolve, Ayres Britto estuda publicar uma portaria com regras provisórias - assessores do ministro preparam uma minuta do texto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

SERVIDORES DO JUDICIÁRIO PARALISAM ATIVIDADES

Servidores do Judiciário paralisam atividades em SP. Funcionários reivindicam aprovação de projeto que reavisa plano de cargos e salários; greve geral está programada para os dias 4 e 5 de julho

estadão.com.br  28 de junho de 2012 | 16h 06

Funcionários do Judiciário nacional de São Paulo paralisaram as atividades nesta quinta-feira, 28, em todo o Estado, por tempo indeterminado. A greve já acontece no Mato Grosso desde o último dia 21 de junho e deve atingir os demais Estados do País na próxima semana. A paralisação compromete as eleições, já que na próxima semana se encerra o período no qual os candidatos de todo o País têm para realizarem suas inscrições nos cartórios eleitorais. Segundo a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal (Fenajufe) uma greve geral está programada para os próximos dias 4 e 5 de julho.

Servidores do Judiciário, incluindo os funcionários da Justiça Federal, Justiça Eleitoral, Justiça Trabalhista e, em alguns Estados, Militar, reivindicam a aprovação do projeto de lei que revisa o plano de cargos e salários de toda a categoria. O projeto tramita no Congresso desde 2009 e traz uma reposição emergencial das perdas salariais acumuladas desde junho de 2006, data da última reposição salarial, sde acordo com o coordenador geral do Sintrajud, que representa os funcionários do Judiciário em São Paulo, Adilson Rodrigues Santos.

Mesmo que não haja adesão de toda a categoria, a Fenajufe prevê que o trabalho de cadastro dos candidatos às eleições municipais será comprometido. "Os servidores dos cartórios federais fazem parte da categoria", afirma. "A orientação é que todo o Judiciário pare os trabalhos por tempo indeterminado", destaca a Fenajuve.

De acordo com Silva, está prevista para esta quinta uma assembleia em Brasília com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto. Sem revelar datas e horários, Santos sinalizou ao estadão.com.br que vários protestos estão previstos ainda para esta semana.

Greve de servidores do Judiciário pode atrapalhar trâmite eleitoral - Beatriz Bulla, da Agência Estado, 27 de junho de 2012 | 17h 54

Principal ameaça dos trabalhadores é de um apagão na Justiça Eleitoral entre os dias 1º e 5 de julho, prazo em que acabam as inscrições para as eleições


Uma greve dos servidores do Judiciário pode atrapalhar as inscrições dos candidatos às eleições deste ano. Os funcionários avisaram que em São Paulo a paralisação começa nesta quinta-feira, 28, e segue por tempo indeterminado. A principal ameaça dos trabalhadores é de um apagão na Justiça Eleitoral entre os dias 1º e 5 de julho, prazo em que devem ser feitas as inscrições dos candidatos às eleições no Tribunal Regional Eleitoral. O anúncio foi feito nesta quarta-feira, 27, pelo Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal no Estado de São Paulo (Sintrajud).

Somente uma adesão maciça à greve, contudo, pode atrapalhar de fato o trâmite eleitoral, de acordo com a assessoria do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP). Se a paralisação seguir os padrões de greves anteriores, boa parte dos funcionários (por exemplo os comissionados e os juízes) pode continuar trabalhando normalmente.

A paralisação dos servidores do Judiciário Federal tem caráter nacional e, apesar de abarcar as três esferas do Judiciário (Eleitoral, Federal e Trabalhista), terá o foco das manifestações voltado na Justiça Eleitoral. A maioria dos Estados pretende realizar paralisações entre 4 e 5 de julho, os últimos dois dias do prazo para registro dos candidatos na Justiça Eleitoral.

Nesta semana, serão feitas paralisações de 48 horas na Paraíba, Bahia, Rio Grande do Sul e Distrito Federal. No Mato Grosso, os servidores já estão em greve também por tempo indeterminado.

Os servidores reivindicam avanço nas negociações de reajuste salarial. De acordo com o Sintrajud, a categoria não tem reajuste desde 2006. Os trabalhadores pedem a aprovação imediata do projeto que altera dispositivos do Plano de Carreira dos Servidores do Poder Judiciário da União, entre outras disposições. Atualmente, a proposta (PL 6613/09) está na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.

De acordo com o Sintrajud, os sindicatos alertaram o presidente do STF, Carlos Ayres Britto e a presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, sobre a situação da categoria.

ELIANE CALMON DEFENDE DIVULGAÇÃO DE SALÁRIOS E PENDURICALHOS

ELIANE CALMON DEFENDE DIVULGAÇÃO DE SALÁRIOS DO JUDICIÁRIO

Corregedora disse que divulgação deve alcançar não apenas o salário principal dos magistrados, mas também 'os muitos penduricalhos'

VANNILDO MENDES - Agência Estado 28 de junho de 2012 | 17h 27

BRASÍLIA - A corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministra Eliana Calmon, defendeu nesta quinta-feira, 28, que o Poder Judiciário siga o exemplo do Executivo e publique imediatamente os salários dos seus servidores, inclusive dos altos dirigentes, magistrados e ministros. Líder de uma campanha nacional pela transparência e moralização da Justiça, ela disse que a divulgação deverá ocorrer em todas as instâncias e alcançando não apenas o salário principal dos magistrados, mas também "os muitos penduricalhos".

"A Justiça deve fazer o mesmo (que o Executivo) de forma imediata", afirmou a ministra. Ela disse que recebeu ordem expressa do presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), Ayres Brito, para operacionalizar o quanto antes a medida. "Ele está absolutamente seguro e não abre exceção". Ela explicou que não vale disponibilizar apenas a remuneração básica. "Nós temos muitas gratificações, adicionais e outros (acréscimos) que eu chamo penduricalhos. Nós pretendemos colocar para divulgação todos os itens de remuneração dos magistrados", enfatizou.

Eliana disse ter recebido apelos de diversos magistrados e servidores contrários à divulgação e que, por isso, "quase como advogada do diabo", levou as ponderações a Ayres Britto, que foi muito claro. "O ministro está absolutamente convicto de que tem de ser assim", garantiu. Alguns magistrados, segundo ela, alegaram razão de segurança, mas ela disse que a resposta do presidente foi taxativa: "Essa não é uma questão de segurança, a divulgação é um dever e uma prioridade do Judiciário".

Ela lembrou que a ministra Carmen Lúcia, do STF, antecipou-se e já divulgou seu contracheque. "E nós (os demais magistrados) estamos fazendo exatamente a mesma coisa. Cabe à corregedoria então cumprir as ordens da presidência". Ela deu a declaração em entrevista na qual fez um balanço de suas principais realizações à frente da Corregedoria, cujo mandato termina em setembro. Ela será substituída pelo ministro Francisco Falcão, do STJ.

Segundo Eliana, foram dois os maiores projetos de sua gestão - "minhas meninas dos olhos". O primeiro foi o programa "Justiça Plena", que destravou processos de grande repercussão social que tramitam há anos nos tribunais, como o assassinato da deputada alagoana Cecy Cunha (PSDB), com grave dano à imagem do Judiciário. Outro é o projeto que pôr ordem na gigantesca bagunça dos precatórios nos tribunais brasileiros.

Autora da declaração polêmica de que "a Justiça tem bandidos escondidos atrás da toga", que produziu forte reação corporativa, ela admitiu que sua bandeira pela moralização do Judiciário "foi também importante" e não se arrepende de ter comprado a briga. "Isso (a causa) é pela preservação do Poder Judiciário como um todo. Se nós não tomarmos posições firmes agora, nós teremos gravíssimos problemas. Daqui a no mínimo dois anos, as coisas estarão piores", previu.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

O PROCESSO DO MENSALÃO

EDITORIAL 27 de junho de 2012 | N° 17113 


Ao marcar para 1º de agosto o início do julgamento do processo do mensalão, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres Britto, fez jus à expectativa dos brasileiros que aguardam a célere e adequada administração da justiça aos réus do maior escândalo político dos últimos anos. Nem as legítimas manifestações de réus e advogados de defesa nem as considerações de natureza política de integrantes do Executivo, do Legislativo e do próprio Judiciário a respeito de um possível uso indevido do julgamento na campanha eleitoral para as prefeituras fizeram Ayres Britto recuar da decisão tomada. Ao entregar ontem o voto revisor do relatório do ministro Joaquim Barbosa, o também ministro Ricardo Lewandowski garantiu o cumprimento do cronograma definido pelos colegas.

Para que o julgamento se inicie no dia 1º de agosto, primeiro dia após o final do recesso do Judiciário em julho, é preciso obedecer a dois prazos processuais: de 24 horas para conhecimento dos réus e de 48 horas entre a publicação da data aos réus e a sessão de julgamento. São necessários, portanto, três dias – margem que se torna cada vez mais exígua, a se considerar que, com o recesso de julho, os prazos processuais são suspensos e voltam a fluir somente em 1º de agosto. Em ofício a Lewandowski, Ayres Britto havia pedido a liberação do processo na segunda-feira, sugestão não atendida pelo revisor.

Lewandowski fez uso de prerrogativas intocáveis de ministro da mais alta Corte do país ao desconsiderar o pedido de Ayres Britto. Ao atendê-lo ontem, permitiu que não se frustre o clamor da sociedade por um julgamento justo do mensalão. Não é segredo que o caso, no qual 38 réus são acusados de diferentes crimes, já tramita há sete anos no Supremo. A realização de eleições em outubro não pode servir de pretexto para que, mais uma vez, se adie a conclusão do caso, o que acarretaria prescrição de parte dos crimes e reforço à sensação de impunidade que reina no Brasil.

O JUIZ ENCURRALADO

ZERO HORA, 27 de junho de 2012 | N° 17113. ARTIGOS

Luiz Fernando Cabeda, magistrado.


Os episódios e detalhes que são revelados a cada semana da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, conseguem surpreender até quem já está muito cansado de ver a ousadia com que grupos criminosos bem articulados tomam de assalto bens e programas públicos, especialmente aqueles que orientam políticas de ação social. O fato mais recente foi o afastamento do juiz da causa que exerceu o controle jurisdicional das investigações policiais que se estenderam por um ano e meio em Goiás. Ele reconheceu que não tinha mais condições de atuar no caso por estar exposto às ações dos criminosos. Sua atitude surpreendente decorreu principalmente de dois fatos: seus pais foram visitados por policiais ligados aos crimes, que, com isso, fizeram ver que a família do magistrado estava vulnerável a represálias, ainda que ele próprio já dispusesse de escolta armada e carro blindado. Segundo, o relator da ação de habeas corpus no Tribunal Regional Federal concedeu liberdade ao mentor do bando, Carlos Cachoeira, e ainda votou pela anulação de toda a investigação, já que as escutas telefônicas, que tiveram trechos amplamente divulgados pela televisão, foram consideradas insuficientemente fundamentadas. Desqualificou a prova, ainda que ela tenha mostrado um resultado estarrecedor. A libertação do preso só não se consumou porque ele é acusado por outro motivo, estabelecido pela polícia e pelo Judiciário do Distrito Federal. Também a anulação do inquérito da Polícia Federal foi obstada, em virtude do voto de dois juízes que o legitimaram, por ora. Até que surja outro Napoleão de birô querendo reescrever a derrota de Waterloo.

Faz muito pouco tempo que a juíza Patrícia Acioli foi assassinada. Pois o poder de fogo do grupo investigado no Distrito Federal e sua potencial letalidade podem ser avaliados neste pequeno trecho copiado da ação de habeas corpus: “São muitos os envolvidos (dois delegados de Polícia Federal, seis delegados da Polícia Civil, 30 policiais militares, dentre eles três tenentes-coronéis, um major, um capitão, dois sargentos, quatro cabos e 18 soldados, um servidor administrativo da Polícia Federal, um policial rodoviário federal, dois agentes da Polícia Civil e dois servidores municipais) que fazem parte do esquema delituoso, sob o comando de Carlinhos Cachoeira...”.

É preciso que o Judiciário encare de modo sistemático e planejado todas as implicações de sua atuação prática, ao estabelecer o Direito, o que não se resume a manifestações retóricas sobre independência institucional que sempre estiveram tão ao gosto dos rebarbativos retóricos, as chamadas proclamações de gabinete. Isto quer dizer com absoluta clareza: é preciso encarar o medo do medo.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Brilhante e oportunas as conclusões do magistrado ao exaltar a necessidade do Poder Judiciário encarar  "de modo sistemático e planejado todas as implicações de sua atuação prática, ao estabelecer o Direito, o que não se resume a manifestações retóricas sobre independência institucional que sempre estiveram tão ao gosto dos rebarbativos retóricos, as chamadas proclamações de gabinete."  Realmente, "é preciso encarar o medo do medo", mas para tanto é necessário REPENSAR A JUSTIÇA NO BRASIL. Repensar as LEIS (segurança jurídica), o SISTEMA ATUAL (sistema de justiça criminal) e a POSTURA LENIENTE E MOROSA (burocrata, demorada, vários recursos, amplos prazos, benevolências, critérios pessoais) do Poder Judiciário e da maioria dos magistrados na aplicação das leis e no  tratamento das questões  de ordem pública que envolvem a paz social, vidas e patrimônio das pessoas. Enquanto permanecer na soberba, centralizado, encima do muro, mediador de conflitos, distante dos delitos e das questões de ordem pública, dependente da polícia, dos agentes prisionais e do MP, e conivente com a situação de descaso, impunidade e insegurança, o Poder Judiciário continuará encurralado, amedrontado e enfraquecido por uma bandidagem, cada vez mais organizada, ousada, cruel e sem medo de atacar o povo e as autoridades constituídas.


TJ-SP ARQUIVA PROCESSO CONTRA PALOCCI

ZERO HORA, 27 de junho de 2012 | N° 17113

VITÓRIA DE PALOCCI. Arquivado processo contra ex-ministro

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou ontem o arquivamento da investigação criminal que apurava a participação do ex-ministro da Casa Civil Antonio Palocci em esquema de lavagem de dinheiro no apartamento onde morava em São Paulo. De acordo com a representação que deu origem à abertura da investigação, Palocci pagava aluguel de R$ 15 mil do imóvel ao proprietário e sócio, Gesmo Siqueira do Santos, acusado de ser o laranja do esquema.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Nada contra a decisão judicial, mas casos de repercussão como este deveriam ser julgados ou então arquivados mediante publicação das justificativas e do pedido do Ministério Público, e não arquivar por simples decisão judicial. 

terça-feira, 26 de junho de 2012

MINISTRO REJEITA PRESSÕES, E AÇÃO DO MENSALÃO VAI ATRASAR





















FOLHA.COM. 26/06/2012 - 05h30

VERA MAGALHÃES, EDITORA DO PAINEL
FELIPE SELIGMAN, DE BRASÍLIA


O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal, se disse "estupefato" com pressões que recebeu para devolver logo o processo e afirmou ontem que tem até sexta-feira para concluir seu trabalho.

A decisão de usar todo o prazo deverá provocar um atraso de cinco dias no julgamento, adiando seu início do dia 1º de agosto para o dia 6.

"Estou trabalhando noite e dia para cumprir o prazo de entregar o voto revisor no fim do mês", afirmou Lewandowski à Folha, por telefone.

Na semana passada, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, enviou ofício ao colega advertindo que o processo deveria ser devolvido ontem para que o julgamento comece em 1º de agosto.

Lewandowski afirmou que ficou "estupefato" ao saber do envio do ofício. "Tive de me ausentar de Brasília na quinta-feira para o casamento do meu filho", disse. Segundo ele, o ofício de Britto era "genérico".

Lewandowski lembrou que o prazo para a devolução do processo foi aprovado pela maioria dos ministros. "O presidente está mudando o prazo? Estou surpreso."

No início da noite, Lewandowski divulgou nota em que expôs o incômodo.

"Sempre tive como princípio fundamental, em meus 22 anos de magistratura, não retardar nem precipitar o julgamento de nenhum processo, sob pena de instaurar odioso procedimento de exceção."

Ele acrescenta que o STF tem condições de cumprir o prazo e, citando reportagem de ontem da Folha, manifestou incômodo também com o fato de a cobrança ter ido parar na imprensa. Procurado, Britto não quis comentar.

TRÂMITE

A pressão para que Lewandowski concluísse até ontem a revisão do trabalho do relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, foi revelada no domingo pelo Painel.

Se Lewandowski tivesse concluído seu trabalho ontem, a liberação do processo seria publicada hoje. Haveria então dois dias para a notificação do Ministério Público e dos 38 réus, mais 48 horas para o início do julgamento.

Como Lewandowski não devolveu o processo ontem, não há mais tempo para cumprir essas formalidades nesta semana, antes do recesso. É por isso que será necessário esperar mais alguns dias para dar início ao julgamento em agosto, quando os ministros voltarem ao trabalho.

Ao ministro revisor cabe identificar omissões do relator, "confirmar, completar ou retificar" o relatório.

À Folha Lewandowski disse que sua missão não se resume à revisão. "Tenho de fazer um voto paralelo ao do ministro Joaquim, que seja um contraponto ao voto dele. Tenho de descer ao mérito, rever provas, todos os volumes dos autos. Não é simples julgar 38 pessoas, 38 seres humanos, 38 famílias."

Lewandowski disse ainda que precisa "trabalhar em paz" e negou que esteja sofrendo pressões externas, da opinião pública ou de advogado, mas não respondeu quando questionado se sofre pressões dos colegas.

"Eu não recebi nenhuma pressão de fora, nem para adiantar nem para atrasar nada. O dia em que um ministro do Supremo não tiver isenção para julgar, a própria democracia estará em risco."

Editoria de Arte/Folhapress





JUSTIÇA TRANSFERE FAZENDA PARA FAMÍLIA DE TRAFICANTE

Família de traficante 'ganha' fazenda em MS. Longa disputa judicial sobre área avaliada em R$ 250 milhões deverá ser decidida ainda neste ano pelo Superior Tribunal de Justiça.

LEANDRO MODÉ, ENVIADO ESPECIAL/ JARDIM (MS) - O Estado de S.Paulo, 25/06/2012



Uma decisão polêmica da Justiça de Mato Grosso do Sul, que transferiu à família de um traficante de drogas a propriedade de uma área agrícola do tamanho de Diadema, na Grande São Paulo, está no centro de uma batalha judicial que, ainda em 2012, deve desembarcar no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O que chama a atenção no caso é o fato de que a decisão se baseou em um documento rechaçado pela Justiça em julgamentos anteriores sobre o mesmo assunto. Desta vez, no entanto, o juiz Marcos José de Brito Rodrigues transferiu a propriedade dos 32 mil hectares da Fazenda Aurora para Rodrigo Fioravante Dametto, de 20 anos, e Renato Fioravante Dametto, de 22. A sentença é de 1.º de abril de 2011.

Rodrigo e Renato são filhos de Odacir Antônio Dametto, condenado pelas Justiças de Mato Grosso do Sul e do Rio de Janeiro por tráfico de drogas. Em uma dessas condenações, em 2005, ele pegou sete anos de prisão. Dametto morreu de ataque cardíaco em San Juan Caballero, no Paraguai, no dia 22 de maio.

A área em questão, que tem valor de mercado estimado em R$ 250 milhões, está situada entre os municípios de Bela Vista e Jardim, no sudoeste do Estado. Nas primeiras décadas do século passado, pertencia a um único proprietário. Hoje, quatro famílias de tradicionais agricultores sul-mato-grossenses dividem o espaço que antes formava a Aurora.

Nenhuma dessas famílias quis falar com o Estado com medo de represálias. Mas a reportagem obteve farta documentação sobre o caso na Justiça.

A história foi parar no STJ porque, em novembro, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul interrompeu o processo de adjudicação (transferência de propriedade) da fazenda. Na sentença, o desembargador Hildebrando Coelho Neto afirmou que "há notícias sérias de fraudes nas documentações". Os autores da ação (família Dametto) recorreram e a decisão final será do STJ.

História antiga. Esse processo não é o primeiro que envolve os 32 mil hectares que compõem a antiga Aurora. Em ao menos outras três ocasiões, se repetiu o mesmo modus operandi. A diferença, agora, é o desfecho favorável ao reclamante.

O enredo tem como peça-chave Ivo de Lima, um pecuarista nascido em 1930, que não foi localizado pela reportagem. Nas várias ações que tramitam (e tramitaram) na Justiça, Lima se apresenta como herdeiro da área. Nos processos, ele sempre está ao lado de alguém que comprou dele o suposto direito aos 32 mil hectares. Foi o caso dos irmãos Dametto, que firmaram com Lima, em janeiro de 2011, um contrato pelo qual pagariam R$ 75,7 milhões pela Aurora.

O problema é que o suposto direito de Lima se fundamenta em um testamento que foi considerado falso em julgamentos anteriores. Em um deles, o juiz chamou a atenção para algumas inconsistências. A primeira é que o testamento, lavrado em um cartório do Paraguai em 1936, falava em uma área em Mato Grosso do Sul, Estado criado só em 1977.

A segunda é que Lima teria nascido 15 anos depois da morte do pai dele, que seria o dono original da terra. Em 1995, parecer do Ministério Público também apontou a incoerência nas datas. O documento notava que "estranhamente, o legatário da área é filho do autor da herança, falecido 15 anos antes de o filho nascer".

A reportagem entrou em contato com o advogado dos irmãos Dametto, Paulo Roberto Massetti, mas não obteve retorno.

O ESTADO CAPITULOU

 
ZERO HORA, 26 de junho de 2012 | N° 17112. ARTIGOS

Aderbal Torres de Amorim, Advogado, professor da Escola Superior da Magistratura/Ajuris


Entorpecida pela indiferença e pela apatia, a sociedade brasileira já não se surpreende com as gangues de traficantes que dominam as grandes cidades, expulsam de suas casas famílias inteiras e as transformam em vassalos de seus intocáveis reinados. Vive-se a banalização do crime. Já não se reage quando o complacente Estado se acovarda ante a criminalidade de colarinho branco, nem se estranha que parlamentares, réus de processos criminais, integrem comissões de ética; tudo isso parece normal. E tão anestesiados estamos, que sequer percebemos a mais grave agressão que acaba de sofrer nosso denominado Estado de direito. Algo talvez pior do que um golpe de Estado, o recente fato materializa a vitória final do crime organizado contra as instituições oficiais.

Atemorizado pelas ameaças dirigidas a ele e a seus familiares, o juiz federal Paulo Augusto Ferreira Lima requereu sua substituição do processo criminal que apura os crimes da quadrilha do bicheiro Carlinhos Cachoeira, desvendados pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo. Deferindo o pedido e ferido de morte, o Estado ajoelhou-se ante o atrevimento da criminalidade. Venceu mais uma vez a bandidagem, como antes se vitoriara na eliminação da juíza Patrícia Accioli, assassinada com 21 tiros na porta de casa. Ela combatia o crime organizado da Baixada Fluminense.

Esses revoltantes episódios submetem a Justiça e materializam a completa falência do Estado. Rompem-se as instituições quando um juiz acossado renuncia a seus deveres, entra em férias e viaja para o Exterior para fugir à sanha da delinquência. Pior ainda – se pudesse haver algo pior –, o Tribunal competente defere o invulgar pedido de afastamento, reconhecendo, enfim, o superior poder dos fora da lei que agora submetem o último bastião da segurança em qualquer nação civilizada: a Justiça.

Ora, em nenhuma hipótese pode um juiz afastar-se ou ser afastado da direção de um processo a pretexto de ameaças de quem quer que seja, notadamente de réus que a ele compete processar e julgar. Pena de naufragar a própria cidadania, o Estado não pode reconhecer o poder do crime, aceitando ser atingido na mais sensível de suas funções: a de mandar para a cadeia os inimigos da sociedade. Não pode um juiz deixar a jurisdição por esse motivo. É dever do Estado prover sua segurança e de seus familiares, ou esse mesmo Estado não passará de um fantoche governado pela delinquência, já agora institucionalizada e também instalada nas altas cúpulas do poder. Se é verdade que o Estado não se torna insolvente por questões financeiras, verdade menor não é que ele deixa de existir quando se submete aos fora da lei. A força sem o direito é a tirania, mas o direito sem a força é a anarquia.

Vivemos um desgoverno. O Estado capitulou.




COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - E QUEM É O ESTADO? São Poderes da República Federativa do Brasil, independentes e harmônicos, o Legislativo (normativo, elaborador das leis), o Executivo (administrativo, converte as lei em ato individual e concreto) e o Judiciário (judicial, aplicação coativa das leis).   Estes Poderes de Estado em conjunto forma o Governo e constituem o Estado. O Estado não é apenas incumbência do Poder Executivo. Agora, se os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciãrio são "complascentes", "se acorvardam ante a criminalidade de colarinho branco", "ajoelham-se ante o atrevimento da crimianlidade", reconhecem o poder superior da bandidagem, demonstram incapacidade em assegurar a incolumidade do povo e de seus agentes públicos, e agem com descaso e inoperância no trato das questões de ordem pública, é porque uma grave e letal anomia já contaminou o Governo e entorpeceu o povo. A bandidagem agradece.