MAZELAS DA JUSTIÇA

Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

JUDICIALIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO



O Estado de S.Paulo 31 de dezembro de 2012 | 2h 05

OPINIÃO 


Foi adiada por tempo indeterminado a licitação de 15 obras viárias importantes destinadas a melhorar o transporte público na capital, entre elas terminais rodoviários e corredores de ônibus. O que motivou a decisão foi uma notificação do Ministério Público Estadual (MPE) ao governo municipal sobre a necessidade de interromper o processo referente ao Terminal Rodoviário de Vila Sônia, na zona oeste. Trata-se de mais um caso de judicialização da administração pública, com destacada participação do Ministério Público.

O MPE justifica sua atitude pelo fato de aquele terminal, que sofre críticas dos moradores da vizinhança, fazer parte da Operação Urbana Vila Sônia, cuja execução, como mostra reportagem do Estado, foi suspensa pela Justiça por falta de participação popular em seu planejamento. Como a Justiça está em recesso até 7 de janeiro - portanto impossibilitada de se manifestar sobre a abertura das propostas das empresas dispostas a participar da licitação, que havia sido marcada para o dia 27 de dezembro -, o promotor Maurício Ribeiro Lopes comunicou à Prefeitura que o processo teria de ser interrompido até aquela data.

Embora só o Terminal de Vila Sônia tenha sido objeto da iniciativa do MPE, a Prefeitura suspendeu a licitação de outras 14 obras que faziam parte do mesmo pacote, entre elas as Rodoviárias de Parelheiros, Jardim Ângela e Itaquera e a construção de 63,5 quilômetros de corredores de ônibus. Independentemente do acerto ou não dessa decisão abrangente, o caso daquele terminal merece atenção especial, porque é um bom exemplo da polêmica e crescente interferência do MPE, principalmente, mas também do Judiciário, nos rumos da administração pública em todos os níveis.

A reportagem do Estado mostra que muitos dos moradores das vizinhanças do futuro terminal estão de fato descontentes com o projeto. Um dos organizadores do movimento contrário à sua construção garante já ter obtido a adesão de 8.400 moradores. Alegam eles que a região já está saturada e não suporta o aumento de tráfego que uma rodoviária acarretaria. Argumentam também que as três rodoviárias existentes - Tietê, Barra Funda e Jabaquara - estão subutilizadas. A do Tietê utilizaria apenas 25% de sua capacidade.

Em primeiro lugar, não parece razoável que a Prefeitura tenha cometido um erro tão grosseiro na avaliação da capacidade dos terminais, em especial o do Tietê. Em segundo lugar, como determinar qual é o sentimento majoritário dos moradores da região? Questão importante, porque a suspensão da Operação Urbana Vila Sônia, da qual faz parte o terminal, foi determinada por falta de participação dos moradores no seu planejamento.

Fala-se muito em participação popular. Virou moda. Mas até agora não se determinou com precisão como ela deve se dar na prática. Ouvindo associações de moradores? Mas até que ponto elas representam a maioria? Fazendo uma consulta por meio de votação? Em cada caso seria preciso, então, determinar o número de votantes de uma área bem delimitada. Tarefa nada fácil, como se vê. Em terceiro lugar, quem decide que assuntos devem ser submetidos a tais consultas, se é que devem? Afinal, se prefeito e vereadores foram eleitos para governar e legislar, por que essas consultas, esses plebiscitos? Finalmente, o que têm a ver com isso - que são questões administrativas, da alçada dos governantes - o Ministério Público e a Justiça, a menos que alguma lei tenha sido desrespeitada?

Em artigo publicado no Estado (3/10/2012), o desembargador Rogério Medeiros Garcia de Lima chamou a atenção para os riscos da judicialização da política e da administração pública, na qual se enquadram casos como esse. Diz ele, com muita propriedade, que "o povo elege o governante e o governante governa. Se governa mal, o povo, em eleições democráticas periódicas, removerá (ou não) o governante que lhe desagrade (...) O Poder Judiciário não pode servir de trampolim para o exercício arbitrário e ilegítimo do poder político por quem não foi eleito".

sábado, 29 de dezembro de 2012

ESCOLHA DE JUÍZES PARA OS TRIBUNAIS

ZERO HORA 27 de dezembro de 2012 | N° 17295. ARTIGOS


Nylson Paim de Abreu*


Com o julgamento do processo conhecido como “mensalão”, no Supremo Tribunal Federal, muitas críticas têm surgido a respeito da escolha de juízes para os tribunais superiores. A mesma situação também acontece nos tribunais estaduais, regionais federais e regionais do Trabalho.

Por isso, faz-se necessária uma reflexão profunda a respeito de tão instigante tema, de interesse de toda a sociedade.

De minha parte, após longa experiência vivida na advocacia e na magistratura, cerca de 40 anos, ouso oferecer, a quem de direito, a seguinte proposição.

A nomeação de magistrados para os tribunais de segundo grau (desembargadores estaduais e federais), tribunais superiores (STJ, TST, STM e TSE) e Supremo Tribunal Federal deveria observar as seguintes regras:

I. Para os magistrados de segundo grau, oriundos da carreira, estes seriam escolhidos em lista sêxtupla, eleita diretamente pelos magistrados de primeiro grau;

II. Para os magistrados de segundo grau, oriundos do quinto constitucional, Ministério Público e Advocacia, estes seriam escolhidos em lista sêxtupla, por meio de eleição direta pelas respectivas classes e encaminhadas ao tribunal respectivo.

III. Para a composição dos tribunais superiores, seus integrantes seriam escolhidos em lista sêxtupla pelos tribunais de segundo grau, observada a origem de cada vaga, inclusive quanto ao quinto constitucional.

Parágrafo único: no caso do STM, os magistrados seriam escolhidos em lista sêxtupla pelas respectivas carreiras. No caso dos juízes militares, estes seriam escolhidos pelo alto-comando das Forças Armadas. Os juízes civis seriam recrutados em lista sêxtupla, eleita diretamente pelos juízes auditores e pelos membros do quinto constitucional, respeitadas as respectivas classes.

IV. Para o Supremo Tribunal Federal, a escolha seria feita por lista sêxtupla escolhida pelos tribunais superiores (STJ, TST, STM e TSE).

V. Em todas as hipóteses, o candidato mais votado da lista sêxtupla será nomeado pelo presidente do respectivo tribunal.

Assim, ressalvadas eventuais adequações, penso que tal proposta eliminaria a nefasta e constrangedora peregrinação dos candidatos junto a autoridades alheias à comunidade jurídica.

Adotadas tais regras, restariam afastadas quaisquer suspeitas de conotação político-partidária sobre os julgamentos dos tribunais, circunstância que certamente elevaria a credibilidade do Poder Judiciário perante a sociedade.

*ADVOGADO, EX-PRESIDENTE DO TRF/4

O DESABAFO DO DELEGADO



ZERO HORA 29 de dezembro de 2012 | N° 17297


NOVA ESTRATÉGIA | Humberto Trezzi

O desabafo do delegado


Com a entrada em campo da PF e ações integradas das polícias Civis, é chegada a hora de o Judiciário se agilizar na questão de assaltos a banco. Pelo menos é esta a opinião de um conceituado policial gaúcho, o delegado Guilherme Wondracek, diretor do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).

– Tenho inveja da polícia catarinense. Eles têm um Judiciário sempre a postos e conseguem resposta em 24 horas, não em duas ou três semanas, como tem ocorrido aqui no Rio Grande do Sul. Essa é a nossa mágoa – desabafa o policial.

A queixa dos policiais civis, às claras, é a mesma que policiais federais fazem a Zero Hora de forma mais discreta. As duas polícias sofrem com falta de agilidade dos juízes, quando se trata de apreciar pedidos de prisão, interceptação telefônica ou busca de provas. Hora de analisar: é compreensível que um magistrado tenha dúvidas sobre mandar prender ou não alguém. Ou antes de deixar que policiais revistem sua casa de alto a baixo. O problema é que, reconhecem os policiais, na maioria dos casos o juiz não tem dúvidas: ele tem é uma mesa repleta de trabalho e pouco tempo para analisar tanta papelada. O resultado é que muito pedido de urgência leva dias ou até semanas para ser apreciado.

Ora, criminoso escolado fica apenas alguns dias com um telefone, antes de trocá-lo. Está sempre mudando de casa. Remove também dinheiro e armas, que são indícios materiais. É por isso que um pedido de busca ou interceptação da polícia é sempre urgente. Precisam agir, antes que as provas sumam. No desespero, alguns policiais recorrem a magistrados amigos. Não deve ser assim. Já diz um ditado: Justiça tarda, mas não falha. Pois urge que tarde menos ou então a bandidagem continuará com motivos para celebrar.


Ataques mobilizam polícias do RS e de SC

A visão de bandidos com capuz, armados com o que há de melhor na indústria bélica, dominando reféns e com maior poder de fogo que as polícias, tem apavorado as autoridades em todo o Brasil. Tanto que essa modalidade de crime, conhecida como Novo Cangaço, foi assunto dominante no encontro nacional de chefes de Inteligência policial, que congregou nos dias 13 e 14 em Brasília policiais civis de todos os 27 Estados.

De todos os tipos de assalto a banco, Novo Cangaço, que nasceu nos estados do Nordeste e de uns anos para cá migrou para o sul do país, é o mais temido. A tática é dominar pequenas comunidades e fazer o maior número possível de reféns. Em alguns casos, os bandidos cortam as comunicações telefônicas de toda a região, numa autêntica operação militar.

– Temos trocado informações, dossiês, fotos – resume o delegado Ranolfo Vieira Junior, chefe de Polícia do Rio Grande do Sul.

A cooperação é mais intensa entre os Estados do Sul, que registraram 504 ataques até outubro – ante 293 no mesmo período do ano passado. Um cálculo extraoficial é de que os bancos percam, em média, R$ 60 milhões anuais.

Como resultado da integração, em 22 de dezembro, o delegado Juliano Ferreira, titular da Delegacia de Roubos, coordenou uma operação-conjunta com colegas catarinenses. Vinte e cinco agentes participaram da ação, que resultou na prisão de três foragidos. Os policiais prenderam Douglas Souza da Silva, 27 anos, Fábio Rode de Oliveira, 22 anos, e Denis Martins Fernandes, 32 anos. Com eles foram encontrados dois fuzis (modelos M-16 e AK-47), pistolas, centenas de projéteis, miguelitos, dois coletes à prova de bala, quatro toucas ninjas, roupas camufladas, 10 celulares, câmera fotográfica, luvas e até uma alavanca usada para quebrar os caixas eletrônicos.

O trio teria vínculo com Elisandro Falcão, foragido suspeito de lidera a maioria dos assaltos com uso de explosivos e com vítimas usadas como escudos humanos na Serra.

Em Santa Catarina, o bando de Falcão é suspeito de um assalto em Praia Grande em 2011, do ataque a um carro-forte em Dona Francisca (próximo a Joinville) em outubro passado e também do assalto em Sombrio.

JUSTIÇA INTIMIDADA


ZERO HORA 29 de dezembro de 2012 | N° 17297

PM é denunciado por ameaçar juíza. Em ligações telefônicas, homem falava em “arrancar os olhos” de magistrada

JOSÉ LUÍS COSTA

As ameaças à juíza Elaine Maria Canto da Fonseca, que colocaram em alerta o judiciário gaúcho em abril, teriam partido de um soldado lotado no Batalhão de Polícia de Guarda – unidade responsável pelo policiamento externo dos presídios. Considerada uma das mais surpreendentes afrontas a um magistrado gaúcho, a ameaça à juíza teve as investigações encerradas com a denúncia formalizada pelo Ministério Público (MP) contra o PM Enilson de Oliveira Rodrigues, 47 anos.

Segundo denúncia apresentada à 6ª Vara Criminal de Porto Alegre pelo promotor Ricardo Herbstrith, o policial seria autor de telefonemas anônimos “para diversos números utilizados pela juíza”. Em algumas ligações, teria ameaçado “arrancar os olhos” da magistrada.

A ameaça seria concretizada caso Elaine não seguisse uma ordem: acolher todos os pedidos de liberdade de presos que tramitavam na vara em que estava lotada entre 19 e 30 de março. À época, ela atuava na 2ª Vara do Tribunal do Júri da Capital. O soldado nega envolvimento.

A ameaça a Elaine ocorreu na manhã de 19 de março. Conforme o MP, o soldado teria obtido informações pessoais sobre ela – como nomes e endereços de parentes – ao ligar para um colega que trabalha no Centro Integrado de Operações da Segurança Pública (Ciosp), durante uma madrugada.

Promotor do caso levou em consideração perícia de voz

É comum PMs ligarem para o centro, solicitando, por exemplo, consultas sobre nomes de pessoas para verificar se elas são foragidas ou sobre placas de carros, checando se são furtados ou roubados. Como se trata de um órgão de segurança máxima, todas as conversas são gravadas e arquivadas.

Ao iniciar as investigações, o MP, em parceria com o Núcleo de Inteligência do Judiciário (NIJ), descobriu o nome do homem que fez o pedido de informações ao Ciosp: C. Emerson. Em um dos códigos de diálogos da BM, “C” significa sargento. O MP foi atrás de todos os “sargentos Emerson” na BM. Foram localizados três e intimados a depor. Eles negaram as ameaças, mas um deles, ao ouvir a gravação do Ciosp, teria reconhecido a voz do soldado Enilson.

A voz foi submetida a uma perícia no Instituto-geral de Perícias. Resultado: 98% de certeza de se tratar da mesma pessoa. Com base no exame, o promotor Herbstrith denunciou o policial militar.

Por intermédio da assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça, a juíza informou que não se manifestaria sobre o caso.

Por conta da denúncia, Enilson responde na Corregedoria-geral da BM a um Inquérito Policial-militar por uso de informação extraída do sistema reservado Segurança Pública. O soldado é réu em um processo na 2ª Auditoria da Justiça Militar, com outros 19 praças e um oficial da BM, por supostamente extorquir donos de caça-níqueis na zona norte da Capital.


Contraponto

O que diz o soldado Enilson de Oliveira Rodrigues - “Se fui denunciado, agora terão de provar que fui eu. Mas eu garanto: não tenho nada a ver com isso. Não tenho mais nada a te dizer.”

O crime - Coação no curso de processo, previsto no artigo 344 do Código Penal – quando é usado de violência ou grave ameaça com intenção de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade ou qualquer pessoa com participação em processo judicial, policial ou administrativo. A pena, em caso de condenação, varia de um a quatro anos de prisão, devendo ser cumprida em regime aberto.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

A JUSTIÇA AOS JUÍZES


ZERO HORA 28 de dezembro de 2012 | N° 17296. ARTIGOS


José Aquino Flôres de Camargo *

Recente opinião publicada em ZH sustentou a desnecessidade de criação de novos cargos de desembargador no Tribunal. A prioridade seria a provisão de servidores no primeiro grau, a adequação de desembargadores aos tempos da informática e a necessária uniformização de entendimentos. E, como recomendação, apontava para a obrigatoriedade da competência do Juizado Especial, comparando custos de um e outro sistema.

Certamente, a criação de cargos no TJ não ignora as lacunas existentes na estrutura da instituição. E criá-los não significa provê-los de imediato na integralidade.

Felizmente, a gestão do Judiciário deixou de ser interna corporis, vindo o debate a público. O risco é adotar-se discurso baseado em uma visão limitada do problema.

Se potencializar os Juizados Especiais é meta a perseguir; torná-los obrigatório não prescindiria de sua estruturação e alteração na legislação federal. Tampouco a opção seria solução mágica para a jurisdição. Não “se veste um santo, despindo outro”. Há demandas estratégicas, como a das ações de massa, o incremento das fontes alternativas de resolução de conflitos. Outras reclamam investimentos, como os temas associados à violência doméstica, à execução criminal, à proteção dos idosos, à infância e adolescência...

Criar cargos de desembargador nada mais significaria, senão dar sequência à política de gestão planejada. Medida que veio a ser precedida por aprovação de lei estadual, ainda na presente legislatura (de nº 13.974, de 20.04.12), autorizando o Tribunal, por definição administrativa, a alterar a composição das câmaras, acen-tuando a especialização e reafirmando a política de extinção gradual dos grupos, favorecendo a tão almejada sedimentação do entendimento da jurisprudência. Tudo isso com redução de estruturas e agilização da resposta jurisdicional.

Também não é por outra razão que o Tribunal optou por duplicar suas dependências físicas, arvorando-se na construção de seu anexo. Medida que deve ser acompanhada de investimentos na gestão de gabinetes, na implantação de sessão virtual...

Muito se tem feito por aqui, mas de forma planejada. Não obstante as carências de pessoal e orçamentária e o garrote fiscal, a Justiça gaúcha continua paradigma de produtividade e credibilidade.

Ainda não inventaram o computador que substitua o juiz, sendo nosso órgão judicante sensível e capaz de avaliar as desigualdades e as mudanças da sociedade. Estas mudanças respeitam o tempo de cada um.

Embora a realidade da informática, não se pode deletar (no jargão da virtualidade) o maior patrimônio da nossa Justiça: os valores humanos que a constituem.

Não se está diante de uma simples troca de homem por máquina. Mas de uma transição, que envolve procedimentos, mas que não prescinde do valor humano que constitui a magnífica história desta instituição.

*DESEMBARGADOR DO TJ/RS

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Sim, "a justiça aos juízes", mas também aos servidores da justiça, ao cidadão e à ordem pública. Não sou contra o aumento do número de desembargadores, mas é preciso antes aumentar o número de juízes, de servidores da justiça e de varas judiciais para aproximar o Poder Judiciário do cidadão, das ilicitudes e dos esforços dos outros órgãos que integram os Sistemas de Justiça Criminal e Cível (infelizmente inexistentes no Brasil), de forma a agilizar os processos e o transitado em julgado, aumentar a confiança na justiça gaúcha e atender a crescente demanda por justiça.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

QUESTÃO DE PRIORIDADES

Revista Consultor Jurídico, 22 de dezembro de 2012

Denúncias menores deixam grandes fraudes impunes

Por Pedro Canário


A insistência em punir pequenos delitos fez a 7ª Vara Federal Criminal se debruçar mais uma vez sobre caso que já havia sido extinto em 2006. É a história de um flanelinha que recebeu uma nota falsa de R$ 20 em 2005. Foi acusado de receber e tentar repassar a nota, crime descrito no artigo 289, parágrafo 1º, do Código Penal. Na primeira ação penal, de 2006, foi condenado na primeira instância, mas o processo foi extinto pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Nova denúncia foi feita. O réu foi absolvido já no primeiro grau.

Consta dos autos que o flanelinha guardava carros durante corrida em Interlagos, em São Paulo. Recebeu de um motorista a tal nota R$ 20 e deu troco de R$ 15. Disse que só foi perceber que a nota era falsa no dia seguinte. Logo concluiu: “tomei calote”. O juiz federal Ali Mazloum, titular da 7ª Vara, condenou o flanelinha, mas com base no parágrafo 2º do artigo 289 do CP. Concluiu que ele recebeu a nota de boa-fé, sem saber que era falsa.

Recursos foram apresentados pelo Ministério Público Federal e pela Defensoria. O primeiro pedindo aumento da pena. O segundo, a absolvição. O caso foi extinto de ofício.

O MPF apresentou nova denúncia. Mazloum, no entanto, não a aceitou. Disse que, além de não existirem provas nos autos quanto à intenção do rapaz de pegar a nota falsa, decisão nova sobre o mesmo fato não pode agravar a situação do réu. Neste caso, escreve Mazloum, a punibilidade estaria extinta pela prescrição.

Levantou questões processuais. O artigo 617 do Código de Processo Penal proíbe que a pena seja agravada quando só a defesa recorre da decisão. Já a Súmula 160 do Supremo Tribunal Federal diz que “é nula a decisão de tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”. Mas, no caso do flanelinha, o TRF-3 anulou o processo de ofício, sem analisar quaisquer argumentos, nem de defesa nem de acusação.

“Nesta hipótese, falta à ação penal condição essencial para sua instauração, consubstanciada no trinômio interesse/necessidade/utilidade (artigo 395, II, do CPP). Abrir novo processo para, ao final, ficar-se adstrito à apenação pretérita, em face da inafastável proibição da reformatio in pejus, atenta contra a dignidade humana, que proíbe seja o processo utilizado como instrumento de punição”, sentenciou Mazloum.

Prioridades
Ao fim da sentença, Ali Mazloum faz uma reclamação. Enquanto a “deficiente estrutura” do Judiciário é movimentada com casos como o do flanelinha, “as grandes fraudes financeiras e lavagens bilionárias de dinheiro sujo circulam impunemente pelo país”.

E não é uma questão de falta de trabalho. Em 2012, a 7ª Vara Federal Criminal recebeu 167 novas denúncias. Dessas, acolheu 133 e rejeitou 34. Isso, na opinião do juiz titular, “demonstra nossa criteriosa análise antes de abrir processo contra qualquer pessoa”.

Mesmo com a análise detalhada, o saldo é positivo. Foram 201 sentenças proferidas durante o ano, número mais de 50% acima da quantidade de denúncias acolhidas no mesmo período. Hoje, a 7ª Vara conta 300 processos em acervo, “o que nos coloca nos melhores padrões internacionais de Justiça Penal”, diz o juiz federal Ali Mazloum. Segundo ele, um processo não dura mais de dez meses na vara.

Pedro Canário é repórter da revista Consultor Jurídico.



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - A questão não é esta de criar "prioridades". A justiça tem que julgar desde os pequenos delitos aos grandes e mais graves delitos. Esta história de deixar de lado e não dar importância aos pequenos delitos que o Brasil vai mal, pois a justiça brasileira está entrando em colapso pela insuficiência de juízes, servidores e varas judiciais, pelo orçamento falimentar e pelo descaso para com a aplicação coativa das leis.

ESTADO NÃO PRECISA DE MAIS DESEMBARGADORES

ZERO HORA 26 de dezembro de 2012 | N° 17294. ARTIGOS

Pedro Luiz Pozza*



Recentemente, foi noticiado o encaminhamento de projeto de lei do Tribunal de Justiça para criar 30 cargos de desembargador, seguindo-se iniciativa idêntica do Ministério Público para criar o mesmo número de cargos de procurador de Justiça. Projetos esses que por certo serão aprovados em breve.

Realmente, nosso tribunal é a corte brasileira que recebe o maior número de processos, que cresce a cada ano, sendo cada vez mais difícil seu julgamento em tempo razoável, além de poder gerar prejuízo à qualidade das decisões – o mesmo ocorre no primeiro grau de jurisdição da Justiça comum.

Não há razão, todavia, para criar mais cargos de desembargador, muito menos de procurador de Justiça. Até porque há carências de servidores no Judiciário de primeiro grau, não supridas pela alegada falta de recursos.

Para amenizar o excesso de trabalho no Tribunal, bastaria melhorar sua gestão visando a uma maior produtividade de seus julgadores, alguns ainda na idade da pedra, que se recusam a usar o computador ou pelo menos todos os recursos da informática.

Além disso, uniformizar a jurisprudência do Tribunal seria uma forma de reduzir o ingresso de novas ações no primeiro grau, desafogando também a Corte, que em alguns casos julga contrariamente ao STJ, decisões essas quase sempre reformadas.

Solução mais eficaz – e de longo prazo – ainda seria, contrariando o interesse corporativo dos advogados, tornar absoluta a competência dos Juizados Especiais Cíveis, que no Estado ainda é relativa, ao contrário de vários outros, que a têm por absoluta.

Tal caráter poderia ser implantado gradativamente, a fim de permitir que os JECs e as Turmas Recursais Cíveis assumissem o trabalho que hoje é da Justiça comum e do Tribunal, que teriam menos processos a julgar, reduzindo também o número de recursos especiais, que não podem ser opostos contra as decisões proferidas pelas Turmas Recursais Cíveis. Até o STJ restaria agradecido.

Certo, isso implicaria a necessidade de aumentar o número de Juízes das Turmas Recursais Cíveis, hoje de apenas 12 – mas não seriam necessários mais 30. Isso poderia ser feito com um custo muito menor, pois enquanto um gabinete de desembargador gera uma despesa com pessoal de cerca de R$ 80 mil, o de um juiz de Turma Recursal custa menos da metade, julgando número equivalente de recursos aos dos membros do Tribunal.

E, se não criarmos cargos de desembargador, não há necessidade de criar novos cargos de procurador de Justiça. A economia, assim, seria dupla.

Portanto, deve a sociedade gaúcha atentar para essa realidade e lutar contra a criação desses novos cargos no Tribunal de Justiça e Ministério Público.

*JUIZ DE DIREITO

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Está correto, o Judiciário não precisa de mais "caciques". O Judiciário precisa sim de um número bem maior de juízes de direito, de servidores da justiça e de varas da justiça espalhadas em todos os municípios do RS. O sistema judiciário necessidade de se desburocratizar, delegar atribuições, agilizar os processos, reduzir prazos, extinguir o formato atual do inquérito policial, aumentar as ligações com os demais órgãos e integrar os Sistemas de Justiça Criminal e Cível para se envolver nos casos com mais comprometimento, supervisão e coatividade. O problema principal é a política salarial extravagante que consome a maior parte do orçamento do poder, impedindo de investir no potencial humano.

domingo, 23 de dezembro de 2012

LEÕES SOB O TRONO, SOBRE O STF

23 de dezembro de 2012 | 2h 07

Roberto Romano* - O Estado de S.Paulo


Recente entrevista do ministro Luiz Fux ilumina algo pouco analisado: se o Supremo Tribunal Federal (STF) é a instância maior da Justiça, como são escolhidos, de fato, os seus integrantes? Cito as palavras de Fux: "Busquei apoio demais. Viajei para o Nordeste, achava que tinha que ter o maior apoio político possível. O que é um erro, porque o presidente não gostava desse tipo de abordagem. Quando nomeia, ele quer que seja um ato dele". O Palácio do Planalto tem primazia na escolha do candidato. Para chegar ao presidente existem os favores. "Alguém me disse: 'Olha, o Delfim é uma pessoa ouvida pelo governo'. Aí eu colei no pé dele'." E surge o socorro da esquerda. "Ele (Stédile) me apoia pelo seguinte: houve um grave confronto no Pontal do Paranapanema e eu fiz uma mesa de conciliação no STJ entre o proprietário e os sem-terra. Depois pedi a ele para mandar um fax me recomendando e tal. Ele mandou." O líder e a Corte (conservadora ou progressista) decidem longe dos "cidadãos comuns" ("leigos"...), que pagam impostos e quase nada recebem do Estado. Soberania popular é fábula no Brasil.

O ministro exibe a distorção republicana: a hegemonia presidencial absoluta, algo que o(a) chefe do Estado deve ressarcir de mil modos. Os pagamentos reiteram a ditadura do Executivo, garantida por favores orçamentários, cargos, benesses. Perto de tal sistema, o conteúdo da Ação Penal 470 é nonada. O balcão das trocas e o "é dando que se recebe" definem a vida política. No caso do STF, o "exame" do Senado produz náusea. É preciso mudar, para bem da autoridade pública, o modo como são indicados os ministros do Supremo.

Nos EUA, modelo de nossa prática, tensões e interesses econômicos, políticos, religiosos, partidários entram na liça pelas cadeiras do tribunal. Ali a escolha dos juízes tem origem em compromissos. Já o Plano Randolph, apresentado à Convenção da Filadélfia, adianta que o Legislativo nacional indicaria os membros da Corte. Mas os convencionais optam pela indicação do Executivo. Benjamin Franklin sugere o corpo dos advogados, que escolheria os mais hábeis dentre eles. Proposta vencida. Os choques vêm de antagonismos geográficos. Madison defende a indicação pelo Senado e depois recusa o modelo com receio de que a escolha favoreça "os Estados do norte".

Embora os convencionais afirmassem desejar para a Corte pessoas íntegras e peritas, ficou patente no debate a importância dos interesses que presidiram a forma de escolha. Mas todo o Legislativo assume responsabilidade na ordem dos tribunais, segundo o Judiciary Act de 1789.

Cabe ao Congresso definir o tamanho da Corte Suprema. Várias propostas foram apresentados aos legisladores para que a nomeação dos magistrados da Corte resultasse do voto popular. Foram 13 projetos em tal sentido entre 1889 e 1926. Em 11 deles os juízes deveriam ser escolhidos pelos eleitores e o presidente, eleito pelos seus pares. A proposta visava a fazer do Supremo uma instância mais responsável em face da vontade do povo. Das sugestões para mudar a escolha, a mais recente é de 1956. Nela os indicados deveriam ter pelo menos cinco anos de experiência judiciária em tribunais superiores do Estado ou federais.

Nos EUA, a escolha dos postulantes ao Supremo leva, não raro, à recusa de indicados. O Senado não impõe nomes. O presidente opta segundo alvos científicos, políticos, econômicos, ideológico. Interesses díspares exercem pressão sobre o comitê senatorial para o Judiciário (Senate Judiciary Committee) para que tal ou tal indicado seja escolhido.

Como analisar os juízes na Corte Suprema? O ideal do governo onde a lei é soberana define a democracia. Trata-se de um paradigma. John Schmidhauser (The Supreme Court: Its Politics, Personalities and Procedures) usa um truísmo: as leis são feitas e interpretadas por seres humanos. A exegese legal traz a estampa dos que a fazem. A Corte norte-americana reuniu, na maior parte, estadistas, e não fantoches dos interesses civis e dos governos. Além do saber jurídico, a nação deles recebe o impacto de sua pessoa, o maior ou menor grau de autoridade e decoro. Eles, pelo menos desde 1937, defendem minorias contra o arbítrio da maioria. Advertência de Schmidhauser: "É preciso analisar a moderna tendência judiciária e sua ênfase nos direitos não econômicos" assumida pelo Supremo estadunidense.

E no Brasil? A história não é tão edificante. Na era Vargas, o onipotente perseguiu oposicionistas (Luís Carlos Prestes, João Mangabeira, Julio de Mesquita e outros), afastando a Justiça comum. Ele expõe à Câmara dos Deputados o projeto de um tribunal de exceção, vetado pela Carta Magna ("Não haverá foro privilegiado nem Tribunais de exceção"). A frase seguinte do texto ("Admitem-se, porém, Juízos especiais em razão da natureza das causas") favorece o poder. O golpe é bem-sucedido e em 24/08/1936 surge o Tribunal de Segurança Nacional. Por unanimidade a Corte Suprema o declara "em perfeito acordo com a Constituição da República". Entre os atos do tribunal, um arruína o Direito: com o empate no julgamento de João Mangabeira, o presidente, desembargador Barros Barreto, vota... contra o réu (para outros aspectos do pretório, Reynaldo Pompeu de Campos, Repressão Judicial no Estado Novo, 1982). Disse o padre Laberthonnière: "Não julgo a vítima, mas apenas os juízes"...

É tempo de mudar a forma de indicação para o STF e impedir o absolutismo do Executivo. Se o desprezo pelos "leigos" afasta o voto dos eleitores, que ao menos a comunidade jurídica indique os magistrados em escolha ampla e transparente. Tenham eles prática em tribunais superiores e não devam o cargo ao Executivo ou ao subserviente Legislativo nacional, nem aos oligarcas dos partidos. Sejam poupados aos juízes os peditórios e outros recursos cortesãos. Que se negue a tese de Francis Bacon sobre eles, o seu triste papel de "leões sob o trono".

* Filósofo, professor de ética e filosofia na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é autor, entre outros livros, de 'O Caldeirão de Medeia' (Perspectiva)



MENSALÃO: JULGAMENTO POLITIZADO?


ZERO HORA, 23/12/2012

ENTREVISTAS

“Não tenho dúvida de que o julgamento foi politizado” - Dalmo Dallari - Professor emérito da USP


Aos 81 anos, Dalmo de Abreu Dallari tornou-se um dos maiores críticos do julgamento. Membro da Comissão Internacional de Juristas e professor visitante da Universidade de Paris, ficou estarrecido com os votos de alguns dos ministros. De sua casa, nos arredores do Parque Ibirapuera, em São Paulo, ele conversou com ZH por telefone no dia 14.

Zero Hora – Qual é a sua avaliação sobre o julgamento?

Dalmo de Abreu Dallari – Houve excesso de publicidade, criando a imagem de uma revolução no Judiciário, o que é absolutamente falso. Grandes jornais falaram em “julgamento do século”. Acho que será, quando muito, o julgamento de dois ou três meses. Não surgiu nenhuma tese jurídica nova. Pelo contrário, o que se viu foram falhas muito graves do Supremo. Houve erros jurídicos tão evidentes que não dá para achar que foi um bom julgamento, sem contar o excesso de exibicionismo.

ZH – O senhor acredita que houve politização do caso?

Dallari – Não tenho dúvida de que o julgamento foi politizado. Por uma série de aspectos, ficou mais do que evidente a politização. E aí eu vejo, em parte, uma responsabilidade da mídia. Os grandes jornais, tradicionalistas, têm uma posição absolutamente parcial e partidária contra Lula e o PT. Essa teria sido uma grande oportunidade para mostrar que Lula e o PT são iguais aos outros em termos de práticas de corrupção. E isso foi muito explorado, assim como uma fragilidade psicológica de vários ministros, a começar por Joaquim Barbosa. Ele foi superassediado, se deixou levar, se deslumbrou. Isso contaminou, sim, a pureza da decisão.

ZH – Os juristas que discordam da tese da politização argumentam que a maioria dos ministros do Supremo foi nomeada por governos do PT e, ainda assim, condenaram os réus. Como o senhor avalia isso?

Dallari – De fato, vários dos ministros que foram nomeados por Lula adotaram uma posição radical contra o PT, mas eles foram simplesmente nomeados. Não tinham vinculação com o partido.

ZH – Que legado fica para o Direito brasileiro?

Dallari – O que fica é a necessidade de uma reforma profunda no Supremo. Fica, também, a demonstração da aplicação errada, por exemplo, da teoria do domínio do fato. Os ministros mostraram que não conhecem ou que não sabem o que ela significa. E isso é uma fragilidade muito séria. Mostra, uma vez mais, a necessidade de escolher melhor os ministros.

ZH – O que muda para sociedade?

Dallari – Caso se faça a aplicação que o Supremo fez do domínio do fato, todas as vezes que algum funcionário de uma empresa for acusado de ter interferido numa licitação pública será processado o presidente da empresa. Se se aplicar a teoria dessa forma, vai haver um número muito grande de empresários sendo processados por corrupção. E, muitas vezes, de forma equivocada. Fora isso, não vai haver mais nenhuma contribuição.

ZH – Os tribunais vão mudar a forma como punem a corrupção a partir desse precedente?

Dallari – Não acredito nisso. Pode ser que haja um efeito de advertência. Mas será um efeito mínimo. Não será de maneira alguma um divisor de águas na história brasileira, exatamente pelas falhas do Supremo. A fragilidade das posições é tão grande e tão evidente que nenhum tribunal vai se sentir obrigado a copiar isso.



“Dizer que houve politização é como cuspir para cima”- Paulo Brossard - Ministro aposentado do STF


Aos 88 anos, Paulo Brossard acompanhou o julgamento do mensalão pela TV, de sua casa no bairro Petrópolis, em Porto Alegre. Classificou o que viu como um marco na história do Direito brasileiro. No dia 12, Brossard recebeu ZH em sua residência e, rodeado de livros e de recordações dos tempos de magistratura, fez uma análise do processo.

Zero Hora – Qual é a sua avaliação sobre o julgamento do mensalão?

Paulo Brossard – O que aconteceu foi inédito e, pelo ineditismo, é claro que se tornará um marco. Vou fazer 60 anos de formado e não tenho lembrança de nada parecido. No início, havia um certo ceticismo em relação aos resultados, mas as pessoas foram se surpreendendo e, a partir de um certo momento, foram se dando conta de que a coisa era séria. Mesmo com todas as divergências e com toda a complexidade do caso, a maior parte das condenações se deu por maioria absoluta.

ZH – O senhor acredita que houve politização do caso?

Brossard – Há um dado que desmancha essa suposição. A maioria dos ministros foi nomeada pelos governos do PT. Dizer que houve politização do julgamento é como cuspir para cima. Se tivesse havido, o resultado teria de ser totalmente diferente. Os réus teriam sido absolvidos. E mais do que isso: o relator (Joaquim Barbosa) e o revisor (Ricardo Lewandowski) do processo foram nomeados pelo ex-presidente Lula. Esse dado mostra como é leviano e irresponsável dizer que houve politização.

ZH – Que legado fica para o Direito brasileiro?

Brossard – Para o Direito, essa decisão é de importância óbvia, sem precedentes. Ninguém pode dizer que tenha sido algo improvisado ou fruto de reações apaixonadas. Foram votos maduros e longos. Mas o legado maior é para a sociedade.

ZH – O que muda na sociedade?

Brossard – Até então, havia uma tradição atávica no país de que o governo ganhava sempre, de que casos desse tipo prescreviam ou terminavam impunes. Em 1640, o padre Antônio Vieira, em um de seus sermões, disse: “Perde-se o Brasil, senhor, porque alguns ministros de sua majestade não vêm cá buscar nosso bem, vêm cá buscar nossos bens”. Essa sentença traduz uma realidade. Aqui no Rio Grande do Sul, há uma expressão que diz que o cavalo do comissário sempre ganha. Pois o julgamento mostrou que isso não é verdade. O cavalo do comissário perdeu a penca. Não se pode menosprezar o efeito disso. O caso do mensalão será lembrado por muito tempo. A palavra ficará como um estigma. Na história, ficou um símbolo, e um símbolo que não tinha antecedente. A partir dele, espera-se que haja consequências.

ZH – Esse precedente vai repercutir nos tribunais?

Brossard – Claro que sim. Mas quantos são os juízes brasileiros? São milhares. E há juízes modelares e juízes que não são modelares. Nunca vi, como nos últimos tempos, tanta denúncia contra juiz. De um modo geral, não acho que a corrupção vai se extinguir, porque é uma chaga da miséria humana. Mas há certos abusos, certos crimes que, se forem tentados, o serão de forma muito mais discreta. O combate à corrupção não depende só do juiz, também depende da sociedade e da comunidade judiciária.

sábado, 22 de dezembro de 2012

USO ILEGAL DE FUNDO


CNJ vê uso ilegal de fundo em São Paulo. Para Corregedoria, TJ não poderia utilizar verba destinada a 'aperfeiçoamento da atividade jurisdicional' com auxílio-alimentação

FERNANDO GALLO - O Estado de S.Paulo, 21/12/2012



A Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça viu ilegalidade no uso do Fundo Especial de Despesa (FED) do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) para o pagamento de auxílio-alimentação a magistrados e servidores. Só no exercício de 2011, a corte usou R$ 200 milhões do Fundo (45,1% do total) para esse fim. O TJ alega haver previsão legal para o pagamento.

A suposta ilegalidade foi detectada em inspeção promovida pelo CNJ no tribunal paulista em agosto. Consta de um relatório publicado em 19 de outubro no Diário de Justiça. Nele, a então corregedora do CNJ, ministra Eliana Calmon, anotou: "Entende-se que estes pagamentos que estão sendo efetivados por meio de recursos do fundo não coadunam com as finalidades constantes na legislação: aperfeiçoamento da atividade jurisdicional".

O imbróglio sobre o uso dos recursos tem origem no desvirtuamento da finalidade do fundo, inicialmente constituído para modernizar e informatizar o tribunal. Instituído em 1994, o FED tinha por finalidade, de acordo com a Lei 8.876 daquele ano, assegurar recursos para "a expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional", e "em especial" três itens: modernização administrativa do TJ; desenvolvimento de programas internos e aquisição de equipamentos e informática; e aperfeiçoamento de servidores e magistrados.

Contudo, em 2006 o texto foi alterado para tirar esses três itens e fazer constar que os recursos do fundo se destinavam a "despesas com recursos humanos, decorrentes do cumprimento de decisões administrativas do Tribunal de Justiça, excetuando-se os gastos com vencimentos, concessão de vantagem, reajuste ou adequação de remuneração".

Foi mantida, porém, a expressão segundo a qual o fundo "tem por finalidade assegurar recursos para expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional". Esse é o trecho usado pelo CNJ para apontar ilegalidade no pagamento de auxílio-alimentação.

Ontem, a Assembleia Legislativa aprovou nova lei, enviada pelo Palácio dos Bandeirantes em 1.º de dezembro, para nova alteração legal - desta vez, para fazer constar textualmente a possibilidade da utilização dos recursos do FED para o pagamento de auxílio-alimentação, creche e funeral (leia ao lado).

Base legal. Além da legislação estadual, a corregedoria do CNJ usou a Constituição Federal para apontar a ilegalidade do uso que o TJ tem dado à verba do fundo. No relatório, a ministra diz que "o parágrafo segundo do artigo 98 dispõe que "as custas e emolumentos serão destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça". Ela grifou o "exclusivamente". Ocorre que, entre outras fontes de receita, o fundo é custeado por eles.

Segundo a presidência do TJ, os funcionários recebem auxílio-alimentação desde 2005 e os magistrados, desde 2012. O tribunal afirma que paga R$ 23 milhões por mês para os primeiros e R$ 1,5 milhão para os juízes e desembargadores, e que todos recebem a mesma quantia: R$ 29 por dia. Ao todo, são 43 mil servidores e 2.200 magistrados.

Desde 2007, a corte já gastou R$ 700 milhões do fundo para o pagamento de auxílio-alimentação. Entre 2007 e 2010, o valor total usado para esse fim variou entre R$ 56 milhões e R$ 72 milhões. No ano passado, subiu para R$ 200 milhões. Em 2012, já chega a R$ 242 milhões.


Assembleia de SP muda lei para manter auxílios ao TJ

FERNANDO GALLO - Agência Estado


A Assembleia Legislativa aprovou no fim da noite de quarta-feira (19) projeto de lei de autoria do Executivo que altera o texto da legislação que instituiu o Fundo Especial de Despesa (FED) do Tribunal de Justiça de São Paulo.

A lei 8.876/1994, que instituiu o Fundo, foi alterada para constar textualmente a possibilidade do uso do FED para o pagamento do auxílio-alimentação dos funcionários do tribunal. "Desde que não haja destinação orçamentária suficiente no Tesouro do Estado e comprometimento da finalidade prevista no ?caput? deste artigo, os recursos do Fundo poderão ser utilizados para as despesas decorrentes do cumprimento de decisões administrativas, bem como as de auxílios alimentação, creche e funeral."

Contudo, foi mantida a expressão questionada pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), segundo a qual "o Fundo a que se refere o artigo anterior tem por finalidade assegurar recursos para expansão e aperfeiçoamento da atividade jurisdicional".

O projeto, que foi publicado no Diário Oficial em 1.º de dezembro, passou a tramitar em caráter de urgência e foi aprovado em uma velocidade incomum na Assembleia, dois meses depois de o relatório da então corregedora Eliana Calmon ter apontado a ilegalidade no uso do fundo para o pagamento do auxílio-alimentação.

O jornal O Estado de S. Paulo apurou com deputados que participaram da discussão do projeto que o presidente do TJ, Ivan Sartori, apelou ao colégio de líderes da Casa pela mudança, sob a alegação de que precisava dar uma resposta ao apontamento da corregedoria, sob pena de ter de parar de pagar o auxílio-alimentação aos mais de 43 mil servidores do judiciário.

A proposta acabou sendo aprovada por consenso, com apoio inclusive da oposição. Contudo, dentro do PT e do PSOL havia insatisfação com o desvirtuamento do uso do FED.

"Foi para legalizar o pagamento. Se não, o tribunal ia ter que cortar o vale-refeição de 40 mil servidores", afirmou o deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL). "O Alckmin cortou mais de R$ 2 bilhões do orçamento do Judiciário, o que leva a esse tipo de distorção. Mas dos males, o menor."

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

BRASIL É O PAÍS DOS PRIVILÉGIOS

ZERO HORA ONLINE 21/12/2012 | 10h05

Brasil é o país dos privilégios, diz Joaquim Barbosa
Presidente do STF pretende adotar práticas para combater advocacia de parentes de ministros e conselheiros


Joaquim Barbosa concedeu entrevista coletiva na quinta-feiraFoto: Carlos Humberto / STF,Divulgação


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, falou na quinta-feira sobre as prioridades que deverá adotar como líder da Suprema Corte e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Uma das ações, segundo o ministro, será combater a advocacia de parentes de ministros e conselheiros em tribunais superiores, o que ele considera um privilégio indevido.

— É uma visão minha, mas é muito provável que seja contrária ao pensamento de uma maioria. O Brasil é o país dos privilégios, que são internalizados como se fosse a coisa mais natural do mundo. Parece ser um direito constitucional ao privilégio— disse o ministro, durante entrevista coletiva.

Barbosa disse que "a prioridade número um" no Supremo em 2013 será o julgamento de recursos reconhecidos como repercussão geral. Nesses casos, as decisões em apenas um processo no STF são aplicadas a todos os casos semelhantes em instâncias inferiores, desafogando a Justiça. O ministro disse que colocou sua equipe para analisar a questão em conjunto com tribunais pelo país.

Ainda segundo Barbosa, a pauta das sessões de 2013 será "mais regular", destinada à "limpeza de processos que estão prontos para julgamento há muito tempo".

Quanto ao processo que apura o chamado mensalão mineiro, Barbosa disse que não é mais relator do caso e que a arbitramento do processo dependerá da liberação do próximo ministro responsável, que ainda não foi indicado pela presidenta Dilma Rousseff.

O presidente ainda disse que, no CNJ, atacará a questão do "patrimonialismo no Brasil" em casos de corrupção e improbidade, mas apenas nos casos que envolvem a competência do Conselho, "sem extrapolação". Ele também analisará a questão dos supersalários no Judiciário e dará atenção especial à questão carcerária, com estudos, publicações e mutirões para tornar o cumprimento das penas mais humano.



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Se ele fizer o que está prometendo, o povo voltará a confiar na justiça brasileira. Mais, ele marcaria sua passagem se enviasse ao Congresso o projeto de criação do SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL e a delegação do transitado em julgado dos processos não relevantes para os tribunais regionais. 

O Poder Judiciário deveria abandonar sua postura burocrata, benevolente, aristocrática e oligárquica, passando a se aproximar da sociedade, das ilicitudes e dos demais instrumentos de Justiça Criminal, especialmente.  Uma justiça morosa só interessa aos bandidos, corruptos, rebeldes, oportunistas e justiceiros.

Um súmula vinculante poderia desburocratizar os procedimentos e  delegar o transitado em julgado para os Tribunais Regionais para desafogar as cortes supremas, fortalecer este tribunais e agilizar os processos. O Judiciário deveria interferir mais fortemente na elaboração dos Códigos Penal e Processo Penal para reduzir prazos, recursos e formalidades, criando os juízes de instrução e de garantia e extinguindo o atual formato do inquérito policial para acelerar os procedimentos policiais.  

OS RISCOS DA FALÊNCIA DO JUDICIÁRIO

JORNAL DO COMÉRCIO, 21/12/2012

Espaço Vital
Marco A. Birnfeld - Espaço Vital
Autor da ação que questionou as eleições de dezembro do ano passado no TJ-RS, o desembargador Arno Werlang - depois do resultado (5x3) que na quarta-feira passada (12) lhe foi desfavorável no STF - afasta as especulações de que, aborrecido, fosse logo se aposentar. “Resolvi reivindicar o cargo de corregedor-geral da Justiça, que por lei me é assegurado, na expectativa de que pudesse ajudar dentro da instituição a corrigir erros muito graves”, disse ele ao Espaço Vital.

Ele anuncia que manterá sua vigília na ativa - contando com o reforço das redes sociais e com a criação de um saite, com a sua assinatura, que entrará no ar no primeiro trimestre de 2013. “Vou continuar tentando a modificação de alguns costumes que estão se arraigando” - diz ele.

Na terça-feira (18) pela manhã - num intervalo da sua apertada agenda de revisão dos mais de 900 processos pautados para a última sessão do ano da 2ª Câmara Cível -, Werlang recebeu o colunista do Espaço Vital para uma entrevista. Algumas frases do magistrado:

Falência - “Se continuar como está, em pouco tempo, a Justiça brasileira se transformará em mais um serviço público falido, assim como a saúde, a segurança e a educação. O Judiciário servirá para as pequenas causas, tal quais o SUS e o ensino público.”

Corrupção - “Até bem pouco tempo, era inaceitável crítica quanto à corrupção no Judiciário gaúcho. Já foram punidos alguns, outros estão sendo processados, e mais outros precisam ser investigados. Não é passando a mão sobre a cabeça dos poucos - felizmente, muito poucos - que se desviam da conduta, que vamos combater este mal.”

Cidadania - “Enquanto estiver na ativa, vou continuar exigindo a transparência necessária. Depois de me aposentar, vou cobrar como cidadão que sou.”

Vocação - “A magistratura não é uma profissão como as demais. Antes de tudo, é um sacerdócio. Quem não tem vocação para ser juiz não deve exercer essa profissão.”

Improbidade - “No Tribunal de Justiça do RS, há contratações irregulares, sem licitação. As mesmas que, se realizadas por agentes políticos municipais, são objeto de ações civis públicas por improbidade. Ainda que não se duvide da nobreza do propósito, porque realizadas no Judiciário, não estão imunes à observância do princípio da legalidade. Além disso, quando realizadas desta forma, estimulam que outros órgãos públicos sigam o exemplo.

Corporativismo - “Há poucos dias, o Conselho da Magistratura liberou da jurisdição, sem previsão legal, o vice-presidente administrativo da Ajuris”.

Leia a íntegra da entrevista em www.espacovital.com.br.

ESPAÇO VITAL - (21.12.12)

Previsão: "a justiça se transformará em mais um serviço público falido"


Jonathan Heckler/Jornal do Comércio



Autor da ação que questionou as eleições de dezembro do ano passado no TJRS, o desembargador Arno Werlang - depois do resultado (5 x 3) que na quarta-feira da semana passada (12) lhe foi desfavorável no STF - afasta as especulações de que, aborrecido, fosse se aposentar. "Quando reivindiquei o cargo de corregedor-geral da Justiça, que por lei me é assegurado, minha expectativa foi a de que pudesse ajudar dentro da instituição a corrigir erros muito graves; agora, como desembargador e como cidadão vou continuar em busca dos objetivos" - disse ele ao Espaço Vital.

Na terça-feira (18), pela manhã - num intervalo da sua apertada agenda de revisão dos mais de 900 processos que estavam pautados para a última sessão do ano da 2ª Câmara Cível, no dia 19 - Werlang concedeu objetiva entrevista.

Espaço Vital - Depois de um ano de demora, o STF, por maioria, decidiu de forma contrária ao seu pensamento. O que o senhor conclui disso?

Arno Werlang - Num julgamento em colegiado, em especial quando integrado por mais de três membros, é possível que não prevaleça a solução majoritária. Quando são três juízes, divergindo o revisor do voto do relator, o vogal - como terceiro membro -, opta por uma das duas posições: ou acompanha o relator, ou o revisor. Num colegiado de mais de três membros basta surgir uma terceira posição para que as soluções se diversifiquem, somando-se as que divergem do relator. Foi o que aconteceu na espécie. Somaram-se os votos daqueles que entenderam não ter havido violação ao princípio da antiguidade; foi o caso dos ministros Teori e Rosa Weber. Por sua vez, a ministra Cármen Lúcia entendeu não ser caso de reclamação. E também houve os que defenderam não mais viger o princípio da antiguidade, caso dos ministros Marco Aurélio e Lewandowski. Assim, as três posições divergentes, todas minoritárias, somadas derrotaram a que era majoritária, formada pelos ministros Fux, Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa que reconheceram a minha tese.

EV - O jornal ZH, no domingo, publicou rápidos e instigantes desabafos seus. No primeiro deles, o senhor diz que ´pretende ajudar a corrigir erros muito graves dentro da instituição´. A referência é ao TJRS especificamente ou à Justiça brasileira como instituição?

Werlang - Refiro-me ao TJRS. Vivemos dias difíceis. A corrupção hoje em dia está infiltrada em todos os poderes e instituições. Até bem pouco tempo, era inaceitável crítica ao Judiciário gaúcho. Infelizmente os tempos mudaram. Já foram punidos alguns, outros estão sendo processados, e mais outros precisam ser investigados. Não é passando a mão sobre a cabeça dos poucos - felizmente, muito poucos - que se desviam da conduta, que vamos combater este mal. Também não é encobrindo essa realidade que ajudaremos o Rio Grande do Sul a que tenha o melhor Judiciário do país.

EV - O senhor já anunciou que ´vai prosseguir na luta´. O que fará proximamente?

Werlang - Enquanto estiver na ativa, vou continuar exigindo a transparência necessária. Depois de me aposentar, em fevereiro de 2014, alcançado pela compulsória, vou cobrar como cidadão.

EV - De que maneira a opção pelo corporativismo - no TJRS, e no STF também - interferiu no insucesso de seu pleito?

Werlang – Nem sempre os fins justificam os meios. Após a concessão da liminar pelo ministro relator, o que vimos neste episódio, em termos de interferência da corporação, foi algo lamentável. A atuação da Ajuris, associada a outras entidades de classe, foi intensa na defesa de interesses dos que a comandam no momento. Contratação de advogados, encomenda de pareceres de juristas, caravanas de dirigentes e juízes convidados aos gabinetes dos ministros do Supremo.

EV - O senhor sustenta que "a observância do princípio da antiguidade diminui a politização das instituições"...

Werlang - O sistema de eleições que não obedece ao que preceitua a Loman conduz à formação de chapas em que a disputa tende a se politizar. Os candidatos, quase sempre em sua maioria ex-presidentes das associações, estão comprometidos com reivindicações da classe. Além disso, junto com a eleição dos membros diretivos, são eleitos os 12 desembargadores que comporão, com os mais antigos, o órgão máximo do Poder Judiciário. Estes candidatos vitoriosos, na maioria, também vêm patrocinados pela entidade de classe. Forma-se, assim, maioria folgada no Órgão Especial, obtendo-se aprovação tranquila de tudo quanto emana da administração.

EV - Se o senhor tivesse sido empossado como corregedor, quais seriam as características e a rotina de sua gestão?

Werlang - Pelo passado que tenho dentro das administrações de que participei teria muita contribuição a dar. Fundamentalmente, retornaria a projetos que foram abandonados. A magistratura não é uma profissão como as demais. Antes de tudo é um sacerdócio. Quem não tem vocação para ser juiz, não deve exercer essa profissão.

EV - O senhor anunciou que, via Tweeter e por meio de um saite, vai lutar contra a ´deterioração´ da Justiça.

Werlang - Os novos meios de comunicação são instrumentos poderosos para influir na modificação de costumes. Apenas pretendo me associar a eles, sem esquecer a literatura, a qual exerço há bastante tempo e também é poderosa para mostrar os erros. Serafim Machado se estivesse vivo, seria laureado com sua monografia.

EV - Não tendo conseguido as alterações pela via legal, o senhor acredita que isso será possível por meio da ampla divulgação na Internet e nas redes sociais? Ou espera uma mudança legislativa?

Werlang - Antes de mudar a legislação, deve haver uma mudança de consciência do próprio Judiciário. Se continuar como está, em pouco tempo, a justiça se transformará em mais um serviço público falido, assim como a saúde, a segurança e a educação. O Judiciário servirá para as pequenas causas, tal qual o SUS, e o ensino público. Aliás, as grandes questões já não são mais decididas pelo Judiciário. Opta-se por arbitragens ou outras formas de solução de conflitos.

EV - O senhor também tem falado na necessidade de serem exigidas prestações de contas dos que dirigem a Justiça. Isso pode ser interpretado como um alerta de que existem gastos que estão mal contados?

Werlang - Existem gastos mal realizados. Há contratações irregulares, sem licitação. As mesmas que, se realizadas por agentes políticos municipais, são objeto de ações civis públicas por improbidade. Ainda que não se duvide da nobreza do propósito, não estão imunes à observância do princípio da legalidade. Além disso, quando realizadas desta forma pelo Judiciário, estimulam a que outros órgãos públicos façam o mesmo, como o fez o Ministério Público gaúcho, conforme noticiado recentemente pela jornalista Rosane de Oliveira. Denunciei estas contratações irregulares perante o Órgão Especial do TJRS e foram objeto de representação ao Conselho Nacional de Justiça. Não estou revelando nenhuma novidade.

EV - Outra de suas críticas é a de que o corporativismo transformou a Justiça estadual do RS em uma "longa manus" da Ajuris. De que forma ocorre isto?

Werlang - Basta ver a composição dos órgãos diretivos e analisar os pleitos da Associação dos Juízes do RS. Há poucos dias o Conselho da Magistratura liberou da jurisdição, sem qualquer previsão legal, o vice-presidente administrativo da Ajuris. Coincidência ou não, foi ele quem se encarregou de divulgar, diretamente do Supremo, o resultado do julgamento da reclamação, assumindo publicamente a bandeira do que chama de democratização da justiça.

EV - Em sessões do Conselho Seccional da OAB-RS já foi dito que, às vezes, é mais fácil encontrar determinados juízes na sede da Ajuris do que nas varas em que estão classificados. Seria efeito do corporativismo?

Werlang – Não me refiro a falta de dedicação ao trabalho. Os juízes, na quase totalidade, trabalham, e muito. Refiro-me à nocividade da interferência do sindicato - visto como associação - na Justiça como instituição. Os interesses são diferentes e cada um deve trabalhar pelo seu aperfeiçoamento. O que a OAB deveria fazer, isso sim, é se insurgir quanto a uma nova advocacia que vem sendo implantada nos tribunais. Refiro-me a certos lobistas que usam do seu prestígio para influir nas decisões. Na posse, esta semana, do novo corregedor-geral de justiça, houve expresso agradecimento a um ministro ex-presidente do STJ, pelo entusiasmo com que desempenhou o seu mandato neste episódio “parecendo um estagiário” - para usar uma expressão que foi dita ao microfone.



FONTE: http://www.espacovital.com.br/noticia-29023-previsao-justica-se-transformara-em-mais-servico-publico-falido

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

TCE FARÁ NOVA INSPEÇÃO SOBRE AUXÍLIO-MORADIA

ANTONIO PAZ/JC















JORNAL DO COMERCIO 20/12/2012

Julgamento foi interrompido mais uma vez por pedido de vista


Alexandre Leboutte

Na última sessão antes do recesso, pleno não avançou na análise do benefício pago aos juízes

Há mais de um ano discutindo a legalidade do pagamento de auxílio-moradia a juízes e desembargadores gaúchos, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) voltou a analisar o tema ontem - na última sessão antes do recesso de fim de ano. O relator da matéria, conselheiro Marco Peixoto, manteve a linha de argumentação sustentada nos votos que proferiu anteriormente e votou contra a suspensão do benefício, chamado de Parcela Autônoma de Equivalência (PAE). No entanto, Peixoto pediu que, ao final do processo, seja feita nova inspeção para avaliar “a regularidade do pagamento da PAE”. A recomendação, que deverá ser seguida pela presidência da Corte, pode ser interpretada como um pedido para a revisão da correção monetária aplicada no cálculo do montante a ser pago pelo Tesouro do Estado.

O impacto nas contas do Tesouro, que tinha previsão inicial de R$ 600 milhões, poderá chegar a R$ 2 bilhões, de acordo com Estilac Xavier, caso o pagamento seja mantido, porque o MP e, inclusive, o TCE poderão solicitar tratamento isonômico. A origem da despesa se refere à equiparação que a magistratura obteve, em 1998, ao auxílio-moradia autoconcedido pelos deputados federais em 1994. A retroatividade leva em conta o período em que os magistrados não receberam o benefício, entre 1994 e 1998. O benefício vem sendo pago aos magistrados desde dezembro de 2010, por determinação de ato administrativo do Tribunal de Justiça.

Em virtude de a Fazenda Pública não possuir recursos suficientes para o pagamento integral da PAE, o desembolso vem sendo feito em parcelas mensais de até R$ 15 mil. Ao final do pagamento, o valor médio que será recebido por cada desembargador ativo e inativo será de R$ 821.722,78. Os juízes ativos e inativos receberão montante individual que varia de R$ 732.539,34 a R$ 563.973,92.

Uma inspeção feita pelo TCE apurou que o valor bruto reivindicado representa apenas 14,7% da dívida atual - o valor médio individual devido aos desembargadores, por exemplo, era de R$ 115.589,83. A diferença é formada por correção monetária e juros de mora solicitados pela categoria.

Os dois recursos - que agora têm o mérito sendo julgado, de forma conjunta - foram impetrados pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e pelo Ministério Público (MP) de Contas contra decisão unânime proferida pela Corte, em agosto de 2011, a favor da manutenção das parcelas retroativas. MP e PGE contestam a validade do ato administrativo, argumentando que a despesa só poderia ser autorizada por lei, e que, além disso, o direito à remuneração estaria prescrito desde fevereiro de 2005.

Na sessão de ontem, tanto o procurador do Estado Eduardo Cunha da Costa quanto o procurador-geral do MP de Contas, Geraldo Da Camino, reafirmaram o pedido para a suspensão do pagamento. Ambos solicitaram que, caso a Corte decida pela manutenção da PAE, deveria haver uma revisão dos cálculos, que estariam superdimensionados.

O julgamento, no entanto, foi interrompido, mais uma vez, por um pedido de vista do conselheiro Estilac Xavier, logo após o voto do relator. Estilac - que completou um ano de Corte ontem - vem marcando posição no processo como o único conselheiro a votar sistematicamente a favor dos recursos impetrados pela PGE e pelo MP.

TSE FECHA ANO SEM JULGAR 10% DAS AÇÕES

ZERO HORA 20 de dezembro de 2012 | N° 17289

RESCALDO DAS URNAS - FICOU PARA 2013


TSE fecha ano sem julgar 10% das ações

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fez ontem sua última sessão em 2012 sem concluir o julgamento de todos os processos das eleições municipais de outubro. Dos 7.781 processos que chegaram à Corte envolvendo registros de candidatura, 780 não foram analisados, cerca de 10% do total.

A Corte funcionará em regime de plantão a partir de amanhã até o dia 6 de janeiro, com a presença da presidente Cármen Lúcia. Ela não deverá julgar processos monocraticamente no período.


MP ajuizou 713 ações relacionadas às eleições

ADRIANA IRION

O Ministério Público Eleitoral concluiu balanço parcial das ações ajuizadas nas eleições de 2012. No total, foram 713 representações, sendo que 501 se referem à propaganda irregular.

Das 212 restantes, 125 podem ter como consequência a cassação do diploma dos eleitos. O balanço, que foi apresentado ontem pelo gabinete de assessoramento eleitoral à cúpula do MP, é parcial porque nem todos os 173 promotores eleitorais atualizaram a informação sobre as medidas. Além disso, há situações em que os promotores têm prazo para ingressar com ações até 7 de janeiro, devido ao recesso forense eleitoral.

As ações que podem resultar em perda de mandato são por conduta vedada durante a campanha, como uso da máquina pública, por investigação judicial eleitoral, como a ajuizada na semana passada contra o vereador eleito de Porto Alegre Cássio Trogildo (PTB), por captação ilegal de sufrágio e por uso de caixa 2.

Transferências de eleitores e corrupção na pauta

Há ainda 31 representações penais, que apuram fatos como transferência irregular de eleitores e corrupção eleitoral. Também há 21 casos de cancelamento de inscrição eleitoral, 13 por pesquisa irregular, e outras 25 ações cautelares.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O caos já chegou até na justiça eleitoral, considerada a área mais ágil e eficiente do judiciário.  De férias sem a preocupação com as consequências desta morosidade em julgar estes casos.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

PRODUTIVIDADE DOS JUÍZES DE SP CAI

Revista Consultor Jurídico, 18 de dezembro de 2012

MOVIMENTO PROCESSUAL. Produtividade de juízes paulistas cai 5% em novembro

Por Pedro Canário


Em novembro foram proferidas 295 mil sentenças pela Justiça de São Paulo, queda de 5% em relação às 311 mil dadas por juízes paulistas em setembro. No dia 30 de novembro, a primeira instância do Judiciário paulista registrou 19,5 milhões de processos em acervo, segundo dados divulgados  nesta terça-feira (18/12) pela Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo. Em setembro, o acervo foi de 19,4 milhões de ações.

Os números foram publicados nesta terça no Diário de Justiça de São Paulo. Das sentenças prolatadas em novembro, 138 mil foram cíveis e 19,6 mil criminais. Em setembro, último balanço publicado pela Corregedoria, foram 149 mil sentenças cíveis e 22,5 criminais, o que mostra que as atividades se mantém estáveis mês a mês.

As demais sentenças de novembro, não computadas entre as civis e penais, se dividem entre Infância (11 mil), Execução Fiscal (51,6 mil), Juizados Especiais Cíveis (60 mil) e Juizados Especiais Criminais (15 mil).

Fora dos tribunais
O mês também registrou 12,5 mil acordos no Juizados Especiais Cíveis, dos quais 4 mil foram acordos extrajudiciais comunicados ao juízo, 5,7 mil acordos feitos por conciliadores e 2,5 mil fechados em audiências. Os Juizados Especiais Criminais apreciaram 1,9 mil denúncias: 1,8 mil recebidas e 101 rejeitadas.

Os Juizados Informais de Conciliação (JIC) continuam mostrando que a maior eficiência para acordos está fora das salas de audiência. Em novembro, foram computados 667 acordos nos JICs, dos quais 491 foram conseguidos por conciliadores, 148 foram extrajudiciais comunicados ao juízo e apenas 28 foram conseguidos por juízes durante audiências. Os JICs também receberam mil reclamações.

Execuções fiscais
As execuções fiscais homologadas pelos juízes de São Paulo merecem capítulo especial. É dos entraves mais dramáticos do primeiro grau paulista. Em novembro, foram 51,6 mil sentenças de execução fiscal, contra 10,9 milhões de processos sobre o tema em acervo.

Os juízes trabalham, mas o volume chega a ser sobre-humano. Em julho, a Corregedoria informou existirem 10,8 milhões de execuções fiscais pendentes na primeira instância. Em agosto, já haviam entrado mais de 20 mil novas execuções no primeiro grau, mas proferidas 58 mil sentenças em execuções fiscais.

Em agosto, o acervo de execuções fiscais estava em 10,83 milhões (pouco mais de 10 mil a mais que no mês anterior), mas foram proferidas 52,8 mil sentenças. O resultado é que, em novembro, mais de 50% do acervo total de processos da primeira instância era de execuções fiscais, mas menos de 20% das sentenças tratavam do assunto.

Pedro Canário é repórter da revista Consultor Jurídico.

SENADO APROVA AUMENTO PARA MINISTROS DO STF


JORNAL DO COMERCIO 18/12/2012 - 22h03min

Agência Estado


Em votações que não durou sequer dez minutos, o plenário do Senado aprovou na noite desta terça-feira dois projetos de lei que concedem reajustes salariais aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e ao procurador-geral da República. As propostas, que vão seguir para sanção da presidente Dilma Rousseff, preveem um aumento escalonado dos subsídios de 15,7% nos próximos três anos, chegando a R$ 30.935,36 mensais no início de 2015. Atualmente, essas autoridades recebem R$ 26.723 por mês.

Pela Constituição, os salários dos ministros do Supremo são os mais altos do Poder Público e é o teto a que cada servidor pode receber mensalmente. Pelo texto, o aumento vale a partir de 1º de janeiro de 2013 e, se sancionado, provocará um efeito cascata tanto no Poder Judiciário como no Ministério Público, uma vez que os salários de juízes e procuradores são vinculados aos dos ministros do STF.

A elevação do teto do funcionalismo público pode abrir margem para que os próprios congressistas aumentem os respectivos contracheques. No final da legislatura passada, em 2010, deputados e senadores aprovaram um decreto legislativo em que autoconcederam um aumento, equiparando os salários aos recebidos atualmente pelos ministros do Supremo.

Não houve discussão dos projetos e as matérias foram aprovadas de forma simbólica, quando os senadores não votam individualmente. O líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), relator do projeto que aumenta os vencimentos do chefe do Ministério Público Federal, afirmou em plenário que o subsídio da categoria está "sabidamente defasado". Os dois projetos haviam sido aprovados duas semanas atrás pela Câmara dos Deputados.

No início do próximo mês, a remuneração dos 11 integrantes do STF da corte e do chefe do Ministério Público Federal passaria para R$ 28.059,28 por mês. No início de 2014, por sua vez, seria de R$ 29.462,25 mensais e no ano seguinte quase R$ 31 mil por mês.

Na sessão da noite desta terça-feira (18), o Senado aprovou numa só tacada um pacote de 11 projetos que aumenta salários e institui gratificações para servidores públicos. Foram contemplados na votação servidores do Executivo federal, do Congresso Nacional, do poder Judiciário e do Ministério Público da União. Os aumentos, conforme acordado com o governo Dilma Rousseff, ficaram na média em 5% ao ano pelos próximos três anos.

Entre as matérias apreciadas a toque de caixa, os senadores decidiram criar uma gratificação de desempenho para os servidores da Casa. O benefício estará vinculado ao desempenho que os funcionários públicos terão nos respectivos cargos.

O DIREITO DE ERRAR POR ÚLTIMO

ZERO HORA 19 de dezembro de 2012 | N° 17288

EDITORIAIS


Decisão judicial deve ser cumprida, a não ser que seja revogada. É o caso dos três deputados federais que tiveram seus mandatos cassados pelo Supremo Tribunal Federal na última segunda-feira, na sessão de encerramento do mensalão. Tão logo ocorra o chamado trânsito em julgado da sentença, figura jurídica que significa a impossibilidade de recursos, perderão seus mandatos os parlamentares João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar da Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) – todos condenados por crimes como corrupção e lavagem de dinheiro. Merecem, portanto, perder a representatividade parlamentar que os eleitores lhes conferiram. Mas não há dúvida de que o Supremo está interferindo indevidamente em outro poder ao decidir pela cassação automática dos condenados, pois a Constituição Federal diz claramente que esta prerrogativa é da Câmara dos Deputados – ainda que possa existir um aparente conflito na interpretação do artigo 55 da Carta.

Ao desempatar a polêmica votação, o ministro Celso de Mello lembrou que a Suprema Corte detém o monopólio da última palavra – o que é verdade –, mas complementou sua assertiva com uma citação questionável de Rui Barbosa, registrada em 1914, quando o jurista baiano afirmou que cabe ao STF “errar por último”. Não é o que se esperava da mais alta corte de Justiça do país, na conclusão do julgamento histórico do mensalão. O tribunal ganhou a admiração dos brasileiros pela independência, pela firmeza e pelos acertos em suas decisões, demonstrados durante todo o processo do mensalão, em que foram julgados 38 suspeitos de envolvimento num esquema de compra de votos no Congresso, dos quais 25 foram condenados, incluindo-se aí personagens ilustres da política nacional.

Faltava, apenas, decidir se cabia ao próprio Supremo cassar os mandatos dos parlamentares condenados ou se essa era uma atribuição da Câmara Federal, como recomenda expressamente a Constituição. Quatro ministros reconheceram a prerrogativa parlamentar, mas cinco outros votaram pela perda imediata dos mandatos, sob o pretexto de que o ato da Câmara, em caso de condenação criminal, é meramente declaratório. A decisão tem potencial para abrir uma crise institucional entre os poderes Legislativo e Judiciário, mas seu cumprimento ainda depende do julgamento de embargos a serem interpostos pelos advogados dos réus.

Mesmo diante do temor de que a Câmara ceda ao corporativismo, o Supremo não pode ignorar a Constituição que lhe compete proteger. “Errar por último” não é, decididamente, o que os brasileiros esperam de um tribunal que acaba de dar lições de moralidade e decência ao país. Numa democracia, o que se espera é que o Judiciário acerte nas suas decisões, que o Legislativo cumpra as suas atribuições de legislar e que os poderes se mantenham independentes e harmônicos entre si, como define o regulamento maior da nação.

UM FALSO IMPASSE

ZERO HORA 19 de dezembro de 2012 | N° 17288. ARTIGOS


Aderbal Torres de Amorim, Professor de Direito Constitucional


Repetidamente e substituindo-se ao legislador, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade das cotas raciais e das uniões homoafetivas, regulou a ocupação de terras indígenas, autorizou pesquisas com células-tronco, entendeu legal o aborto de feto anencefálico e proibiu a importação de pneus usados. Conquanto matérias da exclusiva competência do Congresso Nacional, este silenciou. Esse protagonismo judicial baseou-se na denominada mutação constitucional, ou seja, a mudança da aplicação do texto maior, ainda que nenhum de seus dispositivos haja sido alterado. Assim, o mesmo dispositivo que antes impunha a existência de lei, agora dispensava a intervenção legislativa. Nessa mesma esteira, aplicando a Constituição como seu supremo intérprete, o STF vem de decretar a perda dos mandatos dos deputados condenados no processo do denominado mensalão.

A reação corporativista já se fizera antecipada. Sustentando o “perigo” de grave “impasse institucional” entre Judiciário e parlamento, a ameaça de descumprimento da decisão veio carregada de interesses político-partidários e suportada pela ignorância ou pela soberba. Como diria Churchill, “o estadista olha para a próxima geração; o político, para a próxima eleição”.

Sem olhar para a Constituição como um todo, “intérpretes” comprometidos com posicionamentos políticos pinçam dispositivos isolados da Carta para sustentarem seus propósitos. Notadamente, quando estão por trás interesses partidários, alguns deles inconfessáveis. No caso presente, quando muito, haveria um imaginoso conflito de normas constitucionais, alguma antinomia entre regras. Todavia, solucioná-lo soberanamente não é tarefa do parlamento. Com primazia absoluta, ao Supremo Tribunal Federal pertence dizer o que é a Constituição. É o clássico adágio “a Constituição é o que o Supremo Tribunal Federal diz que a Constituição é”. E se o STF decretou a perda dos direitos políticos e dos mandatos de parlamentares por condenação criminal transitada em julgado, não cabe à Casa respectiva deliberar sobre a decisão, menos ainda em votação secreta. Toca à Mesa, unicamente, declará-la; nada decide sobre ela. É o que diz nossa Carta Magna e se seu guarda maior assim a interpretou e decidiu, fê-lo para cumprir o Direito posto do qual ele é o supremo intérprete.

Em assim sendo, as ameaças de desobediência que se ouvem por aí, algumas delas irresponsavelmente emitidas por altas autoridades da nação, não fizeram vencedores os votos minoritários de alguns juízes da Corte Suprema, a despeito de que nem todos estes estejam livres da suspeição. Seja como for, a perda dificilmente ocorrerá antes de 2014. E nesse ano extinguem-se os mandatos dos deputados condenados...

UMA DECISÃO DEMOCRÁTICA

ZERO HORA 19 de dezembro de 2012 | N° 17288 ARTIGOS

Pio Giovani Dresch *


Após quase um ano, e já passada metade de uma gestão, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que os 95 votos recebidos pelo desembargador Orlando Heemann Júnior na eleição para a Corregedoria-Geral de Justiça devem ser respeitados.

Nenhuma surpresa houve na decisão, porque idêntico entendimento havia sido adotado pelo Supremo no julgamento da reclamação referente às eleições anteriores do Tribunal de Justiça, e foi isso que sempre sustentou o otimismo quanto à final validação da decisão soberana dos desembargadores.

Há motivos para comemorar. Em primeiro lugar, afasta-se a pecha de rebeldia tantas vezes atribuída ao Judiciário gaúcho, até mesmo por comentadores tão afoitos quanto desinformados. Nesse ponto, é de se lembrar que, no seu voto, dois ministros que conhecem bem o nosso tribunal, Rosa Maria Weber e Teori Albino Zavascki, atestaram que a sistemática da eleição aqui realizada é exatamente a mesma dos seus tribunais de origem, o TRT e o TRF da 4ª Região.

Não se há de esquecer que, com poucos dias de diferença, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia eleito presidente Ivan Sartori, 137º na lista de antiguidade, embora seu concorrente ocupasse o quarto lugar na antiguidade. Nenhuma queixa adveio dessa eleição, e o Judiciário paulista prosseguiu naturalmente suas atividades, ao contrário do que aqui aconteceu: uma eleição impugnada porque quem venceu por 95 a 28 ocupava o 50º lugar na antiguidade.

Contudo, o mais significativo na decisão do STF é a interpretação que faz do texto do art. 102 da Lei Orgânica da Magistratura, diploma legal que vem da ditadura militar, e do qual alguns querem concluir a compulsoriedade de as direções dos tribunais serem compostas dos desembargadores mais antigos, ainda que não obtenham a adesão de seus pares.

Dizer-se que não se faz política nos tribunais é o mesmo que pretender manter insepulto o entulho de um tempo que passou e não deixa saudade. Evidentemente, a política que ali se faz não é a política partidária e nem tampouco a política de colecionar apoios para a indicação a um tribunal planaltino, mas a política de um poder democrático, constituído num Estado democrático, em que deve haver a escolha de um modo de gestão, o que implica optar por propostas e, em decorrência, votar em candidatos.

O Judiciário não é o de 30 anos atrás, quando sua direção pouco mais significava que um cargo de representação, ocupado para comparecer a solenidades oficiais. Hoje o país é outro e o Judiciário é outro: não se pode conceber um Brasil democrático com um Judiciário submetido a uma ritualística adjudicação de cargos, para a qual o atributo único é ser antigo.

É isso que o Supremo decidiu, e a decisão merece ser saudada.


*PRESIDENTE DA AJURIS

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

A ÉTICA DA DELAÇÃO PREMIADA

ZERO HORA 18 de dezembro de 2012 | N° 17287. ARTIGOS


José Carlos Teixeira Giorgis*



“Judas logo se aproximou de Jesus, dizendo: ‘Salve Rabi’. E beijou-o. Jesus lhe disse: ‘Amigo, para que vieste?’ Então, os outros avançaram, lançando as mãos sobre Jesus e o prenderam” (MT, 26, 49-50). Eis o paradigma da perfídia, como a de Calabar.

A delação pertence ao jargão criminal, consistindo na revelação em que o indiciado, suspeito ou acusado incrimina outrem; e se diz “premiada” porque a lei recompensa o agente com benefícios, como o abrandamento do regime, redução da pena, escusa judicial e outras.

As Ordenações Filipinas perdoavam os malfeitores no crime de lesa-majestade quando “dessem outros à prisão”; depois, o instituto desapareceu por séculos, ressuscitando em regras dos crimes hediondos e na extorsão mediante sequestro; na lei contra o crime organizado e na de lavagem de dinheiro; na proteção das testemunhas e vítimas; na lei de tóxicos.

Essa forma de denúncia contra terceiro é abonada pelos tribunais como uma prova relativa que exige concordância de outros elementos do processo; há quem sustente que ela não se contenha nos limites do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas se admita ainda na revisão criminal como nova circunstância que autorize a diminuição da pena.

Alguns ressaltam sua importância como um “mal necessário” que o Estado usa na busca da verdade e na ânsia de dirimir os conflitos para obter paz social; embora, diga-se, a delação não se apoia na vontade de colaborar com a justiça ou em relevante valor moral, mas, ao contrário, no desamparo que a pessoa sente ao se achar abandonada pelos comparsas; também na aflição, desgosto ou ira do infrator quando verifica sua solidão.

Outros veem na delação premiada a incapacidade do Estado e sua ineficiência na apuração dos ilícitos penais, sossegando-se no incentivo à infidelidade; uma apatia em avançar nas investigações, acomodando-se em solução simplista; um descanso que desacelera a pesquisa e freia o impulso inquisitorial, propiciando, muitas vezes, um lamentável espetáculo midiático em que se valoriza o escândalo e a inconfidência.

Uma expressiva parcela de juristas, contudo, aponta a ausência ética no conteúdo desta felonia.

A ética, para Vásquez, é a ciência do comportamento moral dos homens em sociedade; é a disciplina dos costumes que se alicerça em valores; é uma regra de conduta.

O direito tem substrato ético que se ancora no respeito entre as pessoas e objetiva limitar a ação pessoal em face do exercício da atividade alheia.

No âmbito penal o delito é a vulneração dos valores morais da sociedade e o repúdio à infração não pode desbordar dessa equivalência.

A dignidade do Estado – e da Justiça – não permite comportamento desajustado; ou seja, o Estado deve ser essencialmente ético, descabe-lhe reagir com a arma que abomina.

A delação premiada é um “beijo de Judas”, é a apoteose legal da traição.


*DESEMBARGADOR APOSENTADO

AO ENCERRAR MENSALÃO, UM CONFLITO COM O CONGRESSO


ZERO HORA 18 de dezembro de 2012 | N° 17287


ENCERRAMENTO DO MENSALÃO. Fim de julgamento, abertura de conflito. Ao concluir caso, STF decide cassar deputados, mas Câmara contesta


O julgamento do mensalão não poderia terminar sem um último mal-estar entre ministros e uma nova queda de braço. O conflito agora é com a Câmara, que não aceita a derradeira decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na análise do caso que se arrastou por sete anos.

A Corte determinou ontem, por cinco votos a quatro, a perda de mandato dos três parlamentares condenados por participar do esquema de compra de votos durante o governo Lula: João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).

As cassações, porém, vão demorar. Embora tenha encerrado o julgamento, o STF ainda terá de analisar os recursos que serão encaminhados pela defesa dos 25 condenados. Esta fase se prolongará por 2013, e os deputados só terão de entregar os cargos após sua conclusão. Ainda assim, a medida colocou o STF em choque com o Legislativo, que entende ser seu o poder de decidir sobre o tema.

Decano da Corte, Celso de Mello deu o voto que desempatou a definição sobre os mandatos. Ele entendeu que a condenação criminal a uma pena superior a quatro anos de prisão implica na suspensão de direitos políticos e que, nesta hipótese, cabe à Câmara apenas declarar a perda do mandato.

– Não se pode vislumbrar o exercício de mandato parlamentar por aqueles cujos direitos políticos estão suspensos.

O resultado deixou mais uma vez vencido o revisor do processo, Ricardo Lewandowski. O ministro sustentou que a decisão final seria da Câmara porque a Constituição assim determina em casos de condenação criminal transitada em julgado. A questão, porém, poderá ser suscitada pela defesa dos réus em embargos. Neste caso, Teori Zavascki, empossado durante o julgamento, e o substituto de Ayres Britto, que se aposentou, poderão votar e alterar o resultado proclamado ontem.

Curiosamente, Lewandowski não foi protagonista do último bate-boca do julgamento. Ontem, foi a vez de Marco Aurélio Mello discutir com Joaquim Barbosa, relator do mensalão e presidente da Corte. O embate aconteceu porque Barbosa quis agradecer publicamente profissionais que o ajudaram no processo e Marco Aurélio o criticou.

– Peço licença para não ter de ouvir isso – disse Marco Aurélio, abandonando o plenário.

O presidente encerrou a sessão como se nada tivesse acontecido.



“Uma proeza extraordinária” - Joaquim Barbosa protagonizou os maiores embates

ADRIANO BARCELOS

Quem viu este, provavelmente não verá outro igual. A considerar pela visível estafa dos ministros e declarações do presidente e relator, Joaquim Barbosa, jamais o Supremo se embretará em outro julgamento com tantos réus (38), tantas testemunhas (mais de 600) e tantas páginas (mais de 50 mil).

A sucessão alucinante de fatos embaralha a memória: do distante 2 de agosto, o da sessão inaugural, pouco restou de igual na Justiça e na política do país. No começo, foram os às vezes enfadonhos, às vezes engraçados discursos de advogados e do Ministério Público. Roberto Gurgel, sisudo, foi duro com os réus e acusou um esquema “atrevido e escandaloso” de corrupção. O advogado Paulo Sérgio Abreu e Silva, que defendia a ré Geiza Dias, surpreendeu e atacou a cliente: “funcionária mequetrefe”, disse. Deu certo: a funcionária de Marcos Valério escapou ilesa pela mão pesada dos ministros. Alguns riram da semelhança de Gurgel com o apresentador Jô Soares. Outros, falaram de novela.

Foram mais de quatro meses de tensão. E de duelos. Ricardo Lewandowski x Joaquim Barbosa. Marco Aurélio Mello x Joaquim Barbosa. O relator esteve em quase todas as disputas. Disse que Lewandowski “barateava” o crime de corrupção. De Marco Aurélio, ouviu pedidos para que “policiasse” sua linguagem.

Nos bastidores do plenário, um personagem dos autos emergia da sombra. Ao passo em que sua defesa caía e as condenações sobrevinham, Marcos Valério procurou a Procuradoria-Geral da República. Envolveu Lula. É o pós-fim do julgamento, o que ainda virá. Por ora, caiu José Dirceu. Caiu Delúbio Soares. Foi condenado até o delator, Roberto Jefferson. Coube a ele a frase mais contundente contra Valério e sua suposta boa vontade com as investigações: “Delação premiada é coisa de canalha”.

Barbosa não quer mais. “Condenar não é fácil”, disse ontem. E concluiu:

– Que tenhamos conseguido terminar esta ação já é uma proeza extraordinária.


Maia aponta “ingerência” na Câmara


Sob o argumento de que a cassação de parlamentares é uma prerrogativa da Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), declarou ontem que deve recorrer da decisão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão.

– Houve uma ingerência sobre um poder que tem, garantido pela Constituição, o direito de decidir as cassações de mandato dos seus parlamentares. Não estamos discutindo com o STF as penas imputadas aos envolvidos. O que estamos tratando são as prerrogativas específicas dos poderes – ressaltou Maia.

O petista se ampara no artigo 55 da Constituição Federal, que dá ao parlamento a palavra final nos casos de cassação. Ontem, o ministro Celso de Mello, que desempatou a votação na Corte, disse ser inaceitável que um deputado com direitos políticos suspensos por condenação criminal continue exercendo mandato.

– A perda do mandato é consequência direta e imediata da suspensão de direitos políticos por condenação criminal transitada em julgado. Nesses casos, a Câmara dos Deputados procederá meramente declarando o fato conhecido já reconhecido e integrado ao tipo penal condenatório – disse o ministro.

Petista afirma que não houve “ameaça”

Maia informou que já entrou em contato com a Advocacia-Geral da União (AGU) e com o setor jurídico da Câmara solicitando uma análise técnica da situação. Para o petista, a decisão do Supremo foi “precária”, uma vez que a Corte se dividiu na hora de votar. O placar foi de cinco votos contra quatro.

– Pedi que avaliasse o seguinte: se houve tentativa de usurpar algum tipo de prerrogativa da Câmara no processo da ação penal 470 – disse o deputado.

Maia não quis comentar as declarações de Mello, que, durante o seu voto, criticou a possibilidade aventada por Maia de a Câmara não cumprir a decisão do STF.

O magistrado classificou a hipótese como “intolerável, inaceitável e incompreensível” e advertiu que o responsável pelo eventual descumprimento estaria sujeito a punições nas esferas penal e civil, podendo levar à condenação por prevaricação e improbidade administrativa.

– Comete crime de prevaricação o agente que, em ofício, deixa de praticar, retarda ou frustra execução de ordem judicial – disse o ministro.

Maia evitou a polêmica:

– Ele falou num clima de emoção. Talvez pelo momento que está vivendo, talvez pela sua doença, pelo julgamento tão tenso que ele está realizando. Não acho que nenhum ministro do STF teria a pretensão de ameaçar um presidente da Câmara.

Maia explicou que só depois de esgotadas todas as possibilidades de recursos em 2013, quando não será mais presidente da Câmara, a Casa decidirá se cumpre imediatamente a ordem judicial ou se parte para o confronto com o STF.


Passo a passo

O QUE FOI DECIDIDO ONTEM
 - Os 25 condenados perderam os direitos políticos. Ou seja, não podem concorrer a cargos públicos. A decisão foi unânime.
- Os três deputados condenados perderão o mandato assim que terminar a possibilidade de recursos. Houve divisão na Corte: cinco votos a quatro.
- A cassação é automática e não precisará passar por deliberação da Câmara. Os atuais mandatos se encerram no começo de 2015.
- Não foi fixada indenização para que os condenados promovam ressarcimento aos cofres públicos. A Corte deixou a cobrança para o Executivo, por meio de ação judicial.
- A multa imposta ao advogado Rogério Tolentino foi reajustada de R$ 312 mil para R$ 494 mil.
- O procurador-geral Roberto Gurgel retirou o pedido de prisão imediata dos condenados. Disse que vai refazer a proposta.

O QUE FALTA DEFINIR
- A Procuradoria-Geral pedirá a execução imediata das penas. Se o pedido chegar até amanhã, deverá ser levado ao plenário. Se chegar durante o recesso (de quinta-feira até 1º de fevereiro), poderá ser decidido por Joaquim Barbosa.
- É preciso publicar o acórdão, que resume o julgamento. Há expectativa de que isso ocorra em até 60 dias. Como o recesso não conta no prazo, o acórdão deve sair só em abril.
- Depois da publicação do acórdão, os advogados dos réus poderão recorrer das condenações, e a Corte terá de decidir sobre os pedidos. Embargos infringentes serão usados nos casos em que não houve unanimidade na decisão.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O SUCESSO DO STF, OS PROBLEMAS DO STF

FOLHA.COM 16/12/2012 - 06h39. Tendências/Debates:


JOAQUIM FALCÃO


A confiança do cidadão no Supremo Tribunal Federal vinha crescendo, desde a decisão a favor do Conselho Nacional de Justiça contra desembargadores que queriam calar a ministra Eliana Calmon.

Tal confianças cresceu ainda mais com o mensalão, como pesquisas da FGV-SP e do Ipespe já demonstram. Surgem algumas questões: essa confiança se manterá? Beneficiará o Judiciário como um todo?

O cerne do sucesso foi o encontro da agenda do Supremo com a pauta do povo. Feliz encontro. Na ficha limpa, na união homoafetiva, no aborto anencéfalo e tantos outros. Juntou-se a força jurídica do Supremo com a força política da ética.

O que parecia um risco, as disputas e descortesias entre ministros, descaminhos na televisão ao vivo, não o foi tanto.

O maior perigo para a imagem do Supremo não é a TV Justiça. São as intrigas, insinuações, antecipações, em on e off, encontros moralmente indevidos, a sugerir bastidores judiciais antirepublicanos.

O Supremo não parece querer enfrentar o problema da ânsia midiática de alguns ministros nem criar um código de conduta da vida pública para seus ministros.

Mas essa ânsia se expande a tribunais e outros profissionais jurídicos: Ministério Público, Polícia Federal e inclusive o CNJ. Isso fere o devido processo legal. O ativismo a temer não é jurídico. É midiático. Traz insegurança jurídica. Gasta a legitimidade institucional.

O Supremo deverá também enfrentar uma múltipla insegurança operacional. Dados preliminares elaborados pelos pesquisadores Ivar Hartmann e Daniel Chada mostram que os ministros fizeram mais de 3.500 pedidos de vista desde 1988. Existe processo que ficou parado 7.311 dias. De 1988 a 2011, o pedido de vista em geral atrasa 377 dias o processo. Sem falar em cerca de 2.500 processos já decididos aguardando o acordão ser publicado. Justiça parada.

Insegurança operacional também na prática da repercussão geral, saudada como solução, mas que tem sido bomba de retardamento.

Ao reconhecer a repercussão geral de um caso, o Supremo suspende, paralisa, milhares de outros. Criam tribunais-dique. As partes não se beneficiam. Falha modernização.

No congresso dos magistrados de Santa Catarina, chegou-se à estimativa de que mais de 600 mil casos estão represados, aguardando o Supremo. O ministro Joaquim Barbosa terá de enfrentar e solucionar a repercussão geral protelatória.

Daqui para frente, tudo vai depender de como a liderança de Joaquim Barbosa vai gerir o enorme capital de legitimidade que o Supremo conseguiu com o Mensalão. O que não é pouco. Vamos acompanhar.

JOAQUIM FALCÃO, 69, mestre em direito por Harvard e doutor em educação pela Universidade de Genebra, é professor e diretor da Escola de Direito da FGV-RJ