MAZELAS DA JUSTIÇA

Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.

terça-feira, 30 de setembro de 2014

AUXÍLIO-MORADIA COMEÇA A SER PAGO AOS JUÍZES EM OUTUBRO



ZERO HORA 30 de setembro de 2014 | N° 17938


REFORÇO NO CONTRACHEQUE



Os magistrados do Rio Grande do Sul começarão a receber na folha do mês de outubro o pagamento de auxílio-moradia no valor de R$ 4,3 mil. Ontem, a direção do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RS) anunciou que o benefício será proporcionalmente retroativo ao dia 18 de setembro, data em que foi publicada decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux que concedeu o auxílio aos juízes.

Segundo estimativa de ZH, levando em conta que o TJ-RS tem 1.156 magistrados (entre ativos e inativos), o impacto financeiro, neste ano, será de cerca de R$ 15 milhões aos cofres públicos. Em 2015, pode chegar a R$ 60 milhões. Ministério Público, Defensoria Pública e Tribunal de Contas do Estado também podem determinar o pagamento de auxílio-moradia nos próximos dias para promotores e procuradores.

Na análise do caso, o ministro Fux considerou que o pagamento é garantido pela Lei Orgânica da Magistratura, editada em 1979. Conforme a legislação, além dos salários, os juízes podem receber vantagens, como ajuda de custo para moradia nas cidades onde não há residência oficial à disposição. Para pagar o auxílio-moradia, o Tribunal de Justiça terá de readequar verbas do orçamento deste ano.

Hoje, o conselho da magistratura do TJ julgaria outro pedido de benefício da Associação dos Juízes do Estado (Ajuris), o auxílio-alimentação. No entanto, o processo foi retirado ontem da pauta e, segundo a assessoria de imprensa do tribunal, não tem previsão para ser apreciado. Uma ação idêntica já havia sido rejeitada pelo conselho no ano passado, mas a Ajuris decidiu insistir.

domingo, 28 de setembro de 2014

PARA PRESIDENTE DO TSE NÃO EXISTE CAIXA 2 NO BRASIL E O SUPREMO FAZ O PODER MODERADOR

ZH 27/09/2014 | 18h01

"Essa história de caixa dois não existe no Brasil", diz o presidente do TSE. Dias Toffoli argumenta que no Brasil "o caixa 1 contempla tudo, porque você não tem limite de gastos"



por Carolina Bahia e Guilherme Mazui



Indicado por Lula em 2009, Dias Toffoli, que foi advogado do PT em campanhas presidenciais, tomou posse no Supremo aos 41 anos Foto: Roberto Jayme / TSE,Divulgação


O homem que comanda a disputa nas urnas de 2014 é categórico ao negar a existência de caixa 2 nas campanhas políticas no Brasil. Para o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro José Antonio Dias Toffoli, trata-se de um "não assunto". Sem limitação estabelecida de gastos para as campanhas, a contabilidade oficial de candidatos e partidos comporta todas as despesas, afirma o ministro.

Aos 46 anos, Toffoli conhece as entranhas da política. Natural de Marília (SP), formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), foi assessor jurídico da liderança do PT na Câmara, advogado do partido em campanhas presidenciais, subordinado de José Dirceu na Casa Civil e Advogado-Geral da União (AGU) no governo Lula.

A relação com a sigla e o ex-presidente valeu a indicação feita por Lula para o Supremo Tribunal Federal (STF). Toffoli tomou posse em 2009, aos 41 anos. Ignorou a pressão para se declarar impedido e julgou o processo do mensalão, no qual o ex-chefe José Dirceu era réu. Em maio passado, ao assumir o TSE, garantiu desprendimento do passado:

– É página virada.

Pelo menos três candidatos a governador renunciaram ao serem barrados pela Lei da Ficha Limpa. A lei está cumprindo sua função? Torna a eleição mais limpa?
Mais importante do que a Lei da Ficha Limpa foi a fixação de um prazo anterior às eleições para as renúncias. Fui designado relator pela ministra Cármen Lúcia para fazer as instruções das eleições de 2014, quando estabeleci um prazo de renúncia. Em 2012, os prefeitos renunciavam na véspera da eleição e eram substituídos pelo filho ou pela mulher. Não havia tempo para que o substituto fosse submetido ao crivo do contraditório, do debate de ideias, da disputa política. Foi determinante estabelecer que, ao menos 20 dias antes da eleição, aquele que fosse candidato majoritário não poderia renunciar. É uma conjugação: a Lei da Ficha Limpa junto com essa determinação. Sem ela, talvez uma candidatura como a do Arruda (José Roberto, no Distrito Federal) fosse até a véspera da eleição.

Contudo, substituir o candidato por parentes ainda é um hábito.
A questão do parentesco é muito mais profunda. Em uma federação como o Brasil, teríamos de entrar em estudos de sociologia, antropologia e cultura política para ver que o parentesco é uma das formas de formação da elite no país.

É preciso mudar a lei, proibir mulher ou filho de substituir um candidato que renuncia na véspera da eleição?
É uma das questões que precisamos romper. Temos a súmula vinculante número 13 no Supremo Tribunal Federal, que impede as nomeações de parentes em cargos públicos, o que é um grande avanço civilizatório em uma cultura de formação de elites pelo parentesco e pela política de famílias.

O Supremo Tribunal Federal deve decidir sobre o financiamento de campanha público ou privado?
Quando provocado, é. Todos que foram eleitos receberam dinheiro de empresas na campanha. O julgamento das doações de empresas já foi um início maduro de discussão. Na França, o limite de doação de pessoa física é de 4,6 mil euros (cerca de R$ 14,2 mil), nos EUA, de US$ 2,6 mil (R$ 6,2 mil). No Brasil, o cidadão pode doar até 10% da sua renda conforme o imposto de renda. Aqui, você não tem uma igualdade como há em outros países. Uma pessoa que teve uma renda de R$ 100 milhões, e existem no Brasil pessoas com essa renda, pode doar R$ 10 milhões. Já quem recebe um salário mínimo (R$ 724) doa pouco.

O senhor é a favor do financiamento público?
Exclusivo, não. O cidadão tem o direito de contribuir para sua campanha como contribui para sua igreja, seu clube. Agora, tem de haver limite para ter igualdade, para que os que têm muito dinheiro não extrapolem sua influência nas eleições. Limite de doação e limite de gastos são importantes.

O limite de gastos é um tema que não anda no Congresso.
Nos EUA, uma candidatura à Presidência teria direito a receber de financiamento público, mais ou menos, cerca de US$ 95 milhões (em torno de R$ 228 milhões). Ainda é menos do que as principais candidaturas declaram no Brasil. Na França, o limite do primeiro turno é de 15 milhões de euros (R$ 46 milhões) e, no segundo turno, de 20 milhões de euros (R$ 61,4 milhões).

E o caixa 2, ministro? A fiscalização e a Justiça Eleitoral conseguem barrar essa prática nas campanhas?
Temos condições de coibir o caixa 2, o problema é que no Brasil o caixa 1 contempla tudo, porque você não tem limite de gastos. No Brasil, você não precisa de caixa 2. O partido chega e fala que vai gastar R$ 400 milhões na campanha para presidente da República. Alguém precisa de caixa 2 no Brasil?

Então, por que os partidos e candidatos fazem caixa 2?
Na campanha para presidente da República, acho que não fazem. Falo com sinceridade, não fazem. Caixa 2 só se justifica quando há limite de gastos, e aí você quer escamotear o limite. Essa história de caixa 2 não existe no Brasil.

Mas e o recurso não declarado, que aparece em investigações e escândalos?
Alguém consegue gastar mais de R$ 400 milhões em uma campanha presidencial? O caixa 1 contempla tudo no Brasil. Nós temos de parar de agir com essas metáforas e mitos, e enfrentar a realidade. Nas campanhas, não há que se falar em caixa 2, porque no Brasil não há limite de gastos. Se tivesse, poderia se falar em caixa 2. A gente fica discutindo um não assunto.

Mas não é o caixa 2 que financia a corrupção?
É outra coisa. Se você tem a possibilidade de pessoa jurídica financiar campanha, você pode dizer que se cria um compromisso entre o financiador e o financiado. Nos EUA, em 1907, isso foi proibido. Em 1947, com o surgimento do sindicalismo, então se introduziu a proibição dos sindicatos contribuírem para as campanhas. Esse debate não é exclusivo do Brasil.

As empresas deveriam doar para as campanhas?
Uma coisa é falar de caixa 2, que acho que não tem nas disputas eleitorais, pois é o próprio candidato que define o seu limite de gastos. As doações são outra discussão. Pessoa jurídica vota? Se pessoa jurídica não vota, por que ela contribui? A questão não é falar em financiamento de candidatura ou de partido. Quem financia a democracia? No Brasil, é o grande capital. Isso é bom para democracia brasileira? Não. No mundo ocidental, tem se mostrado uma corrupção da vontade popular.


Mensalão: Toffoli ignorou a pressão para se declarar impedido de julgar e absolveu Dirceu, que acabou condenado.

O Supremo julgou exaustivamente o mensalão. Durante o julgamento, a defesa argumentava que era um esquema de recursos não contabilizados. Não foi caso de caixa 2?
A tática do caixa 2 na defesa do mensalão se mostrou absolutamente equivocada. Aquilo não era questão de campanha eleitoral, por isso que o Supremo condenou. Não foi julgado na Justiça Eleitoral.

O que o julgamento representou para o país? Foi um golpe na impunidade, mudou algo no Brasil?
A história vai dizer se mudou ou não o país.

A reeleição entrou no debate da campanha presidencial. O senhor é a favor ou contra?
No Brasil, se formos olhar da Proclamação da República até hoje, não se passou maior período de estabilidade democrática senão a partir da Constituição de 1988. Se olharmos a história do Brasil, todo presidente eleito é submetido a um teste de derrubada. Não digo que quem está no poder deva ser reeleito, mas a instituição da reeleição trouxe uma estabilidade em um país sem uma elite nacional, formado por uma confederação de elites regionais.

Então, a reeleição torna o Brasil mais estável para governar?
Para aquele que está no poder ter o mínimo de estabilidade, ele deve ter o direito de tentar a reeleição. O Brasil errou ao criar a República sem a reeleição. A Constituição de 1946 não conseguiu dar estabilidade com mandato de cinco anos. Depois, a redemocratização sem reeleição levou ao impeachment do primeiro presidente eleito pelo voto popular (Fernando Collor de Mello, em 1992), o que não é pouca coisa. No primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, diziam "fora FHC", e ele se reelegeu (em 1998). Lula quase caiu com o mensalão. Se não houvesse a possibilidade de reeleição, Lula teria caído. Voltar ao mandato de cinco anos é voltar à Constituição de 1946, que foi testada e não deu certo.

O senhor diz que não existe uma elite nacional no Brasil. Por quê?
Todo mundo que está no Brasil está de passagem, quem está em Brasília está de passagem. Alguns ficam, como o Sarney (José Sarney, senador e ex-presidente da República), que está há 60 anos no poder, ganhou de Dom Pedro II em tempo no poder. Mas é caso isolado, não se pode dizer que no Brasil exista alguém que represente politicamente uma estabilidade nacional. O país é muito difícil de governar.

Como as elites se organizaram no país?
A partir da Revolução de 1930, o Brasil deixou de ser uma elite de proprietários de terras e passou a ser um país que tentou e tenta ser cada vez mais moderno e civilizado. No período colonial e no Império, o Brasil teve uma unidade nacional entre as várias províncias baseada, do ponto de vista econômico, na escravatura. Os historiadores nunca disseram, ou, quando disseram, foi de forma envergonhada, que a escravatura negra foi uma das razões para o Brasil ter se mantido unido como nação, ao contrário da América espanhola.

A escravidão ajudou a manter o país unido?
No Brasil, o regime da escravatura foi um regime econômico que fez as elites locais permanecerem unidas junto a um modelo de império com um governante que fosse um imperador. Esse modelo veio à ruína depois da abolição da escravatura, e o Brasil quase se desmilinguiu com a República.


Perto do poder: depois de atuar nas campanhas presidenciais do PT, foi advogado-geral da União no governo Lula

Voltando à reeleição, ela está inserida no debate da reforma política. Alguns candidatos dizem que é a reforma das reformas. O senhor acredita nisso? Que reforma deve ser feita?
Os partidos políticos surgiram no século 19. No Brasil, os partidos são o único meio de acesso ao poder, e são os partidos que dizem em quem nós podemos votar. Vivemos em uma democracia ou em uma partidocracia? Os partidos políticos representam a sociedade ou não? Penso que as manifestações de junho de 2013 indicaram uma insatisfação da sociedade com os meios tradicionais de representação, ou seja, numa época em que os partidos se configuravam entre direita e esquerda, naquela clássica divisão marxista de lutas de classe, isso está superado.

Os partidos precisam se reciclar?
No mundo, você tem pessoas que, ao mesmo tempo, são contrárias ao aborto, mas a favor do divórcio, ou pessoas favoráveis ao livre mercado, mas contrárias à liberação das drogas e do jogo ou do casamento gay. Quem representa as nossas ideias? Os partidos perderam completamente aquele veículo de ser a representação da sociedade.

E qual seria o caminho?
Não podemos olhar o retrovisor. Temos de olhar o futuro, essa nova maneira de se comunicar, as relações de uma sociedade online. Temos de pensar em outra democracia. Se quisermos encaixar essa nova sociedade nas caixinhas dos conceitos sociológicos anteriores, vamos estancar os meios de possibilidade de a sociedade extrapolar os seus desejos, e isso gera revolução.

O Brasil tem 32 partidos políticos. É um número adequado para o país?
De maneira alguma, pois não existem 30 ideologias. Os partidos políticos são mandados por suas cúpulas. Temos de rediscutir isso. A sociedade brasileira dizia que, na época do governo militar, você não poderia eleger diretamente, então fomos à praça pública, Diretas Já, queremos eleger nosso presidente. Quem escolhe quem é candidato à Presidência? Dizia-se antigamente que eram os militares. E hoje, quem escolhe?

Os partidos políticos nos oferecem candidatos.
Vocês que estão dizendo (risos). Quem escolheu a Dilma candidata em 2010? Foi o Lula. Quem escolheu Aécio, Serra ou Alckmin? Meia dúzia do PSDB. Quem escolheu Eduardo Campos? Ele próprio.

Qual a melhor forma de escolher um candidato?
Não estou aqui para dar respostas, estou aqui para realmente chocar e dizer o seguinte: temos de reformular a nossa democracia para o futuro. Não é de hoje que os agrupamentos no Congresso são muito menos por partidos e muito mais por segmento de interesse. Bancada ruralista, bancada evangélica, bancada católica, bancada de trabalhadores, bancada de banqueiro, da OAB, dos médicos etc. Isso já existia e cada vez vai ser mais assim. Temos de repensar: a sociedade quer ser representada de forma segmentada?

Mas qual seria o fórum para essa discussão? O Congresso?
Toda a sociedade. O Congresso é uma representação parcial da sociedade. Temos de encontrar uma nova forma de pensar a sociedade. Não se trata de uma Constituinte. Aliás, sou contra uma nova Constituinte. Sou a favor de um debate nacional, talvez com uma maior prática de referendos e plebiscitos, porque em uma sociedade online isso vai naturalmente ser demandado, senão o povo vai sair às ruas. Os partidos têm de se adaptar a isso, ou eles vão ser superados por outros movimentos.

As agendas mais progressistas no país têm encontrado espaço e palavra final no STF. Já o Congresso critica o Supremo por uma suposta vontade de querer legislar. A crítica está correta?
O Judiciário é um poder eunuco, é um poder sem desejo. O Judiciário não age de ofício, ele só age provocado. Então, como falar que o Judiciário tem ativismo? Aos poucos, desde 1988 o Judiciário no Brasil assume o papel do Judiciário em uma real democracia como foi nos EUA, o de ser o poder moderador. No Brasil imperial, o poder moderador era o imperador, a nobreza fazia o papel de ser a unidade da nação, a defensora da unidade das elites locais e de árbitra dos conflitos. Com o fim da escravidão, veio a República, e o Brasil só não se desmilinguiu porque havia os militares. Até 1964, os militares tomaram conta desse poder. Quando havia crise, eles vinham, intervinham e saíam. Qual foi o grande erro? Em 1964, eles tomaram gosto e optaram por ficar, em vez de fazer a intervenção cirúrgica e sair. O Brasil e eles pagam um preço enorme.

Hoje, o poder moderador é realizado, de fato, pelo Judiciário?
A redemocratização trouxe de volta aquilo que estava previsto para 1889: quem faz o poder moderador de uma sociedade é uma Suprema Corte. Então, quando você fala de ativismo judiciário hoje, você fala daquilo que há 200 anos nos EUA é aceito pela sociedade. Nós moderamos os conflitos entre as unidades da federação, entre os poderes, tratamos das questões culturais. Quem diz se pode ou não pode abortar nos EUA não é o parlamento, é a Suprema Corte, assim como nós dissemos aqui. São questões que a sociedade brasileira nunca vai resolver.

Discussões como o aborto passam longe de um acordo no Congresso.
Os candidatos têm eleitores nos dois lados da discussão, é um empate que não se resolve. Quem tem de decidir e destravar é o Judiciário. Isso não é ativismo, é um desbloqueio de empates de disputas que há na sociedade.

O senhor foi advogado do PT, trabalhou com José Dirceu e depois foi advogado-geral da União no governo Lula, que o indicou para o Supremo. Em algum momento, pensou em se declarar impedido de julgar o mensalão?
Tive histórico no PT com muito orgulho, consta no meu currículo. De jeito nenhum me senti pressionado. Quando você assume o posto de ministro do Supremo, tem toda a independência para julgar.

Pessoalmente, o senhor ficou tranquilo após sua participação no julgamento?
Tranquilo. Um juiz não pode ter desejo. Se o juiz quer ter desejo, ele tem de deixar a magistratura e fazer política. O juiz julga de acordo com a Constituição e as leis. Pessoalmente, gostaria muito que no Brasil não tivesse o direito de greve para o servidor público, mas está na Constituição. Acho um absurdo que o meu servidor no TSE faça uma greve e ainda venha reivindicar a remuneração, mas não posso ignorar o direito previsto na Constituição.


Posse no STF: em 2009, posando para fotos com Lula e o irmão, José Eduardo, portador de síndrome de Down.

O senhor tomou posse no STF aos 41 anos, jovem para um ministro. Pensa em se aposentar mais cedo ou pretende ficar na Corte até a aposentadoria compulsória, aos 70 anos?
De jeito nenhum. Não tenho medo de ser juiz. Gosto de ser juiz. Espero ir aos 110 anos (risos). Espero que o Congresso aprove emenda que transforme no Brasil a vitaliciedade humana e não limitada, assim como é nos EUA, que a pessoa vai até morrer.

O primeiro turno das eleições ocorre em 5 de outubro. Qual a expectativa do senhor?

São as eleições mais tranquilas que nós estamos vivendo, o Brasil mostra maturidade democrática. Temos condições de ter as melhores eleições.

Está sendo uma campanha que o senhor considera cara?
Acho que não. Do ponto de vista ostensivo, as eleições estão menos caras, não vejo tanta publicidade.

Nas eleições atuais, vencerá quem tem mais recursos ou quem apresentar as melhores propostas?
Hoje, se elege quem tem mais recursos. Quem tem mais recursos tem mais condições de aparecer.

sábado, 27 de setembro de 2014

CRISE DOS VALORES ÉTICOS NOS TRÊS PODERES

REVISTA ISTO É N° Edição: 2340 | 26.Set.14

Ética: um conceito cada vez mais divorciado da política
O vale-tudo eleitoral, as mentiras das campanhas, as candidaturas de políticos corruptos e os recentes escândalos nos Três Poderes expõem a crise dos valores éticos no País

Josie Jeronimo



As primeiras eleições presidenciais depois da ditadura militar, realizadas em 1989, ficaram marcadas pela acirrada disputa entre o “caçador de marajás” Fernando Collor de Mello e o petista Luiz Inácio Lula da Silva. Na reta final da campanha, quando as pesquisas apontavam empate técnico entre os dois concorrentes, Collor levou ao programa de TV o depoimento de Miriam Cordeiro. Ex-namorada de Lula, ela o acusava de ter proposto um aborto quando estava grávida de Lurian, filha do casal, na época com 15 anos.



A cartada foi decisiva para a vitória de Collor e o episódio entrou para a história brasileira como a primeira grande baixaria política da democracia que se instalava no País. O que poderia servir de exemplo sobre práticas a serem esquecidas e condenadas pela sociedade, porém, tornou-se regra das campanhas eleitorais. Nos 25 anos seguintes à refrega de 1989, a ética e a política seguiram caminhos distintos. Sucessivos escândalos de corrupção em quase três décadas de democracia revelaram aos brasileiros uma profunda crise nos valores que deveriam nortear o comportamento dos governantes. Apesar de avanços inegáveis, como a Lei da Ficha Limpa, hoje prevalece nas campanhas e no exercício do poder um vale-tudo que contamina candidatos e instituições. Os programas dos partidos apresentados no rádio e na TV expõem ataques pessoais, acusações infundadas, mentiras e distorções sobre as propostas dos adversários. Nesta semana que antecede o dia das eleições, o jogo bruto das campanhas tende a se intensificar. Nesse ambiente de abusos, resta aos eleitores redobrar a atenção na hora do voto, método mais eficiente na tentativa de resgatar os valores éticos tão imprescindíveis a uma sociedade desenvolvida em todos os aspectos.

A tática do jogo sujo ficou tão banalizada que nem mesmo as autoridades escondem seus maus costumes. Em março do ano passado, num lampejo de sinceridade, a presidenta Dilma Rousseff revelou em um discurso feito na Paraíba sua filosofia nas disputas pelo poder: “Podemos fazer o diabo quando é hora de eleição”. Pelo que se viu nas últimas semanas, Dilma e outros candidatos cumprem à risca esse ensinamento. A falta de filtros morais no jeito de fazer política se manifesta desde a negociação das coligações, acertadas na maioria das vezes em função de mais tempo nos programas de TV, até a formação dos governos, definida em função do rateio de cargos em todos os escalões. “A ética brasileira foi cunhada pelo absolutismo, que centraliza os poderes do Estado, mas que por não ser um governo totalmente legítimo precisou cativar os setores que poderiam se rebelar. Daí nasceu a troca de favores e a venda de cargos”, afirma o professor da Unicamp Roberto Romano, especialista em filosofia política e ética.



Estudo elaborado pela ONG alemã Transparência Internacional situa o País
na 72ª posição entre 177 nações analisadas sob o critério de percepção de corrupção

Esse sentimento de subversão generalizada dos preceitos republicanos tem reflexos deletérios para a imagem do Brasil no mundo. O último estudo elaborado pela ONG alemã Transparência Internacional situa o País na 72ª posição entre 177 nações analisadas sob o critério de percepção de corrupção. Pelas projeções feitas sobre os resultados de 2014, a tendência é piorar essa classificação. “Há criminosos candidatos que não foram enquadrados pela Lei da Ficha Limpa, e escândalos como o da Petrobras impactam os avaliadores. Fica a impressão de que no setor público até os contratos de faxina têm esquema de corrupção e que sem propina nem o cafezinho é servido”, afirma Léo Torresan, presidente da Amarribo, associação que representa a organização alemã em solo brasileiro.

Os exemplos da falta de honestidade apareceram com força logo depois da primeira eleição direta para a Presidência. Em 1992, o então presidente, Fernando Collor, foi submetido a um processo de impeachment após ser alvo de denúncias de corrupção. No governo Fernando Henrique Cardoso, para aprovar a emenda constitucional que permitiu a reeleição de ocupantes de cargos executivos, deputados foram acusados de vender seus votos. Em 2005, no mais rumoroso caso de corrupção da história recente, os brasileiros foram surpreendidos com o “mensalão”, nome pelo qual ficou conhecida a transferência de dinheiro ilegal do PT para partidos aliados. O então presidente Lula se defendeu com o argumento de que se tratava de “caixa 2” de campanha, o que configura crime eleitoral, mas é disseminado por quase todas as legendas. O STF, porém, entendeu que se tratava de compra de apoio parlamentar. Com isso, foram parar na cadeia alguns figurões do PT, como o ex-ministro José Dirceu, da Casa Civil, e o ex-presidente do partido José Genoino.



A lista de escândalos com dinheiro público, no entanto, não escolhe partidos. No ano passado, os brasileiros souberam pela ISTOÉ que, no Estado de São Paulo, durante as gestões tucanas de Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin foi montado um propinoduto em que autoridades, em troca de verbas para campanhas do PSDB paulista, usavam influência política para interferir na assinatura de contratos com as empresas Alstom e Siemens para a construção do metrô. Investigações identificaram pagamento de R$ 13,5 milhões só em propinas. No Distrito Federal, o então governador José Roberto Arruda teve a carreira interrompida depois de divulgadas imagens de um vídeo que o mostraram recebendo pacotes de dinheiro ilegal. O envolvimento no caso provocou a prisão de Arruda, por dois meses, na sede da Superintendência da PF em Brasília. Apesar da imoralidade das imagens, até três semanas atrás, Arruda liderava as pesquisas para governador. Ele só decidiu desistir da disputa depois que teve a candidatura impugnada pelo TSE com base na Lei da Ficha Limpa. Mais recentemente, irrompeu o escândalo da Petrobras. Em depoimento sob o regime de delação premiada, o ex-diretor da estatal, hoje preso, acusou parlamentares, governadores e ministros do governo Dilma de participação de um esquema de corrupção que sangrou os cofres da Petrobras em bilhões. O próprio delator admitiu ter recebido US$ 23 milhões de uma única empreiteira.

Os métodos condenáveis não são exclusividade do Executivo e Legislativo do País. Mancham também o Judiciário. Embora não seja crime, a prática de indicar parentes para cargos de destaque se tornou corriqueira nos tribunais. É o que faz atualmente o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF). Fux está empenhado em assegurar a nomeação de sua filha Marianna Fux para desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Ela disputa o posto com outros 38 cidadãos com credenciais para a função. A pressão do ministro do STF ganhou repercussão nacional nos últimos dias e fez com que a OAB mudasse o processo de escolha, com o objetivo de blindar-se de possíveis críticas de favorecimento à filha do ministro. Letícia Mello, filha de outro ministro do STF, Marco Aurélio de Mello, teve sucesso em empreitada semelhante. Em abril deste ano, ela tomou posse como desembargadora no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo). Marco Aurélio afirmou, à época, que não pediu votos aos desembargadores, mas reconheceu que telefonou para agradecer a atenção que os magistrados deram à filha quando ela os visitou nos gabinetes.

"Fica a impressão de que no setor público até os contratos de faxina têm
esquema de corrupção e que sem propina nem o cafezinho é servido",
afirma Léo Torresan, presidente da Amarribo



O presidente da Câmara, Henrique Alves, quer que o juiz Marlon Reis,
idealizador da Lei da Ficha Limpa, seja punido pela publicação de um
livro em que relata casos de parlamentares corruptos

Na atual campanha eleitoral, os exemplos de tentativas de ludibriar os eleitores surgem aos borbotões. Durante entrevista na semana passada ao telejornal “Bom Dia Brasil”, da TV Globo, a presidenta Dilma apresentou números econômicos irreais contestados de imediato pelos jornalistas. Ao forjar situações inexistentes, distorcer e falsear dados oficiais, os políticos conseguem piorar uma prática tornada pública, involuntariamente, em 1994, pelo então ministro da Fazenda, Rubens Ricupero. Na ocasião, enquanto aguardava o momento em que seria entrevistado pela TV Globo e, sem saber que o microfone estava aberto, Ricupero expôs o que nenhuma autoridade diz em público. “Eu não tenho escrúpulos. O que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”, disse o ministro. Captadas por aparelhos com antena parabólica, o ministro perdeu o cargo.

Apesar das evidentes rupturas com os princípios éticos, a realidade demonstra como é difícil mudar o comportamento dos poderosos. Em junho do ano passado, as ruas das principais cidades brasileiras foram tomadas por milhões de pessoas que protestavam por mudanças na política e nos governos. Agora, no entanto, observa-se a dificuldade em institucionalizar esse clamor. O mesmo aconteceu com a “Primavera Árabe”, nome pelo qual ficaram conhecidas as manifestações que sacudiram países do Oriente Médio e do norte da África a partir de dezembro de 2010. Passada a turbulência inicial, muita coisa continua como antes. No Egito, por exemplo, depois da derrubada do ditador Hosni Mubarak, a disputa pelo poder no país continua sendo travada pelos militares e pela Irmandade Muçulmana. Também no Brasil, a história demonstra que mesmo as grandes rupturas ocorridas em nome do combate à corrupção se revelaram inócuas. Em 1954, Getúlio Vargas cometeu suicídio quando seu governo era acusado pelos adversários de se ter transformado em um “mar de lama”. Dez anos depois, os militares deram um golpe e assumiram o poder com a bandeira da moralidade, mas foram escorraçados do poder em 1985 quando a censura não conseguia mais abafar o que ocorria nos porões do regime autoritário.

A poucos dias do primeiro turno das eleições, ainda há tempo para os brasileiros provocarem uma interferência efetiva na triste realidade. Somente o eleitor, na solidão da cabine de votação, pode afastar os maus políticos. Se dependêssemos apenas das autoridades, não haveria solução. O melhor exemplo disso talvez tenha sido dado pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves. Na semana passada, ele encaminhou ao Conselho Nacional de Justiça uma representação contra o juiz Marlon Reis, um dos principais responsáveis pela aprovação da Lei da Ficha Limpa. Alves quer que Reis seja punido pela publicação de um livro em que relata dezenas de casos de parlamentares envolvidos em corrupção. “Afirmei e reafirmo que há entre os deputados pessoas que alcançaram seus mandatos por vias ilícitas. Estes precisam ser detidos, o que demanda uma profunda mudança do vigente sistema eleitoral, corroído por uma mercantilização do conceito de política”, diz o juiz. O primeiro passo para isso pode ser dado pela sociedade no dia 5 de outubro.

Corruptos, tremei!

Com a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa, é do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba Sérgio Moro o título de algoz dos corruptos, atualmente. Moro é considerado o principal especialista brasileiro no crime de lavagem de dinheiro. À frente do Caso Banestado, criou método de trabalho que levou à condenação de 15 réus e o mapeamento da movimentação irregular de U$ 30 bilhões. Aos 41 anos, o magistrado tem um extenso currículo. Assessorou a ministra Rosa Weber durante o julgamento do mensalão, em 2012, e agora é o responsável pelo processo da Operação Lava Jato, escândalo que abala as estruturas do poder por envolver a Petrobras e parlamentares da base governista.


ALGOZ
O juiz Sérgio Moro é o responsável pelo
processo da Operação Lava Jato

O AUXÍLIO-MORADIA TEM FINALIDADE PÚBLICA?




ZH 27 de setembro de 2014 | N° 17935


AMAURI PERUSSO




Fundamentou a decisão na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (art. 65, inciso II), a Lei Complementar nº 35, de 1979, editada sob a ditadura militar. Veja-se que o texto diz “poderão ser outorgadas aos magistrados, nos termos da lei, ajuda de custo, para moradia”.

Em consulta formulada pelo CNJ, recebida e respondida no último dia 17 pelo ministro Fux, foi o tal direito estendido para todos os magistrados do Brasil.

Diante da decisão provisória, algumas questões precisam ser analisadas: Qual o caráter da despesa? Tem finalidade pública? Pode ser estendida para todos, de modo igual e indistintamente? Qual o alcance da natureza indenizatória da despesa?

Hoje, o parâmetro existente para concessão do benefício é a Instrução Normativa nº 09/12 do CNJ, na qual se constata que não podem ser beneficiados com a indenização: 1 – os aposentados; 2 – os que residam em imóveis funcionais ou tenham imóvel próprio; 3 – os que foram removidos por promoção; 4 – aqueles que tenham residido na comarca nos últimos 12 meses; além de um conjunto maior de restrições. Destaque: mesmo com alvoroço geral, não há como estender uma liminar do STF, baseado no CNJ, para conselheiros de Tribunais de Contas, ainda que ativos.

O pagamento do auxílio-moradia será objeto de julgamento pelo TCE, constando do relatório de auditoria do exercício de realização da despesa. Constatados casos em que não cabe a indenização, será determinada devolução dos valores. Situação reconhecida inclusive pelos juízes federais ao argumentarem na petição que “a medida pleiteada apresenta caráter reversível, uma vez que os valores eventualmente antecipados poderão ser restituídos mediante desconto em folha caso a ação venha a ser julgada improcedente”.

Nossos relatórios já questionaram o pagamento do auxílio- moradia escondido na PAE, na primeira auditoria de folha em 2010. O que tem de novo em relação àquele momento é a Lei de Acesso a Informações e a determinação dos conselheiros e ministros de TCs em dar publicidade ativa, na internet, para todos os relatórios de auditoria tão logo decorra o prazo de defesa.

Presidente da Federação Nacional de Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil (Fenastc)


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O auxílio-moradia tem sim "finalidade pública". Quando estava na ativa, em certas cidades, tinha grande dificuldades para alugar uma residência, principalmente onde a BM não tinha próprios funcionais. Era com o dinheiro do orçamento salarial que pagava este custo. Como comandante de uma histórica Unidade Operacional da BM que exercia seus deveres na garantia do direito da população à segurança pública, enfrentei este problema em Santana do Livramento, pelo alto custo do aluguel na época. Outros colegas e subordinados destacados para lá tiveram o mesmo problema.

O servidor não escolhe o lugar para servir; ele vai para onde mandam e necessitam de seus préstimos públicos. Ocorre em todos os Poderes, instituições, órgão e departamentos públicos. Seria muito bom que todos os servidores tivessem este auxílio. É fator de disparidade, discriminação, desarmonia, injustiça e desigualdade, contemplar apenas os altos cargos com melhor remuneração, e esquecer de outros, bem menos aquinhoados nos salários, sem residência própria no local de trabalho e com maiores dificuldades para custear aluguel com o seu combalido orçamento familiar.

JUDICIÁRIO RS: IGUALDADE DE TRATAMENTO



ZH 27 de setembro de 2014 | N° 17935


EUGÊNIO COUTO TERRA




A estrutura da carreira é nacional desde o advento da EC 45/2004, como já reconheceu o STF, intérprete último e com a palavra final em matéria constitucional. E, mais uma vez, em decisão proferida pelo ministro Luiz Fux no dia 25/09, na Ação Originária 1.946, foi reconhecido o direito de todos os magistrados do país receberem remuneração de forma igualitária. E o comando judicial é expresso nesta ação, garantindo aos juízes estaduais – RS incluído – os mesmos direitos dos demais ramos do Judiciário (federal, do trabalho e militar). Note-se. Não se trata de agregação de efeito oriundo de algo reconhecido aos juízes federais. É direito próprio da magistratura estadual.

O Judiciário do RS, além de ser, como é público e notório, uma Justiça inovadora e de vanguarda no cenário nacional, tem desempenho de ponta, como comprova o recente relatório Justiça em Números, do CNJ, que analisa as atividades judiciárias de 2013. Como exemplo desse desempenho, destaque-se que é a Justiça com a menor taxa de congestionamento entre os tribunais de grande porte do Brasil (62%); está no segundo lugar nacional no índice de produtividade, com 2.154 processos baixados por magistrado.

Em termos de economicidade, a Justiça rio-grandense é, disparado, a mais eficiente e austera entre os tribunais de grande porte (SP, RJ, MG, PR e RS). Comparando a despesa total da Justiça em relação à despesa pública de cada um desses Estados, ficamos no percentual de 4,9%. Atrás somente de São Paulo, que está em 4,2%. Mas não se pode esquecer que São Paulo é a maior economia do país, representando 31,4% do PIB do Brasil, enquanto nós somos a quarta maior economia, com 6,4% do Produto Interno Bruto, conforme dados divulgados pelo IBGE no final de 2013.

Os dados falam por si só. Garantir remuneração igualitária para a magistratura gaúcha não é só um direito. É uma questão de justiça!

Ter um Judiciário de qualidade exige igualdade.

Juiz de Direito, presidente da Ajuris


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - IGUALDADE só para um dos Poderes, o Judiciário, não é igualdade nem justiça; é corporativismo, injustiça e desarmonia. O Judiciário é um dos três poderes da República, independentes e harmônicos entre si. O Judiciário não é separado do Estado uno e indivisível. Seria igualdade e justiça se TODOS os membros de TODOS os poderes tivessem uma simetria salarial e as mesmas vantagens, e não só privilegiando aqueles para que militam na justiça.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

DIFÍCIL MORALIZAÇÃO



ZH 25 de setembro de 2014 | N° 17933


EDITORIAL



A batalha jurídica em torno da candidatura do deputado Paulo Maluf (PP-SP) é exemplar da dificuldade das instituições brasileiras para consolidar a moralidade na administração pública. Resultante de uma ação de iniciativa popular, a Lei da Ficha Limpa tem sido saudada como um avanço na regulação da política nacional, com potencial para eliminar da disputa os candidatos condenados por tribunais colegiados. É o que acaba de reconhecer o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao julgar recurso do ex-prefeito Paulo Maluf, condenado por improbidade administrativa devido ao superfaturamento de obras durante sua gestão na prefeitura da capital paulista. Ainda assim, indiferente ao resultado, o candidato segue em campanha, sob a alegação de que tem direito a recorrer.

É óbvio que, numa democracia, não pode existir espaço para o desrespeito a princípios do processo legal e da ampla defesa. A questão é que casos paradigmáticos como o do parlamentar paulista acabam colocando em xeque a eficácia de uma lei saudada como vacina contra fichas- sujas. A lei é clara ao garantir que pessoas condenadas em definitivo ou por órgãos colegiados e políticos cassados ou que tenham optado pela renúncia para evitar a cassação não podem concorrer. Se, mesmo assim, não há como barrá-los, o eleitor só pode se sentir inseguro em relação a suas escolhas.

Um agravante, sob o ponto de vista do eleitor, é que políticos, em muitos casos, contam com privilégios como foros privilegiados e costumam se valer constantemente de chicanas para postergar decisões judiciais desfavoráveis. No caso específico, as acusações dizem respeito a fatos ocorridos no longínquo período entre 1993 e 1996. Desde então, apesar das suspeitas, o parlamentar continuou livre para pedir voto e beneficiar-se de mandatos confirmados por votações expressivas.

Quando nem mesmo leis rígidas conseguem barrar políticos já condenados, perde o eleitor. A única saída é procurar se informar ao máximo, para não correr o risco de desperdiçar o voto.

BENEFÍCIO INJUSTIFICADO

 
ZH 25 de setembro de 2014 | N° 17933


EDITORIAL


A autonomia do Judiciário não pode servir de pretexto para um evidente privilégio, com potencial para comprometer ainda mais as já combalidas finanças do Estado.


Por qualquer ângulo que se examine, é injustificável a pretensão dos magistrados estaduais de incluir nos próprios subsídios o benefício de R$ 4,3 mil concedido pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, aos magistrados federais que não dispõem de residência oficial em suas áreas de atuação. A autonomia do Judiciário, uma garantia constitucional indispensável para o bom funcionamento da democracia, não pode servir de pretexto para um evidente privilégio, com potencial para se estender a outras categorias de servidores e, no caso do Rio Grande do Sul, comprometer ainda mais as já combalidas finanças do Estado.

Quando conquistaram o direito à remuneração por subsídios, em 2008, juízes, promotores e procuradores argumentaram que a nova forma de vencimentos, além de ser mais transparente, eliminaria de vez os chamados penduricalhos – denominação pejorativa para auxílios e benefícios extrassalariais. O artigo 39 da Constituição, em seu parágrafo 4º, veda o acúmulo de subsídio com verbas remuneratórias de outras espécies, caso do auxílio-moradia. Portanto, até mesmo a legalidade do benefício é questionável.

Mas o que mais fere o bom senso é a possibilidade de inclusão nos maiores salários de servidores públicos de um valor superior aos vencimentos pagos a várias categorias de servidores e à imensa maioria dos contribuintes, elevando ainda mais as disparidades já existentes. Como bem lembrou o deputado Raul Pont em pronunciamento na Assembleia Legislativa nesta semana, o auxílio-moradia se constitui em acinte para uma sociedade que sequer consegue pagar o piso nacional aos seus professores.

É inquestionável que os magistrados exercem uma atividade essencial para a sociedade e merecem remuneração condigna. Isso não está em discussão. O que se questiona é o subterfúgio utilizado para um reajuste inoportuno, danoso para o Estado e incompreensível para os cidadãos que sustentam a máquina administrativa com os impostos. Diante de tamanho absurdo, o mínimo que se espera das lideranças políticas e do próprio Judiciário é uma negociação ponderada sobre o assunto, antes que essa aberração se concretize e gere ainda mais descrença dos cidadãos nas instituições públicas.


quarta-feira, 24 de setembro de 2014

AUXÍLIO-MORADIA CUSTARÁ 110 MILHÕES POR ANO AOS COFRES PÚBLICOS DO RS

ZH Atualizada em 24/09/2014

Impacto ao contribuinte. Auxílio-moradia no Judiciário custará R$ 110 milhões por ano aos cofres públicos do Rio Grande do Sul. Benefício mensal de R$ 4,3 mil deverá ser pago a desembargadores, juízes, promotores e procuradores, carreiras com salário acima de R$ 19 mil

por Juliano Rodrigues



O aval para o auxílio-moradia veio do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal Foto: Carlos Humberto / Divulgação


Em meio à crise das finanças que corrói os cofres do governo estadual, juízes, desembargadores, promotores e procuradores que recebem subsídios entre R$ 19,3 mil e R$ 26,8 mil deverão ser contemplados com auxílio-moradia de R$ 4,3 mil mensais.

A conta passaria de R$ 110 milhões para os gaúchos no próximo ano. O valor seria suficiente para construir 22 mil casas populares e reduzir o déficit habitacional do Estado, de cerca de 180 mil moradias. O Tribunal de Justiça (TJ) e o Ministério Público (MP) já começaram a calcular o impacto no orçamento de 2015.

– O orçamento do tribunal para 2015 comporta acréscimos como expansão do quadro e crescimento vegetativo. Mas decisão judicial se cumpre – justifica o presidente do Conselho de Comunicação do TJ, desembargador Tulio Martins.

O aval para o auxílio-moradia veio do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF). Seria apenas para a magistratura federal. Consultado pelo Conselho Nacional de Justiça, Fux estendeu o benefício aos juízes estaduais.

Além do auxílio-moradia, que não entra no teto de R$ 29,4 mil, por ser considerado verba indenizatória, magistrados do STF e promotores querem mais. Eles aguardam decisão do Congresso que examinará pedido de reajuste encaminhado pelo STF. Os ministros pedem 22%. Se aprovado, o teto irá para R$ 35,9 mil e provocará efeito cascata nas carreiras jurídicas estaduais.

Também tramita, no Senado, proposta que prevê pagamento de gratificação por tempo de serviço a membros da magistratura e do MP da União e de Estados. A cada cinco anos, seria pago adicional de 5%. O benefício se estenderia a aposentados e pensionistas.

E tem mais: os membros do Ministério Público do RS lutam para receber o subsídio retroativo ao período entre janeiro de 2005 e fevereiro de 2009. Uma conta que pode passar de R$ 200 milhões.

Veja quanto ganhariam o auxílio-moradia no Estado e o custo do benefício pago pelos gaúchos

Juízes e desembargadores
Ativos: 747
Inativos: 409
Total: 1.159
Custo anual: R$ 59,6 milhões

Promotores e procuradores
Ativos: 699
Inativos: 257
Total: 956
Custo anual: R$ 49,3 milhões

Tribunal de Contas
Ativos: 8 (sete conselheiros e um procurador)
Inativos: 14 (13 conselheiros e um procurador)
Total: 22
Custo anual: R$ 1,1 milhões

Orçamentos para pagamento de pessoal em 2015***
Tribunal de Justiça: R$ 2,1 bilhões, elevação de 10,4% em relação a 2014
Ministério Público: R$ 771 milhões, aumento de 11,7% em relação a 2014
***Inclui magistrados e servidores ativos e inativos





COMENTÁRIO DO BENGOCHEA

JUSTIÇA CORPORATIVA NÃO É JUSTIÇA, MAS INJUSTIÇA TIRANA

DECISÃO JUDICIAL SE CUMPRE! - Aprendi isto na minha vida de policial da ativa. Mas colocado nesta matéria é uma afronta a todos os servidores públicos e ao cidadão contribuinte que é carente de justiça e de segurança pública. Se hoje vivemos um estado
de terror nas ruas é porque a justiça não cumpre o papel dela, e quando toma suas "decisões judiciais", estas são inoperantes, condescendentes, alternativas, superficiais, pontuais, lenientes, desprovidas de sistema e sem vontade para defender o cidadão, a população, os agentes prisionais e os policiais que todos os dias arriscam a vida enfrentando bandidos impunes e armas de guerra, carentes de "auxílios", de reconhecimento como função essencial à justiça, de amparo nas leis, de valorização de seus esforços e de segurança financeira.

QUALQUER ORDEM OU DECISÃO SE CUMPRE SE FOR LEGAL, MORAL, IGUALITÁRIA E JUSTIFICADA

Ocorre que esta "ordem judicial", apesar de "legal", é imoral por privilegiar servidores com supersalários, é discriminadora por criar animosidade entre poderes, e não
se justifica, pois ofende a sociedade, arromba os já combalidos cofres públicos, prejudica investimentos do Estado em direitos sociais, ataca os limites orçamentários do poder e reduz investimentos em juízes e servidores para o atendimento pleno e aproximado das demandas do povo por justiça e segurança. Por isto, surpreende a justificativa do presidente do Conselho de Comunicação do TJ - "O orçamento do tribunal para 2015 comporta acréscimos como expansão do quadro e crescimento vegetativo. Mas decisão judicial se cumpre."


MANEIRA DE CONTER A TIRANIA DO JUDICIÁRIO

É necessário elaborar uma nova e enxuta constituição que possibilite aprovação de leis específicas que promovam uma ampla e profunda reforma da justiça, obrigando o poder a respeitar a harmonia entre poderes, obs
ervar os limites da lei de responsabilidade fiscal, cumprir sua finalidade pública e exercer a função precípua da aplicação coativa das leis, se aproximando das ilicitudes e agilizando as demandas com um número necessário de varas, juízes togados e servidores da justiça para impedir a sobrecarga, a demora no transitado em julgado, a prescrição de crimes, a delegação de poderes, a fuga de obrigações inerentes ao poder e o descrédito nas leis e na justiça brasileira.



PILARES DA REPÚBLICA
Numa das reflexões me peguei questionando - qual é o maior problema brasileiro? Pensei ser um problema político com a gastança desenfreada, as farras, os supersalários e os inúmeros diretores, assessores e terceirizados, elaborando leis permissivas, desviando recursos, apadrinhando corruptos, desperdiçando a riqueza do país e saqueando os cofres públicos. Só que ao olhar para o lado, existe a justiça cuja razão de ser é a execução e aplicação coativa das leis, promotora da cidadania, guardiã da constituição e defensora das leis e dos direitos. Tudo o que ocorre de ilícito e imoral no poder político tem o devido aval da inoperância na justiça e a salvaguarda de compadrios corporativos.

POLÍTICOS SÉRIOS

POR ISTO, é importante que o povo vote em políticos sérios, probos e comprometidos em representar os direitos sociais e fundamentais do povo que só podem ser garantidos no Estado Democrático de Direito por um Sistema de Justiça integrado, ágil, harmônica, confiável, probo, democrático, imparcial, comprometido com a finalidade pública e exercendo a função precípua da aplicação coativa das leis.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

DO SUBSÍDIO AO TETO: A PEC 63/2011 E O PROTAGONISMO JUDICIAL REMUNERATÓRIO



Crítica Constitucional em 24 de maio de 2014

Douglas Zaidan
Doutorando em Direito/UnB, pesquisador visitante na Universidad Pompeu Fabra (Barcelona)

Flávia Santiago Lima
Doutora em Direito/UFPE



Romper com uma longa tradição de privilégios numa democracia não é tarefa fácil. Porém, em determinados contextos exige um esforço quase inalcançável fazer com que os do andar de “cima” sujeitem-se às regras, muitas delas criadas por eles mesmos.

No Brasil, a relação entre estatuto institucional, estrutura corporativa e as conveniências remuneratórias dos titulares de poder encontra no Poder Judiciário um excelente campo de investigação e crítica, ofuscado pelas constantes menções aos privilégios dos membros de outros poderes e seus servidores.

A magistratura brasileira é numerosa, culturalmente heterogênea e exerce sua atividade por todo o vasto território nacional, estando distribuída em conformidade com um complexo sistema de distribuição de competências – dos quais se destaca o critério federativo. Para reduzir ou minimizar as distinções, tem-se uma disciplina uniforme da organização da carreira, a LOMAN; a unidade do modo de recrutamento, o concurso público; e o estabelecimento de um controle externo administrativo e disciplinar centralizado, o CNJ.

As operações a que esse modelo tem se sujeitado, contudo, parecem não impedir a formação daquilo que Antonie Garapon chamou de um “novo elitismo liberto de qualquer controle democrático”[1], ao alertar para o risco de que o funcionamento aristocrático da justiça pode muito bem evoluir para a organização corporativa do poder em detrimento da cidadania, o que vem ao encontro de práticas arraigadas em nossa cultura bacharelesca.

Se aproximarmos esse viés sobre a relação entre orçamento público e o regime de remuneração dos magistrados brasileiros, fica evidente a dificuldade de revisão de práticas históricas e privilégios arraigados à luz dos controles democráticos sobre o gasto público. E, nesse sentido, enfraquece a discussão em torno do papel de garantia do Estado Democrático de Direito exercido pelo Judiciário, quando seus membros tentam, pelas mais diversas vias, afastar a aplicação do subsídio e do limite constitucional, transformando o discurso sobre o acesso à justiça dos mais pobres numa piada de péssimo gosto.

O exemplo mais recente sobre essa relação está na PEC n° 63/2013, apresentada pelo Senador Gim Argello (PTB/DF), que propõe o restabelecimento dos quinquênios (o acréscimo de 5% sobre o subsídio a cada cinco anos de serviço), a título de “parcela indenizatória de valorização”, como retribuição à permanência na função de magistrado ou membro do ministério público. Segundo dados levantados pelo jornal Estado de São Paulo, o impacto da PEC elevará a remuneração dos ministros do STF, que chegará a R$ 39.774,04 por mês (em valores atuais), a de desembargadores a R$ 35,9 mil a de juízes federais titulares a R$ 34,1 mil e dos substitutos a R$ 32,4 mil. Ou seja, todos passarão a ganhar acima do teto constitucional que hoje é de R$29,4 mil.

A partir de dados extraídos do relatório da Comissão Europeia sobre a Eficiência da Justiça/CEPEJ[2], com o objetivo de verificar se a remuneração dos magistrados e membros do ministério publico em atuação no mais alto escalão da justiça brasileira (que recebem o teto constitucional ou algo próximo a ele) está distante de seus colegas-equiparados de países europeus, destacamos os salários anuais em euros de cinco deles: França, Alemanha, Portugal, Espanha e Suécia:

País Juízes da Suprema Corte/Corte Constitucional ou Corte de Apelação em último grau Membro do Ministério Público junto à Suprema Corte/Corte Constitucional ou Corte de Apelação em último grau
França € 113.478 € 113.478
Alemanha € 73.679 € 73.679
Portugal € 85.820 € 85.820
Espanha € 111.932 € 111.932
Suécia € 91.600 € 69.318


Pois bem, contabilizadas as treze remunerações anuais (incluído o décimo terceiro salário, mas excluídas as férias), um ministro ou subprocurador da República que atualmente receba o teto constitucional, teria sua remuneração anual fixada em R$382.200,00 ou o equivalente a € 126.138,61. Um subsídio maior do que o pago nos cinco países comparados.

Porém, a situação torna-se mais absurdamente despropositada quando comparamos o valor que o subsídio poderia chegar se a PEC n° 63/2013 fosse aprovada. Nesse caso, juízes e procuradores que recebem o teto passariam a ganhar R$517.062,52 anuais, ou seja, €170.647,69. Um completo absurdo para um país que tem o PIB/per capita de U$12.340, valor muito inferior ao de todos os países comparados[3].

A PEC constitui, em verdade, a manifestação mais eloquente de uma série medidas adotadas pelos tribunais há alguns anos, cujas consequências jurídicas são semelhantes. Seu diferencial é a pretensão de alteração da própria norma constitucional para excepcionar uma determinada categoria das limitações atinentes aos demais membros de Poder e servidores em geral.

O emprego das expressões “indenização” e “auxílio” já é, contudo, uma tendência e se presta a majorar os subsídios dos juízes. A PEC surge, assim, após vários outros tribunais estabelecerem o pagamento de “indenizações”, muitas delas sob as lentes do Conselho Nacional de Justiça e do próprio Supremo Tribunal Federal.

É o caso, por exemplo, da decisão do CNJ que em 03/06/2013 suspendeu o pagamento retroativo de auxílio alimentação dos tribunais de justiça da Bahia, Pernambuco, Roraima, Sergipe, Espírito Santo, Maranhão, São Paulo e Pará. Porém, o mesmo Conselho, que acertadamente suspendeu a despesa com o retroativo, em 2011 editou a corporativa Resolução n. 133, já tratada aqui no blog, que autoriza o pagamento do auxílio alimentação. Dita resolução foi impugnada pela ADIn n. 4882/PE da OAB e está sob o pedido de vista do ministro Dias Toffoli, mas já conta com os lamentáveis votos pela improcedência dos ministros Teori Zavascki e Luiz Fux, após o voto pela declaração de inconstitucionalidade formal do relator, ministro Marco Aurélio.

Vantagens remuneratórias camufladas por indenizações também são vistas no auxílio transporte do TJMT, em que desembargadores com direito ao uso de veículos preferiam deixá-los na garagem do tribunal e receber 15% a mais em seus contracheques; no projeto de lei complementar do TJMG que contém “previsão do pagamento de diárias e de despesas de transporte independentemente de regulamentação; substituição do reembolso das despesas de transporte e mudança pelo pagamento equivalente a um subsídio, a título de custeio de despesas de mudança, em casos de remoção e promoção para outra comarca; instituição de auxílio anual no valor de metade do subsídio mensal para aquisição de livros, publicações digitais e material de informática; instituição de auxílio-saúde, auxílio-alimentação e gratificação mensal pelo exercício de direção de foro e pela participação em turma recursal; e previsão de regulamentação do auxílio-moradia por resolução do TJMG”; e ainda no absurdo projeto de lei encaminhado pelo TJRJ para autorizar o pagamento de auxílio moradia de 18% para todos os seus juízes, o que acrescentaria ao subsídio R$5.400,00 ao mês, com o injustificado efeito retroativo a 10 anos, que representa o impacto de quase meio bilhão de reais.

Um desavisado que se deparasse com essas absurdas reivindicações poderia até pensar que os juízes no Brasil recebem menos que um salário mínimo, afinal para o mínimo a Constituição (art. 7°, IV) já estabelece que seja capaz de atender “a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo”.

Mas o atual subsídio dos juízes federais brasileiros é de R$23.997,19 (conforme o último edital do concurso para o TRF2), o que representa pouco mais de 33 vezes o valor do salário mínimo nacional (R$724,00); 13,44 vezes mais o valor do que a média mensal dos trabalhadores da iniciativa privada (R$1.785,20), e 7.67 vezes a média dos salários do setor público (R$3.127,00), segundo dados do IBGE para o mês de abril.

Na busca de pretensões remuneratórias, parece válido ressignificar até mesmo o léxico “indenização”. Se o termo “indenizar” quer dizer compensar ou reparar um dano sofrido, poderíamos considerar que ser juiz ou membro do ministério público no Brasil é, de fato, uma atividade danosa, arriscada, e porque não insalubre e perigosa. Mas todos estes aspectos não são observados na determinação dos seus subsídios? E os riscos inerentes à atividade realmente aumentam com o passar dos anos, justamente quando seus membros são mais experientes e atuam em localidades mais convenientes aos seus interesses?

A verdade é que estamos criando uma espécie de Frankenstein jurídico, uma “parcela indenizatória” que, nos termos propostos, não restitui nem repõe nada, mas apenas mantém a situação como ela está: com os magistrados e membros do MP no topo da cadeia remuneratória e, progressivamente, distanciando-se das demais carreiras, das quais já se encontram em patamar muito superior. Tampouco a parcela representa alguma gratificação por eficiência ou produtividade, também incompatíveis com o regime de subsídio. Na proposta, a manutenção de profissionais experientes é apresentada apenas como benefício para o sistema de administração de justiça, mas em nenhum momento parece contabilizar que o ganho de experiência auferido com o tempo na atividade reverte-se também, e especialmente, para os seus agentes. E estes ganhos vão além do incremento do subsídio decorrente das promoções, mas reverberam nas lotações, número de servidores e outros fatores relevantes para o exercício das atividades cotidianas.

É de se destacar, ainda, o fato de que estes agentes percebem, desde o ingresso nas respectivas instituições, subsídios elevados. E esta afirmação é valida sob qualquer parâmetro: seja no serviço público ou na iniciativa privada, ainda que considerados aspectos como poder aquisitivo e outros, como fica evidenciado quando em comparação com a remuneração daqueles mesmos países[4] (substancialmente menos desiguais que o Brasil), vejamos:

País Juízes em início de carreira Procuradores em início de carreira
França € 40.660 € 40.600
Alemanha € 41.127 € 41.127
Portugal € 35.699 € 35.699
Espanha € 47.494 € 47.494
Suécia € 52.587 € 52.290


No Brasil, um juiz federal em início de carreira recebe em um ano[5] a quantia de R$311.963,47 ou €102.958,24, quase o dobro do seu colega sueco, o mais bem pago entre os cinco países comparados.

Claro que há uma série de variáveis que precisam ser contempladas numa comparação entre as remunerações de juízes e procuradores brasileiros e europeus, mas os dados indicam que essas carreiras já têm uma sobrevalorização fora do comum no Brasil.

Ou seja: aqueles que usufruem de alta remuneração no início da carreira, próxima ao teto constitucional –– um dos grandes atrativos dos que pretendem ingressar em seus quadros – parecem querer manter esta situação ou acentuá-la, em detrimento das previsões constitucionais aplicáveis a todos os demais agentes públicos.

Se observarmos mais precisamente não a remuneração, mas a alocação orçamentária para manter o Judiciário numa comparação entre o Brasil e países da União Europeia, a exemplo do estudo recentemente publicado pelo Grupo de Pesquisa em e-Justiça da UFPR[6], também verificamos o quão alto é o custo do acesso à justiça brasileira.

Como aponta a pesquisa mencionada, no ano de 2010 o Judiciário brasileiro custou o equivalente a 1,12% do PIB (R$41 bilhões), o que resulta numa despesa média de U$127,46 por habitante. Já a média da despesa dos 40 países da União Europeia no mesmo ano foi de U$54,95 (quantia inferior à metade da brasileira). Quando comparado o percentual relativo ao PIB do gasto com o Judiciário, o Brasil supera todos os países avaliados pelo Conselho da Europa, que indica ser em Montenegro a nação com o maior índice (0,81% do PIB).

No entanto, na justificativa que acompanha a PEC n. 63, após os elogios programa nacional de valorização da magistratura, destaca o seguinte: “Este processo já não é sem tempo, segue no esteio da Reforma Administrativa aprovada em 3 de junho de 1998, com a publicação da Emenda Constitucional n. 19. Entre os inúmeros avanços trazidos por esta, encontra-se a fixação, sob forma de subsídio, da remuneração dos membros de Poder, entre outras autoridades de escalão superior da esfera federal, estadual, distrital e municipal, dando transparência a esse aspecto historicamente tão sensível quanto desprezado, referente ao modo de retribuição dos servidores públicos de todos, a partir dos cargos e carreiras, bem como escalões, mais essenciais e representativos dos Poderes da República, como determina o art. 39, parágrafo 4, da Carta Magna.”

No mesmo sentido, é o parecer do Senador Vital do Rêgo (PMDB/PB), aprovado dia 21/05/2014, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado: “é inegável a necessidade da criação de mecanismos que permitam, de um lado, retornar a atratividade das carreiras da magistratura e do Ministério Público e, de outro, enfatizar a sua posição institucional peculiar.” E, mais adiante, arremata: “Essa posição sui generis tem, necessariamente, reflexos em sua posição remuneratória, inclusive como garantia do exercício do seu papel institucional diferenciado”.

A proposta e o parecer incorporam muito bem o sentido de como membros da magistratura e do ministério público autocompreendem a distinta nobreza de suas funções, no caso, em estritos termos remuneratórios, ainda que para isso precisem desprezar os dados sobre a situação global de remuneração do serviço público ou o PIB/per capita do país.

Os argumentos partem de considerações gerais sobre os poderes, mas destaca um papel institucional diferenciado, a justificar um estatuto distinto. Para alcançar estes objetivos, todos os meios são válidos: medidas administrativas supostamente amparadas na autonomia financeira e administrativa, regulamentos gerais de duvidosa constitucionalidade e até, em ultimo caso, a reforma da constituição, através de emenda acompanhada de intenso lobby das associações, para estabelecer exceção à norma que constitui empecilho às pretensões encartadas.

Se aprovada a PEC, sua compatibilidade com os princípios da separação de poderes, igualdade, moralidade e outros certamente será objeto de questionamentos perante o Supremo Tribunal Federal, que estará na confortável posição de decidir, em último caso, sobre matéria de interesse de seus membros. Aliás, o Presidente da instituição, Min. Joaquim Barbosa, já se mostrou favorável à alteração, conforme amplamente divulgado.

Nesta hipótese, interessados também veriam o campo de investigação ampliado, uma vez que posteriormente à aprovação da PEC se estabeleceria uma interessante corrida: os demais membros de poder e carreiras do serviço público disputando o privilégio de se afastar das regras do teto e do subsídio como corolário do seu prestígio.

Ainda que não promulgada, a PEC já cumpriu uma missão: explicitar as relações sociais e de poder estabelecidas por uma instituição que, mesmo sob a égide da constituição, mantém uma postura bacharelesca e aristocrática ao enxergar o cargo público como propriedade privada, qualidade que os distingue da ralé ou dos descamisados. Aliás, esse foi o termo utilizado há pouco tempo por um subprocurador da República em apoio à ação do atual Procurador-Geral ao defender os vôos em primeira classe para seus pares.

No contexto de um poder em que a transparência ainda engatinha e que conserva práticas orientadas por critérios nada democráticos em relação ao pagamento de seus membros, as críticas não raras vezes são respondidas com o chauvinismo: “estude e passe no concurso, foi o que eu fiz”. Uma resposta pouco supreendente diante do nosso velho patrimonialismo, exatamente aquele que autoriza pôr em jogo outros bens jurídicos, caso não atendidas as exigências sobre os benefícios a que alguns julgam fazer jus.


[1] GARAPON, Antonie (1996). O Guardador de Promessas. Lisboa: Instituto Piaget, p. 60.


[2] Apesar de a publicação ter ocorrido em marco/2013, os dados apurados sobre a remuneração dos juízes e membros do ministério publico referem-se ao ano de 2010. Porém, considerando a pequena variação dos reajustes no período, consideramos que os dados ainda estão aptos à uma comparação.


[3] Segundo os dados do FMI para 2013, o PIB/per capita dos países mencionados são os seguintes: França – U$35.942; Alemanha – U$39.993; Portugal – U$23.185; Espanha – U$30.620, e Suécia – U$42.037.


[4] Dados extraídos do relatório da Comissão Europeia sobre a Eficiência da Justiça/CEPEJ, publicado em março/2013, com dados sobre a remuneração apurada em 2010.


[5] Tomado como referência o subsídio de R$23.997,19, indicado no edital do TRF 2, incluindo-se o décimo terceiro e excluindo-se as férias.


[6] Trata-se de uma análise com farto material empírico que compara o relatório do Justiça em numeros, do CNJ, com relatório produzido pela European Comission of Efficiency Justice – CEPEJ, cujas conclusões estão em SEBERNA, WIVIURKA, MONTEMEZZO & BARBOZA (2013). Justiça em Números: uma análise comparativa entre os sistemas judiciais brasileiro e de países europeus. Revista Democracia Digital e Governo Eletrônico. n. 8, p. 73-92.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

JUÍZES CONDENAM PROBIÇÃO AO USO DA MACONHA



JORNAL DO COMÉRCIO 22/09/2014 - 14h46min


Juízes condenam em audiência no Senado proibição ao uso da maconha

Agência Brasil


Juízes condenaram hoje (22) a proibição do consumo da maconha no Brasil. Eles participaram de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos do Senado para discutir a regulamentação do uso recreativo, medicinal e industrial da maconha. No debate desta segunda-feira, o tema foi o impacto do uso da droga para a Justiça.

"O proibicionismo fracassou. Eu não vou dizer que a regulamentação é a solução, muito menos como seria essa regulamentação, que é extremamente complexa, mas o proibicionismo fracassou em relação ao álcool, nos Estados Unidos, e está fracassando em relação à droga no mundo inteiro", disse o juiz Roberto Luiz Corcioli Filho.

Para o magistrado Carlos Maroja, os usuários de drogas não devem ser considerados criminosos, mas pessoas que precisam de ajuda. Segundo ele, as quatro varas de entorpecentes no Distrito Federal têm juntas cerca de 10 mil processos envolvendo traficantes - a maioria formada por usuários que começam a comercializar a droga para suprir o próprio vício. "O sistema penitenciário infelizmente não ajuda a educar as pessoas, e o problema grande aqui é [falta] de educação."

A proibição da substância também foi criticada pelo juiz João Batista Damasceno, representante da Associação de Juízes para a Democracia. Ele destacou que defender a regulamentação do uso da maconha não significa incentivar o consumo. "A regulamentação da produção, do comércio e uso de drogas pode ser o começo para passarmos a tratar da questão à luz do dia - e a luz do sol é o melhor desinfetante - e vislumbrarmos os efeitos danosos do proibicionismo."

Além de juízes, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), responsável por elaborar um parecer - favorável ou não à elaboração de projetos de lei sobre o assunto - ouviu mais especialistas e representantes da sociedade civil que se manifestaram contrários à regulamentação do uso recreativo da droga.

Entre as posições contrárias à liberação está a do procurador da República, Guilherme Schelb, que citou dados de pesquisas internacionais. "Na questão da prostituição, a incidência do consumo de drogas é total. As crianças e adolescentes exploradas sexualmente recorrem intensamente ao consumo de drogas. É intenso o consumo de drogas também associado à prostituição e ao estupro. Trago uma pesquisa dos Estados Unidos que revelou que, em 90% dos casos de violência sexual e estupro, nas universidades americanas, o autor, a vítima, ou ambos estavam sob o efeito de drogas."

A professora Maria Alice Costa, de Brasília, também fez um apelo contrário à regulamentação do uso recreativo da maconha. Ela contou a experiência com a filha, que é dependente química."Ela experimentou para recrear. Ela experimentou para se divertir. Só que isso a levou ao vício. Ela não conseguiu mais se libertar da maconha. E como consequência de ela não conseguir se libertar da maconha, ela começou a procurar outras drogas mais pesadas, até o crack."

A próxima audiência pública para discutir o assunto na Comissão de Direitos Humanos do Senado está marcada para o dia 13 de outubro.

domingo, 21 de setembro de 2014

FICHA LIMPA E CONFRONTOS NOS TRIBUNAIS



FOLHA.COM 21/09/14 08:16


Por Frederico Vasconcelos



Um condomínio em Curitiba (PR) incluiu em sua convenção a exigência de que o síndico tivesse “ficha limpa”.

“Isto demonstra que a lei veio para ficar”, diz o advogado Luciano Caparroz Pereira dos Santos, especialista em direito eleitoral, membro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) e presidente do Centro Santo Dias de Direitos Humanos.

Esse exemplo da aceitação da Lei da Ficha Limpa pela sociedade é mencionado no livro “Ficha Limpa – Impacto nos tribunais: tensões e confrontos” [editado em maio pela Thomson Reuters/Revista dos Tribunais].

Como o título sugere, o projeto é resultado de iniciativa popular, com a adesão de um milhão e seiscentas mil assinaturas, mas gerou e ainda deverá provocar muitas batalhas nos tribunais.

“Pode-se afirmar que o eleitor do século XXI já incorporou o papel de jogador com veto no mundo democrático”, afirma a professora Monica Herman Caggiano, coordenadora da obra. “Hoje, com o auxílio da alta tecnologia, o eleitor constrói e desconstrói candidaturas”, afirma Caggiano, Livre-Docente, Doutora e Mestre pela Faculdade de Direito da USP.

Com prefácio do ministro Dias Toffoli, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e apresentação de Antônio Carlos Mathias Coltro, presidente do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, o livro é dividido em três partes: pesquisa com base em dados da Justiça Eleitoral de São Paulo e decisões do TSE –segundo a coordenadora, a pesquisa “teve em vista preparar o espírito dos atores eleitorais de 2014 para a rigidez e drasticidade da lei”; análises de membros do Ministério Público Eleitoral, magistrados, advogados e especialistas que relatam a experiência das eleições municipais de 2012 e, finalmente, depoimentos de personagens envolvidos no movimento que gerou a “Ficha Limpa” e de especialistas que acompanharam a aplicação da lei.

Essa investigação envolveu uma equipe de magistrados do TRE-SP e de professores e alunos do Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito da USP, membros da Escola Judiciária Eleitoral Paulista e pesquisadores.

A seguir, comentários selecionados pelo Blog:

“Algumas vezes, deve-se proteger as maiorias contra elas mesmas e, muitas vezes, compete ao Poder Judiciário o desagradável papel de restringir a vontade popular em nome da proteção do equilíbrio das forças democráticas, contra o esmagamento de minorias ou de pautas axiológicas que transcendam o critério quantitativo do número de votos em uma eleição ou um plebiscito.” (Ministro Dias Toffoli, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do STF)

“A história pré e legislativa da formação da LC 135/2010 é marcada por um apelo popular muito forte, evento que, se sobre o sistema político exerce legítima influência, já no jurídico não é visto com bons olhos, o que acaba por apontar mais uma distinção existente entre esses imprescindíveis sistemas à sociedade democrática.” (Paulo Thadeu Gomes da Silva, Procurador Regional Eleitoral Substituto em São Paulo, e Marco Antonio Martin Vargas, Juiz Assessor da presidência do TRE-SP)

“Certamente muitas batalhas nos Tribunais e na doutrina serão travadas em virtude da Lei da Ficha Limpa, mas não há dúvidas de que o grande avanço alcançado não pode retroagir.” (…) Não há dúvida de que a ética e a probidade são valores fundamentais de uma sociedade e acabaram sendo eleitos pela nossa Constituição Federal como princípios basilares. Para o exercício qualificado das funções públicas, esses princípios, com o devido respeito a quem possa pensar o contrário, são absolutos, pois não podem ser ponderados. As regras impostas pela Lei da Ficha Lima consagraram, no nosso entender, a aplicação efetiva desses princípios e espera-se que o cumprimento cuidadoso e eficiente dessas normas modifiquem não só o cenário eleitoral, mas também o político e o administrativo público.” (Richard Pae Kim, Juiz de Direito, e Paulo Hamilton Siqueira Júnior, Advogado e Jornalista)

“O significado das exigências trazidas pela LC 135/2010, que veio a ser popularmente conhecida como Lei da Ficha Limpa, transcende o Direito Eleitoral: trata-se da concretização de uma demanda popular histórica por uma representação política menos viciada pelas atitudes patrimonialistas, desconectadas dos anseios dos representados.” (…) “Havia –como há até hoje– um sério risco de inefetividade da Lei da Ficha Limpa, fazendo nascer mais um caso de direito eleitoral simbólico, que frustra as expectativa e se converte em ‘lei que não pega’.” (…) “A Lei da Ficha Limpa é um grande exemplo da necessidade de direcionarmos esforços para implementação e completa efetivação das boas lei que já possuímos. No caso do direito eleitoral, a atuação dos agentes públicos terá, cada vez mais, de se preocupar com mecanismos de inteligência, que permitam uma fiscalização eficaz mesmo em vista de dados complexos e organizados em bancos diversos.” (André de Carvalho Ramos, Procurador Regional Eleitoral no Estado de São Paulo)

“Não seria o caso de se iniciar uma campanha cívica para se acrescentar à Lei da Ficha Limpa penalidades aos partidos e a seus dirigentes, quando agiram contrariamente aos dispositivos expostos pela legislação?” (Cláudio Lembo, Professor Doutor da Universidade Presbiteriana Mackenzie e ex-governador do Estado de São Paulo)

“Como observado pelo doutrinador José Jairo Gomes, ‘Tornou-se comum, nos dias correntes, a exigência de ética na política e, de resto, em todos os setores da vida social. As ações imorais, antiéticas, têm sido repudiadas em toda parte’.” (…) “Ainda que seja longo o caminho a ser percorrido, é certo que a Lei da Ficha Limpa enseja à Justiça Eleitoral uma atuação mais firme e sem obstáculos na busca, ao lado da sociedade, da almejada ética na política e na incessante luta contra a corrupção e a impunidade no país.” (Mário Devienne Ferraz, Desembargador vice-presidente e Corregedor Regional Eleitoral – TRE-SP)

“No meio jurídico, a tese da inconstitucionalidade do projeto de lei por ofensa ao princípio da presunção de inocência sempre nos pareceu majoritária. Muitas vezes, como palestrante, enfrentei públicos hostis. Penso que entre os advogados criminalistas estavam os nossos maiores opositores. Entre eles era mais difícil promover o convencimento.” (…) Creio que os juristas que –como eu– apostaram na aprovação da Lei da Ficha Limpa, colocaram em risco a sua reputação. Se essas teses não tivessem sido acolhidas, nossa imagem restaria abalada no meio jurídico e social. Mas, pela mesma razão, podemos hoje comemorar a construção de novas premissas para o Direito Eleitoral segundo uma gênese da qual tivemos a honra de fazer parte.” (Márlon Reis, Juiz de Direito)

“A Justiça Eleitoral, por não ter uma carreira própria de magistrados, já padece, naturalmente, das dificuldades criadas por alterações jurisprudenciais abruptas, decorrentes do rodízio de ministros, desembargadores e juízes. Assim, muitas vezes, interpretações legais consoidadas através dos anos, são alteradas por composições novas do Tribunais Eleitorais às vésperas das eleições.” (…) Preocupa-me, assim, que a jurisprudência venha abrandando o rigor do texto legal, ainda que, repito, muitas vezes seja pouco claro ou mesmo confuso. A vontade popular, ainda assim, se manifesta com clareza e é ela que precisa ser respeitada.” (Sandra Cureau, Subprocuradora-Geral da República)

17 MORTES, 10 ANOS, NENHUM CULPADO



ZH 21 de setembro de 2014 | N° 17929

TAÍS SEIBT*

10 ANOS DE DOR E IMPUNIDADE

ACIDENTE COM ÔNIBUS ESCOLAR que resultou na morte de 16 adolescentes e de uma monitora, em Erechim, completa uma década na segunda-feira. O processo criminal está prestes a prescrever sem que responsáveis sejam condenados



Ladeira abaixo, numa estradinha de chão batido na pequena localidade de Argenta, zona rural de Erechim, uma placa avisa: ponte interditada a 300 metros. Há 10 anos, nenhum veículo passa pelo pontilhão sobre a barragem da Corsan onde 16 estudantes e uma monitora morreram afogados depois que o ônibus que os levaria para mais um dia de aula tombou e afundou.

Outros 15 passageiros e o motorista conseguiram se salvar. Nas comunidades conhecidas como km 7 e km 10, nas quais os estudantes que tomavam a rota 31 para ir à escola cresceram – e morreram – juntos, o olhar distante de cada pai ou mãe que perdeu um filho na tragédia revela que uma década é pouco para aliviar o sofrimento. Tampouco foi tempo suficiente para punir os culpados, mas pode ser o bastante para que o processo prescreva sem que ninguém seja condenado.

Enquanto a perda e o trauma agoniam familiares de vítimas e sobreviventes, Ministério Público (MP) e Justiça discutem se os réus – o motorista do ônibus, Juliano Moisés dos Santos, e os empresários responsáveis pelo transporte, Carlos Demoliner e Ernani Dassi – devem responder por homicídio doloso (com intenção ou risco assumido de matar) ou culposo (não intencional). No caso de dolo, os réus seriam levados a júri e estariam sujeitos a penas de até 30 anos de prisão. As penas para homicídio culposo de trânsito caem para dois a quatro anos de reclusão e são fixadas por um juiz singular.

CASO ESTÁ DESDE MAIO NA MESA DE MINISTRO DO STF


O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Está desde maio na mesa do ministro Luís Roberto Barroso. A assessoria de gabinete do ministro adiantou à reportagem que ele deve se manifestar nesta semana.

Como o entendimento pelo homicídio culposo vem sendo mantido, a possibilidade de reversão em última instância é remota. Assim, se o processo retornar para a Comarca de Erechim como homicídio culposo e o juiz fixar a pena no mínimo, seguindo a prática usual, o crime já estará prescrito. Pelo atual Código Penal brasileiro, se a condenação for igual a um ano e não superior a dois, o crime prescreve em quatro anos. Para a coordenadora da Procuradoria de Recursos do MP, Ana Luiza Lartigau, há possibilidade de a pena base ficar acima do mínimo devido ao fato de que o motorista estava em atividade profissional no ato do acidente, o que evitaria a prescrição.

O marco jurídico no caso da tragédia de Erechim é o recebimento da denúncia: 30 de dezembro de 2009.

– O atual sistema de prescrição incentiva a impunidade, tanto que foram propostas modificações no novo Código Penal. Num país sério, jamais estaria prescrito este caso – comenta Douglas Fischer, coordenador da Assessoria Jurídica Criminal do Procurador-Geral da República junto ao STF, e um dos auxiliares do senador Pedro Taques (PDT-MT) para a reforma do Código Penal, ainda em tramitação.

Um processo indenizatório, encerrado em 2011, de cerca de R$ 13 milhões, pagos pela Corsan, permitiu a algumas famílias mudar de endereço, em melhores condições, mais longe das inevitáveis lembranças cotidianas.

– Mas não houve justiça. Os verdadeiros culpados não foram punidos – lamenta Dirceu Pertili, que perdeu dois filhos na tragédia.

*Colaborou José Luís Costa



AS HOMENAGENS
-Logo após a tragédia, a fundação Vida Urgente colocou uma placa com os nomes das 17 vítimas na cabeceira da ponte onde ocorreu o acidente, mas muitos nomes já estão apagados.
-Uma missa será celebrada nesta segundafeira na capela da comunidade do km 7 às 19h30min. A cada ano, as comunidades se alternam para sediar a cerimônia.
-A Câmara de Vereadores de Erechim aprovou a sugestão de construir um monumento em memória das vítimas da tragédia de 2004 em alguma praça da cidade. A licitação está prevista para janeiro de 2015. Ainda não há arte e modelo definido, ficando a criação a cargo dos artistas que se inscreverem no edital. Também não foi escolhida a praça para a colocação do memorial.

O PAPEL DO JUDICIÁRIO NA SOCIEDADE BRASILEIRA

ZH 20/09/2014 | 15h05

Especialistas discutem o papel do Judiciário na sociedade brasileira. Demasiada para uns, necessária para outros, atuação mais intensa do Judiciário tem pautado grandes questões sociais e comportamentais no país

por Itamar Melo




A estátua da deusa Justiça postada à frente da sede do Supremo Tribunal Federal, em Brasília. Foto: Carlos Humberto / SCO/STF


No começo dos anos 90, chegou à Justiça o caso de uma mulher de Porto Alegre que, depois de ser deixada pelo marido, trabalhou duas décadas como lavadeira, criou sozinha os cinco filhos e conseguiu amealhar alguns bens, incluindo uma casa. Agora, o homem estava de volta para pedir o divórcio e exigir metade do patrimônio que ela havia construído.

A lei dava razão ao marido. Dizia que o regime de bens instituído no casamento cessava apenas com a separação judicial. Não importava se o casal vivesse junto ou não. Responsável pelo caso, a juíza Maria Berenice Dias chegou à conclusão de que a legislação estava em conflito com o mundo real. Negou a divisão dos bens da lavadeira.

– Tomei uma decisão que parecia ser absolutamente contrária à lei. Mas fiz justiça, que é o compromisso do juiz – afirma Maria Berenice, hoje advogada.

No últimos anos, esse tipo de sentença, que surge em contradição com a lei ou estabelece novos direitos nos casos em que a lei é omissa, tornou-se corriqueiro. Em um primeiro momento inéditas e pioneiras, essas decisões se acumularam na forma de jurisprudência e em alguns casos provocaram até mesmo mudanças na legislação. Transformaram não só a Justiça, mas a própria sociedade brasileira. Foi a partir de decisões judiciais que o casamento dos homossexuais, o aborto de fetos anencéfalos e formas alternativas de família passaram a ser reconhecidos pelo Estado.

Posicionados na vanguarda desse processo, os juízes brasileiros se converteram em agentes de transformação social.

O protagonismo dos magistrados, chamado de ativismo judicial, tem com frequência feito avançarem nos tribunais agendas que não conseguem prosperar no sistema legislativo. Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família, acredita que os juízes ganharam importância por causa da “inércia” do Congresso Nacional:

– Quem tem feito o Direito de Família avançar no Brasil, por meio de decisões históricas, é o Judiciário. A lei não está acompanhando os costumes, porque qualquer tema que tenha conteúdo moral é reprovado no Congresso. Alguns dizem que o juiz está extrapolando sua função, que a função dele é julgar, não legislar. Mas eu não concordo. O Judiciário vem para proteger as minorias que não têm respaldo da lei. Se for esperar que a maioria seja a favor do casamento gay ou da multiparentalidade, isso nunca vai ser reconhecido.

A nova influência dos juízes desabrochou no Brasil com a Constituição de 1988, que introduziu uma série de garantias fundamentais a que se pode recorrer nos tribunais para ir além do que está na lei. Em nome do princípio da igualdade, por exemplo, os homossexuais puderam comparecer ao Judiciário em busca do direito ao casamento.

– Uma Constituição como a nossa cria facilidades para o juiz. Ela estabelece a união estável entre homem e mulher. Mas não veda a união estável entre pessoas de mesmo sexo. Não há proibição. Algum juiz pode fazer uma interpretação diferente, mas o avanço ocorre quando a parte que procura o Judiciário encontra um juiz que está, digamos, melhor preparado para fazer uma interpretação cidadã, uma interpretação que assegura direitos – afirma o juiz Roberto Lorea, que atua no foro central da Capital.

A partir de uma decisão pioneira, observa Lorea, outras sentenças no mesmo sentido se acumulam, consolidando uma jurisprudência. Segundo ele, esse processo impede que um magistrado imponha uma determinada agenda.

– O juiz pode ser um agente de transformação social. Acredito nisso. Mas não é um cara sozinho que faz uma loucura. Se houver uma decisão de primeiro grau, cabe recurso para o Tribunal de Justiça. Depois, cabe recurso ao STJ. As coisas vão acontecendo por meio de pequenos avanços, até que vira uma espécie de consenso. Não receio uma ditadura do Judiciário, porque existem pesos e contrafreios – afirma Lorea.

Maria Berenice Dias, responsável por várias decisões pioneiras, acredita que as sentenças polêmicas acabam por mudar também a sociedade:

– O papel do juiz não é julgar para servir de coisa emblemática. Isso é consequência. Ele julga de determinada maneira porque aquela é a decisão mais justa. Mas ele puxa a mudança na medida em que, se um juiz diz algo, as pessoas acolhem. Não vou afirmar que mude a sociedade, mas faz as pessoas refletirem.

O polêmico episódio de Livramento

O protagonismo assumido pelos magistrados ganhou contornos explosivos neste mês, com um casamento coletivo programado pela juíza Carina Labres em um CTG de Livramento. Um dos casais era formado por duas mulheres. Carina já vinha promovendo uniões gays, mas mexeu em um vespeiro ao levá-las para um reduto do tradicionalismo. O CTG foi incendiado, e o casamento foi para o fórum. A juíza não se abalou:

– Eu vim para fazer diferença, não para passar em branco pelas comarcas.

A ação da magistrada colheu elogios e críticas. Para a advogada e professora da PUCRS Ana Luiza Carvalho Ferreira, o que Carina fez foi agir de acordo com resolução do CNJ que obriga os cartórios a registrar casamentos gays:

– Além do cartório, ela fez uma celebração pública. Está correta? Sim. Se há previsão legal e não há vedação, os noivos podem escolher onde casar.

As ressalvas à ação de Carina não se direcionaram ao casamento gay, mas ao local de sua realização. O desembargador Alexandre Mussoi Moreira afirma que o papel do juiz é pacificar a sociedade, não agravar problemas:

– No caso das uniões homossexuais, não é questão de concordar. O direito evoluiu da maneira que está posta. Mas daí a tomar atitudes que confrontam a sociedade, isso é que se deve evitar. Os direitos têm de ser garantidos. O que a Justiça não precisa fazer é celebrar o contrato num CTG.

A juíza Rosana Garbin celebra a transferência para o fórum:

– Eu elogiaria o fato de ela ter transferido para o fórum, porque mostra que esse é um espaço em que essas situações são normais.



Entrevista: João Ricardo dos Santos Costa

Magistrado diz que só o Judiciário pode enfrentar questões polêmicas. Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros fala sobre o ativismo do Judiciário e o papel do juiz na sociedade



"A velocidade da demanda social supera a capacidade do legislador de corresponder aos fenômenos sociais" Foto: Nelson Jr. / SCO/STF


Na semana passada, o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, João Ricardo dos Santos Costa, viajou a Santana do Livramento para apoiar a cerimônia de casamento coletivo em que foi celebrada a união de um casal homossexual. Na entrevista a seguir, ele afirma que o protagonismo de juízes como Carine Labres é inerente à magistratura e serve para contrabalançar o descompasso entre as demandas da sociedade e a capacidade do Legislativo de responder a elas:
Faz parte do papel do juiz ser um agente de transformação da sociedade através de suas decisões?
Isso ocorre na medida em que a velocidade da demanda social supera a capacidade do legislador de corresponder aos fenômenos sociais. Acaba o Judiciário tendo de regular as novas relações que se estabelecem. É isso que exige do Judiciário um protagonismo. Porque o juiz é quem vê o drama, quem vê a injustiça. Por exemplo, descobrem uma forma de curar tal doença. O Estado não libera as pesquisas, mas o juiz enxerga o doente. É o caso do componente da maconha cuja utilização e pesquisa tem sido autorizada por juízes. A partir do momento em que a tecnologia se desenvolveu e descobriram-se os efeitos de cura desse componente, houve uma demanda social por essa medicação. A sociedade não pode esperar. A sociedade tem pressa. E busca o Judiciário para garantir o direito.

Com frequência, esse descompasso entre a velocidade do legislador e a do juiz aparece em temas bastante polêmicos na sociedade, como os direitos do homossexual. O Legislativo, talvez por motivos eleitorais, não avança. É aí que os juízes acabam tendo um papel mais ativo?
Esse componente é importante. O legislador representa o povo, então é evidente que ele tem de atender à vontade do eleitor. No momento em que o eleitor é refratário a determinados avanços, como o aborto de anencéfalos, as pesquisas com células-tronco e a união homoafetiva, o legislador resiste também, porque atende à questão da representação eleitoral. Não estou dizendo que ele está errado. Mas é preocupante quando esse conservadorismo avança no Congresso Nacional e ocupa o Estado, como no caso da influência religiosa. O Estado é para todos, não para um determinado segmento. Uma crença não pode impor a regulação social para toda a sociedade. Essa é uma dificuldade do Legislativo brasileiro.

É papel do juiz contrabalançar esse tipo de influência?
O Judiciário serve exatamente para isso. Livre do compromisso constitucional que é a representação e munido da independência e das garantias que a magistratura tem, ele faz a adequação, o equilíbrio do sistema.

Nesse processo não existe o risco de que o juiz tome decisões que a maioria da sociedade não aceita?
Exatamente. Aí entra aquela linha muito delicada entre o ativismo e a garantia de direitos fundamentais. É nesse meio que o juiz tem de se equilibrar. Algumas medidas podem gerar uma substituição do legislador, o que não é recomendado. Mas vamos pegar o caso da união homoafetiva. Se lermos a Constituição como um sistema de garantias, que assegura a pluralidade, vemos que qualquer decisão a favor do direito de pessoas do mesmo sexo casarem está garantida. O juiz não está inventando a roda. Ele está aplicando a Constituição. O que é muito positivo é que todos os juízes brasileiros podem aplicar a Constituição nas suas decisões, diferente de alguns sistemas em que só a suprema corte pode fazer isso. É uma vantagem do nosso sistema.

Não é difícil determinar esse equilíbrio ao qual o juiz precisa chegar?
Algumas decisões chocam. Mas quando começa o debate sobre elas, com o aprofundamento da discussão pública sobre o fato, como no caso do CTG de Livramento, as coisas começam a ser mais entendidas pela sociedade. Em Livramento, vimos um exemplo bem típico. O Judiciário disse para a sociedade de forma bem clara: os espaços sociais não podem ser restritos a determinadas categorias de pessoas. As questões mais polêmicas acabam gerando perplexidade, mas só o Judiciário pode enfrentar situações polêmicas.

ATIVISMO DE TOGA
Algumas áreas em que os juízes tomaram decisões que estão ajudando a mudar a sociedade brasileira:


Multiparentalidade

Decisões judiciais recentes ampliaram os tipos reconhecidos de paternidade. Além do pai biológico ou que registra a criança, os juízes acolhem também a noção de pai socioafetivo – aquele que exerce efetivamente a função. Como se reconhecem três formas de paternidade, há filhos obtendo na Justiça o direito de ter dois pais ou duas mães. Nessa linha da multiparentalidade, o juiz de Santa Maria Rafael Pagnon Cunha tomou uma decisão inédita neste mês: determinou que uma recém-nascida tenha o nome do pai e de duas mães na certidão de nascimento. As mulheres formam um casal e acertaram a concepção da criança com o homem, que engravidou uma delas.

União homossexual
Desde os anos 1990, sentenças proferidas por juízes de todo o país passaram a conceder a casais do mesmo sexo direitos garantidos a casais formados por um homem e uma mulher. Essas decisões diziam respeito a questões como partilha de bens depois da separação, herança e inclusão como dependente em plano de saúde. Em 2011, esse processo culminou com o reconhecimento da união estável entre homossexuais pelo Supremo Tribunal Federal. No ano passado, o Judiciário deu mais um passo: o Conselho Nacional de Justiça obrigou todos os cartórios a aceitar o registro de casamentos gays.

Componentes da maconha
Desde abril, juízes têm liberado a importação de canabidiol, uma substância encontrada na maconha que é proibida no país. Pesquisas recentes mostram que o canabidiol é eficaz no tratamento de diversas doenças. O primeiro caso de decisão judicial beneficiou uma menina de seis anos que sofre de epilepsia grave. A partir da ação do Judiciário, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) começou a liberar o remédio em dezenas de casos.

Aborto de anencéfalos
O Código Penal brasileiro, de 1940, permite o aborto apenas em caso de estupro ou risco de vida para a mãe. Com o desenvolvimento de exames que permitem avaliar a saúde do feto, começaram a chegar ao Judiciário pedidos de autorização para o aborto de anencéfalos (fetos sem cérebro), concedidos em vários casos. Em 2012, por oito votos a dois, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a interrupção da gravidez nesses casos não é crime – ampliando as situações em que o aborto é aceito.

Famílias simultâneas
Uma questão polêmica que começa a avançar e pode chegar em breve ao Supremo Tribunal Federal é o reconhecimento da existência de famílias simultâneas, superando o princípio da monogamia. Já começam a se acumular decisões que concedem direitos iguais aos dois núcleos. No ano passado, um juiz de Manaus reconheceu a união estável simultânea de um homem com duas mulheres, após a morte dele. Dois meses atrás, o Tribunal de Justiça do Maranhão tomou, de forma inédita, a decisão de reconhecer como união estável a relação que uma mulher manteve durante 17 anos com um homem casado. Ela ingressou na Justiça pleiteando direitos após o falecimento do amante.