MAZELAS DA JUSTIÇA

Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

SERÁ O COMEÇO DO FIM DA IMPUNIDADE NOS CRIMES CONTRA A MULHER?

Pimenta Neves está preso. Será o começo do fim da impunidade nos crimes contra a mulher? - RUTH DE AQUINO, é colunista de ÉPOCA, morando atualmente na Europa.REVISTA ÉPOCA, 25/05/2011.

Em 2007, quando o jornalista Pimenta Neves comemorou sete anos de liberdade, mesmo tendo confessado o crime hediondo contra uma mulher indefesa, escrevi uma coluna na Época, chamada “A Justiça sem vergonha na cara”.

Reproduzo aqui o texto publicado quatro anos atrás, com alguns cortes, para ajudar quem não acompanhou o caso a entender como é que o assassino ainda estava livre:
No Brasil, a Justiça tem muitas caras. E pouca vergonha. Na semana passada, o jornalista Pimenta Neves comemorou sete anos de liberdade. Em agosto de 2000, ele matou a ex-namorada e também jornalista Sandra Gomide com dois tiros: um pelas costas e o segundo, no ouvido esquerdo, quando Sandra estava caída no chão.

A decisão de mantê-lo livre foi do Superior Tribunal de Justiça.

Antônio Marcos Pimenta Neves tem mais de 70 anos, vive numa casa em São Paulo, vai à praia em Ubatuba, e não gosta muito de jornalistas, embora seja essa sua profissão. Era diretor do jornal O Estado de S. Paulo quando cometeu o crime. Pimenta queria continuar a namorar Sandra, morena de 32 anos. Ele a demitiu do jornal após o fim do namoro, mas continuou a persegui-la. Sandra não queria reatar. Foi assassinada.
“Sob forte emoção” – como dizem seus advogados –, Pimenta saiu de casa armado para encontrar Sandra num haras em Ibiúna, a 64 quilômetros de São Paulo. Cavalgou por duas horas. E a matou.

Fugiu, mas, dias depois, confessou o crime, já orientado por advogados. Após manobras, recursos, liminares e habeas corpus, Pimenta enfrentou enfim um júri popular em maio do ano passado (2006). Foi condenado, por crime hediondo, a 19 anos, 2 meses e 12 dias de prisão. Continuou recorrendo em liberdade. Em dezembro de 2006, três desembargadores do Tribunal de Justiça em São Paulo determinaram a prisão do réu e reduziram a sentença para 18 anos. Ele virou foragido. Sua advogada, Ilana Muller, pediu novo habeas corpus em Brasília. A ministra Maria Thereza de Assis Moura, do STJ, suspendeu o mandado de prisão. E o jornalista reapareceu.

O STJ confirmou a liminar da ministra Maria Thereza. Enquanto todos os recursos não forem julgados, Pimenta continuará livre. Por “presunção de inocência”. Essa expressão jurídica soa como escárnio.

A liberdade de Pimenta é inconcebível do ponto de vista moral. “Para mim, a Justiça não presta neste país. A Justiça só é boa para quem tem dinheiro”, diz João Gomide, pai de Sandra, que sofreu três infartos.

Pimenta diz que “a tragédia deixou duas vítimas: a Sandra, principalmente, e eu”. O pai de Sandra não sente pena: “Peço aos médicos que não me deixem morrer antes de ver o assassino preso”.

Por que é permitido, por que é aceitável neste país demorar tanto para julgar recursos que tenham a ver com homicídio? A vida não deveria ser prioridade para a Justiça? Como a juíza Maria Thereza consegue dormir o sono dos justos?

Agora, o ano é 2011 e, aparentemente, não existe mais recurso ao qual Pimenta Neves possa se agarrar para continuar livre. Precisamos comemorar que o STF tenha agido enfim para começar a reabilitar a imagem da Justiça em crimes de maneira geral, nesse caso específico um crime covarde por motivo torpe, como tantos por aí.

Pimenta Neves tornou-se um símbolo da impunidade por toda a sua história e seu status. Fez tudo que um homem não pode fazer para se impor sobre os desejos de uma mulher. Assediou-a moralmente, despediu-a do jornal para se vingar e, não satisfeito, acabou com a vida dela.

O pai de Sandra, João Gomide, está vivo mas doente, foi entrevistado sobre uma cama, com dificuldade para expressar o sentimento que ele julgava impossível sentir algum dia. Um sentimento de reparação, enfim, diante da prisão de Pimenta Neves, o algoz de sua filha. Mesmo assim, seu João demonstrou serenidade e grandeza humana: “Fico contente pela sua prisão, mas não quero que o machuquem. Minha raiva maior já passou”.

A juíza Ellen Gracie, do Supremo, se dizia constrangida toda vez que o assunto surgia no exterior ou mesmo aqui, no Brasil: “Como justificar que, num delito cometido em 2000, até hoje não cumpre pena o acusado?”, dizia a ministra.

Comemoro a decisão tardia do STF mas aproveito para perguntar: como e por que o Supremo deu habeas corpus para Roger Abdelmassih, o médico multimilionário da clínica do horror de São Paulo, deixando-o em liberdade para fazer o previsível – fugir supostamente para o Líbano? Não deixa de ser outro motivo de constrangimento.

Depois de contrariar o forte apelo por ética da sociedade e reabilitar os políticos fichas-sujas eleitos no ano passado, o Supremo Tribunal Federal parece ter tomado um caminho que aproxima a Justiça brasileira do que se espera dela. Vamos torcer para que a prisão de Pimenta Neves não seja um episódio isolado, mas sim apenas o início de uma outra postura, uma outra atitude, de mais rigor e consequência, que não dependa do prestígio ou da fortuna do réu.

Nota da blogueira: No Brasil, 10 mulheres são mortas por dia, a maioria por atuais ou antigos maridos, namorados ou companheiros, segundo Wânia Izumino, pesquisadora do Núcleo de Estudo da Violência da USP. Calcula-se que, em 25% dos casos, o motivo seja torpe – casos como recusa em fazer sexo ou manter a relação. Em 10%, os crimes são passionais, ligados a ciúmes. O motivo mais frequente são discussões domésticas (50%). O restante dos crimes não tem nada a ver com lar e companheiros ou ex: é relacionado ao uso e venda de drogas.

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