- OPINIÃO, O Estado de S.Paulo - O8/09/2011
Por causa do dinamismo e da heterogeneidade da sociedade brasileira, a introdução de novas leis é um processo complexo. Além de dar ensejo a pretensões muitas vezes exageradas e até abusivas, as mudanças do ordenamento podem propiciar maior sobrecarga de ações nos tribunais, provocando acirrados debates nos meios forenses e acadêmicos, até que os tribunais superiores firmem entendimento comum e uniformizem a jurisprudência.
Isso aconteceu com a Constituição de 1988; com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), de 1990; com o novo Código Civil, que entrou em vigor em 2002, depois de tramitar três décadas no Legislativo; e com várias outras leis no campo do direito penal e trabalhista. Como era inevitável, a estabilização das expectativas dos cidadãos e das empresas com relação ao alcance desses textos legais foi um processo demorado, que disseminou em seu início mais incerteza do que segurança jurídica.
É à luz desse processo de progressivo ajuste de leis novas em uma sociedade dinâmica e heterogênea que se deve entender a preocupação da Justiça de pôr fim a pedidos infundados e abusivos, que costumam ser formulados após o advento de institutos jurídicos inovadores. É esse, por exemplo, o caso das ações de indenização por dano moral, que vêm crescendo em progressão geométrica. Só no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, elas aumentaram 3.607%, entre 2005 e 2010.
Para muitos juristas, esse aumento decorre do amadurecimento da sociedade e da consciência que os cidadãos passaram a ter de seus direitos. Nos últimos anos, contudo, os tribunais detectaram o risco de desvirtuamento da ideia de dano moral, dado o crescente número de processos impetrados por litigantes oportunistas.
Consumidores inveterados de cigarros, por exemplo, passaram a acionar as empresas do setor de fumo, acusando-as de terem sido responsáveis por seu vício. Clientes de bancos passaram a pedir vultosas quantias a título de ressarcimento por terem sido parados nas portas giratórias das agências ou por terem tido cheques devolvidos por divergências com relação à assinatura. Em cidades atingidas por catástrofes naturais, como ocorreu este ano em Teresópolis e Nova Friburgo, moradores que não foram vítimas de deslizamentos e enchentes processaram o poder público e concessionárias de energia. Houve ainda quem processasse donos de pista de patinação no gelo, por ter sofrido queda provocada por imperícia e falta de habilidade. E há até casos de pessoas que entraram com pedido de indenização por danos morais contra parentes, alegando terem sido agredidos verbalmente em discussões familiares.
Para muitos juízes, esses litigantes estariam tentando se locupletar, obtendo "dinheiro fácil". No Rio de Janeiro, o titular da 28.ª Vara Cível negou indenização de R$ 1,2 milhão a um ex-fumante, alegando que ele sabia o risco de sofrer doenças pulmonares quando passou a fumar. Na comarca de Pedregulho, em São Paulo, um juiz do Juizado Especial Cível e Criminal rejeitou o pedido de indenização de um cliente de banco atingido pelo travamento da porta giratória, alegando que ele "deveria se enclausurar em casa ou numa redoma de vidro, posto que viver sem alguns aborrecimentos é algo impossível". No caso do litigante que caiu na pista de patinação, o magistrado responsável pelo caso absolveu o proprietário, afirmando que tombos são inevitáveis nesse tipo de esporte e que a autora da ação "assumiu o risco de queda", por não ter a menor experiência com patins. E, no caso do litigante que processou os cunhados, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que "o ordenamento jurídico não impõe aos familiares a obrigação de se amarem" e que, "em famílias numerosas, é comum que haja divergência no que diz respeito a visões de mundo e ânimos".
Decisões como essas mostram que os tribunais estão conscientes dos problemas de entendimento e dos riscos de abusos inerentes à entrada em vigor de leis mais modernas em nosso ordenamento jurídico.
O dia em que a Justiça Brasileira se tornar sistêmica, independente, ágil e coativa, e com Tribunais fortes e juízes próximos do cidadão e dos delitos, o Brasil terá justiça, segurança e paz social.
"A Função Precípua da Justiça é a aplicação coativa da Lei aos litigantes" (Hely Lopes Meirelles)- "A Autoridade da Justiça é moral e sustenta-se pela moralidade de suas decisões" (Rui Barbosa)
MAZELAS DA JUSTIÇA
Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.
Nenhum comentário:
Postar um comentário