Jocelaine Teixeira, juíza de Direito
As notícias de que uma idosa de 87 anos baleou e matou um ladrão despertaram aplausos. O indiciamento dela pela Polícia Civil gerou reclamações inflamadas contra os órgãos do Estado e tantas outras manifestações de prestígio à conduta da anciã.
Não pretendo avaliar juridicamente o caso. O que me instiga é o lado humano posto em debate. Imagino o quão mal a idosa sinta-se com o ocorrido e sou solidária a ela. Chocam-me, no entanto, as avaliações de que matar um ladrão é uma bravura. Intrigam-me também as motivações das inflamadas críticas à apuração dos fatos.
Isso porque, no Estado social de direito ou em qualquer comunidade humana, matar alguém pode ser uma atitude de desespero, mas não é um ato heroico, e deve ser apurado. Cabe, pois, ao Estado dispensar ao caso adequado tratamento jurídico, de modo fundamentado, como é próprio das conclusões do inquérito policial, da avaliação do promotor de Justiça e das decisões judiciais.
Retorno, no entanto, aos questionamentos pela visão humanística. A falta de segurança que nos aflige; contudo, o coletivo regozijo com a morte de um ladrão, como se assim estivéssemos reduzindo a violência, pavimentando um futuro melhor para as próximas gerações, ou fazendo uma limpeza dos maus para o triunfo dos bons, a exemplo do que fez Hitler, é tão mais grave e perigoso, é antidemocrático e descivilizado.
O ladrão era uma pessoa (sim, um ser humano) possivelmente privada de acesso à formação sociocultural e de amparo familiar, com vários registros policiais e usuário de crack. É um daqueles que nos faz fechar os vidros dos carros, de quem, todos, inclusive o Estado, se afastou. Digo isso, não por saber quem foi o morto, mas apenas com base na experiência da jurisdição criminal, porque esse é o perfil prevalente dos réus em ações penais e na população carcerária do Estado.
Seria, na minha avaliação, salutar, a partir do desventurado episódio, questionar-se sobre o valor da vida e sobre a importância do acesso à educação de razoável qualidade, à alimentação, a oportunidades de trabalho, à cultura, ao lazer, do desenvolvimento da criança e do adolescente em ambiente familiar permeado pelo afeto, e de o Estado ser capaz (financeiramente e no âmbito de sua gestão) de, em parceria com o setor privado, suprir essas demandas sociais. Ao contrário disso, sobressaltam-se as comemorações da morte de um pobre ladrão, como se matá-lo fosse uma vingança coletiva e quem materializou esse desejo tivesse cometido um ato de heroísmo.
As notícias de que uma idosa de 87 anos baleou e matou um ladrão despertaram aplausos. O indiciamento dela pela Polícia Civil gerou reclamações inflamadas contra os órgãos do Estado e tantas outras manifestações de prestígio à conduta da anciã.
Não pretendo avaliar juridicamente o caso. O que me instiga é o lado humano posto em debate. Imagino o quão mal a idosa sinta-se com o ocorrido e sou solidária a ela. Chocam-me, no entanto, as avaliações de que matar um ladrão é uma bravura. Intrigam-me também as motivações das inflamadas críticas à apuração dos fatos.
Isso porque, no Estado social de direito ou em qualquer comunidade humana, matar alguém pode ser uma atitude de desespero, mas não é um ato heroico, e deve ser apurado. Cabe, pois, ao Estado dispensar ao caso adequado tratamento jurídico, de modo fundamentado, como é próprio das conclusões do inquérito policial, da avaliação do promotor de Justiça e das decisões judiciais.
Retorno, no entanto, aos questionamentos pela visão humanística. A falta de segurança que nos aflige; contudo, o coletivo regozijo com a morte de um ladrão, como se assim estivéssemos reduzindo a violência, pavimentando um futuro melhor para as próximas gerações, ou fazendo uma limpeza dos maus para o triunfo dos bons, a exemplo do que fez Hitler, é tão mais grave e perigoso, é antidemocrático e descivilizado.
O ladrão era uma pessoa (sim, um ser humano) possivelmente privada de acesso à formação sociocultural e de amparo familiar, com vários registros policiais e usuário de crack. É um daqueles que nos faz fechar os vidros dos carros, de quem, todos, inclusive o Estado, se afastou. Digo isso, não por saber quem foi o morto, mas apenas com base na experiência da jurisdição criminal, porque esse é o perfil prevalente dos réus em ações penais e na população carcerária do Estado.
Seria, na minha avaliação, salutar, a partir do desventurado episódio, questionar-se sobre o valor da vida e sobre a importância do acesso à educação de razoável qualidade, à alimentação, a oportunidades de trabalho, à cultura, ao lazer, do desenvolvimento da criança e do adolescente em ambiente familiar permeado pelo afeto, e de o Estado ser capaz (financeiramente e no âmbito de sua gestão) de, em parceria com o setor privado, suprir essas demandas sociais. Ao contrário disso, sobressaltam-se as comemorações da morte de um pobre ladrão, como se matá-lo fosse uma vingança coletiva e quem materializou esse desejo tivesse cometido um ato de heroísmo.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Com certeza, NÃO DEVERIA SER um ato de heroísmo se as circunstâncias envolvessem apenas "uma pessoa (sim, um ser humano) possivelmente privada de acesso à formação sociocultural e de amparo familiar, com vários registros policiais e usuário de crack". Ocorre que nada disto é apresentado na ação dos bandidos quando ousam invadir uma residência, abordar um pedestre, surpreender um condutor de carro, tirotear contra a policiais e, ou atacar outras pessoas para tirar patrimônio e a vida se houver reação. É com este ponto de vista que deveria enxergar uma autoridade de justiça para cumprir sua função coativa e aplicar as leis para que a ordem, a justiça e os direitos sejam restabelecidos e respeitados por todos. Portanto, é sim heroísmo defender-se contra a ação de bandidos, mesmo que cause a morte deles, pois o normal é submeter-se a seus desmandos, ilicitudes, constrangimentos, submissão, afrontas, crueldades e execução sumária.
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