O dia em que a Justiça Brasileira se tornar sistêmica, independente, ágil e coativa, e com Tribunais fortes e juízes próximos do cidadão e dos delitos, o Brasil terá justiça, segurança e paz social.
"A Função Precípua da Justiça é a aplicação coativa da Lei aos litigantes" (Hely Lopes Meirelles)- "A Autoridade da Justiça é moral e sustenta-se pela moralidade de suas decisões" (Rui Barbosa)
MAZELAS DA JUSTIÇA
Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.
domingo, 18 de novembro de 2012
VARIAÇÕES SOBRE A JUSTIÇA
O Estado de S.Paulo , 18 de novembro de 2012 | 2h 04
CELSO LAFER - PROFESSOR EMÉRITO DO INSTITUTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS DA USP
A justiça é o tema dos temas da Filosofia do Direito por conta da força de um sentimento que atravessa os tempos: a de que o Direito, como uma ordenação da convivência humana, esteja permeado e regulado pela justiça. A palavra direito, em português, vem de directum, do verbo latino dirigere, dirigir, apontando, dessa maneira, que o sentido de direção das normas jurídicas deve ser o de se alinhar ao que é justo.
O acesso ao conhecimento do que é justo, no entanto, não é óbvio. Basta lembrar que os gregos, para lidar com as múltiplas vertentes da justiça, valiam-se, na sua mitologia, de mais de uma divindade: Têmis, a lei, Diké, a equidade, Eirene, a paz, Eunômia, as boas leis, Nêmesis, que pune os crimes e persegue a desmedida.
No mundo contemporâneo o Direito tem uma complexa função de gestão das sociedades, que torna ainda mais problemático o acesso ao conhecimento do que é justiça, por meio da razão, da intuição ou da revelação. Essa problematicidade não afasta a força das aspirações da justiça, que surge como um valor que emerge da tensão entre o ser das normas do Direito Positivo e de sua aplicação e o dever ser dos anseios do justo. Na dinâmica dessa tensão tem papel relevante o sentimento de justiça. Este é forte, mas indeterminado. Daí as dificuldades da passagem do sentir para o saber. Por esse motivo, a tarefa da Teoria da Justiça é um insistente e contínuo repensar o significado de justiça no conjunto de preferências, bens e interesses positivados pelo Direito.
Nestas variações sobre justiça vou inspirar-me no ensinamento de Bobbio, para quem o Direito se constitui como ordem pacificadora, aperfeiçoa-se como igualdade e completa-se com a liberdade. Paz, igualdade e liberdade, pondera ele, não são valores idênticos ou contrapostos. Têm esferas próprias, porém a realização da justiça, na sociedade, requer sua integração, num sempre desafiante compromisso teórico-prático.
As dicotomias paz/guerra, ordem/caos estão na raiz da natureza constitutiva do Direito como uma ordem asseguradora da paz. O Direito não elimina os conflitos. Administra sua solução por meios não violentos. É a antítese da guerra e do caos, condição da possibilidade de igualdade e da liberdade, inclusive a de viver sem medo. O que está acontecendo na Síria e o que representa a ameaça à ordem da atual violência da criminalidade organizada do PCC em São Paulo esclarecem a afirmação. Por isso, uma das clássicas acepções de justiça é a da conformidade das condutas com a lei.
Num Estado de Direito a exigência de que as leis sejam gerais e impessoais atende a outro requisito da ordem jurídica como paz: o de garantir, na convivência coletiva, a segurança da certeza do Direito, que afasta a indeterminação do agir discricionário.
Ir além da justiça como legalidade é uma exigência da Teoria da Justiça, porque qualquer ordenamento jurídico não é necessariamente justo. Requer o exame do conteúdo da lei. Nesse contexto, na lição de Aristóteles, é a igualdade que norteia a averiguação, cabendo, no entanto, lembrar que existem afinidades entre os conceitos de ordem e igualdade. A igualdade perante a lei é uma expressão dessa afinidade, porque se contrapõe à desordenada desproporção entre as partes e das partes em relação ao todo. O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do mensalão, ao afirmar a igualdade perante a lei, está assegurando justiça ao não diferenciar a conduta dos poderosos da do cidadão comum.
A igualdade é um conceito complexo, porque existem vários critérios para aferir a igualdade. Esta não se confunde com o igualitarismo, que postula que todos devem ser iguais em tudo, rejeitando, dessa maneira, a diversidade da condição humana. Numa sociedade pluralista e democrática não cabe aplicar, para se realizar a justiça, um único critério de igualdade. Todos têm sua validade no âmbito de determinadas esferas. Assim, por exemplo, cabe aplicar o critério da necessidade para a concessão da Bolsa-Família; o do mérito para o da concessão, pela Fapesp, do financiamento de projetos de pesquisa; o da capacidade contributiva para nortear a tributação. A busca da igualdade dos pontos de partida norteia o critério de justiça das políticas afirmativas. É por esse motivo que o recorrente desafio para a Teoria da Justiça é o da síntese e da conciliação das várias vertentes da igualdade, voltadas para aperfeiçoar, numa sociedade, a dimensão do Direito como ordem.
A justiça, numa sociedade, tende a se completar quando o Direito, como a paz da ordem aperfeiçoada pela igualdade, ensejadora de um viver sem miséria, permite a fruição da liberdade. A liberdade, como a igualdade, tem muitas vertentes, mas é uma aspiração das sociedades contemporâneas que se contrapõe às excludentes dicotomias senhor/escravo, rei/súdito. A justiça, como liberdade, parte da asserção kantiana de que a pessoa humana não tem preço, mas a dignidade de ser um fim em si mesma, não redutível à natureza ou ao todo sociopolítico. Existe a dimensão da liberdade como não impedimento, ou seja, como uma esfera de atividades do ser humano não controlada pelo Estado e pela sociedade, assim como a liberdade de participação nas deliberações coletivas, que está na raiz da democracia. São desdobramentos da liberdade, por exemplo, a liberdade religiosa, que postula a tolerância, a liberdade de associação, a liberdade de pensamento e de sua expressão não censurada, a liberdade de iniciativa. O Direito assegura a justiça como liberdade quando constrói as condições apropriadas para a coexistência das liberdades, ou seja, quando cria a moldura para que a liberdade de um não se transforme em não liberdade para os outros. É nesse sentido que se pode falar em igualdade na liberdade, numa ordem jurídica alinhada com as aspirações do justo.
O mundo não é uma realidade necessária, mas um conjunto de possibilidades. É o que permite afirmar o papel e o valor de uma Teoria da Justiça que integre, de maneira pluralista, no Direito Positivo, a ordem, aperfeiçoada pela igualdade e pela liberdade.
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