FOLHA.COM 13/09/2012 - 03h30 . Tendências/Debates:
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
ANTÔNIO CLAUDIO DA COSTA MACHADO
Apesar do brilho da equipe encarregada de elaborar um novo projeto de
Código de Processo Civil, aquele, ora em discussão no Congresso
Nacional, merece reparos, como têm inúmeras instituições de juristas, no
país inteiro, procurado demonstrar.
As críticas maiores ao
Projeto de Lei 8.046/2010 se referem a ele entregar aos juízes poderes
enormes para a solução dos conflitos, diminuindo perigosamente, em
contrapartida, os direitos das partes e dos advogados, o que colocará em
grande risco o direito de um justo processo legal e, como consequência,
a própria integridade de todos os nossos direitos tão arduamente
conquistados nas últimas décadas. Fere, inclusive, o direito a ampla
defesa assegurado constitucionalmente (artigo 5º, inciso LV).
Para se ter uma ideia das questionáveis propostas de alteração trazidas, basta elencar algumas:
1) Os juízes poderão decidir tudo em matéria probatória sem que caiba
qualquer recurso --se o juiz não admitir uma perícia, um documento ou
uma testemunha que a parte reputa importante para provar o seu direito,
nada poderá ser feito para mudar a decisão de imediato;
2) Os
juízes poderão conceder medidas antecipatórias (verdadeiras sentenças no
início do processo) com grande facilidade, apenas à vista de um bom
documento apresentado pelo autor;
3) Os juízes poderão
determinar a constrição de bens, móveis ou imóveis, inclusive contas
bancárias e aplicações do réu, sem critérios estabelecidos precisamente
pela lei (medidas como arresto, sequestro, busca e apreensão,
arrolamento serão concedidas e executadas com enorme agilidade, segundo a
vontade do magistrado);
4) Os juízes poderão proferir suas
sentenças (as decisões finais das causas) observando princípios
abstratíssimos, como "dignidade da pessoa humana", "proporcionalidade" e
"razoabilidade", o que vai facilitar enormemente o subjetivismo
judicial e a desconsideração de normas legais de todo tipo e de
contratos, abalando os alicerces da segurança jurídica;
5) As
sentenças serão executadas imediatamente, sem a necessidade de
confirmação por um tribunal, o que significará, a um só tempo, a
eliminação do direito de cada um de nós a "uma segunda opinião" (de um
colegiado composto por magistrados mais experientes) e a diminuição
considerável da possibilidade de conserto de decisões injustas.
Enfim, instituir-se-á um Judiciário praticamente de instância única,
para a maioria dos casos, em direta afronta aos valores constitucionais
do Estado de Direito.
E por pior é que toda esta celeridade que se deseja emprestar ao
processo a qualquer custo não vai resolver os problemas da lentidão da
nossa Justiça, que não é decorrente dos defeitos da lei processual, mas
sim da falta de vontade política e orçamentária para investir nos
Judiciários estaduais, da falta de informatização de pessoal e de
capacitação dos servidores, da falta, em suma, de um choque de gestão
que traga o estrito profissionalismo para a administração do Poder
Judiciário brasileiro.
Miremo-nos nos exemplos das Justiças do
Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e, hoje, do Rio de Janeiro, em que
as apelações são julgadas em meses. Lá, os processos não precisam de um
novo código para se mostrarem rápidos e suficientes, seguros o bastante
para garantir o jogo equilibrado da discussão das partes e, sobretudo,
justos como todo processo deve ser em uma democracia.
IVES
GANDRA DA SILVA MARTINS, 77, é advogado e professor emérito da
Universidade Mackenzie; ANTÔNIO CLAUDIO DA COSTA MACHADO, 52, é
professor de direito processual civil da USP, da Unifieo e da EPD
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O que está faltando no Brasil é a independência real, a desburocratização, a aproximação nos delitos, mediações e conflitos e
o fortalecimento do Poder Judiciário como supervidor ativo dos sistemas de justiça criminal e de justiça cívil, onde o judiciário e as funções
essenciais à justiça passariam a sintonizar na aplicação da lei e na defesa de direitos, promovendo audiências oportunas, agilizando os processos e atendendo os objetivos de interesse coletivo em prol da lei,
da ordem e da justiça. Mas para isto, é necessário que se fortaleça o juiz natural e encerre a maioria dos processos nos Tribunais regionais, deixando para as cortes supremas apenas o transito em julgado para casos de repercussão e relevância. Hoje, apesar dos bons exemplos locais de dinamismo, a justiça brasileira é arcaica, morosa e inoperante. Não atende o que se deseja dela na aplicação das leis, especialmente quando enfrenta o poder político e financeiro.
O dia em que a Justiça Brasileira se tornar sistêmica, independente, ágil e coativa, e com Tribunais fortes e juízes próximos do cidadão e dos delitos, o Brasil terá justiça, segurança e paz social.
"A Função Precípua da Justiça é a aplicação coativa da Lei aos litigantes" (Hely Lopes Meirelles)- "A Autoridade da Justiça é moral e sustenta-se pela moralidade de suas decisões" (Rui Barbosa)
MAZELAS DA JUSTIÇA
Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.
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