REVISTA ISTO É N° Edição: 2236, 16.Set.12 - 08:41
ENTREVISTA: Francisco Falcão
"Quem ocupa cargo público deve abrir o Imposto de Renda"
Novo
corregedor do Conselho Nacional de Justiça promete não recuar no
trabalho de afastamento dos maus juízes, a que chama de "maçãs podres"
por Marta Salomon
AUSTERIDADE
Corregedor do CNJ prepara corte nos salários de juízes
A
comparação com a ex-corregedora Eliana Calmon tem sido inevitável nos
primeiros dias de Francisco Falcão no cargo de xerife do Conselho
Nacional de Justiça, órgão que fiscaliza a atuação de 16 mil juízes. Aos
60 anos de idade e 24 de magistratura, o pernambucano discreto armou-se
de propostas polêmicas para começar o mandato de dois anos. Nesta
entrevista, Falcão diz que prepara o corte dos salários de juízes que
ganham mais do que os ministros do Supremo Tribunal Federal ou R$ 26,7
mil mensais. “Vamos cortar”, anuncia. Falcão também defende que todas as
autoridades públicas – sejam juízes, sejam parlamentares ou integrantes
do Executivo – abram dados do Imposto de Renda na internet.
"Em matéria de rigor, vocês (magistrados) correm o
risco de sentir saudade da ministra Eliana Calmon"
"Quando era presidente do Congresso, o ACM pediu preferência
num processo. É natural. É demagogia dizer que não existe"
Istoé - Quais as semelhanças e diferenças entre o sr. e a sua antecessora, Eliana Calmon?
Francisco Falcão - Entramos juntos no Superior Tribunal de Justiça em
1999, fomos sabatinados juntos, integramos a mesma sessão de direito
público e, mais uma coincidência, moramos já há cinco ou seis anos no
mesmo prédio. Tenho um estilo muito parecido com o dela em matéria de
rigor. Talvez eu seja até mais rigoroso do que ela, só que procuro agir
de uma forma mais discreta. Cada pessoa tem o seu temperamento. No
fundo, o resultado será o mesmo. Inclusive ela me disse que tinha muita
gente apostando que, quando o Falcão assumisse, as coisas iam mudar. Mas
quem estiver pensando que vai haver modificação no trabalho está
completamente enganado.
Istoé - Na sua posse, o sr.
investiu contra o que chamou de “maçãs podres” do Judiciário. É o
equivalente, no seu vocabulário, aos “bandidos de toga” a que a ministra
se referia? O sr. acha que ela foi feliz na expressão, criticada por
entidades de juízes?
Francisco Falcão - Eu não queria
fazer esse comentário. Foi uma expressão que ela usou, e ela mesma me
disse que não foi para chamar todo mundo de bandido. O que ela quis
dizer é que havia maçãs podres, o mesmo que estou dizendo agora, só que
eu acho que não é essa quantidade tão grande. Existe uma minoria, que
espero que seja uma minoria mínima, do que eu chamo de maus juízes, de
vagabundos. E essas maçãs podres é que temos de extirpar do Poder
Judiciário, sob pena de prejudicar a imagem da instituição.
Istoé - Qual será o seu método para chegar aos maus juízes?
Francisco Falcão - O meu trabalho é exatamente trabalhar com as
corregedorias. Onde os corregedores não punirem, nós vamos agir. E punir
quem estiver errado. Inclusive o corregedor, se for o caso.
Istoé - O que exatamente o sr. chama de maçã podre?
Francisco Falcão - As notícias que correm são de que aqui e acolá, num
tribunal ou em outro, é comum ter essas pessoas que se desviam do
interesse público para o interesse privado. A corrupção é algo
intolerável, mas há também os maus juízes, aqueles que não trabalham,
que não residem na comarca. Um dos pontos da nossa administração vai ser
garantir a presença do juiz no local de trabalho. Hoje você vai a uma
comarca do interior da Paraíba, por exemplo. O juiz está lá terça e
quarta-feira. Segunda, quinta e sexta-feiras, não tem ninguém.
Istoé - Que punição o sr. defende para esses juízes?
Francisco Falcão - Afastar do Judiciário. Há uma polêmica que envolve
essa questão da aposentadoria com remuneração. Temos de assegurar ao
magistrado a remuneração com base no que ele contribuiu. Não temos como
aposentar e dizer que não vai receber nada. O que se faz é conceder
aposentadoria proporcional ao tempo de serviço. O magistrado que tiver
mais de 35 anos de serviço sai com aposentadoria integral, o que é um
prêmio. Agora, eu defendo o ressarcimento ao erário, uma medida em
discussão no Congresso. O juiz vendeu uma sentença, cobrou R$ 100 mil,
tem de devolver isso para o Fisco. Não deve haver apenas a condenação
penal e a perda do cargo, mas o ressarcimento ao erário do dano causado.
Istoé - E o sr. admite que o CNJ possa quebrar o sigilo dos investigados?
Francisco Falcão - A Constituição Federal garante a todos o sigilo
fiscal, bancário e telefônico. A corregedoria não fará nenhuma quebra de
sigilo sem autorização judicial. Eu, pessoalmente, defendo, a exemplo
do que ocorre nos Estados Unidos, que nenhuma autoridade pública tenha
direito a sigilo. É um tema que mais cedo ou mais tarde vai voltar a ser
discutido, e eu espero que um dia esse sigilo acabe no Brasil. Quem
exercer cargo público deve ter o Imposto de Renda aberto na internet.
Nós já encaminhamos as nossas declarações ao Tribunal de Contas, mas
isso tem de ser aberto para qualquer cidadão.
Istoé - A que
o sr. atribui a expectativa favorável da Associação dos Magistrados
Brasileiros à sua atuação? A AMB chegou a ir ao Supremo contra os
poderes do CNJ.
Francisco Falcão - Não sei. Sou filho de
juiz. Tenho um temperamento mais ponderado. Mas não confundam
ponderação com falta de rigor. Inclusive, em visita ao tribunal de São
Paulo, fiz questão de dizer na frente do presidente da AMB, doutor
Nelson Calandra: “Olha, não se confunda humildade e discrição com falta
de rigor. Em matéria de rigor, vocês correm o risco de sentir saudade
da ministra Eliana”.
Istoé - A ministra Eliana costuma dizer que ninguém chega ao STJ sem um padrinho político. Quem são os seus?
Francisco Falcão - É verdade, ninguém chega ao STJ sem padrinho, embora
eu tenha sido o primeiro lugar da lista quando concorri aqui. Na época,
quem me ajudou muito foi o vice-presidente Marco Maciel, pernambucano,
meu primo, o então governador do Ceará, Tasso Jereissati, e o senador
Antônio Carlos Magalhães. Também o governador de Pernambuco na época,
Jarbas Vasconcelos. E isso é bobagem. Estou aqui já há 13 anos e nunca,
nunca Marco Maciel me fez um pedido.
Istoé - E os demais?
Francisco Falcão - O ACM uma vez me pediu a preferência, quando era
presidente do Congresso. Disse: “Tem um processo aí, se puder julgar
isso rápido.” Só isso, o que é uma coisa natural. O processo político é
inevitável. Como você vai fazer se não tiver uma pessoa na área
política? É demagogia dizer que não existe isso.
Istoé - A
ministra Eliana Calmon reclamou que há filhos de ministros e ministros
aposentados que advogam. O sr. vê conflito de interesses?
Francisco Falcão - Há duas categorias de filhos de ministros que
advogam. Eu tenho dois filhos que advogam. Uma filha com 36 e outro com
31. Recolhem Imposto de Renda, têm escritórios em São Paulo e em
Brasília e advogam com procuração nos autos. Não posso impedir. Nunca
aconteceu conflito de interesses, porque na turma em que eu oficiei, que
é a primeira turma, eles não advogam. Na corte especial, em que eu
atuava, acho que já tiveram um ou dois casos. Eles fazem a sustentação
oral deles, eu me retiro do plenário. Posso falar pelos meus filhos.
Pelo dos outros, eu prefiro não falar. A gente sabe que há filhos de
desembargadores que tomam causas dos escritórios. Isso a OAB tem de ir
em cima.
Istoé - O sr. já teve parentes trabalhando em seu gabinete.
Francisco Falcão - Em 1995 e 1996, não havia proibição legal. Isso era
uma prática no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Todos
empregavam. O presidente Fernando Henrique tinha uma filha que era
secretária particular dele. Não havia proibição. E eu tinha uma irmã que
trabalhava comigo. Exigia expediente e ela cumpria. E depois uma filha
minha, a que é advogada até hoje, trabalhou comigo também.
Istoé -
Existe uma proposta em discussão no Congresso de o CNJ passar a
fiscalizar também os conselheiros e ministros de Tribunais de Contas. O
sr. apoia?
Francisco Falcão - Vamos aguardar o que o
Congresso vai decidir. Já temos muito trabalho. Aliás, já orientei que
vamos cuidar do essencial, não vamos ficar na perfumaria. É por isso que
eu digo que vou delegar um pouco aos corregedores estaduais. São 16 mil
juízes e, se eu trouxer tudo para a corregedoria nacional, não vou
fazer nada. Por exemplo, teve o caso aqui de Goiás, o de um juiz que foi
apanhado vendendo uma sentença. É a primeira maçã podre. Já estou
assinando o despacho. Parece que cobrou R$ 96 mil para dar uma sentença.
Já estou mandando para a corregedora do Tribunal de Justiça de Goiás
instaurar um procedimento. Vou dar um prazo de 60 dias para ela se
pronunciar. Se o Tribunal não se pronunciar nesses 60 dias, aí eu vou
em cima da corregedora. Quando for um caso de repercussão nacional,
importante, de maior gravidade, aí eu trago para o CNJ.
Istoé - Quais as suas prioridades?
Francisco Falcão -
Olhe, existe uma cidade vizinha ao Recife, chama-se Jaboatão dos
Guararapes. Lá, existem mais de dois mil júris para serem realizados. O
que significa isso? Mais de duas mil pessoas perderam a vida, os
bandidos estão soltos e não ocorre o julgamento. Então vamos fazer um
mutirão lá em Jaboatão para em pouco tempo zerar isso daí. Depois, vamos
fazer em São Paulo.
Istoé - Por que Jaboatão?
Francisco Falcão - É uma cidade pequena do interior com dois mil júris.
Vamos dizer que São Paulo tenha 20 mil, mas São Paulo é um país. Outra
prioridade é o que chamamos de Justiça Plena. A questão é dar celeridade
a processos de grande relevância, de grande interesse nacional, tipo
usina de Belo Monte. O juiz vai lá, dá uma liminar, segura o processo e o
país fica parado na mão de um juiz. E o que nós vamos fazer? Não vamos
pedir ao juiz que vote contra nem a favor. Mas, sim, que dê celeridade.
Outra prioridade é a questão dos vencimentos.
Istoé - Reajuste salarial?
Francisco
Falcão - Não, o cumprimento do teto salarial. Estamos apenas esperando
que o Supremo decida. Na hora em que o Supremo decidir, e acredito que o
Supremo vai dizer que o que vale é o teto, ninguém poderá ganhar mais
do que ministro do STF. Hoje, há desembargadores que ganham o dobro de
um ministro do STF. É um absurdo. A corregedoria vai atuar. E vamos
cortar na hora.
Istoé - Qual o principal desafio no mandato de dois anos?
Francisco Falcão - Tenho uma responsabilidade muito grande. Além de
defender meu próprio nome, tenho de defender uma biografia, o nome do
meu pai. O desafio é prestigiar o Poder Judiciário, porque as
instituições ficam e a gente passa.
O dia em que a Justiça Brasileira se tornar sistêmica, independente, ágil e coativa, e com Tribunais fortes e juízes próximos do cidadão e dos delitos, o Brasil terá justiça, segurança e paz social.
"A Função Precípua da Justiça é a aplicação coativa da Lei aos litigantes" (Hely Lopes Meirelles)- "A Autoridade da Justiça é moral e sustenta-se pela moralidade de suas decisões" (Rui Barbosa)
MAZELAS DA JUSTIÇA
Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.
Nenhum comentário:
Postar um comentário