ARTIGOS
por Francisco Rossal de Araújo*
A greve é um sagrado direito dos trabalhadores. No plano coletivo, é a forma mais eficiente de pressionar seus patrões a fim de obter melhorias de seus salários e de suas condições de trabalho. Quando se faz greve, se renuncia à violência. Entretanto, não se faz greve sem causar prejuízo, pois, do contrário, a greve não serviria para seus propósitos, não fazendo pressão alguma. São justamente esses prejuízos que abrem o caminho para a negociação e a solução pacífica do conflito laboral.
É um direito tão importante, que está assegurado na Constituição Federal (art. 9º). O Estado, diz a Constituição, não pode intervir nos motivos que levam à greve. Porém, como todo e qualquer direito, não pode ser exercido sem limites. A vida em sociedade nos impõe respeitar os demais para que possamos viver de forma civilizada. Esse é o grande desafio do direito de greve: exercer o direito e respeitar seus limites. É por isso que a própria Constituição remete à lei a tarefa de regulamentar o exercício do direito de greve, em especial nos serviços essenciais à comunidade.
Muitos serviços prestados por empresas, sejam elas públicas ou particulares, dizem respeito a serviços imprescindíveis a uma comunidade, como, por exemplo, o fornecimento de água, luz, saúde e transporte público, entre outros. São serviços cuja natureza transcende pela sua importância vital. Nesses casos, por mais legítimo que seja o direito de greve, ele deve ser exercido com limitações, pois o interesse público sempre prevalece quando em confronto com o interesse de uma classe. Devem ser prestados serviços mínimos, em quotas a serem fixadas pela negociação coletiva ou, quando esta se mostre inviável, pela Justiça do Trabalho, que é o órgão com atribuição constitucional para fazê-lo.
A atual greve no transporte rodoviário de Porto Alegre mostra como é perigoso o desrespeito a esses ditames mínimos de legalidade, mas, sobretudo de racionalidade, bom senso e respeito pela convivência social. As dificuldades na solução do conflito mostram que algo está errado quando o sistema de negociação coletiva não funciona, falta civilidade à categoria profissional e o poder público não tem alternativa.
Os trabalhadores, em que pesem suas justas reivindicações, não podem colocar toda a população como refém de seus caprichos. O poder público precisa repensar o sistema de concessões e cálculo de tarifa e a Justiça do Trabalho tem o desafio de fazer cumprir suas decisões.
O que não pode é a população penar nas paradas de ônibus, em um clima de calor infernal, à espera de um transporte coletivo que não vem. O que os trabalhadores do transporte coletivo precisam, com todo o respeito aos motivos de sua paralisação, é pensar na velha lição que aprendemos em casa: meu direito termina onde começa o do outro.
*Desembargador federal do Trabalho (TRT 4ª Região) e professor de Direito do Trabalho e Economia Política (UFRGS)
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