JOSÉ RENATO NALINI
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) completa hoje 140 anos. Surgiu formalmente em 3/2/1874. Desde então sua missão é solucionar problemas humanos a partir de uma leitura da letra da lei incidente sobre os conflitos. Produziu 83 milhões de processos, hoje um dos desafios postos à sua administração. Tem mais de 20 milhões de ações em curso, 12 milhões das quais são execuções fiscais, fórmula judicial de cobrança de dívidas estatais.
Ao longo do tempo se agigantou. É o maior tribunal do Brasil e do planeta. Não se conhece outro Judiciário com 360 julgadores de segunda instância titulares, além de considerável número de magistrados em atuação nesse duplo grau de jurisdição. E mais de 2 mil juízes de primeira instância. Para atender às suas finalidades alcançou número superior a 45 mil funcionários. E não pode prescindir de terceirizados, de estagiários e de servidores postos à disposição pelos municípios.
Há motivos para comemorar a data. Se nenhum humano consegue atingir 140 anos de idade, o TJSP é jovem na História da civilização. Desde Tristão de Alencar Araripe, o cearense que foi seu primeiro presidente, até Ivan Sartori, que encerrou o mandato em 31 de dezembro de 2013, 77 gestões se sucederam. Mas milhares de pessoas edificaram a tradição do Judiciário paulista e continuam a acrescentar méritos à sua atuação.
Os tempos são outros, desde a São Paulo da segunda metade do século 19. A insensata conurbação que esvaziou o campo e inflou as cidades é uma das causas evidentes da proliferação de discórdias. A população descobriu o Judiciário e parece não enxergar outra maneira de buscar respostas para todo e qualquer problema senão ingressar em juízo. A anomalia no funcionamento dos três clássicos Poderes obrigou a Justiça a um protagonismo que é singelamente denominado "ativismo judicial". Sem a detida pausa sobre o fato de que juiz não começa processo. Não tem a iniciativa. Só age se provocado. E quando provocado é obrigado a responder. Não existe "ativismo", portanto, senão excessiva provocação da Justiça. Ela não tem como deixar de outorgar a jurisdição pleiteada.
Tudo isso custa dinheiro. Para um Judiciário gigantesco, os orçamentos são sempre deficitários. Primeiro, porque não existe a autonomia financeira do Judiciário proclamada na Constituição. O orçamento encaminhado ao Executivo é sempre mutilado para ajuste à Lei de Diretrizes Orçamentárias. Já se inicia o ano com insuficiência para atender às obrigações indeclináveis, quase todas oriundas de despesas com pessoal. O Judiciário é serviço público. É a administração estatal exercida pelo terceiro eixo dentre os Poderes da República, aquele encarregado de realizar o justo concreto. É um serviço que precisa ser eficiente. Para isso, além de estruturas racionais, tem de remunerar condignamente seus quadros. Da qualidade de suas pessoas depende a qualidade do serviço prestado.
Em seguida, há o impacto de medidas alvitradas no âmbito de uma gestão, submetidas à análise do Parlamento e sancionadas pelo Executivo. Se os três Poderes concluíram ser indispensável a reestruturação de quadros, a concessão de alguns benefícios para estimular os servidores, é preciso agora pôr à disposição recursos que atendam a essas iniciativas.
Outros Estados da Federação têm por si a destinação integral dos emolumentos das serventias extrajudiciais. Os antigos "cartórios" desenvolvem um trabalho essencialmente ligado ao Judiciário, o Poder encarregado pelo constituinte de orientar, disciplinar, controlar, fiscalizar e exercer contínua tutela sobre tais serviços. Em São Paulo o destino dos emolumentos não é, como deveria ser, o Fundo Especial de Despesas do Tribunal de Justiça. Tampouco se consegue reservar porcentagem mínima da tributação recolhida no Estado para preservar a autonomia do Judiciário. Assim a Justiça está continuamente à mercê da compreensão e boa vontade de quem detém o controle do erário.
É conveniente que a população se conscientize da situação. E que os cérebros radicados em São Paulo, o maior centro intelectual da América Latina, se disponham a raciocinar para oferecer novas perspectivas a uma Justiça que serve a todos. Como obter aportes do poder público e também conscientizar a comunidade de que é indeclinável contribuir para o aprimoramento da Justiça?
Os municípios já colaboram, mas é urgente intensificar essa parceria. Pois o município é entidade da Federação e não dispõe de Justiça municipal. O munícipe é atendido pela Justiça Estadual. Esta a grande provedora das pretensões da cidadania, que nem sempre tem causas federais. Até porque a União, embora o grande sorvedouro dos tributos que são os mais elevados e desproporcionais ao retorno propiciado ao contribuinte, na rotina está bem distanciada das reais aflições do munícipe. Por sinal, uma boa iniciativa seria ressarcir a Justiça Estadual do trabalho que presta à Justiça Federal, resolvendo processos que não são de sua competência, em todas as comarcas em que não existem Varas Federais.
Enfim, se há motivos para celebrar a data, sobejam aqueles para fazer que a consciência cidadã se debruce para encontrar maneiras de conferir eficiência à Justiça. Que ela precisa ser eficiente não padece dúvida alguma. É serviço público, é administração pública, está sob o comando do artigo 37 da Constituição, que, a par da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, exige eficiência de toda prestação estatal.
O presente que o TJSP gostaria de receber neste 140.º aniversário é a compreensão e o envolvimento efetivo e afetivo de todos. Público interno, que não desconhece as dificuldades enfrentadas, e público externo, destinatário das respostas jurisdicionais, mas também conclamado a se conscientizar de que justiça não é problema exclusivo de juízes, promotores, advogados e demais carreiras jurídicas. Justiça é bem essencial, que afeta a todos e sem o qual não há convívio digno nem democracia que mereça esse nome.
PRESIDENTE DO TJSP
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