ZERO HORA 15 de novembro de 2013 | N° 17615
ARTIGOS
Claudio Lamachia*
Pode parecer estranho que no mesmo instante em que vivemos a era digital, da superinformação e da conectividade, tenhamos que questionar se a Justiça brasileira está efetivamente capacitada para tomar o rumo do processo judicial sem papel, ou seja, plenamente informatizado.
Será o advogado um retrógrado, um antitecnológico, uma classe profissional que se opõe a mudanças no atual sistema processual? A resposta é não! Aliás, muito pelo contrário. A advocacia sabe que o Processo Judicial Eletrônico (PJe) é uma das ferramentas capazes de minimizar um dos maiores problemas do sistema judicial brasileiro: a morosidade.
A nova realidade vem com a promessa de ser mais célere e econômica, além de mais cômoda, uma vez que o Processo Eletrônico permitirá uma atuação mais centrada no escritório do que no foro. No entanto, a experiência vivida até aqui pelos profissionais tem sido diversa.
Implantado de forma açodada, sem a necessária maturação do sistema, ou mesmo a unificação da plataforma, o PJe tem se mostrado muitas vezes ineficiente, excludente e inseguro.
São comuns, por exemplo, os relatos de instabilidade no sistema, que impede que os advogados possam peticionar ao longo de horas, indo na contramão daquele que deveria ser o maior trunfo do seu funcionamento.
Some-se a isso a pluralidade de sistemas que foram criados em todo o país, cada um com sua característica e singularidade, tornando ainda mais complexo algo que deveria servir para simplificar a atuação cotidiana do advogado.
Essas mudanças abruptas não ajudam em nada a tarefa de popularizar o processo eletrônico. O Judiciário peca ao acelerar um trâmite que deveria ser gradual. A Receita Federal, por exemplo, tomou esse cuidado quando criou a declaração de imposto de renda pela internet. Manteve em funcionamento o sistema de declaração em papel e disquete durante alguns anos, até que naturalmente houve a transição para o sistema plenamente eletrônico, quando os contribuintes já haviam se acostumado e, principalmente, aderido ao sistema por sua praticidade e confiabilidade.
Além disso, é preciso que o sistema seja devidamente adaptado para atender às necessidades daqueles que tenham necessidades especiais, como os idosos ou deficientes visuais.
Outro ponto fundamental a ser considerado é o atraso estrutural do Brasil na área das telecomunicações, que resulta em um enorme entrave para o exercício da advocacia. Enfrentamos grandes dificuldades com o péssimo serviço prestado pelas empresas de telefonia e internet banda larga.
Como sabemos, o “apagão” das conexões é algo usual nas capitais, e nas cidades que integram as regiões mais distantes das metrópoles a realidade é ainda pior, e não se pode conceber que o Judiciário leve adiante o processo eletrônico sem que haja condição plena de acesso à internet nas mais longínquas comarcas.
Há que se discutir a viabilidade de implantação de uma banda larga mais veloz e confiável, que possa garantir a todos os usuários do sistema meios de evitar que haja perda de prazos por falta de estrutura e inoperância dos fornecedores do serviço.
Diante de tantos problemas ainda sem solução, será que a urgência imposta pelo Judiciário para implantação plena do processo eletrônico não está atropelando a prudência e colocando em risco a sociedade que busca por justiça?
*VICE-PRESIDENTE NACIONAL DA OAB
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não há mais paciência para suportar uma justiça morosa, burocrata e sobrecarregada por volumes e mais volumes de processos, sendo impossível aos magistrados, servidores da justiça e estagiários tratarem com cuidado como merece cada caso, ainda mais diante do crescimento das demandas. A justiça precisa de uma revolução processual, jurídica, judiciária e de postura dos magistrados. Está na hora de construir sistemas de justiça criminal, cívil e tributária; criar os juizados de instrução e de garantia; descentralizar o transitado em julgado nos tribunais regionais; fortalecer o juiz de primeira instância; aumentar o número de varas, juízes e servidores; reduzir o inquérito policial para o relatório circunstanciado da autoridade policial (com as provas anexadas); promover audiências presencial e oral para solucionar a maioria dos casos que hoje estão em papel. Hoje, a morosidade, a forma assistemática de conduzir a justiça e a sobrecarga burocráticas estão falindo e tornando inoperante a justiça no Brasil, estimulando a impunidade, os interesses corporativistas e o descrédito junto à população.
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