O ESTADO DE S.PAULO 13 Julho 2014 | 02h 03
OPINIÃO
Três semanas depois de o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) ter determinado a prisão preventiva por tempo indeterminado de um magistrado de primeira instância acusado pela Polícia Federal de fazer tráfico de influência em Varas de Execuções Criminais na comarca de Juiz de Fora, de cobrar propina para favorecer os integrantes do bando que realizou o maior roubo a banco da história do País e de chefiar o núcleo jurídico de uma das principais quadrilhas do narcotráfico na Região Sudeste, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) condenou à pena de oito anos e quatro meses de prisão em regime fechado outro juiz de primeira instância, por crime de concussão.
Os dois casos mostram os problemas que as corregedorias judiciais enfrentam para cumprir suas funções fiscalizadoras. Se fossem menos corporativas e mais rigorosas no cumprimento de suas atribuições, magistrados indignos da toga teriam sido punidos muito tempo antes e os abusos e as ilegalidades por eles cometidos não teriam chegado ao ponto que atingiram. Titular da 7.ª Vara Cível de São Bernardo do Campo, no ABC, o magistrado punido pelo TJSP extorquiu 177 vezes um empresário de Santo André, exigindo da vítima dinheiro e bens para não converter em falência o processo de recuperação judicial de sua empresa, especializada em frisos e molduras para automóveis.
A extorsão foi realizada entre 2008 e 2011 e a lista de exigências do juiz, segundo a denúncia da Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo, é extensa, variada e até bizarra. Ao longo desses três anos, ele exigiu do empresário uma propina de R$ 20 mil depositada todos os meses - inclusive pagamentos relativos a uma espécie de 13.º salário do suborno. Os pagamentos foram realizados em hotéis, cafés e até mesmo nas dependências da 7.ª Vara Cível, no Fórum de São Bernardo. O juiz também determinou a compra de uma gargantilha de ouro cravejada de esmeraldas e de relógios de grifes luxuosas, como Rolex e Bvlgari, em joalherias por ele impostas e a entrega das peças em sua residência.
Os procuradores do Ministério Público estadual lembram que o magistrado pediu três canetas da marca Mont Blanc, um notebook da marca Sony Vaio, malas de viagem Louis Vuitton, ternos de fio especial da Brooksfield, um telefone celular modelo iPhone e xampus de R$ 500 a unidade. Obrigou a vítima a pagar o conserto das rodas de seu automóvel. E ainda a mandou pagar uma homenagem que lhe foi prestada pela Academia Brasileira de Arte, Cultura e História - uma organização da sociedade civil de interesse público instalada numa casa colonial no bairro do Morumbi. Segundo seu site, a Academia foi criada para promover "o conservadorismo intrínseco na história agregando elementos necessários à inovação", valorizar "as marcas de um tempo antigo, mas fundamental para o estabelecimento de nossa sociedade", fomentar "arte, novos talentos e novas exposições", "abrir espaços para divulgação da cultura e a história" e desenvolver "projetos em países como Estados Unidos, Itália, Portugal, Argentina e Punta del Este" (sic!).
Além de responder a processo judicial no TJSP, no plano administrativo o juiz da 7.ª Vara Cível de São Bernardo vem sendo investigado desde 2011 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Na defesa que apresentou ao Órgão Especial do TJSP, ele negou os crimes e alegou que só manteve "encontros casuais" com o empresário do ABC. Alegando que o Órgão Especial - formado pelos 25 desembargadores mais antigos do tribunal - "não analisou as provas com o costumeiro acerto", seu advogado já afirmou que impetrará recurso.
Até o momento, o TJSP e o CNJ cumpriram de forma impecável seus respectivos papéis, nos planos judicial e administrativo. Mas, sejam quais forem as decisões definitivas que vierem a tomar, uma coisa é certa: tanto este caso quanto o do TJMG deixam claro que as corregedorias da Justiça precisam ser reorganizadas, para se tornarem mais eficientes. Fossem elas mais rigorosas, juízes corruptos não teriam conseguido ir tão longe.
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