EDITORIAL
Homem (64%), branco (83%) e casado ou em união estável (78%). Em termos educacionais, 100% concluíram curso superior, como não poderia deixar de ser, e 16% têm mestrado, doutorado ou pós-doutorado. Esse é o perfil do juiz brasileiro típico, segundo estudo que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgou nesta semana.
Baseado em questionários autoaplicados, o chamado "Censo do Poder Judiciário" –o primeiro do tipo para a magistratura nacional– contou com respostas de 64% dos 16.812 juízes, um índice de adesão relativamente elevado em pesquisas com essa metodologia.
Seus resultados contrastam de forma evidente com os do Censo do IBGE. No conjunto da população, as mulheres são maioria (51%), e os brasileiros que vivem em união conjugal são 50%; já os brancos ficam em 48%, enquanto os pardos representam 43% (e 14% na magistratura); quanto ao ensino superior, perto de 8% o concluíram.
Seria impossível, e mesmo indesejável, fazer o corpo do Judiciário corresponder exatamente ao perfil da população. A razão mais óbvia é que, exceto para o Supremo Tribunal Federal, possuir bacharelado em direito é condição necessária para ingressar na carreira.
Num desdobramento desse truísmo, parte das diferenças mais gritantes, como as características raciais, pode ser atribuída às desigualdades educacionais no país.
Corrigir essa distorção sem arriscar a qualidade de um dos Poderes da República passa por melhorias na distribuição de renda e sobretudo no sistema de ensino. A ninguém interessa um Judiciário que selecione seus quadros por critérios que não sejam o preparo dos candidatos a magistrado.
Disparidades como a de gênero e de nupcialidade, porém, não se explicam pela educação. Chama a atenção que a preponderância masculina entre juízes ingressantes na carreira seja estável desde os anos 90; de lá para cá, entretanto, as mulheres passaram a constituir maioria nos cursos de direito.
O risco de um fosso profundo entre o juiz típico e o de seus jurisdicionados é que deixe de percebê-los como semelhantes e de compartilhar visões de mundo com eles.
Depois que a neurociência e a psicologia revelaram os inúmeros vieses aos quais os seres humanos estão sujeitos, a noção mais próxima do ideal de imparcialidade é o princípio da igual consideração de interesses –que, para funcionar a contento, depende de alguma empatia entre o magistrado e aqueles que por ele serão julgados
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