Maior beneficiado do processo eletrônico é o cidadão - POR SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, Consultor Jurídico, 16/01/2011
A década que se encerrou em dezembro de 2010 foi marcada pelo período de modernização estrutural do Poder Judiciário. Tivemos a reforma do Poder Judiciário e a criação do Conselho Nacional de Justiça. E se todas as metas não foram atingidas, o rumo foi traçado: maior envolvimento dos juízes com a administração judicial, planejamento estratégico, conciliação e uso intenso da mais moderna tecnologia, sobretudo da Internet, aí incluído o processo totalmente digital.
Assim mesmo, ainda se fala na “caixa preta” do Judiciário, o que é absolutamente injusto para um Poder cujas decisões da Mais Alta Corte são transmitidas ao vivo pela televisão e, não raro, precedidas de audiências públicas, o que faz com que questões jurídicas de inestimável relevância para o País, como biossegurança e reservas indígenas, virem objeto de intensos debates até em botequins. Ou o caso da mais alta instância administrativa, o CNJ, onde qualquer do povo pode peticionar e que tem suas sessões transmitidas em tempo real pela internet. São inúmeros os exemplos em que o Judiciário corta na própria carne quando detecta desvios de condutas. E mais: toda e qualquer decisão judicial é sempre fundamentada para possibilitar ao interessado recorrer. Às vezes menciona-se o “juridiquês”, mas isso não é mais realidade corrente.
Entretanto, o cidadão que tem uma ação judicial de fato fica alheio ao que ocorre no seu processo, pois raramente consegue manusear os autos ou consultar suas peças. É verdade que pode verificar o andamento processual pelo site do tribunal, porém o que vê são informações quase ininteligíveis até para quem é iniciado nas lides forenses. Constam registros como mandado expedido, concluso, partes intimadas etc.
E o cidadão acaba não entendendo o que está acontecendo com seu processo, muito menos porque está demorando tanto. E um belo dia aparece nesse sítio, quase como se fosse um provimento divino, o inteiro teor da tão esperada sentença, através da qual o autor só fica sabendo se ganhou ou se perdeu, pois, apesar de ser uma decisão fundamentada, remete sempre às peças dos autos, aquelas a que o autor não teve acesso. Talvez para o cidadão comum exista mesmo a “caixa preta”.
Esse panorama está mudando completamente com o processo eletrônico, que está definitivamente democratizando o acesso à Justiça, pois o cidadão que até então nunca viu o seu processo pode agora consultar os autos digitais na íntegra pela internet, mediante uma chave especial de consulta. Poderá ver a petição inicial que seu advogado elaborou e os documentos que a instruíram. Poderá ver a resposta da parte contrária com seus documentos e até repassar informações importantes para seu advogado com vistas a instruir sua argumentação. Poderá inclusive contribuir para uma solução mais rápida do litígio ou até se convencer, em qualquer momento, de que a conciliação é a melhor saída para o caso.
Enfim, o autor (ou réu) passa a conhecer e a entender o seu processo e a constituir-se em litigante ativo na relação processual, e não mais um mero expectador na esperança de que um dia a sentença sairá. Não há, pois, mais nenhum reduto para que a Justiça fique escondida do cidadão.
Talvez se contra-argumente com o analfabetismo e a falta de acesso da população pobre à Internet. Mas essa é uma realidade que está mudando rapidamente com as políticas governamentais de inclusão social. O analfabetismo já caiu para menos de 10% da população, e o acesso à Internet cresce mais de 75% ao ano no Brasil, segundo o IBGE. Na semana passada, os Ministros Aluizio Mercadante, da Ciência e Tecnologia, e Paulo Bernardo, da pasta das Comunicações, informaram que a segunda grande prioridade da Presidente Dilma Rousseff para seu governo são políticas públicas para aumentar o acesso à Internet.
De qualquer modo, para o cidadão de baixa renda que não dispõe de Internet, certamente haverá uma lan house próxima e se não souber acessar ou entender o que está ocorrendo, certamente terá um neto, um filho ou um sobrinho de sua confiança que poderá ajudá-lo a entender seu processo, o que está acontecendo nele, qual o efetivo conteúdo da decisão ou, ainda, qual o valor do alvará de pagamento que foi expedido em seu favor.
Há outro efeito positivo do processo eletrônico, cujo maior beneficiado é também o cidadão, que consiste no combate à morosidade judicial. Em levantamento realizado, o CNJ concluiu que 70% do tempo gasto com o processo tradicional se referem a atos meramente burocráticos e ordinatórios e que não conduzem ao objeto do processo, que é a prestação jurisdicional. A ministra Ellen Gracie, do STF, costuma chamar esse interstício de tempo neutro, porque nada faz em benefício da causa. O processo eletrônico simplesmente elimina ou automatiza esse tempo neutro para milésimos de segundo, reduzindo o tempo total para 30%, ou seja, só resta a parte nobre do processo.
E há ainda outros efeitos colaterais do processo eletrônico, como redução de custos, não só para o autor de uma ação judicial, mas também para o Erário, e benefícios para o meio ambiente, o que faz com que um cidadão que nunca se utilizou dos serviços da Justiça também seja beneficiado.
Daí que o maior beneficiado do processo judicial eletrônico é o cidadão, o que deve fazer com que nós, operadores do Direito, pensemos duas vezes antes de arguirmos nossas preferências pessoais ou levantarmos meras filigranas jurídicas para dificultar o uso da tecnologia no Poder Judiciário, sob pena de estarmos atrasando a modernização da Justiça e, consequentemente, prejudicando a inclusão social dos destinatários da prestação jurisdicional.
SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA é juiz federal no Rio Grande do Sul e ex-secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça.
O dia em que a Justiça Brasileira se tornar sistêmica, independente, ágil e coativa, e com Tribunais fortes e juízes próximos do cidadão e dos delitos, o Brasil terá justiça, segurança e paz social.
"A Função Precípua da Justiça é a aplicação coativa da Lei aos litigantes" (Hely Lopes Meirelles)- "A Autoridade da Justiça é moral e sustenta-se pela moralidade de suas decisões" (Rui Barbosa)
MAZELAS DA JUSTIÇA
Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
JUÍZES SEM ROSTO
Recentemente, o Senado Federal, em sessão que contou com apenas dez senadores, aprovou o projeto de novo Código de Processo Penal, simbolicamente, remetendo-o para a Câmara dos Deputados, que deverá colocá-lo em discussão na próxima legislatura que se iniciará nos próximos meses.
Projeto de lei de iniciativa do Senado, tendo como relator o senador Renato Casagrande, do Espírito Santo, que na vida civil exerce a profissão de engenheiro-agrônomo, traz em seu bojo uma porção de fantasmagorias jurídicas, muito embora, positivamente, busque reduzir o número de recursos que hoje eternizam os processos.
Diploma legal tão extenso quanto o atual Código de Processo Penal em vigor desde 1º de janeiro de 1942, esse PLS é composto por mais de 700 artigos, trazendo novidades importadas principalmente da Europa e que, salvo melhor juízo, poderão tumultuar ainda mais o trâmite das ações penais no País.
Trazendo como apensos todos os demais projetos de alteração do CPP em vigor, que tem sido modernizado a contento nos últimos dez anos, o projeto de lei do Senado Federal apresenta algumas novidades como a instituição do juiz de garantias, a alteração do prazo para a comunicação da prisão em flagrante pela autoridade policial à autoridade judiciária, que passaria a ser feita no prazo de 5 dias, e não mais imediatamente, como hoje; a criação da figura do juiz sem rosto, nos tribunais superiores, quando vierem a julgar crimes perpetrados por integrantes do crime organizado.
A nosso ver, a proposta de alteração de prazo para comunicação de prisão em flagrante ao juiz é flagrantemente inconstitucional pois colide de chapa com a Constituição Federal que impõe a sua comunicação imediata ao magistrado competente.
O prazo de 5 dias é utilizado na França, quando o suspeito fica em custódia à vista da polícia judiciária, à disposição do juiz instrutor, não devendo funcionar no Brasil, uma vez que iria, nos grandes centros, congestionar as delegacias e os distritos policiais, além de violar outros direitos constitucionais dos autuados em flagrante, proposta que, certamente, não vingará ao passar pelo crivo da Câmara Federal, onde pontificam advogados, promotores e magistrado.
A criação do juiz de garantias, que não será o juiz do processo em que o réu for acusado, já tem suscitado o protesto de associações de magistrados que alegam que o número de juízes criminais no País é insuficiente para a demanda, e que ficaria ainda mais desfalcado se esse novo tipo de magistrado viesse a ser criado.
O juiz de garantias seria um magistrado que manteria contato com a autoridade de polícia quando esta necessitasse de expedição de mandados de prisão provisória, de buscar e apreensão, de quebra de sigilo bancário, telefônico ou de dados, de buscas domiciliares, de sorte que tais medidas não viessem a contaminar o convencimento do juiz da causa.
Nesse sentido, o juiz de garantias seria um delegado do juiz do processo principal, e o delegado de polícia um delegado do juiz de garantias, tumultuando um procedimento que, na atualidade, é facilmente gerenciando pelos juízes do DIPO de diferentes cidades, sendo certo que a instituição desse novo julgador aumentaria, ainda mais, a demora processual.
A instituição dos juízes sem rosto, a nosso ver, seria uma injustiça em relação aos policiais civis, militares, guardas municipais, promotores de justiças e outros servidores da Justiça, a não ser que todos eles trabalhassem mascarados, comportamento que viola, escandalosamente, o princípio da publicidade processual.
Esperamos que a figura dos juízes sem rosto não venha a ser acolhida pelo legislador pátrio, uma vez que as baixas sofridas pela magistratura brasileira, incluindo-se aí as experimentadas pelo Ministério Público, no século passado foram insignificantes, ainda que sentidas pelo sistema policial-judiciário.
O azar militar sofrido pelas polícias civis e militares brasileiras tem sido um pouco maior, mas a instituição dos juízes embuçados nos tribunais superiores serviria como fator de desânimo no combate ao crime.
No país da lei da ficha limpa, a Polícia, o Ministério Público e a Magistratura devem continuar de caras limpas, sob pena de sucumbirmos ao estado paralelo.
Carlos Alberto Marchi de Queiroz - IPA BRASIL, 28/01/2011 - Enviado por Claudio Bayerle
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Neste blog, no sopé das postagens, poderás comparar as mazelas atuais que dificultam o Poder Judiciário na aplicação da justiça no Brasil. Ao lado, estão nossas esperanças. É preciso mudar muito. Mas esta mudança não pode ser leivada de interesses escusos e corporativos para assegurar privilégios, distanciar a justiça, amarrar os processos, impedir a solução rápida e punir exemplarmente os responsáveis pelas ilicitudes. Precisamos de uma justiça rápida, aproximada dos delitos, das polícias e da sociedade. Não podemos conviver com uma justiça divergente, lerda, descompromissada com as questões de ordem pública e que centraliza o transitado em julgado nas cortes supremas. A justiça brasileira deve ser desburocratizada, descentralizada, agilizada nos seus processos, com recursos solucionados em âmbito federativo e regional, com juízes em todas as cidades do país, aplicando a lei de forma coativa e sendo um poder integrado e harmônico junto ao Estado.
Para se combater o crime de forma contundente deve-se fortalecer os instrumentos de coação, justiça e cidadania; criar estratégias específicas e blindar os agentes públicos e familiares para dar segurança à decisão. Juízes sem rosto, varas criminais especializadas, promotores públicos vigilantes e integrados nos processos e instituições, defensores próximos, guardas prisionais capacitados e segmentos policiais comprometidos, preventivos, contundentes e equipados fazem parte de uma estrutura capaz de derrotar o crime e preservar a ordem pública, garantir a paz social e o respeito às leis e defender a incolumidade das pessoas e do patrimônio.
JUSTIÇA? ONDE?
Quem topa processar o Estado por causa da tragédia que desabrigou mais de 20 mil pessoas na região serrana do Rio de Janeiro e matou mais de mil – entre as sepultadas e as que continuam desaparecidas? Pensando bem: processar para quê? Para perder tempo e dinheiro? Para ficar demonstrado mais uma vez que a Justiça simplesmente não funciona?
Haveria razões de sobra para processar. Nem sempre o cidadão sabe que o local escolhido para construir sua casa faz parte de área de risco. E se sabe e mesmo assim pede licença para construir, cabe ao Estado contrariá-lo. As prefeituras são responsáveis pelo parcelamento e ocupação do solo urbano, segundo a Constituição.
Dos 83 mil imóveis de Nova Friburgo, por exemplo, cerca de 50 mil estão em situação irregular. Há apenas quatro funcionários para fiscalizá-los – e um deles saiu de licença médica. Em Petrópolis, algo como 50% das casas foram levantadas em encostas muito inclinadas e com rala cobertura florestal. Ou então próximas a rios e córregos.
Não seria difícil identificar os autores do que o governador Sérgio Cabral batizou com acerto de “crônica de uma tragédia anunciada” – burocratas, fiscais, secretários de habitação, prefeitos. A propósito: por que Cabral não patrocina na Assembléia Legislativa uma Comissão Parlamentar de Inquérito para passar tudo a limpo?
A exposição pública dos desmandos e a nomeação dos responsáveis por eles poderiam ajudar a reduzir no futuro a emissão de licenças para construções destinadas a serem tragadas por chuva e lama. Mas, desde já concordo: dificilmente serviriam para condenar alguém à cadeia ou a indenizar os desabrigados e as famílias dos mortos.
Fez 23 anos no último dia 31 de dezembro do naufrágio do Bateau Mouche na baía da Guanabara a caminho dos fogos de artifício de Copacabana. Das 153 pessoas a bordo, 55 se afogaram. Houve superlotação. Faltaram salva-vidas. A Capitania dos Portos deteve a embarcação pouco antes de ela partir. O peso era excessivo. Liberou-a depois.
Ninguém foi punido. Ação movida pelo Ministério Público Federal resultou em 2002 na condenação a 18 anos e quatro meses de prisão de seis dos donos da embarcação. Sem efeito prático: a pena prescreveu para alguns deles. Outros fugiram. Parentes de um dos mortos receberam indenização. Foi a União que pagou.
Impune permanece o jornalista Pimenta Neves que assassinou há 10 anos com dois tiros pelas costas a ex-namorada Sandra Gomide. Depois de sete meses preso foi levado a júri popular. Condenado em 2006 a 19 anos de cadeia, está solto desde então. Beneficia-se de sucessivos recursos impetrados por advogados.
Tudo bem que inexista um regime político perfeito. E que a democracia seja o menos imperfeito deles. Contudo, quanto mais capenga for a Justiça menos democracia existirá de fato. Democracia com Justiça de fancaria como a nossa é mera formalidade.
Por Ricardo Noblat, do GLOBO, Repórter de Crime, 24/01/2011
Haveria razões de sobra para processar. Nem sempre o cidadão sabe que o local escolhido para construir sua casa faz parte de área de risco. E se sabe e mesmo assim pede licença para construir, cabe ao Estado contrariá-lo. As prefeituras são responsáveis pelo parcelamento e ocupação do solo urbano, segundo a Constituição.
Dos 83 mil imóveis de Nova Friburgo, por exemplo, cerca de 50 mil estão em situação irregular. Há apenas quatro funcionários para fiscalizá-los – e um deles saiu de licença médica. Em Petrópolis, algo como 50% das casas foram levantadas em encostas muito inclinadas e com rala cobertura florestal. Ou então próximas a rios e córregos.
Não seria difícil identificar os autores do que o governador Sérgio Cabral batizou com acerto de “crônica de uma tragédia anunciada” – burocratas, fiscais, secretários de habitação, prefeitos. A propósito: por que Cabral não patrocina na Assembléia Legislativa uma Comissão Parlamentar de Inquérito para passar tudo a limpo?
A exposição pública dos desmandos e a nomeação dos responsáveis por eles poderiam ajudar a reduzir no futuro a emissão de licenças para construções destinadas a serem tragadas por chuva e lama. Mas, desde já concordo: dificilmente serviriam para condenar alguém à cadeia ou a indenizar os desabrigados e as famílias dos mortos.
Fez 23 anos no último dia 31 de dezembro do naufrágio do Bateau Mouche na baía da Guanabara a caminho dos fogos de artifício de Copacabana. Das 153 pessoas a bordo, 55 se afogaram. Houve superlotação. Faltaram salva-vidas. A Capitania dos Portos deteve a embarcação pouco antes de ela partir. O peso era excessivo. Liberou-a depois.
Ninguém foi punido. Ação movida pelo Ministério Público Federal resultou em 2002 na condenação a 18 anos e quatro meses de prisão de seis dos donos da embarcação. Sem efeito prático: a pena prescreveu para alguns deles. Outros fugiram. Parentes de um dos mortos receberam indenização. Foi a União que pagou.
Impune permanece o jornalista Pimenta Neves que assassinou há 10 anos com dois tiros pelas costas a ex-namorada Sandra Gomide. Depois de sete meses preso foi levado a júri popular. Condenado em 2006 a 19 anos de cadeia, está solto desde então. Beneficia-se de sucessivos recursos impetrados por advogados.
Tudo bem que inexista um regime político perfeito. E que a democracia seja o menos imperfeito deles. Contudo, quanto mais capenga for a Justiça menos democracia existirá de fato. Democracia com Justiça de fancaria como a nossa é mera formalidade.
Por Ricardo Noblat, do GLOBO, Repórter de Crime, 24/01/2011
sábado, 29 de janeiro de 2011
COATIVA - A JUSTIÇA DO URUGUAI
LEIA ESTA NOTÍCIA, COMPARE A JUSTIÇA BRASILEIRA E URUGUAIA E REFLITA...
GRE-NAL - 700 policiais na fronteira - ZERO HORA, 29/01/2011 - RESUMO.
As polícias militares de Santana do Livramento e de Rivera farão o possível para conservar a chamada Fronteira da Paz, como é conhecida a região, no Gre-Nal de amanhã. Montaram um esquema de segurança conjunto que pode chegar a 700 soldados, incluindo o contingente do Batalhão de Operações Especiais (BOE) que vem da Capital para escoltar as organizadas da Dupla. São as organizadas, aliás, o grande foco de preocupação. Passarão por tratamento diferenciado: além do acompanhamento na viagem por 50 homens do BOE, em parceria com a Polícia Rodoviária Federal, receberão vigília da polícia uruguaia da Praça Internacional até o Estádio Atilio Paiva. Vale o mesmo para o caminho de volta, após o Gre-Nal.
Além da atuação de 300 policiais uruguaios, dentro e fora do estádio, outros fatores contribuem:
1 – As quatro tribunas do Atilio Paiva são separadas, ou seja, não haverá contato entre os adversários.
2 – Uma torcida sairá antes da outra do estádio (ordem ainda indefinida).
3 – A lei uruguaia. Não há transação penal, e um suspeito vai a julgamento oito horas depois de ser detido, com decisão praticamente imediata de um juiz. Quer dizer: quem cometer delito corre risco de ter de ficar no país.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Lá no Uruguai a polícia nacional, que trabalha no ciclo completo (investigativo, pericial e ostensivo), é uma força auxiliar da justiça e leva a conclusão dos seus serviços diretamente para um magistrado de plantão. Este julga de forma célere cada caso decidindo os rumos do processo e da situação do autor da ilicitude. Aqui no Brasil, o delegado de polícia é a autoridade que recebe a ocorrência e faz as vezes de intermediário, mediando a decisão de forma burocrata com o magistrado brasileiro, ficando a solução postergada para "sine dia". O fato dá origem à um inquérito arcaico e burocrata, a denúncia é morosa, os processos se arrastam, a pessoa pode ficar livre ou presa anos sem julgamento, os recursos se difundem, as instâncias divergem, o transitado em julgado fica com o STF, o crime pode prescrever e a impunidade se consolidar.
MOROSIDADE - 7 ANOS DEPOIS
Aliado de José Dirceu vira réu em processo sete anos após escândalo. Waldomiro Diniz e outros acusados do caso GTech serão processados por concussão e corrupção - 28 de janeiro de 2011 - Agência Estado - O GLOBO.
BRASÍLIA- A Justiça Federal acolheu uma denúncia contra o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil Waldomiro Diniz e outras pessoas acusadas de envolvimento em irregularidades durante a renovação de um contrato entre a Caixa Econômica Federal (CEF) e a empresa multinacional de processamento de loterias Gtech. A divulgação do fato, ocorrida em 2003, foi o primeiro escândalo do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), os acusados de envolvimento no esquema serão processados pelos crimes de concussão (extorsão praticada por funcionário público), corrupção ativa e passiva e estelionato. O MPF deverá recorrer contra a decisão da Justiça de rejeitar a denúncia contra o ex-diretor da Caixa Paulo Roberto Paixão Bretas.
Segundo o MPF, além de Waldomiro, são réus na ação o advogado Rogério Buratti, o empresário do ramo de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, funcionários da GTech Brasil na época dos fatos e o ex-presidente do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS) Fábio Rolim.
O Ministério Público sustentou que a GTech buscou, "com a utilização de diversos influenciadores, se aproximar de altas autoridades e de agentes públicos importantes para análise de sua pretensão" para conseguir renovar seu contrato com a CEF, que representava quase 100% do faturamento da multinacional no Brasil.
Segundo a denúncia, o ex-assessor da Casa Civil "tinha por hábito cobrar propina e assim buscava nova fonte de recursos". Waldomiro foi exonerado em fevereiro de 2004 após a divulgação de uma fita na qual ele aparecia pedindo propina a Carlinhos Cachoeira. As negociações de emendas parlamentares passaram para o Ministério das Relações Institucionais.
Um ano depois, surgiu um novo escândalo no governo Lula. O presidente do PTB, Roberto Jefferson, revelou o esquema do mensalão e atribuiu ao então ministro da Casa Civil, José Dirceu, o papel de comandante. Jefferson e Dirceu foram cassados. O então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, abriu uma investigação sobre o caso e denunciou no Supremo Tribunal Federal (STF) 40 pessoas suspeitas de envolvimento no esquema. Até agora o STF não julgou o processo. Procurado hoje pela reportagem, após divulgação da nota pelo MPF, Waldomiro não foi localizado.
BRASÍLIA- A Justiça Federal acolheu uma denúncia contra o ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil Waldomiro Diniz e outras pessoas acusadas de envolvimento em irregularidades durante a renovação de um contrato entre a Caixa Econômica Federal (CEF) e a empresa multinacional de processamento de loterias Gtech. A divulgação do fato, ocorrida em 2003, foi o primeiro escândalo do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), os acusados de envolvimento no esquema serão processados pelos crimes de concussão (extorsão praticada por funcionário público), corrupção ativa e passiva e estelionato. O MPF deverá recorrer contra a decisão da Justiça de rejeitar a denúncia contra o ex-diretor da Caixa Paulo Roberto Paixão Bretas.
Segundo o MPF, além de Waldomiro, são réus na ação o advogado Rogério Buratti, o empresário do ramo de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, funcionários da GTech Brasil na época dos fatos e o ex-presidente do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS) Fábio Rolim.
O Ministério Público sustentou que a GTech buscou, "com a utilização de diversos influenciadores, se aproximar de altas autoridades e de agentes públicos importantes para análise de sua pretensão" para conseguir renovar seu contrato com a CEF, que representava quase 100% do faturamento da multinacional no Brasil.
Segundo a denúncia, o ex-assessor da Casa Civil "tinha por hábito cobrar propina e assim buscava nova fonte de recursos". Waldomiro foi exonerado em fevereiro de 2004 após a divulgação de uma fita na qual ele aparecia pedindo propina a Carlinhos Cachoeira. As negociações de emendas parlamentares passaram para o Ministério das Relações Institucionais.
Um ano depois, surgiu um novo escândalo no governo Lula. O presidente do PTB, Roberto Jefferson, revelou o esquema do mensalão e atribuiu ao então ministro da Casa Civil, José Dirceu, o papel de comandante. Jefferson e Dirceu foram cassados. O então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, abriu uma investigação sobre o caso e denunciou no Supremo Tribunal Federal (STF) 40 pessoas suspeitas de envolvimento no esquema. Até agora o STF não julgou o processo. Procurado hoje pela reportagem, após divulgação da nota pelo MPF, Waldomiro não foi localizado.
JUSTIÇA BENEFICIA CONDENADOS E ATERRORIZA AS RUAS
Interdição poderá deixar condenados em liberdade. A partir do dia 14, decisão da Justiça fecha oito albergues a novos detentos do regime semiaberto - CARLOS ETCHICHURY, Zero Hora 29/01/2011
Se não forem criadas vagas em abrigos prisionais e albergues até o dia 14 de fevereiro, condenados a cumprir pena em regime semiaberto permanecerão em liberdade. Ontem, a Vara de Execuções Criminais (VEC) interditou oito casas prisionais em Porto Alegre e Região Metropolitana. Elas ficarão proibidas de receber novos detentos condenados ao semiaberto. A nova decisão integra um conjunto de medidas da VEC para pressionar o governo a reduzir a superlotação das cadeias. Em novembro, a Justiça já havia restringido o ingresso de detentos no Presídio Central.
Segundo o juiz Alexandre de Souza Costa Pacheco, quando a medida começar a vigorar, condenados ficarão sem lugar para cumprir pena.
– Entramos em colapso no regime prisional. São necessárias medidas urgentes de ampliação e construção de casas prisionais – diz Pacheco, justificando a decisão judicial.
Embora interditadas, as prisões continuarão abrigando detentos em progressão de regime (aqueles que saem do fechado para o semiaberto). O objetivo imediato da decisão é possibilitar que 400 apenados mantidos em penitenciárias, mas com direito ao semiaberto, progridam de regime.
– Apenas no Presídio Central há 304 presos que não progridem por falta de vagas – acrescenta.
Sob interdição, o Central não recebe presos foragidos dos regimes aberto e semiaberto há três meses. A medida foi eficaz para o Central, e péssima para as cadeias de Charqueadas. Baixou de 5,3 mil para 4,9 mil a população do Central. Já a massa carcerária da Penitenciária Modulada de Charqueadas no mesmo período saltou de 794 para 884 criminosos. A Penitenciária Estadual de Charqueadas teve um incremento de 126 presos. Ambas estão superlotadas.
Na decisão, Pacheco, ao interpretar a medida, criticou governos passados. Num determinado trecho, escreveu: “Não há mais espaço para amadorismo. São imprescindíveis planejamento estratégico, gestão administrativa-prisional e investimento em recursos materiais e recursos humanos. Não podemos mais esconder a ‘sujeira embaixo do tapete’”.
“É uma situação dramática”. Alexandre de Souza Costa Pacheco, juiz da VEC - O juiz Alexandre de Souza Costa Pacheco tomou, na tarde de ontem, uma das decisões de maior repercussão pública em 13 anos de magistratura. Leia trechos da entrevista concedida a ZH:
Zero Hora – Por que o senhor tomou a decisão?
Alexandre de Souza Costa Pacheco – Chegamos a uma situação dramática. Há centenas de presos que têm direito ao semiaberto mas permanecem ilegalmente no regime fechado. No final do ano passado, concedemos a prisão domiciliar para os presos do aberto, o que também não resolveu o problema. Vamos dar preferência aos presos que já cumprem pena em detrimento dos novos condenados.
ZH – Qual o impacto da medida na segurança pública?
Pacheco – Diversos condenados deixarão de ser presos.
ZH – Como define a atual situação do sistema prisional?
Pacheco – Está em colapso. Não há outra palavra. São décadas de descaso.
ZH – A situação hoje é mais grave no regime fechado ou no semiaberto?
Pacheco – No semiaberto. Há 400 presos que não têm para onde ir porque as casas estão superlotadas.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O magistrado, ao criticar governos passados, esquece que o Judiciário é o principal responsável pela continuidade da má-vontade política em solucionar o caos prisional. As medidas benevolentes, superficiais e inoperantes adotadas até agora só serviram para beneficiar bandidos e sacrificar o povo, pois não "sensibilizam" o Executivo e nem encontram eco positivo na sociedade e no parlamento. Uma justiça que não consegue se impor jamais conseguirá obrigar alguém a cumprir seus deveres com a lei.
Na minha opinião, quem está a "esconder a ‘sujeira embaixo do tapete’” é o próprio Judiciário que age como Pilatos - deixa de tomar uma decisão contra os verdadeiros responsáveis, sacrifica o povo e lava as mãos para o problema. Quantas vezes estas medidas foram adotadas pelo Judiciário? A quanto tempo vem isto? Que resultados positivos conseguiram?
Pois é! Não quero acreditar que o Judiciário não adota medidas coativas contra o Poder Executivo por vislumbrar interesses futuros, por não querer conflitos entre poderes, por não querer se indispor com a classe política ou simplesmente porque a justiça brasileira é fraca.
É simples. Bastaria denunciar o Chefe do Executivo por crimes contra direitos humanos e por desobediência à constituição estadual, pedindo o impeachment e processando criminalmente. Tenho certeza que os presídios seriam construídos, vagas sobrariam e o sistema prisional seria bem mais humano.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
CALAMIDADES - LIMINARES EM NOME DO "SOCIAL"
Justiça tem parte da responsabilidade - Editorial O Globo, 25/01/2011 às 16h50m
Enquanto avança na Região Serrana o resgate das vítimas da catástrofe climática, formam-se alguns consensos sobre a tragédia. Em entrevistas, artigos e por meio de anúncios de medidas pelo poder público, surge um diagnóstico em que se destaca a leniência de prefeituras, e políticos em geral, diante da ocupação irregular de áreas de risco, problema cuja gravidade foi potencializada pela inexistência de um eficiente sistema integrado de defesa civil e de alerta às populações.
O próprio anúncio do ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, da criação de um aparato de monitoramento meteorológico, para obter informações a serem compartilhadas com estados e municípios, pode ser entendido como uma autocrítica.
Mesmo além dos padrões, a tempestade que se abateu sobre os municípios de Friburgo, Teresópolis e Petrópolis há duas semanas teria feito bem menos vítimas se as prefeituras contassem com informações e, tanto quanto isto, um plano para abrigar moradores em locais seguros.
O Rio, com uma cultura de defesa civil mais desenvolvida, começa a instalar sirenes em favelas e a distribuir celulares entre lideranças comunitárias, a serem usados na aproximação de tempestades, a fim de deslocar moradores para abrigos.
Tão logo o novo radar meteorológico adquirido pela prefeitura detecte a aproximação de chuvas fortes, o esquema será acionado a tempo de as pessoas abandonarem regiões de risco.
A irresponsabilidade misturada com demagogia é que dá as condições para estas tragédias. Impressiona a informação de que cerca de 50 mil dos 83 mil imóveis de Nova Friburgo - 60% do total - encontram-se, ou encontravam-se, em situação irregular. Entende-se por que a cidade lidera a estatística de mortes, que deverão passar de mil nos três municípios.
Mas o populismo político não está só no patrocínio da favelização, e não apenas na Região Serrana. Por desvio ideológico, há juízes defensores da perigosa tese de que a Lei precisa estar a serviço da "justiça social", e por isso impedem a remoção de casas construídas à margem de normas e regulamentos, em áreas sujeitas a acidentes.
No Rio, há vários casos de liminares concedidas, em nome do "social", contra o resgate de pessoas de barrancos e encostas. Em Teresópolis, o Ministério Público foi à Justiça em 2008 para conseguir a demolição de casas irregulares no bairro do Caleme. O processo empacou, e a tempestade tratou de fazer, de maneira trágica, o que a Justiça parece ter se recusado a executar de forma planejada.
Por ironia, vítimas dos deslizamentos em Caleme haviam sido removidas, na década de 90, de outra área de risco, na gestão do prefeito Mario Tricano. Protegida por políticos e com juízes na retaguarda, a comunidade ficou no local, até ser soterrada por previsíveis deslizamentos.
Se executivos federais, estaduais e municipais, diante da tragédia na Região Serrana, tratam de criar projetos para passarem a agir mais na prevenção do que na emergência, o Poder Judiciário deveria participar de um esforço para rever a maneira de atuar quando se trata de prevenir grandes acidentes.
O preço por esta maneira enviesada de aplicar a lei tem sido pago em vidas dos mais pobres. Por ironia, aqueles que se quer proteger.
Enquanto avança na Região Serrana o resgate das vítimas da catástrofe climática, formam-se alguns consensos sobre a tragédia. Em entrevistas, artigos e por meio de anúncios de medidas pelo poder público, surge um diagnóstico em que se destaca a leniência de prefeituras, e políticos em geral, diante da ocupação irregular de áreas de risco, problema cuja gravidade foi potencializada pela inexistência de um eficiente sistema integrado de defesa civil e de alerta às populações.
O próprio anúncio do ministro de Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, da criação de um aparato de monitoramento meteorológico, para obter informações a serem compartilhadas com estados e municípios, pode ser entendido como uma autocrítica.
Mesmo além dos padrões, a tempestade que se abateu sobre os municípios de Friburgo, Teresópolis e Petrópolis há duas semanas teria feito bem menos vítimas se as prefeituras contassem com informações e, tanto quanto isto, um plano para abrigar moradores em locais seguros.
O Rio, com uma cultura de defesa civil mais desenvolvida, começa a instalar sirenes em favelas e a distribuir celulares entre lideranças comunitárias, a serem usados na aproximação de tempestades, a fim de deslocar moradores para abrigos.
Tão logo o novo radar meteorológico adquirido pela prefeitura detecte a aproximação de chuvas fortes, o esquema será acionado a tempo de as pessoas abandonarem regiões de risco.
A irresponsabilidade misturada com demagogia é que dá as condições para estas tragédias. Impressiona a informação de que cerca de 50 mil dos 83 mil imóveis de Nova Friburgo - 60% do total - encontram-se, ou encontravam-se, em situação irregular. Entende-se por que a cidade lidera a estatística de mortes, que deverão passar de mil nos três municípios.
Mas o populismo político não está só no patrocínio da favelização, e não apenas na Região Serrana. Por desvio ideológico, há juízes defensores da perigosa tese de que a Lei precisa estar a serviço da "justiça social", e por isso impedem a remoção de casas construídas à margem de normas e regulamentos, em áreas sujeitas a acidentes.
No Rio, há vários casos de liminares concedidas, em nome do "social", contra o resgate de pessoas de barrancos e encostas. Em Teresópolis, o Ministério Público foi à Justiça em 2008 para conseguir a demolição de casas irregulares no bairro do Caleme. O processo empacou, e a tempestade tratou de fazer, de maneira trágica, o que a Justiça parece ter se recusado a executar de forma planejada.
Por ironia, vítimas dos deslizamentos em Caleme haviam sido removidas, na década de 90, de outra área de risco, na gestão do prefeito Mario Tricano. Protegida por políticos e com juízes na retaguarda, a comunidade ficou no local, até ser soterrada por previsíveis deslizamentos.
Se executivos federais, estaduais e municipais, diante da tragédia na Região Serrana, tratam de criar projetos para passarem a agir mais na prevenção do que na emergência, o Poder Judiciário deveria participar de um esforço para rever a maneira de atuar quando se trata de prevenir grandes acidentes.
O preço por esta maneira enviesada de aplicar a lei tem sido pago em vidas dos mais pobres. Por ironia, aqueles que se quer proteger.
domingo, 23 de janeiro de 2011
TOLERÂNCIA MÁXIMA!
TOLERÂNCIA MÁXIMA. 20 vezes livre para Agir - FRANCISCO AMORIM, ZERO HORA 23/01/2011
Se em alguns países, em determinados momentos, a ordem do dia é reprimir com rigor pequenos deslizes como quebrar uma vidraça, o Brasil de hoje parece tolerar que criminosos ajam reiterada vezes, quase sempre impunes.
O entra e sai da cadeia que se repete por anos, muitas vezes só costuma ter fim quando o bandido é morto ou ferido em confronto com forças policiais. É o caso de Fabrício Almeida de Azevedo, 21 anos, preso 20 vezes em um intervalo de cinco anos agindo na Capital.
Quantas vezes um ladrão precisa ser flagrado furtando objetos para receber uma punição mais rigorosa do que um “puxão de orelhas” na delegacia ou no fórum? A prática reiterada de um delito, mesmo que de menor potencial ofensivo, já não oferece prejuízo suficiente à sociedade para justificar seu encarceramento? A rotina de idas e vindas de delegacias não o impulsionaria a ações mais violentas? Especialistas e as autoridades divergem em suas opiniões.
Enquanto os mais liberais defendem que mesmo ladrões contumazes aguardem em liberdade o julgamento de seus processos, alas mais conservadoras sustentam a prisão provisória para bandidos que acumulam crimes nas ruas.
Ao ser preso 20 vezes, a mais recente delas no fim de semana passado, Azevedo se tornou o mais novo símbolo impune desse prende e solta do sistema penal brasileiro, onde a superlotação das cadeias tem influenciado as decisões de magistrados. Velado ou expresso nos despachos judiciais, é regra entre juízes o entendimento de que pessoas sem condenação (os chamados réus primários) devem ficar longe das celas. Juízo que garantiu ao ladrão contumaz se beneficiar por seis vezes da liberdade provisória. Em algumas das prisões, Azevedo sequer ficou um dia preso, mesmo sendo autuado em flagrante por estar com bens furtados.
– O problema da falta de vagas nos presídios é real, mas está sendo usado indevidamente para manter soltos criminosos que sabidamente praticam crimes nas ruas. No caso dele (Azevedo), fica evidente que deveria receber uma punição maior. Isso tudo gera uma sensação de impunidade. O criminoso acha que “não vai dar nada’’, enquanto a vítima deixa de acreditar na Justiça e policiais se sentem desestimulados – avalia o promotor Fabiano Dallazen, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público.
As críticas à magistratura são relativizadas pelo juiz-corregedor Marcelo Mairon Rodrigues. Sem entrar no caso de Azevedo, para evitar dissabores com colegas de toga, Mairon defende a ampliação das medidas alternativas, como prestação de serviços à comunidade, para punir os pequenos infratores. Na sua visão, isso reduziria a reincidência.
– Não adianta simplesmente colocá-los no presídio. As medidas alternativas garantiriam uma reaproximação com a sociedade. Lógico, isso tem de ser bem feito, bem fiscalizado. É claro que em algumas condutas, como a prática reiterada de crimes, isso pode ser revisto – pondera.
Para o professor de Direito Penal e Processual da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS) Rafael Canterji, o questionamento sobre o prende e solta deveria ser outro:
– Em situações como a narrada, muitas vezes se ouve que a soltura foi equivocada, quando poderíamos refletir se a prisão foi acertada. Não tenho dúvidas de que a prisão é uma mola propulsora da criminalidade, devendo ocorrer somente em casos excepcionais.
Para o advogado criminalista, a concessão de liberdade provisória em casos de furtos é a medida correta, já que muitas vezes a pena imposta se inicia em um regime mais brando, como o semiaberto.
– É preciso ter proporcionalidade entre a medida cautelar, durante o processo, e a pena. Incoerente seria manter réu preso durante o processo se eventual pena a ser aplicada não fosse privativa de liberdade em regime fechado.
Difícil será explicar para as futuras vítimas de Azevedo que sua conduta faz jus à benevolência com que vem sendo tratado.
De pequenos furtos a tiroteio
A 20ª prisão de Fabrício Almeida de Azevedo, no fim de semana passado, não surpreendeu os policiais militares responsáveis pelo policiamento na zona leste da Capital.
A escalada criminosa que se iniciou com pequenos furtos e culminou com uma troca de tiros que deixou Azevedo gravemente ferido já era esperada pelos policiais acostumados a detê-lo com objetos furtados.
Com apenas 21 anos, Azevedo acumula 13 passagens pelo Presídio Central de Porto Alegre. Todas por furtos de objetos, como registros de água, fios de cobre, peças de inox, alumínio ou eletroeletrônicos. Nas primeiras três entradas na superlotada cadeia da Capital, entre os 18 e 19 anos, a permanência foi curta. Um ou dois dias. Por ser réu primário e suspeito de crimes considerados de pouca gravidade, ele voltava para casa mediante o benefício da liberdade provisória.
A prática delituosa reiterada, aos poucos, foi ampliando o tempo em que o jovem permanecia segregado a cada nova prisão em flagrante. Em março de 2009, ainda aos 19 anos, por exemplo, Azevedo ficou 85 dias na cadeia pelo furto de um computador e de um aspirador de pó. Em apenas três anos, ele passou por casas prisionais em Charqueadas e Mariante, onde esteve recolhido nas penitenciárias estaduais do Jacuí (PEJ) e de Charqueadas (PEC), além dos institutos penais Escola Profissionalizante (Ipep) e de Mariante (IPM).
De uma família de seis irmãos da Vila Bom Jesus, Azevedo se apresentou como servente de obras em cada uma das primeiras 19 abordagens policiais que culminaram em termos circunstanciados, inquéritos policiais e autos de prisão em flagrante. Não resistia à prisão. No máximo, corria dos PMs. Mas as coisas mudaram no mais recente episódio do roteiro de indas e vindas da cadeia. Ele reagiu.
Com um revólver calibre 38, enfrentou um PM do 11º Batalhão de Polícia Militar (11º BPM) e acabou baleado após tentar invadir uma garagem na noite de sábado, dia 15 de janeiro. Em estado grave, na sexta-feira ele permanecia internado no Hospital de Pronto Socorro (HPS) sob custódia de agentes da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Quando receber alta, Azevedo dará entrada pela 14ª vez no Casarão – como é conhecido o Presídio Central pelos criminosos.
Até enfrentar a polícia, a saga criminosa de Azevedo não surpreendia pela violência dos ataques ou pelo valor dos bens levados. Foi o número de vezes em que a Brigada Militar o flagrou com coisas que não eram suas que chamava a atenção. Ao invadir residências e estabelecimentos comerciais sempre em bairros vizinhos à vila onde morava, Azevedo acabou conhecido pelos PMs que atuam na Zona Leste. Daí foi um passo para assumir o topo da lista dos mais detidos pelo batalhão.
– Não é um retrabalho a prisão de suspeitos como o Fabrício. Apenas uma rotina policial. Meus policiais sabem quem age na região. Estão atentos à conduta desses criminosos e, por isso, eles acabam sendo presos com frequência – avalia o comandante do 11º BPM, tenente-coronel Toni Robilar Pacheco.
Se nas primeiras autuações em flagrante, o réu primário ganhava a liberdade provisória por decisão judicial, o benefício foi rareando à medida em que a conduta de Azevedo piorava dentro e fora da cadeia. As duas últimas saídas do sistema prisional, por exemplo, deram-se por fugas de institutos penais onde já cumpria pena em regime semiaberto.
– Acho que o caso dele é emblemático, pois passou muito tempo no fechado e, quando recebeu condenações, foram a um regime mais brando, o semiaberto. Acabou sendo mais punido durante a prisão provisória do que depois de condenado – afirma a defensora pública Helena Grillo, que atua em processos em que Azevedo é réu.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - PARABÉNS! FRANCISCO AMORIM. TODOS AQUELES QUE LUTAM CONTRA A IMPUNIDADE, CONTRA ESTA LEGISLAÇÃO FRACA E CONTRA AS MAZELAS DA JUSTIÇA AGRADECEM POR ECOAR O BRADO DE ALERTA. Infelizmente somos poucos com coragem e oportunidade para publicar nosso desabafo pela internet e pelos canais que oportunizam os veículos de comunicação. Mas são vocês nossos arautos que podem semear nosso descontentamento.
O Brasileiro convive uma insegurança jurídica que reflete, em cascata, nocivas mazelas judiciárias, saúde precária, educação deficiente e insegurança pública patrocinadas por poderes de estado desacreditados, cegos, negligentes e corporativos. O resultado é o caos que atinge em cheio do cidadão de bem, relegado ao papel ao papel de pagador de impostos sem contrapartidas.
Você, leitor e seguidor deste Blog, encaminhe ao jornal e ao jornalista Francisco Amorim (francisco.amorim@zerohora.com.br) uma manifestação ou comentário parabenizando pela matéria e encorajando para que continue fazendo matérias desta importância - "água mole em pedra dura, tanto bate até que fura."
NÃO FIQUE CALADO. MANIFESTE-SE!
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
APOSENTADORIA COMPULSÓRIA
Aposentadoria compulsória não é pena - POR BRUNO SÁ FREIRE MARTINS, Consultor Jurídico, 21/01/2011
O Conselho Nacional de Justiça, no exercício das atribuições que lhe são conferidas pela Constituição Federal, tem feito uso da pseudo-sanção denominada aposentadoria compulsória como forma de penalizar magistrados de diversas unidades da Federação, por terem estes descumprido deveres inerentes à judicatura.
A magistratura brasileira possui como garantias, para o perfeito exercício do seu mister, a irredutibilidade dos subsídios, a inamovibilidade e a vitaliciedade.
Pela primeira garantia os juízes não podem sofrer qualquer tipo de redução em sua remuneração, já a segunda permite aos magistrados o não afastamento da Comarca onde exercem suas atividades, salvo por promoção ou em casos de remoção a pedido do próprio interessado.
A vitaliciedade, garante aos juízes que somente ocorrerá a perda do cargo por intermédio de sentença judicial transitada em julgado, ou seja, não poderá ocorrer sua demissão com base em decisão proferida em processo administrativo disciplinar.
Com o objetivo de garantir a plenitude dos efeitos da vitaliciedade e ao mesmo tempo proporcionar ao Judiciário a possibilidade de afastar da judicatura os Juízes que atuem de forma incompatível com o cargo que exercem, a Lei Complementar federal n. 35, de 14 de Março de 1.979, ao dispor sobre a Organização da Magistratura brasileira, estabeleceu que:
Art. 56 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, do magistrado:
I - manifestadamente negligente no cumprimento dos deveres do cargo;
Il - de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções;
III - de escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou cujo proceder funcional seja incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário.
O dispositivo supramencionado fundamentou as decisões tomadas pelo Conselho Nacional de Justiça.
Ocorre que o Estatuto da Magistratura foi editado, sob a égide da Constituição Federal de 1967, com as alterações que lhe foram promovidas pela reforma de 1969.
Naquele contexto constitucional, a aposentadoria dos agentes públicos possuía um caráter essencialmente premial, pelo qual o Estado recompensava o cidadão por ter despendido longos anos de sua vida laboral, a seu favor.
A nova ordem estabelecida em 1988, exaltou a vitaliciedade à condição de garantia constitucional.
Em contrapartida e em que pese o texto original estabelecer a aposentadoria compulsória somente aos 70 (setenta) anos de idade, manteve-se a natureza de prêmio às aposentadorias.
Sob este arcabouço constitucional, tornava-se perfeitamente possível promover-se, por intermédio da legislação, o afastamento compulsório de um servidor que incorresse em desvio de conduta.
Contudo, com o advento da Emenda Constitucional 03/93, a aposentadoria perdeu, no âmbito federal, tal caráter e posteriormente com a Emenda Constitucional n. 20/98 esta perda foi estendida a todos os entes federados, passando a revestir-se de benefício concedido em razão de contribuições financeiras realizadas pelos servidores.
Tal transformação decorreu da necessidade de adequação dos benefícios previdenciários ao conceito de previdência social, constituindo-se esta em segmento da Seguridade Social, composta de um conjunto de princípios, de regras e de instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar meios indispensáveis de subsistência ao segurado e a sua família, contra contingência de perda ou redução da sua remuneração, de forma temporária ou permanente, de acordo com a previsão da lei.[i]
As ditas contingências são doutrinariamente denominadas riscos sociais, ou seja, situações, definidas em lei ou na própria Carta Maior, onde o segurado em razão da limitação, redução ou perda da capacidade laboral utiliza-se do sistema protetivo para garantir a manutenção de sua subsistência e/ou de seus familiares.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 201, elege como situações de risco social, amparados pelo sistema protetivo instituído pela Previdência Social, a morte, a idade avançada, a incapacidade temporária ou permanente, a maternidade e a reclusão.
Daí, a previdência social ser considerada direito social de fruição universal para os que contribuam para o sistema. Ocorrendo um risco social — “sinistro” (que afasta o trabalhador da atividade laboral), caberá à previdência a manutenção do segurado ou de sua família.[ii]
No direito pátrio, a aposentadoria do servidor público de cargo efetivo pode ser concebida como direito público subjetivo de passar à inatividade e continuar percebendo, até a morte, salvo ocorrência de um ato ou fato jurídico que lhe cause a extinção, na forma da lei, uma prestação pecuniária correspondente à totalidade ou não dos vencimentos que lhe eram pagos na atividade, em razão do cumprimento de determinadas condições previstas na Constituição ou, excepcionalmente, em lei complementar, nos casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.[iii]
O artigo 40, da Carta Magna, ao disciplinar as aposentadorias estabeleceu a possibilidade de o servidor se aposentar voluntariamente: por idade, por tempo de contribuição ou de forma especial; por invalidez; ou compulsoriamente. Regramento este estendido aos magistrados conforme estabelece o artigo 93, VI, da Constituição Federal.
A jubilação compulsória, no ordenamento jurídico brasileiro, ocorre aos 70 anos de idade e tem por finalidade proteger o servidor que já se encontra em idade avançada e consequentemente tem sua capacidade laboral reduzida ou até mesmo cessada.
Além disso, o avanço da idade conduz, quase sempre, ao comprometimento da saúde do servidor, fato este que pode vir a impedir o exercício normal das atividades do cargo que ocupa.
Na aposentadoria compulsória não cabe ao servidor, mais sim ao ente federado a aposentação deste, ainda, que não haja sua concordância já que ela deve se dar ex-officio, isto porque pressupõe-se que o servidor ao atingir determinada idade não possui mais condições para desenvolver suas atividades laborais plenamente.[iv]
A Carta Magna, conforme já mencionado, pós-reforma de 1998 impingiu o regime contributivo aos benefícios previdenciários, elencou as situações consideradas como de riscos sociais e estabeleceu a compulsoriedade na aposentadoria somente por circunstâncias etárias.
Em que pese a garantia da vitaliciedade dos magistrados, também encontrar-se na condição de norma constitucional, não poderia a legislação infraconstitucional, após o advento da Emenda Constitucional 20/98, estabelecer regras de compulsoriedade para a aposentadoria em desacordo com a Carta Maior.
Fato este que conduz o artigo 56, da Lei Complementar 35/79 a não ser recepcionado pelo texto constitucional modificado.
O fenômeno da recepção consiste na avaliação de compatibilidade entre as leis e atos normativos existentes e o novel texto constitucional, sob pena de sua retirada do mundo jurídico.
No caso de incompatibilidade entre a lei ou ato existente e a nova Lei Maior, ocorrerá a revogação da legislação menor face a sua não-recepção pela nova Carta Magna.
A revogação da norma infraconstitucional por sua não recepção também pode decorrer do advento de Emenda Constitucional, nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal in verbis:
EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: art. 2º, inciso IV, alínea c, da L. est. 12.755, de 22 de março de 2005, do Estado de Pernambuco, que estabelece a vinculação da Defensoria Pública estadual à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos: violação do art. 134, § 2º, da Constituição Federal, com a redação da EC 45/04: inconstitucionalidade declarada.
1. A EC 45/04 outorgou expressamente autonomia funcional e administrativa às defensorias públicas estaduais, além da iniciativa para a propositura de seus orçamentos (art. 134, § 2º): donde, ser inconstitucional a norma local que estabelece a vinculação da Defensoria Pública a Secretaria de Estado.
2. A norma de autonomia inscrita no art. 134, § 2º, da Constituição Federal pela EC 45/04 é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, dado ser a Defensoria Pública um instrumento de efetivação dos direitos humanos. II. Defensoria Pública: vinculação à Secretaria de Justiça, por força da LC est (PE) 20/98: revogação, dada a incompatibilidade com o novo texto constitucional.
1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal - malgrado o dissenso do Relator - que a antinomia entre norma ordinária anterior e a Constituição superveniente se resolve em mera revogação da primeira, a cuja declaração não se presta a ação direta.
2. O mesmo raciocínio é aplicado quando, por força de emenda à Constituição, a lei ordinária ou complementar anterior se torna incompatível com o texto constitucional modificado: precedente[v].
O artigo 56, da Lei Complementar 35/79, foi editado anteriormente à reforma do artigo 40, da Constituição Federal, promovida em 1998, e encontra-se com este incompatível, conforme a ampla explanação supramencionada, fato este que enseja a sua não-recepção pelo texto modificado da Carta Magna.
Então, a aposentadoria compulsória por ser um benefício previdenciário que pressupõe, nos termos da Constituição Federal, a realização de contribuições e por exigir como requisito para a sua concessão o atingimento da idade de 70 (setenta) anos, não pode ser considerada pela legislação infraconstitucional uma sanção decorrente de atos tidos como incompatíveis com o exercício da magistratura, ante a total ausência de amparo na Lei Maior.
[i] MARTINS, Sérgio Pinto. DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL. 27ª edição. Ed. Atlas.
[ii] TAVARES, Marcelo Leonardo. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. 10ª edição. Ed. Lúmen Júris.
[iii] TEIXEIRA, Flávio Germano de Sena. O CONTROLE DAS APOSENTADORIAS PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS. Ed. Fórum.
[iv] MARTINS, Bruno Sá Freire. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO. Ed. Ltr.
[v] STF. ADI n. 3569/PE. Rel. Min. Sepulveda Pertence. J. 02/04/2007
CNJ aplica pena mais branda para juiz do Pará - Consultor Jurídico, 16/12/2010
O Plenário do Conselho Nacional de Justiça optou por aplicar uma pena mais branda a um juiz do Pará, acusado de abuso de poder e crime contra o patrimônio público. De acordo com o processo, o juiz destruiu, com um trator, o armazém de uma cidade, sob alegação de que “era assessor do prefeito”. No TJ-PA, a pena ao juiz foi de aposentadoria compulsória. No entanto, no julgamento da Revisão Disciplinar no CNJ, o relator do caso, conselheiro Leomar Barros Amorim, optou pela remoção compulsória — transferência para outra comarca. Ele entendeu que, na sessão do TJ-PA, não havia quórum suficiente para que a questão fosse avaliada. Os conselheiros ressaltaram a gravidade do caso, que diz respeito à acusação de sérios abusos de poder por parte do magistrado e de crime contra o patrimônio público. No entanto, por maioria de votos, seguiram o entendimento do relator. Ainda é possível recorrer da decisão no próprio TJ-PA. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ. Revisão Disciplinar 2009.10.00.004456-6
O Conselho Nacional de Justiça, no exercício das atribuições que lhe são conferidas pela Constituição Federal, tem feito uso da pseudo-sanção denominada aposentadoria compulsória como forma de penalizar magistrados de diversas unidades da Federação, por terem estes descumprido deveres inerentes à judicatura.
A magistratura brasileira possui como garantias, para o perfeito exercício do seu mister, a irredutibilidade dos subsídios, a inamovibilidade e a vitaliciedade.
Pela primeira garantia os juízes não podem sofrer qualquer tipo de redução em sua remuneração, já a segunda permite aos magistrados o não afastamento da Comarca onde exercem suas atividades, salvo por promoção ou em casos de remoção a pedido do próprio interessado.
A vitaliciedade, garante aos juízes que somente ocorrerá a perda do cargo por intermédio de sentença judicial transitada em julgado, ou seja, não poderá ocorrer sua demissão com base em decisão proferida em processo administrativo disciplinar.
Com o objetivo de garantir a plenitude dos efeitos da vitaliciedade e ao mesmo tempo proporcionar ao Judiciário a possibilidade de afastar da judicatura os Juízes que atuem de forma incompatível com o cargo que exercem, a Lei Complementar federal n. 35, de 14 de Março de 1.979, ao dispor sobre a Organização da Magistratura brasileira, estabeleceu que:
Art. 56 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, do magistrado:
I - manifestadamente negligente no cumprimento dos deveres do cargo;
Il - de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções;
III - de escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou cujo proceder funcional seja incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário.
O dispositivo supramencionado fundamentou as decisões tomadas pelo Conselho Nacional de Justiça.
Ocorre que o Estatuto da Magistratura foi editado, sob a égide da Constituição Federal de 1967, com as alterações que lhe foram promovidas pela reforma de 1969.
Naquele contexto constitucional, a aposentadoria dos agentes públicos possuía um caráter essencialmente premial, pelo qual o Estado recompensava o cidadão por ter despendido longos anos de sua vida laboral, a seu favor.
A nova ordem estabelecida em 1988, exaltou a vitaliciedade à condição de garantia constitucional.
Em contrapartida e em que pese o texto original estabelecer a aposentadoria compulsória somente aos 70 (setenta) anos de idade, manteve-se a natureza de prêmio às aposentadorias.
Sob este arcabouço constitucional, tornava-se perfeitamente possível promover-se, por intermédio da legislação, o afastamento compulsório de um servidor que incorresse em desvio de conduta.
Contudo, com o advento da Emenda Constitucional 03/93, a aposentadoria perdeu, no âmbito federal, tal caráter e posteriormente com a Emenda Constitucional n. 20/98 esta perda foi estendida a todos os entes federados, passando a revestir-se de benefício concedido em razão de contribuições financeiras realizadas pelos servidores.
Tal transformação decorreu da necessidade de adequação dos benefícios previdenciários ao conceito de previdência social, constituindo-se esta em segmento da Seguridade Social, composta de um conjunto de princípios, de regras e de instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar meios indispensáveis de subsistência ao segurado e a sua família, contra contingência de perda ou redução da sua remuneração, de forma temporária ou permanente, de acordo com a previsão da lei.[i]
As ditas contingências são doutrinariamente denominadas riscos sociais, ou seja, situações, definidas em lei ou na própria Carta Maior, onde o segurado em razão da limitação, redução ou perda da capacidade laboral utiliza-se do sistema protetivo para garantir a manutenção de sua subsistência e/ou de seus familiares.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 201, elege como situações de risco social, amparados pelo sistema protetivo instituído pela Previdência Social, a morte, a idade avançada, a incapacidade temporária ou permanente, a maternidade e a reclusão.
Daí, a previdência social ser considerada direito social de fruição universal para os que contribuam para o sistema. Ocorrendo um risco social — “sinistro” (que afasta o trabalhador da atividade laboral), caberá à previdência a manutenção do segurado ou de sua família.[ii]
No direito pátrio, a aposentadoria do servidor público de cargo efetivo pode ser concebida como direito público subjetivo de passar à inatividade e continuar percebendo, até a morte, salvo ocorrência de um ato ou fato jurídico que lhe cause a extinção, na forma da lei, uma prestação pecuniária correspondente à totalidade ou não dos vencimentos que lhe eram pagos na atividade, em razão do cumprimento de determinadas condições previstas na Constituição ou, excepcionalmente, em lei complementar, nos casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.[iii]
O artigo 40, da Carta Magna, ao disciplinar as aposentadorias estabeleceu a possibilidade de o servidor se aposentar voluntariamente: por idade, por tempo de contribuição ou de forma especial; por invalidez; ou compulsoriamente. Regramento este estendido aos magistrados conforme estabelece o artigo 93, VI, da Constituição Federal.
A jubilação compulsória, no ordenamento jurídico brasileiro, ocorre aos 70 anos de idade e tem por finalidade proteger o servidor que já se encontra em idade avançada e consequentemente tem sua capacidade laboral reduzida ou até mesmo cessada.
Além disso, o avanço da idade conduz, quase sempre, ao comprometimento da saúde do servidor, fato este que pode vir a impedir o exercício normal das atividades do cargo que ocupa.
Na aposentadoria compulsória não cabe ao servidor, mais sim ao ente federado a aposentação deste, ainda, que não haja sua concordância já que ela deve se dar ex-officio, isto porque pressupõe-se que o servidor ao atingir determinada idade não possui mais condições para desenvolver suas atividades laborais plenamente.[iv]
A Carta Magna, conforme já mencionado, pós-reforma de 1998 impingiu o regime contributivo aos benefícios previdenciários, elencou as situações consideradas como de riscos sociais e estabeleceu a compulsoriedade na aposentadoria somente por circunstâncias etárias.
Em que pese a garantia da vitaliciedade dos magistrados, também encontrar-se na condição de norma constitucional, não poderia a legislação infraconstitucional, após o advento da Emenda Constitucional 20/98, estabelecer regras de compulsoriedade para a aposentadoria em desacordo com a Carta Maior.
Fato este que conduz o artigo 56, da Lei Complementar 35/79 a não ser recepcionado pelo texto constitucional modificado.
O fenômeno da recepção consiste na avaliação de compatibilidade entre as leis e atos normativos existentes e o novel texto constitucional, sob pena de sua retirada do mundo jurídico.
No caso de incompatibilidade entre a lei ou ato existente e a nova Lei Maior, ocorrerá a revogação da legislação menor face a sua não-recepção pela nova Carta Magna.
A revogação da norma infraconstitucional por sua não recepção também pode decorrer do advento de Emenda Constitucional, nesse sentido é o entendimento do Supremo Tribunal Federal in verbis:
EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: art. 2º, inciso IV, alínea c, da L. est. 12.755, de 22 de março de 2005, do Estado de Pernambuco, que estabelece a vinculação da Defensoria Pública estadual à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos: violação do art. 134, § 2º, da Constituição Federal, com a redação da EC 45/04: inconstitucionalidade declarada.
1. A EC 45/04 outorgou expressamente autonomia funcional e administrativa às defensorias públicas estaduais, além da iniciativa para a propositura de seus orçamentos (art. 134, § 2º): donde, ser inconstitucional a norma local que estabelece a vinculação da Defensoria Pública a Secretaria de Estado.
2. A norma de autonomia inscrita no art. 134, § 2º, da Constituição Federal pela EC 45/04 é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, dado ser a Defensoria Pública um instrumento de efetivação dos direitos humanos. II. Defensoria Pública: vinculação à Secretaria de Justiça, por força da LC est (PE) 20/98: revogação, dada a incompatibilidade com o novo texto constitucional.
1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal - malgrado o dissenso do Relator - que a antinomia entre norma ordinária anterior e a Constituição superveniente se resolve em mera revogação da primeira, a cuja declaração não se presta a ação direta.
2. O mesmo raciocínio é aplicado quando, por força de emenda à Constituição, a lei ordinária ou complementar anterior se torna incompatível com o texto constitucional modificado: precedente[v].
O artigo 56, da Lei Complementar 35/79, foi editado anteriormente à reforma do artigo 40, da Constituição Federal, promovida em 1998, e encontra-se com este incompatível, conforme a ampla explanação supramencionada, fato este que enseja a sua não-recepção pelo texto modificado da Carta Magna.
Então, a aposentadoria compulsória por ser um benefício previdenciário que pressupõe, nos termos da Constituição Federal, a realização de contribuições e por exigir como requisito para a sua concessão o atingimento da idade de 70 (setenta) anos, não pode ser considerada pela legislação infraconstitucional uma sanção decorrente de atos tidos como incompatíveis com o exercício da magistratura, ante a total ausência de amparo na Lei Maior.
[i] MARTINS, Sérgio Pinto. DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL. 27ª edição. Ed. Atlas.
[ii] TAVARES, Marcelo Leonardo. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. 10ª edição. Ed. Lúmen Júris.
[iii] TEIXEIRA, Flávio Germano de Sena. O CONTROLE DAS APOSENTADORIAS PELOS TRIBUNAIS DE CONTAS. Ed. Fórum.
[iv] MARTINS, Bruno Sá Freire. DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO. Ed. Ltr.
[v] STF. ADI n. 3569/PE. Rel. Min. Sepulveda Pertence. J. 02/04/2007
CNJ aplica pena mais branda para juiz do Pará - Consultor Jurídico, 16/12/2010
O Plenário do Conselho Nacional de Justiça optou por aplicar uma pena mais branda a um juiz do Pará, acusado de abuso de poder e crime contra o patrimônio público. De acordo com o processo, o juiz destruiu, com um trator, o armazém de uma cidade, sob alegação de que “era assessor do prefeito”. No TJ-PA, a pena ao juiz foi de aposentadoria compulsória. No entanto, no julgamento da Revisão Disciplinar no CNJ, o relator do caso, conselheiro Leomar Barros Amorim, optou pela remoção compulsória — transferência para outra comarca. Ele entendeu que, na sessão do TJ-PA, não havia quórum suficiente para que a questão fosse avaliada. Os conselheiros ressaltaram a gravidade do caso, que diz respeito à acusação de sérios abusos de poder por parte do magistrado e de crime contra o patrimônio público. No entanto, por maioria de votos, seguiram o entendimento do relator. Ainda é possível recorrer da decisão no próprio TJ-PA. Com informações da Assessoria de Imprensa do CNJ. Revisão Disciplinar 2009.10.00.004456-6
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011
CONSTITUIÇÃO PROLIXA, ANALÍTICA E CASUÍSTICA
A Constituição é prolixa, analítica e casuística. Quando o Legislativo vai mal, o Judiciário toma conta - Luís Roberto Barroso - Constitucionalista
A Constituição Federal de 1988 é prolixa, analítica e casuística, mas nem por isso deixa de merecer o título de fiadora da estabilidade institucional que o país vive desde a sua promulgação, há 20 anos. A opinião é do professor Luís Roberto Barroso, um dos constitucionalistas mais respeitados do país, para quem “o momento da elaboração da Constituição fez com que ela fosse a Constituição das nossas circunstâncias, e não a Constituição da nossa maturidade”.
Barroso esteve à frente de algumas das mais polêmicas discussões que se travaram no Supremo Tribunal Federal recentemente. Foi o advogado a Associação dos Magistrados Brasileiros na Ação Declaratória de Constitucionalidade a partir da qual o STF proibiu o nepotismo no país. Atua também na ação que defende o direito de gestantes decidirem se querem interromper a gravidez em casos de fetos anencéfalos.
Estudioso dedicado de constituições e do Supremo, Barroso considera que a Constituição de 1988 é o símbolo maior do sucesso da transição de um Estado autoritário e intolerante para um Estado democrático de Direito. Ele lembra que sob a nova Carta realizaram-se cinco eleições presidenciais, por voto direto, secreto e universal, com debate público amplo, participação popular e alternância de partidos políticos no poder. “E não foram tempos banais. Ao longo desse período, diversos episódios poderiam ter deflagrado crises que, em outros tempos, teriam levado à ruptura institucional”, ressalta.
Em entrevista à revista Consultor Jurídico, contudo, Barroso não deixa de revelar as fraquezas da Carta. O professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro aponta que muita coisa que foi colocada na Constituição em 1988 poderia perfeitamente ser tratada por lei ordinária. O detalhe, além de inchar a Constituição, obriga os governos a fazer política com maiorias qualificadas.
“Para aprovar uma lei ordinária, é preciso maioria simples do Congresso. Mas para fazer uma emenda à Constituição, é preciso três quintos. Então, a excessiva constitucionalização das matérias é responsável, em alguma medida, pelo tipo de relação que o Executivo tem que estabelecer com o Congresso”, conta.
Mais grave, porém, que a falta de regulamentação de muitos dispositivos previstos em lei, é a falta de políticas públicas para aplicar direitos fundamentais garantidos pelo texto constitucional. Para o professor, mais importante do que regulamentar o direito de greve de funcionários públicos, por exemplo, é desenvolver uma política habitacional que garanta a todo cidadão o direito à moradia, previsto na Constituição.
Na entrevista, a segunda da série que a ConJur publica em comemoração aos 20 anos da Constituição de 88, o professor fala de reforma política, políticas sociais, analisa o perfil ativista do Supremo Tribunal Federal e mostra como algumas das principais garantias dos cidadãos nos Estados Unidos foram conseguidas graças a um movimento semelhante ao que acontece hoje no Brasil: “Quando a política tradicional vive um mau momento, o Judiciário se expande. E, cá para nós, antes o Judiciário que as Forças Armadas”. Consciente da utilidade circunstancial do ativismo judicial, porém, ele faz uma advertência. “Ativismo é como colesterol: tem do bom e tem do mau.”
Trechos da entrevista
"A vida brasileira se judicializou, sobretudo nos últimos anos. E só parte da responsabilidade é da Constituição de 88. Por ser bastante analítica, ela trouxe para o espaço da interpretação constitucional algumas matérias que, se não tivessem sido constitucionalizadas, seriam discutidas no Congresso, no processo político majoritário. Não nos tribunais."
"Na medida em que o assunto está na Constituição, ele sai da esfera política, da deliberação parlamentar, e se torna matéria de interpretação judicial".
"O atual sistema político brasileiro levou a um descolamento entre a sociedade civil e a classe política. Há algumas demandas da sociedade que não são atendidas a tempo pelo Congresso Nacional. E o que acontece? Nos espaços em que havia demandas sociais importantes e o Legislativo não atuou, o Judiciário se expandiu."
"Há um déficit de legitimidade do processo político majoritário para atender algumas das grandes demandas da sociedade e, portanto, o Judiciário está suprindo este déficit. Mas não há democracia sem um Poder Legislativo atuante, dotado de credibilidade e com identificação com a sociedade civil."
"A Constituição é prolixa, analítica e casuística. E, veja, sou um defensor da Constituição de 88 porque ela representa um vertiginoso sucesso institucional. Mas o momento da elaboração da Constituição fez com que ela fosse a Constituição das nossas circunstâncias, e não a Constituição da nossa maturidade."
"O problema de colocar na Constituição o que deveria estar na legislação ordinária infraconstitucional é que obriga a política ordinária a se desenvolver organizando maiorias qualificadas."
"Cabe à Constituição estabelecer os direitos e valores fundamentais de uma sociedade e deixar o restante para a política. Parte disso também é culpa do que eu gosto de chamar de narcisismo constitucional. Cada um que chega ao poder quer uma Constituição à sua imagem e semelhança."
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Apesar do autor defender a constituição de 1988, ele reconhece aspectos nocivos na sua aplicação. A constituição federal de 1988 prioriza direitos corporativos em relação a deveres, estabelece privilégios à elite governante, concede direitos utópicos ao cidadão, não agrega deveres e contrapartidas, deprecia a ordem pública, enfraquece os instrumentos de coação do Estado e tranforma tudo em matéria constitucional, cujos efeitos fomentam a insegurança jurídica, as divergências, a desmoralização dos tribunais regionais, a criminalidade, o desrespeito às leis, a desarmonia, a desigualdade e as desordens judiciária e jurídica no Brasil.
Fontes:
Revista Consultor Jurídico, 21/09/2008 - Rodrigo Haidar: é chefe de redação(a íntegra da entrevista).
A Constituição Federal de 1988 é prolixa, analítica e casuística, mas nem por isso deixa de merecer o título de fiadora da estabilidade institucional que o país vive desde a sua promulgação, há 20 anos. A opinião é do professor Luís Roberto Barroso, um dos constitucionalistas mais respeitados do país, para quem “o momento da elaboração da Constituição fez com que ela fosse a Constituição das nossas circunstâncias, e não a Constituição da nossa maturidade”.
Barroso esteve à frente de algumas das mais polêmicas discussões que se travaram no Supremo Tribunal Federal recentemente. Foi o advogado a Associação dos Magistrados Brasileiros na Ação Declaratória de Constitucionalidade a partir da qual o STF proibiu o nepotismo no país. Atua também na ação que defende o direito de gestantes decidirem se querem interromper a gravidez em casos de fetos anencéfalos.
Estudioso dedicado de constituições e do Supremo, Barroso considera que a Constituição de 1988 é o símbolo maior do sucesso da transição de um Estado autoritário e intolerante para um Estado democrático de Direito. Ele lembra que sob a nova Carta realizaram-se cinco eleições presidenciais, por voto direto, secreto e universal, com debate público amplo, participação popular e alternância de partidos políticos no poder. “E não foram tempos banais. Ao longo desse período, diversos episódios poderiam ter deflagrado crises que, em outros tempos, teriam levado à ruptura institucional”, ressalta.
Em entrevista à revista Consultor Jurídico, contudo, Barroso não deixa de revelar as fraquezas da Carta. O professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro aponta que muita coisa que foi colocada na Constituição em 1988 poderia perfeitamente ser tratada por lei ordinária. O detalhe, além de inchar a Constituição, obriga os governos a fazer política com maiorias qualificadas.
“Para aprovar uma lei ordinária, é preciso maioria simples do Congresso. Mas para fazer uma emenda à Constituição, é preciso três quintos. Então, a excessiva constitucionalização das matérias é responsável, em alguma medida, pelo tipo de relação que o Executivo tem que estabelecer com o Congresso”, conta.
Mais grave, porém, que a falta de regulamentação de muitos dispositivos previstos em lei, é a falta de políticas públicas para aplicar direitos fundamentais garantidos pelo texto constitucional. Para o professor, mais importante do que regulamentar o direito de greve de funcionários públicos, por exemplo, é desenvolver uma política habitacional que garanta a todo cidadão o direito à moradia, previsto na Constituição.
Na entrevista, a segunda da série que a ConJur publica em comemoração aos 20 anos da Constituição de 88, o professor fala de reforma política, políticas sociais, analisa o perfil ativista do Supremo Tribunal Federal e mostra como algumas das principais garantias dos cidadãos nos Estados Unidos foram conseguidas graças a um movimento semelhante ao que acontece hoje no Brasil: “Quando a política tradicional vive um mau momento, o Judiciário se expande. E, cá para nós, antes o Judiciário que as Forças Armadas”. Consciente da utilidade circunstancial do ativismo judicial, porém, ele faz uma advertência. “Ativismo é como colesterol: tem do bom e tem do mau.”
Trechos da entrevista
"A vida brasileira se judicializou, sobretudo nos últimos anos. E só parte da responsabilidade é da Constituição de 88. Por ser bastante analítica, ela trouxe para o espaço da interpretação constitucional algumas matérias que, se não tivessem sido constitucionalizadas, seriam discutidas no Congresso, no processo político majoritário. Não nos tribunais."
"Na medida em que o assunto está na Constituição, ele sai da esfera política, da deliberação parlamentar, e se torna matéria de interpretação judicial".
"O atual sistema político brasileiro levou a um descolamento entre a sociedade civil e a classe política. Há algumas demandas da sociedade que não são atendidas a tempo pelo Congresso Nacional. E o que acontece? Nos espaços em que havia demandas sociais importantes e o Legislativo não atuou, o Judiciário se expandiu."
"Há um déficit de legitimidade do processo político majoritário para atender algumas das grandes demandas da sociedade e, portanto, o Judiciário está suprindo este déficit. Mas não há democracia sem um Poder Legislativo atuante, dotado de credibilidade e com identificação com a sociedade civil."
"A Constituição é prolixa, analítica e casuística. E, veja, sou um defensor da Constituição de 88 porque ela representa um vertiginoso sucesso institucional. Mas o momento da elaboração da Constituição fez com que ela fosse a Constituição das nossas circunstâncias, e não a Constituição da nossa maturidade."
"O problema de colocar na Constituição o que deveria estar na legislação ordinária infraconstitucional é que obriga a política ordinária a se desenvolver organizando maiorias qualificadas."
"Cabe à Constituição estabelecer os direitos e valores fundamentais de uma sociedade e deixar o restante para a política. Parte disso também é culpa do que eu gosto de chamar de narcisismo constitucional. Cada um que chega ao poder quer uma Constituição à sua imagem e semelhança."
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Apesar do autor defender a constituição de 1988, ele reconhece aspectos nocivos na sua aplicação. A constituição federal de 1988 prioriza direitos corporativos em relação a deveres, estabelece privilégios à elite governante, concede direitos utópicos ao cidadão, não agrega deveres e contrapartidas, deprecia a ordem pública, enfraquece os instrumentos de coação do Estado e tranforma tudo em matéria constitucional, cujos efeitos fomentam a insegurança jurídica, as divergências, a desmoralização dos tribunais regionais, a criminalidade, o desrespeito às leis, a desarmonia, a desigualdade e as desordens judiciária e jurídica no Brasil.
Fontes:
Revista Consultor Jurídico, 21/09/2008 - Rodrigo Haidar: é chefe de redação(a íntegra da entrevista).
CONFUSÃO JURÍDICA - STF CONTRARIA CÓDIGO ELEITORAL
Decisão do STF causa confusão jurídica na posse de suplentes de deputados federais - 19/01/2011 às 11h03m; O Globo
RIO - Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) provoca dúvidas jurídicas na posse de suplentes de parlamentares que vão se licenciar para assumir cargos nos governos federal e estaduais. Em dezembro, os ministros do STF determinaram, em caráter liminar, que a Câmara dos Deputados empossasse o primeiro suplente do partido, e não da coligação, no lugar do ex-deputado Natan Donadon (PMDB-RO), que havia renunciado ao mandato. Se prevalecer a decisão do STF, as vagas serão preenchidas de uma forma diferente da que a Câmara vem usando há cinco décadas, segundo o site Congresso em Foco. Pelo menos 39 parlamentares se licenciarão para assumir secretarias e ministérios .
Dois suplentes entraram com ação no Supremo para serem beneficiados pela mesma decisão tomada no caso de Natan Donadon. Assim, assumiriam a vaga de primeiro suplente e assumiriam o mandato. É o caso de Victor da Rocha Mendes (PSB), que com 27.286 votos foi diplomado no TRE-RJ como segundo suplente da coligação formada pelo PSB e pelo PMN.
Victor quer assumir a vaga que será deixada por Alexandre Cardoso (PSB), eleito deputado federal e que retorna para a Secretaria de Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, de onde saiu para concorrer nas últimas eleições. No entanto, pela regra atual quem assume é o suplente mais votado da coligação eleita, que no caso é Alberto Lopes, do PMN, e não o suplente mais votado do partido de que se licencia.
Ainda de acordo com o site Congresso em Foco, também requer o mesmo benefício o suplente Humberto Souto (PPS-MG), para assumir a vaga de Alexandre Oliveira (PPS-MG), eleito deputado e que tomou posse como secretário de Gestão Metropolitana do governo mineiro. No mandado de segurança, Souto argumenta que os efeitos da coligação cessam com o fim das eleições. A partir daí o que vale, na visão do suplente, é o desempenho do partido.
A lógica da maioria dos ministros do STF contraria o que está previsto no Código Eleitoral. Nele, está a previsão de que, para as eleições, as coligações equivalem a um partido político.
- Isso indica que o ministro não entendeu como funcionam as coligações para as eleições proporcionais -disparou o cientista político da Universidade de Brasília (UnB), David Fleischer, em entrevista ao Congresso em Foco.
O ministro Gilmar Mendes disse, no seu voto, que a jurisprudência, tanto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) quando do STF, é firme no sentido de que o mandato parlamentar conquistado no sistema eleitoral proporcional pertence ao partido.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Para que existem as leis se o judiciário legisla de acordo com a convicção pessoal dos magistrados? Este fato mostra o nível de insegurança jurídica vigente no Brasil. Ninguém se entende, as leis não são claras e a aplicação delas é ao bel prazer do STF.
O Brasil precisa de uma constituição enxuta e leis claras harmonizando direitos e deveres sem privilégios políticos ou jurídicos.O Brasil precisa de uma justiça descentralizada, forte, direta, próxima, transparente e lógica que se seja coativa e se baseie nas leis. As cortes supremas só deveriam decidir o transitado em julgado sobre casos de relevância interestadual, interesses internacional e aqueles específicos de suas atribuições de poder.
As decisões alternativas e medidas pessoais devem ser justificadas dentro da lógica e da razão e na relevância da ordem pública e do direito coletivo, e jamais na convicção pessoal do magistrado ou na situação mais fraca ou mais poderosa de uma das partes.
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
ADVOGADO DISPENSÁVEL?
DEFESA LIVRE - Em nove países europeus, advogado é dispensável - Consultor Jurídico, 05/01/2011 - POR ALINE PINHEIRO
A ideia de que a Justiça só é justa se o acusado for defendido por um advogado não vale em nove países europeus. Na Inglaterra, Áustria, Finlândia, Espanha, Suécia, Albânia, Bulgária, Romênia e na Bósnia e Herzegovina não é obrigatório que o réu seja representado nos tribunais por um advogado devidamente qualificado. Nos nove países, os defensores são dispensáveis em qualquer das áreas do Direito.
É o que mostra um levantamento divulgado pelo Conselho da Europa sobre todos os países europeus, exceto Alemanha e o pequeno Liechtenstein, que não conseguiram entregar as informações ao Conselho antes do fechamento do relatório. O diagnóstico foi feito com base em dados de 2008, mas dá um panorama geral da advocacia nos países da Europa.
Países que dispensam advogado em todas as áreas do Direito, inclusive criminal: Albânia, Áustria, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Espanha, Finlândia, Inglaterra, Romênia, Suécia.
De acordo com o estudo, esses nove países representam uma minoria no continente. A exigência de um advogado para representar o cidadão na corte prevalece tanto em matéria criminal como cível. Na Hungria, o defensor pode ser dispensado para acusados de crimes menos ofensivos.
Em matéria cível, há mais espaço para o cidadão bater nas portas do Judiciário sozinho. É o que acontece em 28 Estados, onde o advogado pode ser dispensado. Entre estes, há casos em que o profissional é exigido em algum momento do trâmite do processo, como na República Tcheca, onde o advogado é necessário num processo que chega à Suprema Corte.
O estudo divulgado pelo Conselho da Europa procura mostrar também como é a cobrança de honorários pelos advogados em cada país. Na maioria dos Estados europeus, os advogados estão livres para negociar com o cliente a remuneração. Em oito, no entanto, há limites que devem ser obedecidos. São eles: Dinamarca, Grécia, Itália, Montenegro, San Marino, Eslovênia, Suíça e Irlanda do Norte. Nessa parte, o diagnóstico divulgado é manco. Não especifica quais são esses limites e como eles são fixados. Na Itália, por exemplo, o Ministério da Justiça, a cada dois anos, fixa o mínimo e máximo que pode ser cobrado pelos advogados.
Deslanche da advocacia
Na Europa, em 2008, havia quase 900 mil advogados espalhados pelos países, o que dá mais de 100 advogados para cada grupo de 100 mil cidadãos europeus. Em média, os países europeus têm menos de 90 advogados por grupo de 100 moradores. Na prática, a realidade de cada país é bastante diferente da do outro.
Na Escócia, por exemplo, o número de advogados por grupo de 100 mil habitantes não chega a seis. Isso se explica pela quantidade de defensores legais, que não têm o título de advogado, mas são igualmente habilitados para defender o cidadão na Justiça. Já na Grécia, há mais de 350 advogados para cada 100 mil habitantes.
Estado- Advogados/100 mil hab-Advogados/juiz
Escócia 5,4 1,5
França 75,8 8,3
Portugal 260,2 14,5
Espanha 266,5 25
Itália 332,1 32,4
Grécia 350,6 10,5
Comparativamente ao número do juiz, os Estados europeus possuem, normalmente, algo como quatro advogados por juiz. Nesse número, não estão incluídos os chamados representantes legais que, fora a Escócia, têm participação tão significativa quanto aos dos advogados na Inglaterra, Irlanda, Irlanda do Norte, Noruega, Chipre e Montenegro.
Em Portugal, conhecido pela sua alta litigiosidade, há 260 advogados para cada 100 mil habitantes e mais de 14 para cada juiz. Na Itália, os números são mais altos: para cada juiz italiano, há mais de 30 advogados profissionais. É o país com mais disparidade entre o número de advogados e o de magistrados.
No Brasil
No Brasil a Constituição, em seu artigo 133, diz que o advogado é essencial para a administração da Justiça. A presença do advogado só é dispensada em julgamentos dos juizados especiais. A OAB é contra a resssalva e pugna por tornar a intervenção do advogado obrigatória nos juizados originalmente conhecidos como de "pequenas causas" e criados justamente para simplificar o acesso do cidadão à Justiça.
Os números da advocacia brasileira também não têm paralelo com os da Europa. A OAB tem 713 mil advogados inscritos em seu quadro. O que dá a media de 375 advogados para 100 mil habitantes, uma relação superior à de qualquer país europeu e que se aproxima apenas à da Grêcia (350) e da Itália (332) . Como atuam 16.200 juizes nas três ramas da Justiça brasileira (estadual, federal e trabalhista), tem-se ainda que para cada juiz correspondem 44 advogados por magistrado, bem superior aos 32 da Italia, a campeã europeia nesse quesito.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Existe uma citação de cadeia - "Se eu sou inocente, não preciso de advogado." Mas esta citação não serve para o cidadão no Brasil - "Aqui, sem advogado, você está ferrado!"
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
TOLERANTE - PRESO PELA 20ª VEZ
PRESO PELA 20ª VEZ, BANDIDO ATIRA EM POLICIAIS. VAIVÉM DO CRIME. Ladrão preso pela 20ª vez na Capital - ZERO HORA 17/01/2011
Jovem de 21 anos foi baleado após tentativa de arrombamento de garagem na Capital
Uma tentativa de arrombamento na Avenida Nilo Peçanha, em Porto Alegre, terminou com um suspeito baleado após troca de tiros com a Brigada Militar no final da noite de sábado. A ocorrência chama atenção por um motivo: o jovem ferido, de apenas 21 anos, tem o nome registrado em 20 flagrantes da Brigada.
De acordo com informações do soldado Rodrigo Viedell, da 1ª Companhia do 11º Batalhão de Polícia Militar, desde 2006, Fabrício Almeida de Azevedo teria sido detido em ocorrências que vão desde furto de veículo até falsa identidade, passando por arrombamentos de estabelecimentos comerciais e receptação. Em 2009, foram 12 detenções. Sua área de atuação ficaria entre os bairros Petrópolis, Bela Vista e Cidade Baixa.
Preso pela última vez em setembro de 2010, o jovem foi encaminhado ao Instituto Penal de Mariante, de onde fugiu no início deste mês. Embora Azevedo seja uma figura já conhecida dos policiais que atuam na zona norte da Capital, mantê-lo preso não é uma certeza. Responsável pela prisão do suspeito, o soldado Viedell lamenta a rapidez com que criminosos voltam às ruas após a atuação da BM.
– Furto, na lei, não dá muita coisa. A gente faz o trabalho, a Polícia Civil investiga, e depois ele é solto, porque a pena para furto é muito pequena – resigna-se.
Na noite do sábado, Azevedo tentava, com outro suspeito, arrombar uma garagem no bairro Bela Vista, quando foram vistos por policiais em uma viatura da 1ª Companhia do 11º Batalhão de Polícia Militar. Ao perceberem a presença dos policiais militares, os dois fugiram.
Durante a perseguição, Azevedo trocou tiros com o soldado Viedell. Baleado no peito, Azevedo foi preso na Avenida Lucas de Oliveira, próximo à Avenida Protásio Alves. Com ele, foi apreendido um revólver com a numeração raspada. O outro suspeito conseguiu fugir. O policial não se feriu.
Ainda na madrugada de domingo, o jovem passou por um cirurgia. Até o início da noite de ontem, ele estava internado em estado grave no Hospital de Pronto Socorro (HPS), sem previsão de alta.
Repetição de casos provoca revolta
Essa não é a primeira vez que a reincidência de Fabrício Almeida de Azevedo chama a atenção da polícia. Em reportagem de Zero Hora publicada em 28 novembro de 2009, o então comandante do 11º BPM, tenente-coronel Sérgio Lemos Simões, 30 anos de serviços prestados à Brigada Militar, demonstrava espanto e revolta com a rapidez com que detidos em flagrante por furto voltavam às ruas.
Entre os sete exemplos de reincidentes apresentados por Simões naquela oportunidade, estava o de Azevedo, que havia sido preso pela oitava vez em dois anos.
Na ocasião, ele fora detido pelos policiais militares do 11º BPM carregando um botijão, 10 bancos de plástico e roupas furtadas de uma academia de ginástica arrombada no bairro Petrópolis.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - DE QUEM É A NEGLIGÊNCIA: DOS POLICIAIS QUE ARRISCAM A VIDA PARA PRENDER 20 VEZES O MESMO BANDIDO OU DA JUSTIÇA QUE TOLERA O ROL DE CRIMES COMETIDOS PELO BANDIDO?
E AÍ DE QUEM RECLAMA - É TRANSFERIDO, DESTERRADO, CRITICADO, DESONRADO, DESACREDITADO, DESERDADO,...
Jovem de 21 anos foi baleado após tentativa de arrombamento de garagem na Capital
Uma tentativa de arrombamento na Avenida Nilo Peçanha, em Porto Alegre, terminou com um suspeito baleado após troca de tiros com a Brigada Militar no final da noite de sábado. A ocorrência chama atenção por um motivo: o jovem ferido, de apenas 21 anos, tem o nome registrado em 20 flagrantes da Brigada.
De acordo com informações do soldado Rodrigo Viedell, da 1ª Companhia do 11º Batalhão de Polícia Militar, desde 2006, Fabrício Almeida de Azevedo teria sido detido em ocorrências que vão desde furto de veículo até falsa identidade, passando por arrombamentos de estabelecimentos comerciais e receptação. Em 2009, foram 12 detenções. Sua área de atuação ficaria entre os bairros Petrópolis, Bela Vista e Cidade Baixa.
Preso pela última vez em setembro de 2010, o jovem foi encaminhado ao Instituto Penal de Mariante, de onde fugiu no início deste mês. Embora Azevedo seja uma figura já conhecida dos policiais que atuam na zona norte da Capital, mantê-lo preso não é uma certeza. Responsável pela prisão do suspeito, o soldado Viedell lamenta a rapidez com que criminosos voltam às ruas após a atuação da BM.
– Furto, na lei, não dá muita coisa. A gente faz o trabalho, a Polícia Civil investiga, e depois ele é solto, porque a pena para furto é muito pequena – resigna-se.
Na noite do sábado, Azevedo tentava, com outro suspeito, arrombar uma garagem no bairro Bela Vista, quando foram vistos por policiais em uma viatura da 1ª Companhia do 11º Batalhão de Polícia Militar. Ao perceberem a presença dos policiais militares, os dois fugiram.
Durante a perseguição, Azevedo trocou tiros com o soldado Viedell. Baleado no peito, Azevedo foi preso na Avenida Lucas de Oliveira, próximo à Avenida Protásio Alves. Com ele, foi apreendido um revólver com a numeração raspada. O outro suspeito conseguiu fugir. O policial não se feriu.
Ainda na madrugada de domingo, o jovem passou por um cirurgia. Até o início da noite de ontem, ele estava internado em estado grave no Hospital de Pronto Socorro (HPS), sem previsão de alta.
Repetição de casos provoca revolta
Essa não é a primeira vez que a reincidência de Fabrício Almeida de Azevedo chama a atenção da polícia. Em reportagem de Zero Hora publicada em 28 novembro de 2009, o então comandante do 11º BPM, tenente-coronel Sérgio Lemos Simões, 30 anos de serviços prestados à Brigada Militar, demonstrava espanto e revolta com a rapidez com que detidos em flagrante por furto voltavam às ruas.
Entre os sete exemplos de reincidentes apresentados por Simões naquela oportunidade, estava o de Azevedo, que havia sido preso pela oitava vez em dois anos.
Na ocasião, ele fora detido pelos policiais militares do 11º BPM carregando um botijão, 10 bancos de plástico e roupas furtadas de uma academia de ginástica arrombada no bairro Petrópolis.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - DE QUEM É A NEGLIGÊNCIA: DOS POLICIAIS QUE ARRISCAM A VIDA PARA PRENDER 20 VEZES O MESMO BANDIDO OU DA JUSTIÇA QUE TOLERA O ROL DE CRIMES COMETIDOS PELO BANDIDO?
E AÍ DE QUEM RECLAMA - É TRANSFERIDO, DESTERRADO, CRITICADO, DESONRADO, DESACREDITADO, DESERDADO,...
SENTENÇA A JATO
PROCESSO ACELERADO - Sentença a jato ganha espaço no Judiciário. Juízes criminais adotam prática de decidir destino do réu já na audiência e reduzem o tempo dos processos - JOSÉ LUÍS COSTA, Zero Hora 16/01/2011
Na manhã de terça-feira, após uma hora de audiência, diante da defesa e da acusação, olho no olho com o réu, o juiz Émerson Silveira Mota proferiu a sentença que livrou da cadeia um homem acusado de tráfico de drogas:
– Não se condena criminalmente com base em probabilidades. In dubio pro reo. O senhor está absolvido. Espero não lhe ver mais aqui.
De imediato, a promotora Lisiane Rubim disse que iria recorrer da decisão. O episódio faz parte da rotina diária da 2ª Vara Criminal de Tramandaí, que concentra também o Juizado da Infância e da Juventude. O juiz assina sentenças em audiências, agilizando recursos de advogados e de promotores e abreviando trâmites burocráticos em até 60 dias.
Prevista no Código de Processo Penal (CPP), a partir de 2008, a medida gera polêmica entre advogados. Mas vem sendo adotada por uma parcela de magistrados, em uma tentativa de diminuir a avalanche de processos que avança sobre a magistratura gaúcha. O Rio Grande do Sul é recordista em ações no país, conforme pesquisa do Conselho Nacional de Justiça.
Na mesma terça-feira, conduzindo sete audiências em mais de seis horas de trabalho, Mota determinou três condenações – por abuso sexual, tráfico de drogas e tentativa de homicídio.
Aos 38 anos, juiz há 11 na mesma vara, adepto de um estilo simples e informal no trato com as pessoas, amante de música – é guitarrista da banda de rock Judges com três colegas –, Mota é conhecido por ter a “caneta pesada” (ser rigoroso) e por empregar um ritmo veloz de trabalho. Julga mais da metade dos crimes em audiências.
– Tento ser justo e rápido. É bom para a Justiça, para as partes, para o cartório e para todo o sistema. Só não julgo em audiência quando realmente não dá. Casos mais complexos com vários réus, de maior dificuldade de apuração dos fatos, sem testemunhas presenciais ou provas técnicas – observa.
Inversão da lógica dos tribunais
O método suprime uma série de etapas como a emissão de notas de expediente, citações, intimações e tem como efeito colateral a redução da carga de serviço de funcionários e das montanhas de processos sobre as mesas, tão comuns em fóruns. E tem sobrado mais tempo para Mota dedicar-se a uma importante atividade social: palestrar sobre os malefícios do crack em escolas da região.
Além de dispensar rotinas de trabalho, a medida está conseguindo inverter uma lógica dos tribunais: a do ingresso de processos ser muito superior à capacidade de julgar, o que obriga magistrados a esticar o expediente em casa até altas horas. Este mês, apesar do aumento do volume de crimes por conta da temporada de veraneio, a 2ª Vara Criminal de Tramandaí recebeu 108 processos, e já foram encerrados 249.
O magistrado do Litoral Norte não está sozinho nessa nova empreitada. Na 1ª Vara Criminal do Fórum do Sarandi, na Capital, a juíza Viviane de Faria Miranda adotou como regra aplicar sentenças em audiências na maior parte dos casos.
O mesmo acontece com o juiz Carlos Francisco Gross, da 9ª Vara Criminal do Fórum Central. Ele lembra que, a contar da entrada do processo ao julgamento, tudo pode ser decidido em até 60 dias. O juiz salienta que a medida contribui, e muito, para melhorar a imagem do Judiciário.
– Ao decidir prontamente, principalmente na esfera criminal, o juiz garante que as partes tenham uma resposta imediata para seus problemas. Crescem o crédito da sociedade e o temor de quem comete o crime – afirma.
Medida causa controvérsia
Sentenças criminais decretadas em audiências encontram resistência entre advogados e defensores públicos. Um dos críticos é o professor de Direito Processual Penal e defensor público Álvaro Roberto Antanavicius Fernandes.
– Não tenho dúvidas de que traz prejuízos. Há casos em que é humanamente impossível analisar toda a prova e expor oralmente a defesa de maneira precisa e abrangente. O advogado não é enciclopédia para saber tudo e nem computador para processar informações na velocidade exigida pelo rito – adverte.
O advogado Aury Lopes Junior, doutor em Direito Processual Penal, diz que a medida é positiva apenas para os casos mais simples e alerta para riscos de eventuais decisões judiciais precipitadas:
– É preciso respeitar o tempo para investigar, para acusar, para produzir a prova, para defender e, finalmente, o tempo de maturação e decisão. Casos complexos não podem ser objetos de debates orais e sentença em audiência única. Seria um atropelo do tempo do direito.
Postura semelhante é defendida por Ivan Pareta, vice-presidente regional da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas.
O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, João Ricardo dos Santos Costa, afirma que o método é bem-vindo para dar celeridade aos processos e assegura que o magistrado só decide quando se sente em condições.
– O juiz não é obrigado a dar sentença em audiência. Ele julga no momento em que firma convencimento dos fatos – garante.
O Tribunal de Justiça incentiva a prática de sentenças em audiências, lembra o juiz-corregedor Marcelo Mairon. Ele diz que a medida traz grandes ganhos “desde que não comprometa a qualidade do ato”.
– Esse modelo é o modelo ideal – acrescenta Marcelo Dornelles, presidente da Associação do Ministério Público gaúcho.
ENTREVISTA - “Precisa estar bastante seguro para julgar”- Juiz Carlos Francisco Gross. Juiz há mais de 15 anos, Carlos Francisco Gross, titular da 9ª Vara Criminal de Porto Alegre, é um defensor da nova regra. A maioria de suas sentenças é proferida em audiências.
ZH – Qual a vantagem para o julgador?
Carlos Francisco Gross – Ao resolver a ação penal em audiência, o juiz está diante dos fatos que acabaram de ser reproduzidos em depoimentos e tem condições de decidir, inclusive, levando em conta impressões pessoais percebidas durante a audiência. O juiz capta uma série de coisas que não vão para o papel. Percebe quando estão mentindo.
ZH – Em que aspecto é mais positiva?
Gross – O da celeridade. Evita novas diligências para a intimação do réu da sentença, e economiza tempo do juiz ao tornar desnecessário relembrar de todo o caso ao julgar, posteriormente, a causa.
ZH– Qual a sua estratégia para decidir na hora?
Gross – Eu me preparo. Fico bem atento às declarações que acabo de ouvir, faço algumas anotações. Precisa estar bastante seguro para julgar.
ZH – A prática evita manobras da defesa que poderiam protelar o processo e levando a sua extinção?
Gross – Sempre que os atos processuais são mais concentrados, as oportunidades de criar incidentes acabam reduzidas.
ZH – Alguns magistrados não a adotam porque defensores públicos e advogados têm dificuldades de elaborar a tese da defesa na hora. Como contornar essa questão?
Gross – O uso de debater e julgar em audiência é bastante antigo em processos cíveis. Eu costumava utilizá-lo. É preciso criar uma cultura de utilização do método.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Judiciário precisa se desburocratizar, aplicando a lei de forma coativa, prática, célere e presencial. A justiça não é mediadora, é coativa. Defendo estes estes tribunais "a jato" pelo fato de aproximar a justiça dos delitos, fazendo com que o magistrado tome "in loco" pleno conhecimento do ambiente, das partes e dos fatos que envolveram a ilicitude a ser julgada. Chega de papéis, precisamos de uma justiça prática, destemida, sem intermediário e que tome decisões confrontando a realidade e não papéis. A maioria dos processos é cheio de testemunhos sem importância que vão inchando para confundir o julgamento. Sou a favor desta "justiça a jato" que funcionaria para a maioria dos crimes, passando a outro nível de acordo com o grau de ofensividade.
Na manhã de terça-feira, após uma hora de audiência, diante da defesa e da acusação, olho no olho com o réu, o juiz Émerson Silveira Mota proferiu a sentença que livrou da cadeia um homem acusado de tráfico de drogas:
– Não se condena criminalmente com base em probabilidades. In dubio pro reo. O senhor está absolvido. Espero não lhe ver mais aqui.
De imediato, a promotora Lisiane Rubim disse que iria recorrer da decisão. O episódio faz parte da rotina diária da 2ª Vara Criminal de Tramandaí, que concentra também o Juizado da Infância e da Juventude. O juiz assina sentenças em audiências, agilizando recursos de advogados e de promotores e abreviando trâmites burocráticos em até 60 dias.
Prevista no Código de Processo Penal (CPP), a partir de 2008, a medida gera polêmica entre advogados. Mas vem sendo adotada por uma parcela de magistrados, em uma tentativa de diminuir a avalanche de processos que avança sobre a magistratura gaúcha. O Rio Grande do Sul é recordista em ações no país, conforme pesquisa do Conselho Nacional de Justiça.
Na mesma terça-feira, conduzindo sete audiências em mais de seis horas de trabalho, Mota determinou três condenações – por abuso sexual, tráfico de drogas e tentativa de homicídio.
Aos 38 anos, juiz há 11 na mesma vara, adepto de um estilo simples e informal no trato com as pessoas, amante de música – é guitarrista da banda de rock Judges com três colegas –, Mota é conhecido por ter a “caneta pesada” (ser rigoroso) e por empregar um ritmo veloz de trabalho. Julga mais da metade dos crimes em audiências.
– Tento ser justo e rápido. É bom para a Justiça, para as partes, para o cartório e para todo o sistema. Só não julgo em audiência quando realmente não dá. Casos mais complexos com vários réus, de maior dificuldade de apuração dos fatos, sem testemunhas presenciais ou provas técnicas – observa.
Inversão da lógica dos tribunais
O método suprime uma série de etapas como a emissão de notas de expediente, citações, intimações e tem como efeito colateral a redução da carga de serviço de funcionários e das montanhas de processos sobre as mesas, tão comuns em fóruns. E tem sobrado mais tempo para Mota dedicar-se a uma importante atividade social: palestrar sobre os malefícios do crack em escolas da região.
Além de dispensar rotinas de trabalho, a medida está conseguindo inverter uma lógica dos tribunais: a do ingresso de processos ser muito superior à capacidade de julgar, o que obriga magistrados a esticar o expediente em casa até altas horas. Este mês, apesar do aumento do volume de crimes por conta da temporada de veraneio, a 2ª Vara Criminal de Tramandaí recebeu 108 processos, e já foram encerrados 249.
O magistrado do Litoral Norte não está sozinho nessa nova empreitada. Na 1ª Vara Criminal do Fórum do Sarandi, na Capital, a juíza Viviane de Faria Miranda adotou como regra aplicar sentenças em audiências na maior parte dos casos.
O mesmo acontece com o juiz Carlos Francisco Gross, da 9ª Vara Criminal do Fórum Central. Ele lembra que, a contar da entrada do processo ao julgamento, tudo pode ser decidido em até 60 dias. O juiz salienta que a medida contribui, e muito, para melhorar a imagem do Judiciário.
– Ao decidir prontamente, principalmente na esfera criminal, o juiz garante que as partes tenham uma resposta imediata para seus problemas. Crescem o crédito da sociedade e o temor de quem comete o crime – afirma.
Medida causa controvérsia
Sentenças criminais decretadas em audiências encontram resistência entre advogados e defensores públicos. Um dos críticos é o professor de Direito Processual Penal e defensor público Álvaro Roberto Antanavicius Fernandes.
– Não tenho dúvidas de que traz prejuízos. Há casos em que é humanamente impossível analisar toda a prova e expor oralmente a defesa de maneira precisa e abrangente. O advogado não é enciclopédia para saber tudo e nem computador para processar informações na velocidade exigida pelo rito – adverte.
O advogado Aury Lopes Junior, doutor em Direito Processual Penal, diz que a medida é positiva apenas para os casos mais simples e alerta para riscos de eventuais decisões judiciais precipitadas:
– É preciso respeitar o tempo para investigar, para acusar, para produzir a prova, para defender e, finalmente, o tempo de maturação e decisão. Casos complexos não podem ser objetos de debates orais e sentença em audiência única. Seria um atropelo do tempo do direito.
Postura semelhante é defendida por Ivan Pareta, vice-presidente regional da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas.
O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, João Ricardo dos Santos Costa, afirma que o método é bem-vindo para dar celeridade aos processos e assegura que o magistrado só decide quando se sente em condições.
– O juiz não é obrigado a dar sentença em audiência. Ele julga no momento em que firma convencimento dos fatos – garante.
O Tribunal de Justiça incentiva a prática de sentenças em audiências, lembra o juiz-corregedor Marcelo Mairon. Ele diz que a medida traz grandes ganhos “desde que não comprometa a qualidade do ato”.
– Esse modelo é o modelo ideal – acrescenta Marcelo Dornelles, presidente da Associação do Ministério Público gaúcho.
ENTREVISTA - “Precisa estar bastante seguro para julgar”- Juiz Carlos Francisco Gross. Juiz há mais de 15 anos, Carlos Francisco Gross, titular da 9ª Vara Criminal de Porto Alegre, é um defensor da nova regra. A maioria de suas sentenças é proferida em audiências.
ZH – Qual a vantagem para o julgador?
Carlos Francisco Gross – Ao resolver a ação penal em audiência, o juiz está diante dos fatos que acabaram de ser reproduzidos em depoimentos e tem condições de decidir, inclusive, levando em conta impressões pessoais percebidas durante a audiência. O juiz capta uma série de coisas que não vão para o papel. Percebe quando estão mentindo.
ZH – Em que aspecto é mais positiva?
Gross – O da celeridade. Evita novas diligências para a intimação do réu da sentença, e economiza tempo do juiz ao tornar desnecessário relembrar de todo o caso ao julgar, posteriormente, a causa.
ZH– Qual a sua estratégia para decidir na hora?
Gross – Eu me preparo. Fico bem atento às declarações que acabo de ouvir, faço algumas anotações. Precisa estar bastante seguro para julgar.
ZH – A prática evita manobras da defesa que poderiam protelar o processo e levando a sua extinção?
Gross – Sempre que os atos processuais são mais concentrados, as oportunidades de criar incidentes acabam reduzidas.
ZH – Alguns magistrados não a adotam porque defensores públicos e advogados têm dificuldades de elaborar a tese da defesa na hora. Como contornar essa questão?
Gross – O uso de debater e julgar em audiência é bastante antigo em processos cíveis. Eu costumava utilizá-lo. É preciso criar uma cultura de utilização do método.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Judiciário precisa se desburocratizar, aplicando a lei de forma coativa, prática, célere e presencial. A justiça não é mediadora, é coativa. Defendo estes estes tribunais "a jato" pelo fato de aproximar a justiça dos delitos, fazendo com que o magistrado tome "in loco" pleno conhecimento do ambiente, das partes e dos fatos que envolveram a ilicitude a ser julgada. Chega de papéis, precisamos de uma justiça prática, destemida, sem intermediário e que tome decisões confrontando a realidade e não papéis. A maioria dos processos é cheio de testemunhos sem importância que vão inchando para confundir o julgamento. Sou a favor desta "justiça a jato" que funcionaria para a maioria dos crimes, passando a outro nível de acordo com o grau de ofensividade.
sábado, 15 de janeiro de 2011
TOLERANTE - FUGAS SEM PUNIÇÃO POR CAUSA DA SUPERLOTAÇÃO
SEM CASTIGO. Só 15% dos fugitivos têm punição rigorosa. Superlotação é um dos motivos que impedem regressão de regime de quem escapa das prisões - FRANCISCO AMORIM, Zero Hora, 15/01/2011
Cerca de 85% dos apenados dos regimes aberto e semiaberto que fugiram de albergues da Região Metropolitana não regridem ao regime fechado após serem capturados. A informação é do juiz da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, Eduardo Almada.
Três meses após assumir o juizado responsável pelo julgamento de faltas disciplinares cometidas por presos, o magistrado revelou ontem que a maioria dos fujões não é punida com o retorno ao fechado. Entre os motivos para o abrandamento, Almada destaca a superlotação nas penitenciárias e o perfil da grande parte do apenados que escapam dos albergues e acabam recapturados.
A postura aparentemente liberal é justificada pelo magistrado. Conforme ele, se a Lei de Execuções Penais for aplicada com rigor, corre-se o risco de superlotar ainda mais as cadeias do fechado. Ele pondera:
– É preciso dar nova chance. Ele conquistou o direito à progressão. É preciso analisar bem o porquê da fuga. O que leva um apenado a fugir de um regime mais brando para correr o risco de voltar para o fechado?
Conforme ele, a maioria dos casos analisados na VEC é de presos que fugiram pela primeira vez, logo após progredirem do fechado para o semiaberto. Na sua visão, o tempo em que o preso aguardaria no fechado a definição de seu futuro – entre três e seis meses – já seria “um bom castigo’’.
– Boa parte dos apenados que fogem é de jovens, que já tiveram passagens pela Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo). Sem preparação adequada, eles fogem assim que têm a chance – explicou.
Os reincidentes regridem de regime
O restante do grupo é formado por apenados indesejados pelos criminosos que comandam os albergues.
– Eles são “convidados’’ a se retirar pela facção que domina a casa, seja porque pertencem a outro grupo ou trabalhavam na casa prisional, como o Central, antes de progredir. A gente avalia a situação e o mantém no semiaberto, porém, em outro local – afirmou.
Entre os punidos com a regressão de regime, estão os fujões reincidentes e os presos em flagrante por outro crime. Apesar de raros, há casos em que presos respondem a processos por até seis fugas ocorridas em 2010.
– Nesses casos, não há outra alternativa – avaliou.
Desde o começo do trabalho em 4 de outubro, mais de 1,1 mil casos foram analisados pelo magistrado. Conforme Almada, o número de novos processos se aproxima da média diária de fuga na Região Metropolitana, que seria de 11 casos. O volume de trabalho exige organização. Em alguns dias, são mais de 30 audiências. Em média, duram 10 ou 15 minutos. Em casos mais complicados, o encontro entre magistrado, defesa e Ministério Público se estende por 40 minutos.
– Estamos reduzindo o passivo de processos acumulados. Há muito o que fazer, há pauta (agenda de audiências) até o final de abril – comenta.
O que diz a lei - A Lei de Execuções Penais (LEP) caracteriza a fuga de casa prisional como falta grave. O apenado que fugir poderá regredir de regime. A decisão final sobre o futuro do foragido que é recapturado é do Judiciário.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Ave, bandidos! A justiça vós saudam. Quando a justiça fraqueja, o bem se submete ao mal. Quando vigora a benevolência para com a bandidagem, a desordem toma conta e os bons se sacrificam.
Cerca de 85% dos apenados dos regimes aberto e semiaberto que fugiram de albergues da Região Metropolitana não regridem ao regime fechado após serem capturados. A informação é do juiz da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, Eduardo Almada.
Três meses após assumir o juizado responsável pelo julgamento de faltas disciplinares cometidas por presos, o magistrado revelou ontem que a maioria dos fujões não é punida com o retorno ao fechado. Entre os motivos para o abrandamento, Almada destaca a superlotação nas penitenciárias e o perfil da grande parte do apenados que escapam dos albergues e acabam recapturados.
A postura aparentemente liberal é justificada pelo magistrado. Conforme ele, se a Lei de Execuções Penais for aplicada com rigor, corre-se o risco de superlotar ainda mais as cadeias do fechado. Ele pondera:
– É preciso dar nova chance. Ele conquistou o direito à progressão. É preciso analisar bem o porquê da fuga. O que leva um apenado a fugir de um regime mais brando para correr o risco de voltar para o fechado?
Conforme ele, a maioria dos casos analisados na VEC é de presos que fugiram pela primeira vez, logo após progredirem do fechado para o semiaberto. Na sua visão, o tempo em que o preso aguardaria no fechado a definição de seu futuro – entre três e seis meses – já seria “um bom castigo’’.
– Boa parte dos apenados que fogem é de jovens, que já tiveram passagens pela Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo). Sem preparação adequada, eles fogem assim que têm a chance – explicou.
Os reincidentes regridem de regime
O restante do grupo é formado por apenados indesejados pelos criminosos que comandam os albergues.
– Eles são “convidados’’ a se retirar pela facção que domina a casa, seja porque pertencem a outro grupo ou trabalhavam na casa prisional, como o Central, antes de progredir. A gente avalia a situação e o mantém no semiaberto, porém, em outro local – afirmou.
Entre os punidos com a regressão de regime, estão os fujões reincidentes e os presos em flagrante por outro crime. Apesar de raros, há casos em que presos respondem a processos por até seis fugas ocorridas em 2010.
– Nesses casos, não há outra alternativa – avaliou.
Desde o começo do trabalho em 4 de outubro, mais de 1,1 mil casos foram analisados pelo magistrado. Conforme Almada, o número de novos processos se aproxima da média diária de fuga na Região Metropolitana, que seria de 11 casos. O volume de trabalho exige organização. Em alguns dias, são mais de 30 audiências. Em média, duram 10 ou 15 minutos. Em casos mais complicados, o encontro entre magistrado, defesa e Ministério Público se estende por 40 minutos.
– Estamos reduzindo o passivo de processos acumulados. Há muito o que fazer, há pauta (agenda de audiências) até o final de abril – comenta.
O que diz a lei - A Lei de Execuções Penais (LEP) caracteriza a fuga de casa prisional como falta grave. O apenado que fugir poderá regredir de regime. A decisão final sobre o futuro do foragido que é recapturado é do Judiciário.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Ave, bandidos! A justiça vós saudam. Quando a justiça fraqueja, o bem se submete ao mal. Quando vigora a benevolência para com a bandidagem, a desordem toma conta e os bons se sacrificam.
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
IMPEACHMENT DO PRESIDENTE DO STF
Impeachment de Cezar Peluso? Por Carlos Lungarzo, Correio do Brasil, 10/1/2011 11:42,
O jurista Carlos Lungarzo, da Anistia Internacional, propõe uma reviravolta e uma inversão da situação criada pelo ministro Cezar Peluso do STF, no caso Cesare Battisti. Em reação à tentativa de golpe institucional, o governo poderá impugnar, decretar impeachment e demitir Cezar Peluso por crime de alteração de decisão tomada pelo próprio STF. A inesperada proposta poderá mudar totalmente o quadro: em lugar do STF ridicularizar o Executivo, negando-se a cumprir uma decisão do ex-presidente Lula, será o presidente do STF quem terá de justificar, sob pena de processo e demissão, sua manipulação e alteração de uma decisão do próprio STF. Seguem os argumentos do jurista Carlos Lungarzo que modificam totalmente a análise da questão. Em lugar da extradição de Cesare Battisti, trata-se agora de uma possível impugnação do presidente do STF. Rui Martins.
Decisões Judiciais e Crime de Alteração. (Por Carlos Lungarzo)
Impeachment do ministro Cezar Peluso ou golpe institucional ?
No processo de extradição passiva 1085, onde o requerido era o escritor Cesare Battisti, o Supremo Tribunal Federal julgou dois aspectos. Um foi a admissibilidade de extradição, o outro foi a faculdade do Chefe de Estado para decidir sobre a execução efetiva do ato extradicional. Ambas as questões foram decididas na sessão de 18/11/2009. Como é bem sabido, o tribunal autorizou a extradição por 5 votos contra 4. No final da sessão, foi colocado em votação o direito do presidente para executar ou indeferir a extradição.
Os cinco ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Carmen Lúcia e Eros Grau votaram que o chefe de estado poderia decidir, de maneira discricionária. Já os ministros Peluso, Mendes, Lewandowski e Ellen Gracie votaram contra.
Todavia, no dia 16 de dezembro, por causa de uma moção de ordem colocada pela Itália, a questão foi reaberta, provocando indignação nos juízes Marco Aurélio e Britto. Durante o debate, Peluso tentou pressionar Eros Grau para que votasse contra o que fora decidido na sessão anterior. Grau reclamou de estar sendo mal interpretado, mas acabou aceitando que a discricionariedade do presidente ficaria limitada pelo Tratado de Extradição entre o Brasil e a Itália.
Finalmente, o documento que ficou aprovado e foi publicado no acórdão de abril de 2010, disse, com outras palavras, que: autorizada a extradição pelo STF, o presidente fica facultado a executar a extradição ou a recusar sua aplicação, desde que, para tanto, se baseie no Tratado.
De fato, esta “liberdade” que o STF deu ao presidente não era necessária: a Constituição Federal considera o chefe de estado como representante da nação na política internacional e, além disso, toda a jurisprudência anterior, sem exceção, afirma o direito do presidente de escolher entre acatar o parecer de extraditar ou rejeitá-lo. É significativo que, alguns dias antes, o STF tivesse autorizado uma extradição ao Estado de Israel, deixando ao presidente o direito de decidir. Aliás, o sistema “misto” de extradição (usado no Brasil e em quase todos os países) determina que o judiciário “proteja” o extraditando, proibindo ao executivo sua extradição, se houvesse motivo para isso, mas autorizando quando a situação fosse legalmente viável. Nesse caso, ficaria a critério do presidente aproveitar a autorização ou reter o estrangeiro.
Mesmo assim, foi muito bom que o STF chegasse a uma decisão explícita sobre isso. Se, mesmo assim, o ministro Peluso decidiu alterá-la, o que ele poderia ter feito sem uma decisão explícita?
Na sessão em que foi votada esta matéria, por causa das constantes pressões de Mendes e, sobretudo, de Peluso, Eros Grau parecia muito nervoso, mas ainda assim a decisão final da corte foi clara. Posteriormente, Grau tratou o problema com maior detalhe numa matéria que publicou no Consultor Jurídico, em 29/12/2009 (vide).
Após alguns argumentos muito precisos, Grau disse que o presidente pode recusar a extradição autorizada pelo tribunal nos termos do Tratado. Pode fazer isso em alguns casos que não são examináveis pelo tribunal, e menciona precisamente o artigo 3º, I, que foi o utilizado por Lula. A idéia do magistrado, coerente com toneladas de jurisprudência e doutrinas internacionais, é que o presidente pode negar a extradição por um fundado temor de perseguição do estrangeiro no país requerente, mas esse temor não pode ser avaliado pelo judiciário. Como responsável pela política externa, é o executivo e seus assessores os que melhor podem “sentir” se há perigo ou não.
O Tratado entre o Brasil e a Itália
Esse Tratado (veja aqui) foi assinado em Roma em outubro de 1989, aprovado por Decreto Legislativo no Brasil em novembro de 1992, e finalmente aprovado por Decreto em julho de 1993. Nos artigos 3º, 4º e 5º se enunciam condições que exigem a recusa da extradição. O artigo 4º não é relevante neste caso, pois proíbe a extradição a países onde há pena de morte, o que não acontece na Itália.
O artigo 3º e o 5º são ambos aplicáveis ao caso Battisti. No item I, inciso (f) do artigo 3º, proíbe-se a extradição quando existam motivos para pensar que o requerido possa ser perseguido por pertinência a algum grupo designado (racial, religioso, político, etc.), ou sua situação pudesse ser agravada por causa disso.
No artigo 5º, (a) também se veda a extradição quando a pessoa reclamada “tiver sido ou vier a ser” submetida a um processo sem direito de defesa. Battisti não teria novo julgamento, e ele já tinha sido submetido a um julgamento em ausência, sem provas, sem testemunhas, com advogados falsos e com base em alguns documentos falsificados. Este ponto aplica-se plenamente. O inciso (b) se refere ao perigo de que o extraditado possa sofrer a violação de seus direitos humanos básicos, o que é evidente, tendo em conta as práticas de tortura e tratos degradantes aplicados na Itália a presos políticos, e as ameaças de morte contra ele proferidas por sindicatos (carabineiros e policiais), por associações neofascistas, e até por alguns políticos.
Parecer da AGU e Decisão do Presidente
No dia 31 de Dezembro de 2010, o presidente Lula fez conhecer sua decisão sobre a extradição, recusando sua aplicação e retendo Cesare Battisti no país sob a figura jurídica de imigrante (residente permanente). A decisão foi publicada no Diário Oficial da União em sua edição adicional do próprio dia 31.
A decisão foi baseada no parecer emitido pela Advocacia Geral da União (AGU), assinado pelo advogado geral substituto, Albuquerque Faria, que o elaborou se fundamentando no parecer do consultor da União Arnaldo de Moraes Godoy.
O parecer e é longo, consistente, articulado e detalhadamente fundamentado. Ele é mais do que suficiente para justificar o “fundado temor de perseguição”, pois o consultor se baseia em fatos notórios que são de domínio público. Ele aplica o item 3.I.f, argumentando que a situação de Battisti poderia se agravar na Itália, tendo em conta as grandes manifestações em sua contra. É um fato que qualquer pessoa sem interesse em prejudicar Battisti, responderia de olhos fechados. Vejamos como seria a pergunta:
Uma pessoa estará segura, permanecendo presa num país onde centenas de pessoas vinculadas ao estado promovem manifestações de repúdio contra ele?
Se os inimigos o atacam com ódio, e até incluem Lula em seus ataques, a 10 mil Km, o que poderiam fazer se o tivessem em seu poder?.
Eventualmente, poderia acontecer que Battisti fosse preso e sobrevivesse na prisão, até porque o governo não gostaria, talvez, matar alguém que é tão conhecido. Mas, isso tem uma probabilidade baixa. Os carcereiros italianos pertencem a uma federação de sindicatos de alcance nacional que várias vezes declarou seu desejo de “acertar contas” com o escritor. Aliás, o ministro La Russa manifestou como era grande seu desejo de torturar Battisti. Não se conserva nenhum registro de Adolf Hitler onde ele manifestasse seu desejo de torturar ninguém (embora sim, de matar).
O parecer é mais do que suficiente, mas cabe salientar que os autores manifestam várias vezes, seu grande respeito pelas instituições italianas. Também, afirmam que não terão em conta a fraude das procurações, embora não afirmem nem neguem sua existência. Tudo indica que os autores não queriam irritar Itália, mas esse espírito pacífico não foi útil: de fato, o presidente do STF, Antonio Cezar Peluso, não procurava acordo, mas, pelo contrário, confronto, como veremos a seguir.
O Pedido de Soltura
No dia 3 de janeiro, a equipe de defesa de Battisti solicitou ao presidente do STF, Cezar Peluso a soltura do ex-extraditando, com base no fato de que, uma vez extinta a extradição, a manutenção do estrangeiro em prisão era ilegal.
O chefe da equipe, o jurista Luís Roberto Barroso, apresentou junto com o pedido um raciocínio singelo: Se o STF passou a Lula a responsabilidade pela decisão, cabe ao executivo também concluir essa decisão, colocando em liberdade o ex-extraditando. Ele faz notar que, se Lula tivesse decidido em favor da extradição, ele poderia entregar o prisioneiro à Itália e, sem dúvida, ninguém lhe pediria uma permissão do STF para fazer isto. Portanto, não cabe ao tribunal reavaliar o processo. Barroso acrescenta:
O julgamento já foi concluído, a decisão já transitou em julgado, e o processo de extradição já foi, inclusive, arquivado. Já não é possível, juridicamente, reabrir a discussão acerca da competência do presidente da República [...] Trata-se de dar cumprimento ao que foi decidido, em cumprimento às instituições.
Consistente com o fato de que problema agora deixou de ser judicial, Barroso pede, também, que o Ministério da Justiça libere Battisti.
Peluso recebeu, na mesma época, uma ordem da Itália de manter Battisti preso, e como tinha feito pelo menos 7 vezes durante o julgamento, obedeceu. No dia 6 de janeiro disse que Battisti devia continuar preso, e que o assunto será encaminhado para o novo relator, Gilmar Mendes.
O deboche contra o executivo e o próprio judiciário fica evidente, mas o representante legal da Itália, com um raciocínio torpe e insultuoso, deixou isso ainda mais óbvio. O advogado da Itália disse, explicitamente, que Lula usurpou funções, porque deveria ter adotado como decisão o parecer do STF: extraditar. Embora o advogado não continuou seu “raciocínio”, o que ele disse significava isto: o STF teria dado a Lula apenas a faculdade para decidir entre estas alternativas: (1) extraditar Battisti ou (2) extraditar Battisti.
Quer dizer, que o STF teria dado a Lula a “liberdade” aparente de mostrar obediência. Este comentário é um grave insulto contra os juízes do STF que votaram em favor da decisão presidencial. No momento de negar a liberdade de Battisti pedida por Barroso, Peluso manifestou, de maneira oblíqua, o privilégio do STF para dar a última palavra. Ou seja, para a lógica do ex-relator, podem existir duas últimas palavras ou, então, a realidade é que a outorga da última palavra a Lula foi uma farsa.
Trata-se de uma amostra de desprezo capital não apenas contra o executivo, mas também contra o judiciário, pois significa que uma decisão tomada por um colegiado ou por um juiz, pode ser distorcida por alguém que se apresenta como dono absoluto da decisão.
Peluso ainda disse que não tinha certeza de que Battisti estaria em risco se voltasse a Itália. Cabe ao ministro Peluso apenas apreciar se Lula se pronunciou de acordo com o Tratado, mas não apreciar a subjetividade do presidente. Se a opinião de Lula estivesse sujeita à opinião do STF e este pudesse anulá-la, qual seria o valor do direito de decisão?.
Isto prova de maneira ainda mais contundente, que Peluso e Mendes assumiram aquela decisão do STF como uma formalidade que não pensavam cumprir, e que realmente sua intenção era extraditar o italiano passando por cima da decisão do presidente, e dos colegas que reconheceram o direito do executivo.
Reações Qualificadas
O ministro do STF, Carlos Ayres Britto, afirmou logo em seguida de conhecida a decisão de Lula, que o presidente do STF, Cezar Peluso pode decidir sozinho pela soltura imediata de Battisti. De acordo com Britto, sem a extradição cai o fundamento da prisão. Esta foi a opinião de muitos juristas e políticos, cuja lista não caberia neste artigo. Idêntica foi a manifestação de Marco Aurélio, que defendeu o direito de Battisti a ser liberado logo que a decisão de Lula tivesse sido publicada. O mesmo parecer foi o do jurista Dalmo de Abreu Dallari, que se estendeu detalhadamente sobre o tipo de arbitrariedade cometida por Peluso.
A Teoria do Golpe
Conhecida a negativa de Peluso a soltar Battisti, Luís Barroso, uma pessoa que surpreende por sua equanimidade e seu temperamento calmo, manifestou grande indignação. Afirmou que o ato de Peluso era uma espécie de golpe, e ainda acrescentou que essa “disfunção” parecia ter desaparecido da realidade brasileira. Ou seja, não duvidou em comparar o golpe de Peluso com outros golpes (disfunções). O ex-ministro Tarso Genro, agora governador de RS, qualificou estes fatos como ditadura.
Entre os mais famosos e violentos golpes acontecidos na América Latina, há diferenças de tipos de aliança, graus de cumplicidade e relevância dos papeis de diferentes agentes políticos. Na Argentina, onde os militares tiveram até 1982 um poder absoluto, em aliança com a Igreja e os latifundiários, as forças armadas controlaram a vida civil até nos breves períodos de aparente democracia. Por esse motivo, todos os golpes se originaram no ambiente militar e nos partidos políticos cúmplices, e geraram ditaduras onde o elemento castrense foi o principal.
No Chile e no Uruguai, países com tradição democrática e laica, com poucos golpes em sua história, os assaltos ao poder de 1973 deveram ser preparados por uma prévia campanha de provocação da imprensa, as empresas, a CIA e, no caso do Chile, o judiciário. Já Brasil foi um caso intermédio, onde os fatores de provocação foram deflagrados pelos grandes proprietários, os agentes americanos, e as organizações católicas que prepararam a Marcha que antecedeu o golpe.
Em Honduras, em 2009, o golpe corresponde a outra época, onde o papel militar está reduzido. As forças armadas atuaram principalmente na repressão popular e no seqüestro e desterro do presidente Zelaya. A consagração da ditadura seguinte e a convocação das eleições fraudadas foram planejadas pela Suprema Corte.
Portanto, não é um argumento correto para negar que a ação do ministro Peluso seja um golpe, aduzir o caráter incruento e não militar da ação do juiz. Não sabemos qual foi o motivo desse ato provocativo contra o executivo e o próprio judiciário, mas ele pode ser visto como um golpe parcial. Ele não derrubou nenhum governo, e provavelmente não tenha interesse em fazê-lo, mas contribuiu a tornar mais frágil o executivo, e a subordinar o resto do judiciário.
É importante perceber que a decisão do presidente Lula foi imediatamente denegrida, a custa de quaisquer inverdades, pela maior parte da grande mídia, que tem um histórico muito preciso de desestabilização de governos populares. Também, foi deflagrada uma campanha de ódio contra o presidente pelas figuras mais tortuosas do poder legislativo.
Golpe contra Quem. O golpe “parcial” do presidente do STF afeta dois poderes:
1.O EXECUTIVO. (a) Não há, neste momento, nenhuma dúvida de que o Presidente tinha atributos legais para decidir em favor ou contra o ato de extradição. (b) A prisão de um extraditando só pode ser mantida durante o tempo que dure o processo. Se este acabar com a decisão favorável ao país requerente, o extraditando permanecerá preso até ser embarcado; se o processo culminar na rejeição, como neste caso, deve ser liberado. (c) O ministro Peluso, ao se recusar a liberar o ex-extraditando, nega a validade da decisão do presidente, numa manifestação de desacato.
2.O PRÓPRIO STF. No fundo, é o poder judicial o mais profundamente atacado. Vejamos. (a) O STF, por maioria, decidiu pela faculdade do presidente a decidir a favor ou contra a extradição, desde que respeitado o Tratado. (b) O parecer da AGU se baseia de maneira nítida no artigo 3.I.f desse Tratado, evidenciando que a situação de Battisti se agravaria na Itália. (c) Sendo que Lula agiu em estrito acatamento ao parecer da AGU, e este se baseia de maneira notória no tratado, as condições exigidas pelo STF estão cumpridas.
O presidente foi autorizado pelo STF a proferir a palavra final sobre a extradição. Se o STF pretende questionar sua decisão e rever o assunto, é claro que a palavra não será final. Chama-se final àquele estágio após o qual não nenhum outro!
Ao usurpar a tarefa do presidente, o ministro Peluso está (1) invadindo a área de incumbência do executivo, e (2) ALTERANDO a decisão do STF, da última sessão da EXT 1085. decisDO Necutivoo estionar sua decis proferir a palavra AGU, e este se baseia de maneira notdilte da grande mribunal Federal
Responsabilidade dos Ministros do STF
Na mesma forma que outras autoridades, os ministros do Supremo Tribunal Federal podem incorrer em crimes de responsabilidade. Os crimes de responsabilidade foram elencados na Lei 1079, de 10 de abril de 1950. Na Parte III, Título I, Capítulo I, se mencionam vários tipos de crimes aplicáveis a ministros do SPF. Em nosso caso, interessa apenas o primeiro.
Art. 39. São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1- alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal;
Esta lei nunca foi derrogada, e embora alguns de seus artigos fossem absorvidos pela Lei 10.028, de 19 de outubro de 2000, o artigo 39 nunca perdeu sua validade. A pouca freqüência de sua aplicação se deve, em parte, a que raramente se cometem graves alterações nas decisões do tribunal.
Impugnação
Como qualquer outro ato fora da lei, a alteração de uma decisão jurídica pode ter diversos graus de gravidade. Obviamente, cabe aos juristas e não aos ativistas de direitos humanos, avaliar essa gravidade. No entanto, desde minha perspectiva de leigo, acredito que neste caso a alteração é muito grave e que, aliás, independe de ser um caso de extradição ou de qualquer outra natureza. Observemos:
1.Quando se discutiu no plenário do STF a faculdade do presidente da república para decidir, os ministros Peluso e Mendes aduziram que o assunto era confuso, e, especialmente Peluso, tentou forçar a decisão e confundir os que votavam em favor do chefe de estado.
2. Quando se percebeu vencido, Peluso proferiu uma evidente ameaça. Ele disse que se Battisti fosse mantido no Brasil por decisão do governo, quem tiraria ele da prisão?.
3. O mais importante é que a negativa de Peluso a aceitar a decisão do executivo, é uma alteração notória, que tira credibilidade ao judiciário, e gera na cidadania um sentimento de insegurança jurídica.
Em outros casos (muitos poucos, é verdade), houve reações da cidadania para impugnar alguns juízes. Embora esses casos pareciam justificados, eles deram lugar a longas polêmicas. Ora, quero enfatizar que desde minha visão não especializada do problema, entendo que a alteração da decisão da corte por parte de Peluso não é um ato polêmico. É uma manipulação pública, vista por milhões de pessoas, da decisão emitida pelo próprio Tribunal..
Desejo encerrar este artigo como uma pergunta dirigida aos que possuem formação jurídica. Não será que este ato justifica a impugnação (IMPEACHMENT) do presidente do STF?? Finalmente: lembrem Honduras…
O jurista Carlos Lungarzo, da Anistia Internacional, propõe uma reviravolta e uma inversão da situação criada pelo ministro Cezar Peluso do STF, no caso Cesare Battisti. Em reação à tentativa de golpe institucional, o governo poderá impugnar, decretar impeachment e demitir Cezar Peluso por crime de alteração de decisão tomada pelo próprio STF. A inesperada proposta poderá mudar totalmente o quadro: em lugar do STF ridicularizar o Executivo, negando-se a cumprir uma decisão do ex-presidente Lula, será o presidente do STF quem terá de justificar, sob pena de processo e demissão, sua manipulação e alteração de uma decisão do próprio STF. Seguem os argumentos do jurista Carlos Lungarzo que modificam totalmente a análise da questão. Em lugar da extradição de Cesare Battisti, trata-se agora de uma possível impugnação do presidente do STF. Rui Martins.
Decisões Judiciais e Crime de Alteração. (Por Carlos Lungarzo)
Impeachment do ministro Cezar Peluso ou golpe institucional ?
No processo de extradição passiva 1085, onde o requerido era o escritor Cesare Battisti, o Supremo Tribunal Federal julgou dois aspectos. Um foi a admissibilidade de extradição, o outro foi a faculdade do Chefe de Estado para decidir sobre a execução efetiva do ato extradicional. Ambas as questões foram decididas na sessão de 18/11/2009. Como é bem sabido, o tribunal autorizou a extradição por 5 votos contra 4. No final da sessão, foi colocado em votação o direito do presidente para executar ou indeferir a extradição.
Os cinco ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Carmen Lúcia e Eros Grau votaram que o chefe de estado poderia decidir, de maneira discricionária. Já os ministros Peluso, Mendes, Lewandowski e Ellen Gracie votaram contra.
Todavia, no dia 16 de dezembro, por causa de uma moção de ordem colocada pela Itália, a questão foi reaberta, provocando indignação nos juízes Marco Aurélio e Britto. Durante o debate, Peluso tentou pressionar Eros Grau para que votasse contra o que fora decidido na sessão anterior. Grau reclamou de estar sendo mal interpretado, mas acabou aceitando que a discricionariedade do presidente ficaria limitada pelo Tratado de Extradição entre o Brasil e a Itália.
Finalmente, o documento que ficou aprovado e foi publicado no acórdão de abril de 2010, disse, com outras palavras, que: autorizada a extradição pelo STF, o presidente fica facultado a executar a extradição ou a recusar sua aplicação, desde que, para tanto, se baseie no Tratado.
De fato, esta “liberdade” que o STF deu ao presidente não era necessária: a Constituição Federal considera o chefe de estado como representante da nação na política internacional e, além disso, toda a jurisprudência anterior, sem exceção, afirma o direito do presidente de escolher entre acatar o parecer de extraditar ou rejeitá-lo. É significativo que, alguns dias antes, o STF tivesse autorizado uma extradição ao Estado de Israel, deixando ao presidente o direito de decidir. Aliás, o sistema “misto” de extradição (usado no Brasil e em quase todos os países) determina que o judiciário “proteja” o extraditando, proibindo ao executivo sua extradição, se houvesse motivo para isso, mas autorizando quando a situação fosse legalmente viável. Nesse caso, ficaria a critério do presidente aproveitar a autorização ou reter o estrangeiro.
Mesmo assim, foi muito bom que o STF chegasse a uma decisão explícita sobre isso. Se, mesmo assim, o ministro Peluso decidiu alterá-la, o que ele poderia ter feito sem uma decisão explícita?
Na sessão em que foi votada esta matéria, por causa das constantes pressões de Mendes e, sobretudo, de Peluso, Eros Grau parecia muito nervoso, mas ainda assim a decisão final da corte foi clara. Posteriormente, Grau tratou o problema com maior detalhe numa matéria que publicou no Consultor Jurídico, em 29/12/2009 (vide).
Após alguns argumentos muito precisos, Grau disse que o presidente pode recusar a extradição autorizada pelo tribunal nos termos do Tratado. Pode fazer isso em alguns casos que não são examináveis pelo tribunal, e menciona precisamente o artigo 3º, I, que foi o utilizado por Lula. A idéia do magistrado, coerente com toneladas de jurisprudência e doutrinas internacionais, é que o presidente pode negar a extradição por um fundado temor de perseguição do estrangeiro no país requerente, mas esse temor não pode ser avaliado pelo judiciário. Como responsável pela política externa, é o executivo e seus assessores os que melhor podem “sentir” se há perigo ou não.
O Tratado entre o Brasil e a Itália
Esse Tratado (veja aqui) foi assinado em Roma em outubro de 1989, aprovado por Decreto Legislativo no Brasil em novembro de 1992, e finalmente aprovado por Decreto em julho de 1993. Nos artigos 3º, 4º e 5º se enunciam condições que exigem a recusa da extradição. O artigo 4º não é relevante neste caso, pois proíbe a extradição a países onde há pena de morte, o que não acontece na Itália.
O artigo 3º e o 5º são ambos aplicáveis ao caso Battisti. No item I, inciso (f) do artigo 3º, proíbe-se a extradição quando existam motivos para pensar que o requerido possa ser perseguido por pertinência a algum grupo designado (racial, religioso, político, etc.), ou sua situação pudesse ser agravada por causa disso.
No artigo 5º, (a) também se veda a extradição quando a pessoa reclamada “tiver sido ou vier a ser” submetida a um processo sem direito de defesa. Battisti não teria novo julgamento, e ele já tinha sido submetido a um julgamento em ausência, sem provas, sem testemunhas, com advogados falsos e com base em alguns documentos falsificados. Este ponto aplica-se plenamente. O inciso (b) se refere ao perigo de que o extraditado possa sofrer a violação de seus direitos humanos básicos, o que é evidente, tendo em conta as práticas de tortura e tratos degradantes aplicados na Itália a presos políticos, e as ameaças de morte contra ele proferidas por sindicatos (carabineiros e policiais), por associações neofascistas, e até por alguns políticos.
Parecer da AGU e Decisão do Presidente
No dia 31 de Dezembro de 2010, o presidente Lula fez conhecer sua decisão sobre a extradição, recusando sua aplicação e retendo Cesare Battisti no país sob a figura jurídica de imigrante (residente permanente). A decisão foi publicada no Diário Oficial da União em sua edição adicional do próprio dia 31.
A decisão foi baseada no parecer emitido pela Advocacia Geral da União (AGU), assinado pelo advogado geral substituto, Albuquerque Faria, que o elaborou se fundamentando no parecer do consultor da União Arnaldo de Moraes Godoy.
O parecer e é longo, consistente, articulado e detalhadamente fundamentado. Ele é mais do que suficiente para justificar o “fundado temor de perseguição”, pois o consultor se baseia em fatos notórios que são de domínio público. Ele aplica o item 3.I.f, argumentando que a situação de Battisti poderia se agravar na Itália, tendo em conta as grandes manifestações em sua contra. É um fato que qualquer pessoa sem interesse em prejudicar Battisti, responderia de olhos fechados. Vejamos como seria a pergunta:
Uma pessoa estará segura, permanecendo presa num país onde centenas de pessoas vinculadas ao estado promovem manifestações de repúdio contra ele?
Se os inimigos o atacam com ódio, e até incluem Lula em seus ataques, a 10 mil Km, o que poderiam fazer se o tivessem em seu poder?.
Eventualmente, poderia acontecer que Battisti fosse preso e sobrevivesse na prisão, até porque o governo não gostaria, talvez, matar alguém que é tão conhecido. Mas, isso tem uma probabilidade baixa. Os carcereiros italianos pertencem a uma federação de sindicatos de alcance nacional que várias vezes declarou seu desejo de “acertar contas” com o escritor. Aliás, o ministro La Russa manifestou como era grande seu desejo de torturar Battisti. Não se conserva nenhum registro de Adolf Hitler onde ele manifestasse seu desejo de torturar ninguém (embora sim, de matar).
O parecer é mais do que suficiente, mas cabe salientar que os autores manifestam várias vezes, seu grande respeito pelas instituições italianas. Também, afirmam que não terão em conta a fraude das procurações, embora não afirmem nem neguem sua existência. Tudo indica que os autores não queriam irritar Itália, mas esse espírito pacífico não foi útil: de fato, o presidente do STF, Antonio Cezar Peluso, não procurava acordo, mas, pelo contrário, confronto, como veremos a seguir.
O Pedido de Soltura
No dia 3 de janeiro, a equipe de defesa de Battisti solicitou ao presidente do STF, Cezar Peluso a soltura do ex-extraditando, com base no fato de que, uma vez extinta a extradição, a manutenção do estrangeiro em prisão era ilegal.
O chefe da equipe, o jurista Luís Roberto Barroso, apresentou junto com o pedido um raciocínio singelo: Se o STF passou a Lula a responsabilidade pela decisão, cabe ao executivo também concluir essa decisão, colocando em liberdade o ex-extraditando. Ele faz notar que, se Lula tivesse decidido em favor da extradição, ele poderia entregar o prisioneiro à Itália e, sem dúvida, ninguém lhe pediria uma permissão do STF para fazer isto. Portanto, não cabe ao tribunal reavaliar o processo. Barroso acrescenta:
O julgamento já foi concluído, a decisão já transitou em julgado, e o processo de extradição já foi, inclusive, arquivado. Já não é possível, juridicamente, reabrir a discussão acerca da competência do presidente da República [...] Trata-se de dar cumprimento ao que foi decidido, em cumprimento às instituições.
Consistente com o fato de que problema agora deixou de ser judicial, Barroso pede, também, que o Ministério da Justiça libere Battisti.
Peluso recebeu, na mesma época, uma ordem da Itália de manter Battisti preso, e como tinha feito pelo menos 7 vezes durante o julgamento, obedeceu. No dia 6 de janeiro disse que Battisti devia continuar preso, e que o assunto será encaminhado para o novo relator, Gilmar Mendes.
O deboche contra o executivo e o próprio judiciário fica evidente, mas o representante legal da Itália, com um raciocínio torpe e insultuoso, deixou isso ainda mais óbvio. O advogado da Itália disse, explicitamente, que Lula usurpou funções, porque deveria ter adotado como decisão o parecer do STF: extraditar. Embora o advogado não continuou seu “raciocínio”, o que ele disse significava isto: o STF teria dado a Lula apenas a faculdade para decidir entre estas alternativas: (1) extraditar Battisti ou (2) extraditar Battisti.
Quer dizer, que o STF teria dado a Lula a “liberdade” aparente de mostrar obediência. Este comentário é um grave insulto contra os juízes do STF que votaram em favor da decisão presidencial. No momento de negar a liberdade de Battisti pedida por Barroso, Peluso manifestou, de maneira oblíqua, o privilégio do STF para dar a última palavra. Ou seja, para a lógica do ex-relator, podem existir duas últimas palavras ou, então, a realidade é que a outorga da última palavra a Lula foi uma farsa.
Trata-se de uma amostra de desprezo capital não apenas contra o executivo, mas também contra o judiciário, pois significa que uma decisão tomada por um colegiado ou por um juiz, pode ser distorcida por alguém que se apresenta como dono absoluto da decisão.
Peluso ainda disse que não tinha certeza de que Battisti estaria em risco se voltasse a Itália. Cabe ao ministro Peluso apenas apreciar se Lula se pronunciou de acordo com o Tratado, mas não apreciar a subjetividade do presidente. Se a opinião de Lula estivesse sujeita à opinião do STF e este pudesse anulá-la, qual seria o valor do direito de decisão?.
Isto prova de maneira ainda mais contundente, que Peluso e Mendes assumiram aquela decisão do STF como uma formalidade que não pensavam cumprir, e que realmente sua intenção era extraditar o italiano passando por cima da decisão do presidente, e dos colegas que reconheceram o direito do executivo.
Reações Qualificadas
O ministro do STF, Carlos Ayres Britto, afirmou logo em seguida de conhecida a decisão de Lula, que o presidente do STF, Cezar Peluso pode decidir sozinho pela soltura imediata de Battisti. De acordo com Britto, sem a extradição cai o fundamento da prisão. Esta foi a opinião de muitos juristas e políticos, cuja lista não caberia neste artigo. Idêntica foi a manifestação de Marco Aurélio, que defendeu o direito de Battisti a ser liberado logo que a decisão de Lula tivesse sido publicada. O mesmo parecer foi o do jurista Dalmo de Abreu Dallari, que se estendeu detalhadamente sobre o tipo de arbitrariedade cometida por Peluso.
A Teoria do Golpe
Conhecida a negativa de Peluso a soltar Battisti, Luís Barroso, uma pessoa que surpreende por sua equanimidade e seu temperamento calmo, manifestou grande indignação. Afirmou que o ato de Peluso era uma espécie de golpe, e ainda acrescentou que essa “disfunção” parecia ter desaparecido da realidade brasileira. Ou seja, não duvidou em comparar o golpe de Peluso com outros golpes (disfunções). O ex-ministro Tarso Genro, agora governador de RS, qualificou estes fatos como ditadura.
Entre os mais famosos e violentos golpes acontecidos na América Latina, há diferenças de tipos de aliança, graus de cumplicidade e relevância dos papeis de diferentes agentes políticos. Na Argentina, onde os militares tiveram até 1982 um poder absoluto, em aliança com a Igreja e os latifundiários, as forças armadas controlaram a vida civil até nos breves períodos de aparente democracia. Por esse motivo, todos os golpes se originaram no ambiente militar e nos partidos políticos cúmplices, e geraram ditaduras onde o elemento castrense foi o principal.
No Chile e no Uruguai, países com tradição democrática e laica, com poucos golpes em sua história, os assaltos ao poder de 1973 deveram ser preparados por uma prévia campanha de provocação da imprensa, as empresas, a CIA e, no caso do Chile, o judiciário. Já Brasil foi um caso intermédio, onde os fatores de provocação foram deflagrados pelos grandes proprietários, os agentes americanos, e as organizações católicas que prepararam a Marcha que antecedeu o golpe.
Em Honduras, em 2009, o golpe corresponde a outra época, onde o papel militar está reduzido. As forças armadas atuaram principalmente na repressão popular e no seqüestro e desterro do presidente Zelaya. A consagração da ditadura seguinte e a convocação das eleições fraudadas foram planejadas pela Suprema Corte.
Portanto, não é um argumento correto para negar que a ação do ministro Peluso seja um golpe, aduzir o caráter incruento e não militar da ação do juiz. Não sabemos qual foi o motivo desse ato provocativo contra o executivo e o próprio judiciário, mas ele pode ser visto como um golpe parcial. Ele não derrubou nenhum governo, e provavelmente não tenha interesse em fazê-lo, mas contribuiu a tornar mais frágil o executivo, e a subordinar o resto do judiciário.
É importante perceber que a decisão do presidente Lula foi imediatamente denegrida, a custa de quaisquer inverdades, pela maior parte da grande mídia, que tem um histórico muito preciso de desestabilização de governos populares. Também, foi deflagrada uma campanha de ódio contra o presidente pelas figuras mais tortuosas do poder legislativo.
Golpe contra Quem. O golpe “parcial” do presidente do STF afeta dois poderes:
1.O EXECUTIVO. (a) Não há, neste momento, nenhuma dúvida de que o Presidente tinha atributos legais para decidir em favor ou contra o ato de extradição. (b) A prisão de um extraditando só pode ser mantida durante o tempo que dure o processo. Se este acabar com a decisão favorável ao país requerente, o extraditando permanecerá preso até ser embarcado; se o processo culminar na rejeição, como neste caso, deve ser liberado. (c) O ministro Peluso, ao se recusar a liberar o ex-extraditando, nega a validade da decisão do presidente, numa manifestação de desacato.
2.O PRÓPRIO STF. No fundo, é o poder judicial o mais profundamente atacado. Vejamos. (a) O STF, por maioria, decidiu pela faculdade do presidente a decidir a favor ou contra a extradição, desde que respeitado o Tratado. (b) O parecer da AGU se baseia de maneira nítida no artigo 3.I.f desse Tratado, evidenciando que a situação de Battisti se agravaria na Itália. (c) Sendo que Lula agiu em estrito acatamento ao parecer da AGU, e este se baseia de maneira notória no tratado, as condições exigidas pelo STF estão cumpridas.
O presidente foi autorizado pelo STF a proferir a palavra final sobre a extradição. Se o STF pretende questionar sua decisão e rever o assunto, é claro que a palavra não será final. Chama-se final àquele estágio após o qual não nenhum outro!
Ao usurpar a tarefa do presidente, o ministro Peluso está (1) invadindo a área de incumbência do executivo, e (2) ALTERANDO a decisão do STF, da última sessão da EXT 1085. decisDO Necutivoo estionar sua decis proferir a palavra AGU, e este se baseia de maneira notdilte da grande mribunal Federal
Responsabilidade dos Ministros do STF
Na mesma forma que outras autoridades, os ministros do Supremo Tribunal Federal podem incorrer em crimes de responsabilidade. Os crimes de responsabilidade foram elencados na Lei 1079, de 10 de abril de 1950. Na Parte III, Título I, Capítulo I, se mencionam vários tipos de crimes aplicáveis a ministros do SPF. Em nosso caso, interessa apenas o primeiro.
Art. 39. São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1- alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal;
Esta lei nunca foi derrogada, e embora alguns de seus artigos fossem absorvidos pela Lei 10.028, de 19 de outubro de 2000, o artigo 39 nunca perdeu sua validade. A pouca freqüência de sua aplicação se deve, em parte, a que raramente se cometem graves alterações nas decisões do tribunal.
Impugnação
Como qualquer outro ato fora da lei, a alteração de uma decisão jurídica pode ter diversos graus de gravidade. Obviamente, cabe aos juristas e não aos ativistas de direitos humanos, avaliar essa gravidade. No entanto, desde minha perspectiva de leigo, acredito que neste caso a alteração é muito grave e que, aliás, independe de ser um caso de extradição ou de qualquer outra natureza. Observemos:
1.Quando se discutiu no plenário do STF a faculdade do presidente da república para decidir, os ministros Peluso e Mendes aduziram que o assunto era confuso, e, especialmente Peluso, tentou forçar a decisão e confundir os que votavam em favor do chefe de estado.
2. Quando se percebeu vencido, Peluso proferiu uma evidente ameaça. Ele disse que se Battisti fosse mantido no Brasil por decisão do governo, quem tiraria ele da prisão?.
3. O mais importante é que a negativa de Peluso a aceitar a decisão do executivo, é uma alteração notória, que tira credibilidade ao judiciário, e gera na cidadania um sentimento de insegurança jurídica.
Em outros casos (muitos poucos, é verdade), houve reações da cidadania para impugnar alguns juízes. Embora esses casos pareciam justificados, eles deram lugar a longas polêmicas. Ora, quero enfatizar que desde minha visão não especializada do problema, entendo que a alteração da decisão da corte por parte de Peluso não é um ato polêmico. É uma manipulação pública, vista por milhões de pessoas, da decisão emitida pelo próprio Tribunal..
Desejo encerrar este artigo como uma pergunta dirigida aos que possuem formação jurídica. Não será que este ato justifica a impugnação (IMPEACHMENT) do presidente do STF?? Finalmente: lembrem Honduras…
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