MAZELAS DA JUSTIÇA

Neste blog você vai conhecer as mazelas que impedem a JUSTIÇA BRASILEIRA de desembainhar a espada da severidade da justiça para cumprir sua função precípua da aplicação coativa das leis para que as leis, o direito, a justiça, as instituições e a autoridade sejam respeitadas. Sem justiça, as leis não são aplicadas e deixam de existir na prática. Sem justiça, qualquer nação democrática capitula diante de ditadores, corruptos, traficantes, mafiosos, rebeldes, justiceiros, imorais e oportunistas. Está na hora da Justiça exercer seus deveres para com o povo, praticar suas virtudes e fazer respeitar as leis e o direito neste país. Só uma justiça forte, coativa, proba, célere, séria, confiável, envolvida como Poder de Estado constituído, integrada ao Sistema de Justiça Criminal e comprometida com o Estado Democrático de Direito, será capaz de defender e garantir a vida humana, os direitos, os bens públicos, a moralidade, a igualdade, os princípios, os valores, a ordem pública e o direito de todos à segurança pública.

quarta-feira, 5 de abril de 2017

JUIZ NÃO ENFRENTAR CRISE CARCERÁRIA É COVARDIA


JOTA INFO. Juiz não enfrentar crise carcerária é covardia, diz Sica. Para ex-presidente da AASP, um dos problemas centrais é o excesso de prisões provisórias


Livia Scocuglia

19 de Janeiro de 2017 - 06h00



Crédito CNJ/Flickr
AASP. CRISE PRISIONAL



ENTREVISTA: 

LEONARDO SICA, ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP).



Juízes têm muita responsabilidade diante da crise carcerária e fugir representaria uma afronta à cidadania, um ato de covardia. O momento é muito grave para posturas evasivas e para defesas corporativas. A avaliação é do advogado Leonardo Sica, ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP).

Em entrevista ao JOTA, Sica criticou a constante negativa de responsabilidade por integrantes do Judiciário em meio a uma das mais graves crises no sistema penitenciário do país. A alegação é de que a responsabilidade sobre a superlotação de presídios é do Executivo, competente para construir presídios.

Acontece que, dados da Sistema Integrado de Informação Penitenciária (Infopen), mostram que de 2004 até 2014 foram construídas mais de 171 mil vagas. Em 2004, o número de vagas era de 200.417 mil e passou a ser dez anos depois, 371.884 vagas.

“Nos últimos três anos o Executivo construiu muitos presídios e chegou ao seu limite financeiro e estrutural. O problema é na entrada de presos. E quem gerencia a entrada é o Judiciário”, afirmou Sica.

“Sabemos que um dos problemas centrais é o excesso de prisões provisórias. Ora, quem determina e mantém essas prisões? Juízes. Quem escolhe entre prisão em regime fechado, regime aberto, domiciliar, pena alternativa? Não é o poder executivo, não são os advogados”. “Os juízes podem fazer mais. Eles são essenciais para operar na cultura do encarceramento. Mas, por meio de decisões judiciais, eles estão promovendo cultura do encarceramento”.

A sequência de rebeliões começou em Manaus (AM), onde 56 presos foram assassinados no presídio Anísio Jobim, a maior unidade prisional do estado. Dias depois, 33 pessoas morreram em dois confrontos em Roraima na Penitenciária Agrícola de Monte Cristo. O último incidente ocorreu nesse final de semana na Penitenciária de Alcaçuz, no Rio Grande do Norte. A rebelião durou mais de 14 horas e provocou a morte de 26 presos.

Neste momento, Sica defende um trabalho coletivo de juízes, Ministério Público e advogados para repensar o modelo de justiça criminal do Brasil. “A missão mais difícil e que me parece a única saída exige inteligência e trabalho coletivo: repensar o modelo de justiça criminal, rever e alterar nosso modo de pensar e agir em relação à questão criminal”.


Leia a entrevista completa abaixo:



Em um jogo de empurra, ouvimos diferentes membros do Judiciário afirmando que situação carcerária não é função da Justiça, mas sim do Executivo. Qual é a sua avaliação?

Se vivemos uma crise que passa pela aplicação e execução da lei penal, não entendo como a questão não passe pelo judiciário.

Em momentos de tragédias como esse é preciso mobilizar a sociedade e os profissionais do direito. E a declaração [de que o judiciário não tem responsabilidade] serve para desmoralizar os profissionais. Nos últimos três anos o executivo construiu muitos presídios e chegou no seu limite financeiro e estrutural. O problema é na entrada de presos. E quem gerencia a entrada é o Poder Judiciário.

A limitação do Judiciário à lei de execução penal impede uma atuação mais ativa para colaborar com a melhoria do sistema penitenciário?


É realmente necessário alterar a Lei de Execução Penal que hoje oferece poucas possibilidades para os juízes escolherem pena menores ou alternativas, no entanto, a lei oferece possibilidades suficientes que não são exploradas pelos juízes. Há dias, um juiz de Manaus determinou que presos não fossem para a prisão por falta de vagas. Os juízes podem fazer mais. Eles são essenciais para operar na cultura do encarceramento. Mas, por meio de decisões judiciais, eles estão promovendo cultura do encarceramento.

A Lei de Execução Penal estabelece parâmetros de ocupação. O juízes podem se recusar a mandar pessoas para a prisão se a condenação não estiver de acordo com a lei. A medida é ousada, mas amparada na lei. O juiz pode falar: “Se não tem vaga, não vou prender”.

Alguns juízes preferem penas alternativas e podem escolher o regime prisional e muitas vezes escolhem o fechado, desnecessariamente. Embora a lei precise ser reformada, há muito o que os juízes podem fazer. O poder jurisdicional tem ônus ao juiz. A pessoa que escolheu a carreira pública e deve entender a importância do momento.

O Brasil conta hoje com uma massa de presos provisórios de quase 50% da população carcerária. Como solucionar essa situação?

O problema da prisão provisória é tipicamente aquela que depende dos profissionais do direito. Advogados, promotores e juízes precisam reafirmar a lei. A lei de execução penal diz que a prisão provisória é medida de exceção e ela deve voltar a ser exceção e não a regra.

As audiências de custódia mostram a falta de necessidade de muitas prisões provisórias e precisam ser implementadas em todas as varas do país. Mesmo que com a resistência de juízes, as audiências de custódias foram realizadas e deram certo.

É necessária a revisão da lei de drogas para reduzir a superlotação nos presídios?

A Lei de Drogas só tem servido para duas coisas atualmente: fornecer mão de obra para facções criminosas, porque jovens usuários e pequenos comerciantes são “colocados” sob o poder de facções criminosas, e garantir um mercado clandestino valioso para as facções.

Isso já é reconhecido por quem estuda. É novidade sabida que precisa ser enfrentada. O Brasil está ficando para trás das questões das drogas. Em muitos estados dos Estados Unidos e no Uruguai, por exemplo, o uso da maconha é permitido.

Já existe senso seguro, estudo, de que a descriminalização regulada é o caminho mais seguro, e mais eficiente. A repressão às drogas já foi testada e não funcionou. Qualquer empresário, nesta situação, tentaria uma nova solução. E a solução é essa.

Qual é a postura que juízes, promotores e advogados devem adotar neste momento de crise do sistema carcerário?

Juízes, advogados e promotores não podem renunciar ao seu papel social diante da crise penitenciária, precisam enfrentá-la e trabalhar em conjunto. Diante do atual estado de coisas, é evidente que muita coisa errada foi feita. Logo, cada profissão precisa repensar sua atuação: todos erramos, precisamos assumir isso e reconhecer erros e omissões, sem o que não será possível solucionar ou minimizar o problema.

A missão mais difícil e que me parece a única saída exige inteligência e trabalho coletivo: repensar o modelo de justiça criminal, rever e alterar nosso modo de pensar e agir em relação à questão criminal.


Livia Scocuglia - Brasília

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